O dever da empresa operadora de plano de saúde de custear o tratamento domiciliar de paciente mediante o serviço conhecido como home care tem sido amplamente discutido nos tribunais. As empresas desse ramo alegam que o serviço de home care não consta do rol de coberturas previstas no contrato de plano de saúde, portanto, não podem ser obrigadas a custear as referidas despesas.
Para melhor ilustrar essa realidade, imagine que Pedro é cliente de um plano de saúde. Após ficar doente, ele foi internado no hospital, onde permaneceu por algumas semanas. Até então, o plano de saúde estava pagando todas as despesas. O médico que acompanhava seu estado de saúde viu que seu quadro clínico melhorou e recomendou que ele fosse para casa, mas lá ficasse realizando tratamento domiciliar (home care) até que tivesse alta completa.
Ocorre que o plano de saúde não aceitou, afirmando que o serviço de home care não está no rol de cobertura previsto no contrato firmado com Pedro. Segundo a operadora, apenas o tratamento hospitalar está incluído. Diante de tal situação hipotética, podemos fazer o seguinte questionamento: o plano de saúde pode ser obrigado a custear o tratamento domiciliar (home care) mesmo que isso não conste expressamente do rol de serviços previsto no contrato?
A resposta, sem dúvida, é sim. No caso em que o serviço de home care não conste expressamente do rol de coberturas previsto no contrato de plano de saúde, a operadora ainda assim será obrigada a custeá-lo em substituição à internação hospitalar contratualmente prevista, desde que respeitados os seguintes requisitos:
- Tenha havido indicação desse tratamento pelo médico assistente;
- O paciente concorde com o tratamento domiciliar;
- Não ocorra uma afetação do equilíbrio contratual em prejuízo do plano de saúde (exemplo em que haveria um desequilíbrio: nos casos em que o custo do atendimento domiciliar por dia supera a despesa diária em hospital).
Em geral, o tratamento domiciliar é mais barato que o tratamento hospitalar, de forma que, geralmente, não haveria essa afetação do equilíbrio contratual. Se o plano de saúde não fornecer o home care por não preencher os requisitos acima, ele deverá continuar mantendo os custos do tratamento hospitalar. Em caso de recusa indevida no fornecimento do home care, o plano de saúde poderá ser condenado a pagar indenização por danos morais.
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Os contratos de planos de saúde, além de serem classificados como contratos de consumo (relação jurídica de consumo), são também contratos de adesão. Como consequência, a interpretação dessas cláusulas contratuais segue as regras especiais de interpretação dos contratos de adesão ou dos negócios jurídicos estandardizados.
Assim, havendo dúvidas, imprecisões ou ambiguidades no conteúdo de um negócio jurídico, deve-se interpretar as suas cláusulas do modo mais favorável ao aderente. Nesse sentido, ainda que o serviço de home care não conste expressamente no rol de coberturas previstas no contrato do plano de saúde, havendo dúvida acerca das estipulações contratuais, deve preponderar a interpretação mais favorável ao consumidor, como aderente de um contrato de adesão, conforme, aliás, determinam o art. 47 do Código de Defesa do Consumidor, a doutrina e a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
A conclusão é que o serviço de home care constitui desdobramento do tratamento hospitalar contratualmente previsto. Em outras palavras, é uma etapa do tratamento. Daí o STJ ter entendido ser possível essa obrigação em desfavor dos planos de saúde.
Por fim, destaca-se que esse mesmo raciocínio também é utilizado para reconhecer a abusividade de cláusula contratual que exclui, expressamente, a cobertura do serviço de home care. Essa exclusão contratual do fornecimento de home care estabelece limites que restringem riscos e os transfere para o consumidor, deixando-o em situação de extrema desvantagem.
Dessa forma, é abusiva a cláusula contratual que exclui ou até mesmo limita tratamento domiciliar devidamente prescrito por médico responsável pelo tratamento do segurado de plano de saúde, o que evidentemente viola o disposto no artigo 51, inciso IV e seu § 1º, do Código de Defesa do Consumidor.
As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor.
São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade; § 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que: I – ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence; II – restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual; III – se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso.