Coronavírus: a cura da pandemia pela fé religiosa limites da liberdade religiosa e charlatanismo numa sociedade neoliberal

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27/03/2021 às 09:09
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3. A PANDEMIA DO NOVO CORONAVÍRUS E OFERTA DE CURA PELA FÉ RELIGIOSA

Vai, pois, povo meu, entra nos teus quartos e fecha as tuas portas sobre ti; esconde-te só por um momento, até que passe a ira.Porque eis que o Senhor sairá do seu lugar, para castigar os moradores da terra por causa da sua iniquidade, e a terra descobrirá o seu sangue, e não encobrirá mais os seus mortos. (Isaías 26:20,21)

Como é de conhecimento de grande parte da sociedade, o mundo parou subitamente em razão da pandemia do novo coronavírus, que já contaminou e matou milhares de pessoas no mundo.

Imagens deprimentes de caminhões enfileirados carregando caixões funerais na Itália[12], cerimônia de cremação de corpos diante da ausência de cemitérios para sepultar, proibição de velórios, imagens de sepultamento de corpos em covas coletivas, abertura de covas por máquinas retroescavadeiras em cemitérios de São Paulo, hospitais improvisados, um cenário desolador de tristeza, angústia, sofrimento, súplicas, algo que marca uma geração, a história da humanidade.

As autoridades sanitárias buscam, a todo instante, adoção de medidas preventivas para conter as consequências degradantes do vírus, tentando evitar a superação dos terríveis números deixados pela Gripe Espanhola em 1918, que matou perto de 100 milhões de pessoas no mundo.

Com todas as medidas preventivas, e até repressivas, por parte das autoridades sanitárias - decretos de uso obrigatório de máscaras com ameaça de prisão a quem não cumprir as determinações do poder público, ameaça de aplicação do artigo 268 do Código Penal a quem infringir a determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa com pena de até um ano de prisão, etc - infelizmente é cada vez mais crescente o número de pessoas infectadas e de vítimas fatais da pandemia do novo coronavírus.

Diante de todas as medidas sanitárias propostas cientificamente por autoridades do assunto, outras categorias aparecem e propõem a sanação da grave crise. Nesse sentido, como reforço social do time de enfrentamento, alguns líderes religiosos prometem a infalível solução pelo milagre da cura. Existem casos registrados no Brasil em que órgãos de perseguição criminal apuram possível prática de crime contra a saúde pública.

Existe, por exemplo, uma igreja evangélica no Rio Grande do Sul que é investigada por suposta prática de crime de charlatanismo ou curandeirismo, após prometer "imunização" contra o novo coronavírus por meio de um "óleo consagrado".

No panfleto de divulgação do culto que aconteceu num domingo, dia 01/03/2020, a igreja anunciava: "O poder de Jesus contra o coronavírus: venha porque haverá unção com óleo consagrado no jejum para imunizar contra qualquer epidemia, vírus ou doença".

Em matéria divulgada pelo Portal Correio, há informações dando conta de investigações abertas para apurar possível crime cometido por líderes da Igreja Catedral do Espírito Santo.

Nas redes sociais, a Igreja Catedral Global do Espírito Santo, autoproclamada "Casa dos Milagres", ligada ao Centro de Avivamento para as Nações, anunciou um culto chamado "O Poder de Deus contra o Coronavírus". Na descrição, a igreja pede a ida dos fiéis ao local "porque haverá unção com óleo consagrado no jejum para imunizar contra qualquer epidemia, vírus ou doença".[13]

Em entrevista, a promotora de Justiça, Ângela Salton Rotunno, Coordenadora do Centro de Apoio Operacional dos Direitos Humanos do Ministério Público do Rio Grande do Sul informou in totum:

O Ministério Público do Rio Grande do Sul, ao tomar conhecimento de que pessoas estão oferecendo cultos com o objetivo de curar ou trazer algum tipo de proteção a qualquer tipo de vírus, inclusive o coronavírus, adotou já todas as providências cabíveis. Na área criminal, a conduta pode ser enquadrada como charlatanismo ou curandeirismo, e se houve algum tipo de pagamento também pode ser considerada estelionato. Na área administrativa, a federação que responde em relação a esta igreja que está filiada, já foi notificada pelo fato e foram solicitadas explicações em relação a isto. E na área civil, evidentemente, existe a responsabilidade civil, portanto, há a possibilidade de ressarcimento por qualquer tipo de dano, físico ou moral, que possa vir acontecer. Compreendemos que, diante de uma situação de fragilidade emocional que este tipo de doença provoca, as pessoas se sintam com necessidade de buscar algum tipo de apoio em outros tipos de áreas. Entretanto, é o Ministério da Saúde, é a Secretaria Estadual de Saúde, é a Secretaria Municipal de Saúde que devem ser procurados. E quem souber da existência desse tipo de culto pode denunciar para todas as autoridades de Segurança, inclusive o Ministério Público para que possamos então adotar as providência cabíveis.[14]

