Artigo Destaque dos editores

O pregão em tempos de covid-19: inovações procedimentais de acordo com a Lei n. 13.979/2020

Exibindo página 2 de 3
Leia nesta página:

3. A REDUÇÃO DO PRAZO DE IMPUGNAÇÃO E DO PEDIDO DE ESCLARECIMENTO: COMO FICA?

Ao contrário dos prazos referidos no tópico anterior, cuja contagem se dá de forma prospectiva (“para frente”), observando o art. 110 da Lei nº 8.666/1993[13], a tempestividade para o exercício do direito de impugnar o edital e de apresentar pedido de esclarecimento é estabelecida a partir da metodologia de contagem retroativa (“para trás”), dado o uso do termo “até” nos §§1º e 2º do art. 41 da Lei de Licitações, no art. 12 do Decreto nº 3.555/2000 e nos arts. 23 e 24 do Decreto nº 10.024/2019.

De plano, compreendemos que a lógica de redução meramente matemática (aplicando-se o divisor 2) seria incompatível, em termos jurídicos e práticos, com a metodologia dos prazos de impugnação e de pedido de esclarecimento.

Afinal, na hipótese de se reduzir pela metade, tanto no caso do pregão presencial (“até” 2 dias úteis) como no caso do pregão eletrônico (“até” 3 dias úteis), teríamos um número objetivo: “até” 1 dia útil. Contudo, dada a contagem “para trás”, ao advogar que o novo prazo de impugnação e pedido de esclarecimento seja de “até” 1 dia útil antes da data de abertura do certame, recai-se em uma contradição, porquanto, como se compreender que o prazo está sendo reduzido “pela metade”, se o licitante terá, na verdade, um maior tempo efetivo para impugnar o edital a contar de sua disponibilização?

Tal paradoxo pode ser materializado no exemplo de um pregão eletrônico com prazo de divulgação de 8 dias úteis. No caso de pregão sem a afetação da Lei nº 13.979/2020, o licitante, por poder impugnar o edital até 3 dias úteis antes da data de abertura do certame, disporia de 5 dias úteis iniciais para exercer o seu direito. Contudo, em um pregão para aquisição de bem contemplado no escopo da Lei nº 13.979/2020, se aplicada a regra objetiva de 1 dia útil antes da abertura da licitação, o mesmo licitante disporia de 7 dias úteis iniciais para impugnar. Ou seja, defender que o “novo” prazo seja de 1 dia útil, implica em admitir o aumento do prazo para impugnar e não a sua redução “pela metade”, como parecer pretender o art. 4º-G da Lei nº 13.979/2020.

Ademais, há que se registrar um problema de ordem prática em tal entendimento: caso o licitante venha a impugnar o edital no prazo limite de até 1 dia útil antes da abertura do certame, não haveria prazo útil para a Administração responder à impugnação, já que a licitação seria aberta no dia útil seguinte à apresentação da impugnação...

Se levarmos em conta que a ideia de redução dos prazos do pregão pela metade tem o intuito de ir ao encontro da celeridade necessária para o atendimento da emergência decorrente do coronavírus, dada a metodologia retroativa de contagem de prazo de tais atos procedimentais, a fixação do prazo de “até” 1 dia, por representar o aumento efetivo do prazo para impugnar e solicitar esclarecimentos, não contribui em nada para o objetivo da agilidade do procedimento.

Em nossa avaliação, o que se há de considerar é a garantia de um tempo razoável para os licitantes e demais interessados impugnarem ou pedirem esclarecimentos, tendo sempre como referência a data da publicação do instrumento convocatório e a data prevista para a apresentação das propostas. Ressaltando-se que, em tal lapso de tempo, devem ser assegurados os prazos viáveis para a elaboração das respectivas respostas por parte do Pregoeiro.

