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Responsabilidades da diretoria técnica/clínica dos hospitais e a pandemia

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Muito se tem falado diariamente, na mídia, sobre a escassez de recursos nos hospitais e sobre a impossibilidade de atendimento de todos os doentes de algumas cidades. Até onde vai a responsabilidade da diretoria nesse cenário?

Muito se tem falado diariamente na mídia sobre a escassez de recursos nos hospitais e sobre a impossibilidade de atendimento de todos os doentes de algumas cidades.

Com esses questionamentos, vem à tona a figura dos diretores técnicos e clínicos dos hospitais. Ora, até onde eles podem ser responsabilizados em razão do que estamos vivendo nesta pandemia?

O Decreto nº 44.045/58 e a Lei nº 6.839/80 estabelecem que as instituições de assistência médica estão sob a ação disciplinar e de fiscalização dos Conselhos de Medicina.

A Resolução nº 997/80 do CFM estabelece que o Diretor Técnico Médico, principal responsável pelo funcionamento dos estabelecimentos de saúde, terá obrigatoriamente sob sua responsabilidade a supervisão e coordenação de todos os serviços técnicos do estabelecimento, que a ele ficam subordinados hierarquicamente.

A Resolução nº 2.147/2016 do CFM, por sua vez, estabelece que o diretor técnico, nos termos da lei, é o responsável perante os Conselhos Regionais de Medicina, autoridades sanitárias, Ministério Público, Judiciário e demais autoridades pelos aspectos formais do funcionamento do estabelecimento assistencial que represente.

Nessa mesma Resolução estão estabelecidas as atribuições, direitos e deveres dos diretores técnicos e clínicos.

No atual momento, nos cabe destacar alguns dos principais pontos que podem levar à uma responsabilização das instituições, na figura do diretor técnico, perante aos Conselhos Profissionais e à Justiça, em razão do coronavírus.

É dever do diretor técnico, de acordo com o artigo 2º, §3º da Resolução, zelar pelas condições dignas de trabalho dos profissionais da instituição de saúde. Isso quer dizer que ele será o responsável pelas faltas éticas em decorrência de insuficiência materiais, instrumentais e técnicas do hospital, por exemplo.

Ainda, é dever da diretoria técnica assegurar que os médicos atuantes na instituição estão devidamente registrados nos Conselhos Regionais, bem como organizar as escalas de plantonistas para assegurar o atendimento integral.

Igualmente, é dever assegurar o abastecimento adequado de produtos e insumos de qualquer natureza para o funcionamento do estabelecimento.

Por outro lado, a Resolução nº 2.147/2016 prevê que o diretor clínico é o representante do corpo clínico do estabelecimento assistencial perante o corpo diretivo da instituição, notificando ao diretor técnico sempre que for necessário ao fiel cumprimento de suas atribuições.

É ele(a) que, nos termos do artigo 5º da Resolução, assegura que todos os pacientes terão um médico assistente durante a internação e que organiza os prontuários – tanto sua organização dentro dos parâmetros legais, quanto exige que o corpo clínico realize as anotações corretamente.

São deveres da diretoria clínica, dentre outros, a supervisão das atividades médicas – devendo comunicar à diretoria técnica condições de aparelhos, falta de insumos e medicamentos, dentre outras questões práticas que estejam interferindo na atuação do corpo clínico.

Infere-se dessas disposições, portanto, que os diretores técnicos e clínicos formam, juntos, a espinha dorsal do estabelecimento de saúde e que carregam uma série de responsabilidades, que devem ser observadas mesmo em situações excepcionais de sobrecarga geral da saúde em razão de uma pandemia global.

Mas o que fazer quando não há, em uma determinada localização, disponibilidade de profissionais da saúde suficientes, respiradores, equipamentos de proteção individual, medicamentos, leitos, etc.?

É dever da diretoria técnica agir para solucionar os problemas, mesmo os que aparentemente não têm solução. O diretor técnico deve, para evitar uma responsabilização na esfera administrativa e judicial, comprovar que, assim que ficou ciente do problema, tentou solucioná-lo.

Por exemplo: que procurou os equipamentos no mercado e que os solicitou para as autoridades públicas, que comunicou a falta de leitos e que tentou remanejar os pacientes/profissionais da melhor forma possível, que tomou todas as providências para a contratação de novos profissionais, que organizou a escala para garantir os atendimentos, que buscou substitutos no caso de faltas e afastamentos, que atuou pessoalmente quando tinha condições técnicas para tanto e precisavam do seu serviço, que organizou as comunicações para autoridades sanitárias do casos de notificação compulsória, etc.

Dessa forma, ainda que muitos problemas fiquem sem solução por razões alheias à vontade do diretor técnico, ele comprova que cumpriu o seu papel e atuou para resolver e melhorar a situação. O que não pode existir é a inércia do principal responsável pela instituição de saúde.

No mesmo sentido, o diretor clínico deve comprovar que supervisionava a atuação do corpo clínico da instituição, que fiscalizou os equipamentos e insumos de perto, que verificou pessoalmente as condições de trabalho dos seus colegas, que organizou e fiscalizou os prontuários, que garantiu que todos os pacientes internados estivessem sob a responsabilidade de um médico assistente, que reportou eventuais problemas para a diretoria técnica, etc.

Ressaltamos, ainda, que os profissionais que ocupam os cargos das diretorias devem atuar de acordo com o que dispõe o Código de Ética Médica, demais Resoluções do CFM e legislações federais, estaduais e municipais, correndo o risco de responderem não apenas em nome da instituição, mas também pessoalmente por seus atos.

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Estamos vivendo com uma sobrecarga do sistema de saúde jamais vista em alguns locais do Brasil, o que, obviamente, leva a falhas na prestação de serviço dos hospitais. Porém, essas falhas não podem ser decorrência direta da falta de atuação da diretoria técnica e clínica, o que também pode gerar responsabilização pessoal dos que ocupam os cargos por não terem cumprido as suas atribuições e deveres legais. 

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Sobre as autoras
Ana Beatriz Nieto Martins

Advogada (OAB/SP 356.287), sócia no escritório Dantas & Martins Advogadas Associadas, voltado o atendimento de profissionais da saúde, realizando diagnóstico de riscos jurídicos e elaborando condutas preventivas que permitam uma atuação segura e tranquila.

Erika Evangelista Dantas

Advogada (OAB/SP 434.502), sócia do escritório de advocacia Dantas & Martins Advogadas Associadas, especializado em direito da saúde.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARTINS, Ana Beatriz Nieto ; DANTAS, Erika Evangelista. Responsabilidades da diretoria técnica/clínica dos hospitais e a pandemia. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6180, 2 jun. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/82574. Acesso em: 22 dez. 2024.

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