Um padre da igreja Catedral Metropolitana de Botucatu em São Paulo inovou nas suas bênçãos. Quando a bordo de um avião agrícola usado para pulverizar lavouras, espalhou água benta sobre a população da cidade. "Vamos derramar a água abençoada em todas as famílias, não importa a religião, porque estamos juntos com o mesmo Deus. Pedimos essa força para fazer tudo o que estiver ao nosso alcance, mas confiando em Deus nesse momento que nos desafia”, disse o padre Emerson Rogério Anizi, em vídeo postado na página oficial da catedral (JORNAL O TEMPO).

Assim, as igrejas prometem a cura do vírus pelo infalível método do coronafé, prometem imunizar os fiéis com o poderoso óleo do milagre.

Mesmo antes da crise humanitária do novo coronavírus, alguns segmentos do neopentecostalismo já manifestavam publicamente tratamentos durante os cultos pela cura de fieis, por exemplo, devolvendo o caminhar normal a quem apresentava dificuldades para andar. Um dos líderes mais conhecidos e controvertidos do mundo gospel é o apóstolo e televangelista VALDEMIRO SANTIAGO, líder evangélico da Igreja Mundial do Poder de Deus. Valdemiro Santiago, mineiro da cidade de Palma/MG, aparece em diversos vídeos e entrevistas enaltecendo o poder da cura, inclusive, o religioso enunciou em vídeos, que a camisa que vestia no momento em que sofreu um ataque em 2018, agora tem o poder de “curar” fiéis e realizar milagres.

As declarações polêmicas do pastor Valdemiro Santiago dividem opiniões entre os pastores, dentre eles, o pastor Eliseu Lustosa, que em entrevista gravada em canais virtuais questiona:

Camisa ensanguentada? Será que ele quis dizer, quis afirmar que o sangue dele pode curar? Ou é o simples fato da camisa curar? O que você acha sobre isso, qual é a sua opinião? Porque na mente do Cristão eu sei como é, nós estamos familiarizados a entender que o sangue de Deus cura. Será que o sangue do apóstolo Valdomiro Santiago também cura? Será que é esta, a mensagem que ele quis passar através desta declaração? Ou será que ele faz isso como jogada de marketing para gerar polêmica? Qual a sua opinião? Eu tenho uma forma de falar que já virou quase um provérbio para mim, maconha teológica. Será que isso não é uma maconha teológica não? Maconha teológica é um assunto polêmico que não temos às vezes como provar e comprovar biblicamente falando. E aí, isso dá um debate, uma discussão, e no final uns acreditam e outros não acreditam. Maconha teológica é como se fosse aquela heresia que é bem pregada, mas que quase não tem base e nem fundamentação bíblica e nem comprovação nenhuma. Soa como alguém que fumou um e está querendo interpretar algo que realmente não está escrito na bíblia.... Quem sabe esse vídeo chegue ao conhecimento do apóstolo Valdomiro e ele fale abertamente sobre isso. O sangue da camiseta curou as pessoas ou foi o ato de fé das pessoas? Ou foi porque as pessoas acreditaram nas palavras ou o extremo, as pessoas estão idolatrando ele, vendo ele como ídolo e idolatrando. Isso é idolatria? Não sei.[15]

O mesmo religioso Valdemiro Santiago, líder da Igreja Mundial do Poder de Deus, também foi alvo de muitas discussões recentes nas redes sociais, quando em vídeo divulgado em fontes abertas, anunciou a oferta de grãos de feijão milagrosos denominados “sê tu uma benção”, pedindo um propósito de R$ 1.000,00 reais.