Outrossim, ao se contemplar apenas o tempo para os licitantes e demais interessados impugnarem ou pedirem esclarecimentos, estabelecendo aí o prazo de 1 dia útil antes da data para o recebimento das propostas, correr-se-á o risco de constantes adiamentos da sessão do pregão, dada a necessidade lógica de o Pregoeiro promover, ainda antes da abertura do certame, as respectivas respostas. Isso ocorreria porque, a prevalecer o prazo de “até” 1 dia útil para impugnar ou solicitar esclarecimentos, a Administração receberia tais atos 1 dia útil antes da abertura da sessão, o que não garantiria o tempo hábil para a resposta, ocasionando, fatalmente, o adiamento da licitação.

Diante de tais pressupostos, tem-se como mais razoável e coerente com a finalidade do art. 4º-G da Lei nº 13.979/2020 (redução do tempo para realização de um pregão) que o prazo para impugnação e pedido de esclarecimento seja aferido não a priori e de forma indefectível (como, por exemplo, 1 dia útil), mas sim de forma dinâmica, vinculada ao caso concreto, a depender do prazo de divulgação conferido ao ato convocatório.

Para tanto, o prazo efetivo de impugnação e solicitação de esclarecimento seria apurado a partir da seguinte metodologia:

PREGÃO ELETRÔNICO

Proporção de tempo efetivo que dispõe o licitante para impugnar e solicitar esclarecimento em condições normais do pregão:

Se o prazo mínimo de divulgação é de 8 dias úteis e o licitante poderá impugnar ou solicitar esclarecimento até o 3º dia anterior à sessão de abertura do pregão, há, na verdade, o tempo efetivo de 5 dias úteis, o que equivale a 62,5% do tempo de divulgação do edital.

Com a redução dos prazos “pela metade”, de acordo com o art. 4º-G da Lei nº 13.979/2020, o tempo efetivo para impugnação e esclarecimento, em relação ao tempo de divulgação do edital, é reduzido de 62,5% para 31,25%.

Assim, no caso do pregão eletrônico (Decreto nº 10.024/2019), levantando-se em conta as possibilidades de prazos de divulgação inferiores a 8 dias úteis e orientações de arredondamento[14]:

Pregão com divulgação de 4 dias úteis:

31,25% equivale a 1,25 dia, ou seja, 1 dia de tempo efetivo para impugnar e solicitar esclarecimento, de modo que o prazo limite seria até o 3º dia útil antes da dada de abertura da sessão.

Pregão com divulgação de 5 dias úteis:

31,25% equivale a 1,56 dia, ou seja, 2 dias de tempo efetivo para impugnar e solicitar esclarecimento, de modo que o prazo limite seria até o 3º dia útil antes da dada de abertura da sessão.

Pregão com divulgação de 6 dias úteis:

31,25% equivale a 1,87 dia, ou seja, 2 dias de tempo efetivo para impugnar e solicitar esclarecimento, de modo que o prazo limite seria até o 4º dia útil antes da dada de abertura da sessão.

Pregão com divulgação de 7 dias úteis:

31,25% equivale a 2,18 dia, ou seja, 2 dias de tempo efetivo para impugnar e solicitar esclarecimento, de modo que o prazo limite seria até o 5º dia útil antes da dada de abertura da sessão.

PREGÃO PRESENCIAL

Proporção de tempo efetivo que dispõe o licitante para impugnar e solicitar esclarecimento em condições normais do pregão:

Se o prazo mínimo de divulgação é de 8 dias úteis e o licitante poderá impugnar ou solicitar esclarecimento até o 2º dia anterior à sessão de abertura do pregão, há, na verdade, o tempo efetivo de 6 dias úteis, o que equivale a 75% do tempo de divulgação do edital.

Com a redução dos prazos “pela metade”, de acordo com o art. 4º-G da Lei nº 13.979/2020, o tempo efetivo para impugnação e esclarecimento, em relação ao tempo de divulgação do edital, é reduzido de 75% para 37,5%.

Assim, no caso do pregão eletrônico (Decreto nº 10.024/2019), levantando-se em conta as possibilidades de prazos de divulgação inferiores a 8 dias úteis e orientações de arredondamento[15]:

Pregão com divulgação de 4 dias úteis:

37,5% equivale a 1,5 dia, ou seja, 1 dia de tempo efetivo para impugnar e solicitar esclarecimento, de modo que o prazo limite seria até o 2º dia útil antes da dada de abertura da sessão.

