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Disciplina jurídica e as recentes alterações da Lei 6.404/1976 (Lei das Sociedades por Ações – LSA)

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Apresentamos as alterações recentes havidas na LSA pelas Leis Complementares 182/2021 e 169/2019 e Lei 13.818/2019, 14.030/2020 e 14.195/2021.

As Sociedades Anônimas (ou companhias), juntamente com as Sociedades em Comandita por Ações[1], são reguladas, em linhas gerais, pelas disposições da Lei nº 6.404/76 (Lei das Sociedades por Ações  - LSA) [2], que revogou parcialmente o Decreto-lei nº 2.627/40[3] (dispunha sobre as sociedades por ações antes de ser revogado pela Lei nº 6.404/1976).

A Lei nº 6.404/1976 manteve, essencialmente, muitas das orientações normativas contidas no Decreto-lei nº 2.267/1940. Na omissão da LSA o aplicam-se subsidiariamente as normas do Código Civil, conforme previsão do artigo 1.089.

Na Exposição de Motivos da Lei nº 6.404/1976 (Exposição de Motivos da LSA), destacou-se que o projeto tinha o objetivo de criar uma estrutura jurídica adequada ao fortalecimento do mercado de capitais de risco no Brasil, indispensável ao exercício da atividade empresarial. Acrescentou-se, ademais, que o fluxo de recursos da poupança popular e o direcionamento voluntário de valores dessa natureza para o seguimento empresarial exigiria a consolidação de um sistema capaz de garantir aos investidores minoritários a observância de normas estáveis e equitativas.

Além disso, ao se justificar a disciplina simplificada de algumas matérias que passaram a ser tratadas pela LSA, como as referentes aos grupos societários, à oferta pública de aquisição de controle, cisão de companhias etc., foi ressaltado que as normas que versam sobre a atividade empresarial “sobretudo numa realidade em transformação, como é a do mundo moderno e especialmente a do Brasil, não podem pretender a perenidade, têm necessariamente vida curta, e o legislador deverá estar atento a essa circunstância para não impedir o seu aperfeiçoamento, nem deixar em vigor as partes legislativas ressecadas pelo desuso.”

Desde o início da sua vigência, a Lei nº 6404/76 (Lei das Sociedades por Ações – LSA) foi progressivamente transformada.  Recentemente, contudo, a Lei das Sociedades por Ações (LSA) sofreu inúmeras alterações, promovidas por divesas leis.

Para facilitar a compreensão sobre o alcance dessa mudança, elenco abaixo algumas das principais regras modificadas. 

i) Lei nº 13.818/2019 (simplificação da publicidade de atos societários)[4]

A Lei nº 13.818/2019 tratou das publicações obrigatórias e ampliou para R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais) o valor máximo admitido de patrimônio líquido para que a sociedade anônima de capital fechado pudesse ter direito ao regime simplificado de publicidade de atos societários. Foram alterados os 289 e 294 da Lei nº 6.404/1976 (LSA). Confira:

Art. 289. As publicações ordenadas por esta Lei obedecerão às seguintes condições: I – deverão ser efetuadas em jornal de grande circulação editado na localidade em que esteja situada a sede da companhia, de forma resumida e com divulgação simultânea da íntegra dos documentos na página do mesmo jornal na internet, que deverá providenciar certificação digital da autenticidade dos documentos mantidos na página própria emitida por autoridade certificadora credenciada no âmbito da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileiras (ICP-Brasil); II – no caso de demonstrações financeiras, a publicação de forma resumida deverá conter, no mínimo, em comparação com os dados do exercício social anterior, informações ou valores globais relativos a cada grupo e a respectiva classificação de contas ou registros, assim como extratos das informações relevantes contempladas nas notas explicativas e nos pareceres dos auditores independentes e do conselho fiscal, se houver.

ii) Lei 14.030/2020 (assembleias e as reuniões de sociedades)[5]

A Lei 14.030/2020 dispôs sobre as assembleias e as reuniões das sociedades anônimas, das sociedades limitadas, das sociedades cooperativas e das entidades de representação do cooperativismo durante o exercício de 2020. Também alterou as Leis nº 5.764/1971 (Sociedades Cooperativas), nº 6.404/1976 (Sociedades por ações), e nº 10.406/2002 (Código Civil).

