Covardia dos Poderes da República

16/04/2021 às 12:08
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Em tempos de pandemia - já adentrando o Brasil no segundo ano - os Poderes da República não se mobilizam para que a população não seja duplamente penalizada.

Cumpre, primeiramente, descrever o significado da palavra covardia: é um comportamento que denota ausência de coragem; gesto que se caracteriza pelo medo ou temor.

O Decreto nº 10.282, de 20 de março de 2020 (alterado pelo Decreto 10.329/2020), define quais são os serviços considerados essenciais, e que não podem ser paralisados por medidas de restrição em todo país.

Realmente, há serviços que não podem deixar de funcionar, a exemplo dos supermercados e farmácias. Mas, quais são os critérios utilizados nos Decretos estaduais e municipais para definir o que é, ou não, essencial, já que a maioria proíbe funcionamento depois das 19:00, 20:00 ou 21:00 horas?

Há cidades com escolas que funcionam presencialmente, ao mesmo tempo em que restaurantes, adotando procedimentos de segurança e distanciamento, são proibidos de abrirem suas portas. Qual a diferença de essencialidade entre uma lanchonete que funciona à noite e uma loja de roupas que funciona de dia? De noite haveria maior risco de contágio pela Covid-19? Estas políticas estariam se preocupando com as milhares de pessoas que dependem, para sua subsistência, do comércio noturno? A restrição de horário faz com que diminua ou aumente o risco de contágio, visto que há maior aglomeração nos estabelecimentos? Essas são dúvidas de muitos cidadãos.

Alguns epidemiologistas dizem que realmente a restrição gera maior aglomeração, principalmente em supermercados, consequentemente maior risco de contágio pela Covid-19. As filas são parte do problema, não só a dos estabelecimentos em geral, mas também as de vacinação e para testes da Covid-19. O Poder Público deveria criar regras nesse sentido, orientar e fiscalizar.

É triste para um comerciante atingido pelas restrições sanitárias ver agências lotéricas e bancárias lotadas, transportes públicos lotados e não poder trabalhar em razão dos Decretos, mesmo com todos os cuidados necessários para evitar a transmissão do vírus.

Acredito que, medidas rígidas de distanciamento e higiene, extensão de horário e restrição no número de pessoas, responsabilização dos proprietários em caso de descumprimento (fechamento por um período em reincidência) e fiscalização, evitaria o contágio e deveriam ser tomadas por qualquer governante antes de impor fechamento arbitrário dos comércios.

Se medidas de segurança não funcionassem, todos que trabalham na linha de frente no combate à covid-19, já deveriam ter se contaminado com o vírus. Para quem não é atingido e não tem seu patrimônio comprometido é mais fácil defender o fechamento sem ao menos testar outras possibilidades.

Sabemos também que a atividade física traz uma série de benefícios para a saúde e, recente estudo da UNESP, aponta que a IRISINA (hormônio produzido durante a atividade física) pode evitar o contágio com a Covid-19. Por que os governantes não incentivam a prática de atividades físicas? Já que academias não podem funcionar em muitos locais, por que não liberam um espaço público aberto e auxiliem no transporte desses equipamentos?

Uma outra questão que surge quando se fala em serviço essencial é o contraste com o direito de subsistência das pessoas que exercem atividades consideradas “não essenciais”.

Como ficam as despesas com água, energia, impostos e funcionários? Quem não dá condições ao trabalho não deveria arcar com tais despesas?

Vejo que uma solução coerente seria obrigar os Estados e Municípios que decretaram medidas de restrição, sem ao menos testar outras possibilidades (medidas mais rígidas de higiene, distanciamento, barreiras sanitárias, exames em massa, proibir circulação de pessoas com sintomas da covid/gripe), isentar os tributos de sua competência para os mais atingidos. Há pessoas que não têm seu trabalho considerado como essencial, mas é desse trabalho que tiram sua sobrevivência e, assim, garantem o pagamento das despesas de água, energia e alimentação.

Dias atrás estava pensando sobre as concessionárias de água e energia - que são bens essenciais a nossa subsistência - as quais deveriam suspender a cobrança para pessoas de baixa renda e as que não podem trabalhar por exercerem funções em áreas consideradas “não essencial”.