No vídeo divulgado pela imprensa e por canais da internet, o apóstolo Valdemiro informa que:

“na última reunião de bispos e pastores, apresentando um exame, um laudo médico, gente curada em estado terminal, gravíssimo, um estado muito avançado, e Deus operou milagres, e fez maravilha, e taí o exame para quem quiser, seria bom uma reportagem na Globo, na Bandeirantes, Record, SBT, Rede TV, mostrar ao povo de Deus, você, o quão é importante a semente, a semeadura, e aí sim, conseguiram vencer a crise, a epidemia, só tem um jeito de se vencer essas fases difíceis, é semeando na obra de Deus, essa semente é interessante, você planta essa semente, essa semente, “sê tu uma benção”, isso aqui não é brincadeira não, você planta essa semente, ela vai nascer e na planta vai estar escrito “sê tu uma benção”, mas isso é enganar?, não , você que é enganado, um para cada um, eu vou fazer um propósito de mil reais para cada um deles, e muitos que estão nos assistindo vão fazer em mil reais, outros de quinhentos reais, de acordo com a sua sementeira, tem muita gente que pode semear mil reais, e outros quinhentos e até mais, quem quiser...”

Em reportagem da Revista Veja, consta que o líder religioso anunciava a cura falsa da Covid-19, e que estaria o apóstolo da Igreja Mundial do Poder de Deus, pedindo 1.000 reais pela semente milagrosa de feijão.

Nova estratégia para arrecadar dízimos, a comercialização de “semente” milagrosa de feijão fez o procurador Wellington Saraiva pedir ao Ministério Público de São Paulo, que denuncie o autodenominado apóstolo Valdemiro Santiago por suposta prática de estelionato. Em culto, onde colocou 3.000 pessoas no mesmo ambiente e acompanhado por VEJA, em São Paulo, o líder da Igreja Mundial do Poder de Deus sugere o valor de 1.000 reais pela semente. “Ela vai fazer prosperar e evitar todos os problemas”, disse ele. Valdemiro se referia ao novo coronavírus. Segundo sua lógica, os fiéis devem demonstrar amor por seus familiares comprando a tal da semente: “Leva para os filhos, para a nora, para os netos, para todo mundo.” Imagens no telão mostram a semente sendo plantada. Mais de 50 obreiros com várias delas nas mãos passam pelas fileiras lotadas ofertando o produto, vendido em dinheiro ou com máquina de cartão de crédito. Valdemiro Santiago falou que, segundo os médicos e a sociedade como um todo, ninguém deveria frequentar igrejas. “Querem fechar as ruas, mas daí, vocês acordam mais cedo para poder chegar no culto no horário. Não tem problema. ” Valdemiro Santiago define a Covid-19 como “Exu Corona” e afirma que o número de mortos no Brasil é fake news. “Isso é coisa do maligno: simular que alguém morra para aterrorizar as pessoas”, praguejou. Valdemiro se referia a uma notícia falsa, propagada pela deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP), de que caixões vazios estariam sendo enterrados no Ceará. Algumas pessoas dão testemunho de cura do coronavírus. “Quem cura é Deus não a ciência”, diz Valdemiro. Para entrar em culto da Mundial, é preciso fazer um cadastro prévio pela internet e, na entrada, uma obreira passa álcool gel nas mãos de todos.[16]

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Entretanto, no dia 11 de maio de 2020, o Ministério Público Federal ingressou com pedido de retirada do ar, os vídeos do Youtube em que o pastor Valdomiro Santiago aparece oferecendo sementes de feijão como cura para o novo coronavírus. O Google teria cinco dias para cumprir a medida. No documento, os procuradores também pedem que a empresa mantenha o material “preservado e acautelado em arquivos e na íntegra”, para “eventuais e futuras providências de responsabilização processuais”.

VALDEMIRO, em seus argumentos acerca da semente, ainda cita a parábola da semente, no evangelho de Marcos.