Pregão com divulgação de 5 dias úteis:

37,5% equivale a 1,87 dia, ou seja, 2 dias de tempo efetivo para impugnar e solicitar esclarecimento, de modo que o prazo limite seria até o 3º dia útil antes da dada de abertura da sessão.

Pregão com divulgação de 6 dias úteis:

37,5% equivale a 2,25% dia, ou seja, 2 dias de tempo efetivo para impugnar e solicitar esclarecimento, de modo que o prazo limite seria até o 4º dia útil antes da dada de abertura da sessão.

Pregão com divulgação de 7 dias úteis:

37,5% equivale a 2,62 dia, ou seja, 3 dias de tempo efetivo para impugnar e solicitar esclarecimento, de modo que o prazo limite seria até o 4º dia útil antes da dada de abertura da sessão.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Ou seja, no caso de pregão eletrônico, cujo prazo limite original para impugnação é de “até” 3 dias úteis da data de abertura do certame, diante das possibilidades concretas de redução do prazo de divulgação de que trata o inciso V do art. 4º da Lei nº 10.520/2002, seriam os seguintes prazos limites para impugnação e pedido de esclarecimento:

PREGÃO ELETRÔNICO

PRAZO DE DIVULGAÇÃO

PRAZO LIMITE PARA APRESENTAR A IMPUGNAÇÃO E/OU PEDIDO DE ESCLARECIMENTO

4 dias úteis

até 3 dias úteis antes da data de realização do pregão

5 dias úteis

até 3 dias úteis antes da data de realização do pregão

6 dias úteis

até 4 dias úteis antes da data de realização do pregão

7 dias úteis

até 5 dias úteis antes da data de realização do pregão

A seu turno, considerando a mesma metodologia informada anteriormente e tendo em vista que o prazo para impugnação e pedido de esclarecimento no pregão presencial é de “até” dias úteis da data de abertura do certame, os prazos seriam os seguintes:

PREGÃO PRESENCIAL

PRAZO DE DIVULGAÇÃO

PRAZO LIMITE PARA APRESENTAR A IMPUGNAÇÃO E/OU PEDIDO DE ESCLARECIMENTO

4 dias úteis

até 2 dias úteis antes da data de realização do pregão

5 dias úteis

até 3 dias úteis antes da data de realização do pregão

6 dias úteis

até 4 dias úteis antes da data de realização do pregão

7 dias úteis

até 4 dias úteis antes da data de realização do pregão

Note-se que o resultado dos prazos-limite é proporcional à redução “pela metade” do tempo efetivo de impugnação e pedido de esclarecimento a contar da disponibilização do edital, conforme os prazos originais previstos nos Decretos nº 3.555/2002 e nº 10.024/2019.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Victor Aguiar Jardim de Amorim

Doutorando em Constituição, Direito e Estado pela UnB. Mestre em Direito Constitucional pelo IDP. Coordenador do Curso de Pós-graduação em Licitações e Contratos Administrativos do IGD. Professor de pós-graduação do ILB, IDP, IGD, CERS e Polis Civitas. Por mais de 13 anos, atuou como Pregoeiro no Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (2007-2010) e no Senado Federal (2013-2020). Foi Assessor Técnico da Comissão Especial de Modernização da Lei de Licitações, constituída pelo Ato do Presidente do Senado Federal nº 19/2013, responsável pela elaboração do PLS nº 559/2013 (2013-2016). Membro da Comissão Permanente de Minutas-Padrão de Editais de Licitação do Senado Federal (desde 2015). Membro do Instituto Brasileiro de Direito Administrativo (IBDA). Advogado e Consultor Jurídico. Autor das obras "Licitações e Contratos Administrativos: Teoria e Jurisprudência" (Editora do Senado Federal) e "Pregão Eletrônico: comentários ao Decreto Federal nº 10.024/2019" (Editora Fórum). Site: www.victoramorim.com

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AMORIM, Victor Aguiar Jardim. O pregão em tempos de covid-19: inovações procedimentais de acordo com a Lei n. 13.979/2020. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6344, 13 nov. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/86299. Acesso em: 16 abr. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos