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Captura de digitais em fotos e proteção de dados pessoais

05/07/2021 às 15:55
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O artigo analisa a coleta de impressões digitais publicas em fotos e as regras de proteção de dados pessoais sobre essa questão na Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD - Lei nº 13.709/2018).

O direito à privacidade, desde a sua elaboração no artigo “The right to privacy”, escrito por Samuel Warren e Louis Brandeis (e publicado em 1890 na Harvard Law Review), é um conceito fluído e dinâmico, que recebe uma alta carga de influência das mudanças sociais, culturais, econômicas, políticas e legislativas, entre outras.

Com a difusão e a popularização da internet, houve uma redução dos limites à privacidade e, até mesmo, o desenvolvimento de uma cultura de exposição, de uma busca por reconhecimento, fama e ganhos financeiros. Isso leva à necessidade de atualização do conceito e dos limites do direito à privacidade, inclusive na proteção dos dados pessoais.

Em 2020, a preocupação com a privacidade não é a mesma que existia em 1890, que compreendia principalmente a publicação não autorizada de fotos nas colunas sociais dos jornais.

Atualmente, há uma utilização crescente da biometria para a identificação segura das pessoas (a partir da análise de determinadas características, físicas e/ou comportamentais), em áreas variadas: dos eleitores pela Justiça Eleitoral, de passageiros nos terminais dos aeroportos, dos consumidores clientes de instituições financeiras, academias, empresas de transporte e em outros setores.

Contudo, o uso de impressões digitais como senhas ou outro meio de identificação pessoal gera mais riscos e vulnerabilidades, especialmente em virtude do uso de ferramentas digitais e de comunicações pela internet.

Há alguns anos, uma equipe do Instituto Nacional de Informática do Japão (NII) identificou a possibilidade de coleta das impressões digitais aparentes em fotos postadas nas redes sociais com os dedos em V. A foto tirada com apenas alguns metros de distância (ou alguns centímetros, no caso de selfies), combinada com uma iluminação forte e um smartphone simples com câmera de alta resolução, permite a recriação digital dos dados da impressão digital.

Em consequência – e de acordo com especialistas da equipe do NII –, seria possível o uso dessa impressão digital “copiada” para acessar aplicações eletrônicas que permitirem o desbloqueio por meio desse dado biométrico, com o agravante da impossibilidade de alteração desse dado (considerado um identificador estático).

Não bastasse isso, hackers chineses já demonstraram que o acesso por impressão digital de qualquer smartphone – e qualquer scanner de impressão digital – pode ser desbloqueado em 20 minutos, com o uso de uma fotografia do dado biométrico do titular (com os dedos em V, por exemplo) e um equipamento simples e barato.

Recorda-se que todos os dados pessoais biométricos são dados pessoais sensíveis (art. 5º, II, da LGPD), o que significa que possuem um tratamento diferenciado, consistente em uma proteção maior (em comparação com os dados pessoais não sensíveis).

No Brasil, em princípio é ilícita qualquer captura de impressão digital a partir das fotos publicadas pelo titular, considerando que, em regra, há necessidade do consentimento do titular (art. 11, I, da LGPD), de forma hierarquicamente superior às demais bases legais para o tratamento de dados pessoais sensíveis.

Por outro lado, a regra de dispensa do consentimento para os dados tornados manifestamente públicos pelo titular se aplica somente aos dados pessoais propriamente ditos ou não sensíveis (art. 7º, § 4º, da LGPD).

Excepcionalmente, caso seja demonstrada a indispensabilidade do tratamento do dado pessoal biométrico, admite-se a sua coleta e outras atividades de tratamento, desde que caracterizada alguma das bases legais previstas no art. 11, II, da LGPD. Contudo, ainda assim é questionável a possibilidade de extrair esse dado pessoal por meio da sua reconstituição a partir de uma foto do titular.

De qualquer modo, é preciso ter conhecimento dos riscos derivados da utilização de dados pessoais biométricos como senhas de acesso ou meios de desbloqueio de dispositivos, em virtude da vulnerabilidade e da possibilidade de coleta a partir de fotos.

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Sobre o autor
Oscar Valente Cardoso

Professor, Doutor em Direito, Diretor Geral da Escola da Magistratura Federal do Rio Grande do Sul, Coordenador do Comitê Gestor de Proteção de Dados do TRF da 4a Região, Palestrante, Autor de Livros e Artigos, e Juiz Federal

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARDOSO, Oscar Valente. Captura de digitais em fotos e proteção de dados pessoais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6578, 5 jul. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/91568. Acesso em: 4 out. 2024.

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