E Jesus continuou: —O reino de Deus é assim: Um homem joga a semente na terra. Quer ele esteja dormindo ou acordado, noite e dia, a semente brota e cresce e ele não sabe como isso acontece. Pois a terra produz os grãos por si mesma. Primeiro aparece a planta, depois a espiga e depois os grãos que enchem a espiga. E o homem corta a espiga assim que os grãos amadurecem, pois chegou o tempo da colheita. (MARCOS 4: 21-29)

Após pesquisas investigativas, constatou-se que o vídeo foi retirado da plataforma Youtube, e o apóstolo Valdemiro Santiago, investigado sem sede de Inquérito Policial por suposto crime de estelionato, conduta prevista no art. 171 do Código Penal, consistente em obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro mediante artifício ardil, ou qualquer outro meio fraudulento, pena de reclusão de um a cinco anos, e multa.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho teve como objetivo analisar, sem fins exaustivos, a grave crise humanitária da pandemia do novo coronavírus, estabelecendo uma inter-relação acerca da cura da doença pela fé religiosa, apresentando os exatos limites do exercício da liberdade religiosa e da prática do crime de charlatanismo, curandeirismo, ou até mesmo exploração da credulidade pública pelo uso de meios maliciosos, subterfúgios ardis e artificiosos, notadamente, em face da existência de uma sociedade neoliberal.

A estrutura do presente estudo se deu em face de sua relevância social e jurídica, sendo que, ab initio, foram realizadas abordagens na questão da liberdade religiosa como direito, classificada no rol dos direitos humanos, portanto, irrenunciável, universal e inalienável, prevista em diversos Tratados e Convenções Internacionais, a exemplo da Declaração Universal dos Direitos Humanos, Pacto Internacional de direitos civis e políticos de 1966, e Pacto de São José da Costa Rica de 1969, dos quais o Brasil é signatário.

A liberdade religiosa também é prevista no rol dos direitos fundamentais, artigo 5º, inciso VI, da Constituição da República de 1988, considerada cláusula pétrea, imutável até mesmo por Emendas Constitucionais, a teor do artigo 60, § 4º, inciso IV, da CF/88.

Sendo direito fundamental, a atividade religiosa de qualquer natureza foi elevada à categoria de serviços essenciais e, portanto, indispensável por ocasião da pandemia do novo coronavírus, consoante Decreto Federal nº 10.292, de 20 de março de 2020, que regulamentou a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, para definir os serviços públicos e as atividades essenciais, incluindo, então, as atividades religiosas de qualquer natureza, como serviços essenciais, consoante artigo 3º, inciso XXXIX, do referido comando normativo. Entretanto, por decisão da 6ª Vara de Brasília, a Justiça Federal determinou a retirada da atividade religiosa de qualquer natureza, do rol de serviços essenciais, e desta feita, devem os templos ficar fechados, obedecendo assim, as normas do distanciamento social horizontal, determinadas pelas autoridades sanitárias.

Importante considerar que, recentemente, o STF decidiu que os Estados e Municípios têm competência no âmbito de sua circunscrição, em legislar sobre normas de distanciamento social, e alguns prefeitos têm decidido pelo funcionamento dos templos, impondo algumas restrições de segurança social, a exemplo do município de Teófilo Otoni/MG, que por meio do Decreto nº 8.035, de 20 de abril de 2020, artigo 6º, II, disciplinou e permitiu a realização de cultos e cerimônias religiosas de qualquer natureza, com público não superior a 30 pessoas, com adoção das cautelas preventivas de estilo.

Ato contínuo, uma seção reservada à política econômica no Brasil, num viés neoliberal e possível conduta criminosa, nas atividades religiosas de qualquer natureza. Sabe-se que a política econômica brasileira deve se fundar em bases principiológicas voltadas para a tutela da dignidade da pessoa humana, e valores sociais do trabalho e da livre iniciativa.

Por sua vez, a Constituição da República de 1988 rotula a ordem econômica, que deve possuir um olhar direcionado para a valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos, existência digna, conforme os ditames da justiça social, dentre outros, os princípios da propriedade privada, função social da propriedade, livre concorrência, defesa do consumidor, redução das desigualdades regionais e sociais e busca do pleno emprego.

Neste compasso, devem as atividades religiosas, de qualquer natureza, obedecer aos ditames econômicos sem atropelos e ofensas aos consumidores da fé religiosa, considerando a linha tênue entre o exercício de liberdade religiosa e o cometimento de crimes como charlatanismo, curandeirismo e exploração da credulidade pública. Conforme posições doutrinárias e julgados dos Tribunais Superiores, firmando sólido entendimento que o curandeirismo, por ser uma fraude, não lhe vem em socorro a liberdade religiosa assegurada na Constituição do Brasil. A lei não protege o ilícito, como também não dá cobertura ao artifício, à mentira, à mistificação, pois vale mais o interesse coletivo protegido, que um proselitismo particular em risco cuja extensão não tem medida.

Na última seção foram realizadas incursões acerca da gravíssima pandemia do novo coronavírus, que desafia autoridades públicas e sanitárias do mundo, e consequente oferta de cura pela fé religiosa.

Sabe-se que a pandemia começa na China, se alastra para a Europa, alcançando mais de 200 países do mundo, com saldo negativo de milhões de contaminados e mortes, com fatídicas consequências para a humanidade como perda de vidas, distanciamento social, com impacto na economia e no mercado de trabalho, montagem de hospitais de campanha semelhante ao cenário de guerra, privações de honras fúnebres de familiares que perderam seus entes queridos, sepultamento de mortos em covas coletivas, aumento dos índices de autoextermínio decorrente do desespero e terror do desemprego e da fome, e, diante de tudo isso, cientistas do mundo tentam inventar uma vacina ou medicamento eficaz para a cura da doença, inclusive testando a eficiência da hidroxicloroquina para combate ao vírus destruidor.

Diante da busca de uma solução viável para a cura do novo coronavírus, as autoridades sanitárias e profissionais infectologistas indicam medidas preventivas como assepsia de mãos e braços, técnicas ao tossir, e, sobretudo, ações ligadas ao distanciamento e isolamento social nas modalidades horizontal ou vertical, e, nesse sentido, lamentavelmente, tem aparecido a nociva polarização política em torno das medidas adotadas em detrimento do interesse público.

Em meio a essa confusão gigantesca, alguns líderes religiosos têm se manifestado de forma contundente pela oferta de imunização do vírus através do Poder de Deus, incitando os fiéis a comparecerem à igreja, não obstante, as normas restritivas do distanciamento social, para unção com óleo consagrado no jejum contra qualquer epidemia, vírus ou doença.

Diante de ofertas agressivas em torno da cura da doença viral pela fé religiosa, alguns religiosos são investigados pela Polícia por suposta prática de crimes contra a saúde pública, notadamente, por condutas de charlatanismo, curandeirismo e exploração da credulidade pública por meio de fraude, a exemplo do que acontece com pastores de uma igreja neopentecostal no Rio Grande do Sul, investigados por suposta prática de crimes contra a saúde pública, ou até mesmo delito de estelionato previsto no artigo 171 do Código Penal.

E por aqui, eticamente e pautado no respeito à liberdade religiosa, não se ocuparam das acaloradas e acirradas discussões acerca da doença da carne e da doença do espírito. Segundo entendimento de algumas doutrinas religiosas, para a doença do corpo existem as indicações dos médicos, profissionais que estudam por muito tempo para essa finalidade. Mas há quem afirme que, para a doença do espírito, não há indicação de profissionais da medicina, uma vez que estes não resolvem essa enfermidade, sob argumento de que não existem remédios para a doença do espírito ruim, que foi causada pelo demônio ou pelo satanás, cuja solução é somente com muita oração para expulsar os espíritos ruins. Assim, afirmam que os médicos não conseguem expulsar os espíritos ruins e nem precisam procurá-los.

E mais que isso. Salientam que Deus não criou o homem com órgãos anormais, e então, se seu coração não funciona bem, certamente é porque há um demônio alojado dentro de você, considerando que você abriu a porta para satanás entrar na sua vida quando procurou outros recursos senão a igreja de Deus, e assim, você é doente espiritualmente, e também toda a sua família está contaminada pelo poder desses espíritos.

Por fim, neste momento de grave crise sanitária e econômica, e risco iminente para a sobrevivência da humanidade, é interessante que se tenha como foco a necessidade de adoção de medidas preventivas para minimizar os impactos da doença sem nenhum colorido partidário, reconhecer os esforços de cientistas na descoberta de um medicamento eficaz contra o vírus, assegurar o exercício dos direitos humanos da liberdade religiosa, com a inevitável contenção de aproveitadores que insistem em anunciar métodos secretos e infalíveis para a cura da enfermidade, assegurando, assim, a prevalência das bases fundamentais do Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias.