Foi quando, dias depois, surgiu a proibição pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) do corte de luz das famílias de baixa renda, medida que vale até 30 de junho. Decisão positiva, mas com período de vigência muito curto e, além disso, seria justo cobrar uma taxa mínima desses usuários que, após a pandemia, estarão endividados com tantas contas que não conseguirão pagar, porquanto durante a pandemia, muitas delas tiveram seus valores aumentados.

Acredito que a ANA (Agência Nacional de Águas) deveria tomar decisão no mesmo sentido, visto que ambos são responsáveis pelos mercados desses dois bens necessários à sobrevivência do ser humano.

O corte no fornecimento desses dois bens (e cobrança normal) serve como uma penalidade dupla para aqueles que, além de não poder trabalhar ou não ter condições nesse momento de crise, não podem também ter direito à sua própria subsistência.

Não faz nenhum sentido, na minha opinião, nesse momento, principalmente, ocorrer aumento nos valores dos produtos e serviços essenciais ao ser humano, como água e energia, bem como no combustível, o que gera, por consequência, aumento nos valores dos alimentos e de outros produtos, já que possuímos um transporte majoritariamente rodoviário.

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Qual a lógica do aumento exorbitante nos valores da gasolina, já que a maioria dos países estão em lockdown e foi reduzido o consumo? O que o auxílio emergencial consegue pagar em relação a alimentos, água, energia, transporte para os que estão com as mínimas condições financeiras?

A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, deveriam arcar com esse aumento ou proibir que ocorra, já que, na verdade, quem está arcando é a população. Deveriam regulamentar uma taxação mínima das contas de água e energia, já que são concessionárias do serviço público, e isentar os impostos de sua competência para os que não têm condições ou não podem trabalhar, e veem suas dívidas crescendo.

Impressionante é a covardia dos poderes da República, que não se mobilizam de nenhuma forma para barrar o aumento no valor desses produtos e serviços, que no momento afetam diretamente a sobrevivência da população. A mesma que paga os vultosos salários desses agentes, através da grande quantia de impostos.

Justificam que o Estado não pode intervir economicamente, mas vivemos em um momento de exceção, e o que está em jogo são vidas, são pessoas endividadas, criminalidade e problemas de saúde.

O Brasil prefere manter o sistema burocrático de altos salários e regalias, ao invés de minimizar os efeitos da pandemia. Os que foram eleitos para nos servir não abrem mão de serem servidos.

Não deveríamos cortar gastos desnecessários ao invés de penalizar os menos favorecidos? Por que os parlamentares não doam ou abdicam seus auxílios/regalias para a compra de mais vacinas, mais leitos de UTIs, mais remédios, itens de higiene e equipamentos de limpezas para as cidades?

Além dos altos salários, a maioria do Poder Público (Legislativo, Executivo e Judiciário) recebe: auxílio-paletó; auxílio-moradia; auxílio-saúde; auxílio-alimentação; carro oficial (com combustível). Imaginem quantos bilhões sobrariam com o corte desses auxílios...

Os que posam de bons samaritanos, mas não abrem mão de suas regalias, infelizmente, não servem para as funções às quais foram eleitos.

Esses agentes têm responsabilidade de buscar soluções para os problemas da população, mas, ao contrário, deixam que seja penalizada duplamente com o aumento de preços.

Soluções de como exigir que os devedores da administração pública, direta e indireta, realizem o pagamento para gerar receita, e não penalizar o contribuinte, é a tônica que o momento exige. Um exemplo são os maiores devedores da previdência, que somam bilhões de reais em dívidas. Não seria um momento justo exigir o pagamento dessas quantias, principalmente dos bancos envolvidos que sempre ganham, mesmo na crise?

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Sobre o autor
Thales Bandeira de Melo

Bacharel em Direito pela Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul Pós-graduando em Advocacia Tributária Produtor de conteúdo em @bandeira.jus Assessor Jurídico - Bandeira Advocacia Estágios Realizados: Defensoria Pública do Estado de Rondônia; Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul; Estágio Participação na Câmara dos Deputados - DF. Amante da escrita e de temas relevantes para o todo!

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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