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Sobre o autor
Jeferson Botelho Pereira

Jeferson Botelho Pereira. Ex-Secretário Adjunto de Justiça e Segurança Pública de MG, de 03/02/2021 a 23/11/2022. É Delegado Geral de Polícia Civil em Minas Gerais, aposentado. Ex-Superintendente de Investigações e Polícia Judiciária de Minas Gerais, no período de 19 de setembro de 2011 a 10 de fevereiro de 2015. Ex-Chefe do 2º Departamento de Polícia Civil de Minas Gerais, Ex-Delegado Regional de Governador Valadares, Ex-Delegado da Divisão de Tóxicos e Entorpecentes e Repressão a Homicídios em Teófilo Otoni/MG, Graduado em Direito pela Fundação Educacional Nordeste Mineiro - FENORD - Teófilo Otoni/MG, em 1991995. Professor de Direito Penal, Processo Penal, Teoria Geral do Processo, Instituições de Direito Público e Privado, Legislação Especial, Direito Penal Avançado, Professor da Academia de Polícia Civil de Minas Gerais, Professor do Curso de Pós-Graduação de Direito Penal e Processo Penal da Faculdade Estácio de Sá, Pós-Graduado em Direito Penal e Processo Penal pela FADIVALE em Governador Valadares/MG, Prof. do Curso de Pós-Graduação em Ciências Criminais e Segurança Pública, Faculdades Unificadas Doctum, Campus Teófilo Otoni, Professor do curso de Pós-Graduação da FADIVALE/MG, Professor da Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC-Teófilo Otoni. Especialização em Combate à corrupção, crime organizado e Antiterrorismo pela Vniversidad DSalamanca, Espanha, 40ª curso de Especialização em Direito. Mestrando em Ciências das Religiões pela Faculdade Unida de Vitória/ES. Participação no 1º Estado Social, neoliberalismo e desenvolvimento social e econômico, Vniversidad DSalamanca, 19/01/2017, Espanha, 2017. Participação no 2º Taller Desenvolvimento social numa sociedade de Risco e as novas Ameaças aos Direitos Fundamentais, 24/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Participação no 3º Taller A solução de conflitos no âmbito do Direito Privado, 26/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Jornada Internacional Comjib-VSAL EL espaço jurídico ibero-americano: Oportunidades e Desafios Compartidos. Participação no Seminário A relação entre União Europeia e América Latina, em 23 de janeiro de 2017. Apresentação em Taller Avanco Social numa Sociedade de Risco e a proteção dos direitos fundamentais, celebrado em 24 de janeiro de 2017. Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad Del Museo Social Argentino, Buenos Aires – Argentina, autor do Livro Tráfico e Uso Ilícitos de Drogas: Atividade sindical complexa e ameaça transnacional, Editora JHMIZUNO, Participação no Livro: Lei nº 12.403/2011 na Prática - Alterações da Novel legislação e os Delegados de Polícia, Participação no Livro Comentários ao Projeto do Novo Código Penal PLS nº 236/2012, Editora Impetus, Participação no Livro Atividade Policial, 6ª Edição, Autor Rogério Greco, Coautor do Livro Manual de Processo Penal, 2015, 1ª Edição Editora D´Plácido, Autor do Livro Elementos do Direito Penal, 1ª edição, Editora D´Plácido, Belo Horizonte, 2016. Coautor do Livro RELEITURA DE CASOS CÉLEBRES. Julgamento complexo no Brasil. Editora Conhecimento - Belo Horizonte. Ano 2020. Autor do Livro VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. 2022. Editora Mizuno, São Paulo. articulista em Revistas Jurídicas, Professor em Cursos preparatórios para Concurso Público, palestrante em Seminários e Congressos. É advogado criminalista em Minas Gerais. OAB/MG. Condecorações: Medalha da Inconfidência Mineira em Ouro Preto em 2013, Conferida pelo Governo do Estado, Medalha de Mérito Legislativo da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, 2013, Medalha Santos Drumont, Conferida pelo Governo do Estado de Minas Gerais, em 2013, Medalha Circuito das Águas, em 2014, Conferida Conselho da Medalha de São Lourenço/MG. Medalha Garimpeiro do ano de 2013, em Teófilo Otoni, Medalha Sesquicentenária em Teófilo Otoni. Medalha Imperador Dom Pedro II, do Corpo de Bombeiros, 29/08/2014, Medalha Gilberto Porto, Grau Ouro, pela Academia de Polícia Civil em Belo Horizonte - 2015, Medalha do Mérito Estudantil da UETO - União Estudantil de Teófilo Otoni, junho/2016, Título de Cidadão Honorário de Governador Valadares/MG, em 2012, Contagem/MG em 2013 e Belo Horizonte/MG, em 2013.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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