A Lei nº 5.764/1971 (Sociedades Cooperativas) recebeu o art. 43-A:

Art. 43-A. O associado poderá participar e votar a distância em reunião ou em assembleia, que poderão ser realizadas em meio digital, nos termos do regulamento do órgão competente do Poder Executivo federal. Parágrafo único. A assembleia geral poderá ser realizada de forma digital, respeitados os direitos legalmente previstos de participação e de manifestação dos associados e os demais requisitos regulamentares.”

O Código Civil também foi acrescido do art. 1.080-A:

Art. 1.080-A. O sócio poderá participar e votar a distância em reunião ou em assembleia, nos termos do regulamento do órgão competente do Poder Executivo federal. Parágrafo único. A reunião ou a assembleia poderá ser realizada de forma digital, respeitados os direitos legalmente previstos de participação e de manifestação dos sócios e os demais requisitos regulamentares.”

Por fim, foram alterados os artigos 121 e 124 da Lei nº 6.404/1976 (Lei das Sociedades por Ações – LSA).

Art. 124. [...] Parágrafo único. Nas companhias, abertas e fechadas, o acionista poderá participar e votar a distância em assembleia geral, nos termos do regulamento da Comissão de Valores Mobiliários e do órgão competente do Poder Executivo federal, respectivamente.

Art. 124. [...] § 2º A assembleia geral deverá ser realizada, preferencialmente, no edifício onde a companhia tiver sede ou, por motivo de força maior, em outro lugar, desde que seja no mesmo Município da sede e seja indicado com clareza nos anúncios. § 2º-A.  Sem prejuízo do disposto no § 2º deste artigo, as companhias, abertas e fechadas, poderão realizar assembleia digital, nos termos do regulamento da Comissão de Valores Mobiliários e do órgão competente do Poder Executivo federal, respectivamente.

iii) Lei nº 14.195/2021 (proteção dos acionistas minoritários)[6]

Além de promover ampla alteração da legislação, a Lei nº 14.195/2021, resultante da conversão da Medida Provisória nº 1.040/2021, dispôs sobre a facilitação para abertura de empresas, sobre a facilitação do comércio exterior, sobre o Sistema Integrado de Recuperação de Ativos (Sira), sobre as cobranças realizadas pelos conselhos profissionais, sobre a profissão de tradutor e intérprete público, sobre a obtenção de eletricidade, sobre a desburocratização societária e de atos processuais e a prescrição intercorrente no Código Civil.

No âmbito das Sociedades Anônimas, a Lei nº 14.195/2021 tratou da proteção de acionistas minoritários.

As alterações foram concretizadas nos seguintes artigos: art. 15, §1º; art. 16, IV e parágrafo único; art. 16-A; art. 100, §3º; art. 110-A, §§ 1º a 14; art. 122, incisos VIII a X, e parágrafo único; art. 124, §1º, II, §5º, I; art. 125; art. 135; art. 136, §2º, §2º-A e §3º; art. 138, §§ 3º e 4º; art. 140, §§ 1º e 2º; art. 141 §7º; art. 146, §2º, I e II; art. 215, §1º; art. 243, §5º; art. 252, §2º; e art. 284.  

iv) Lei Complementar nº 169/2019 (Sociedade de garantia solidária e de sociedade de contragarantia)[7]

A Lei Complementar nº 169/2019, por sua vez, autorizou a constituição de sociedade de garantia solidária (SGS), sob a forma de sociedade por ações, para a concessão de garantia a seus sócios participantes. Também incluiu na Lei Complementar nº123/2006 (Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte) os artigos 61-E a 61-I.

Art. 61-E. É autorizada a constituição de sociedade de garantia solidária (SGS), sob a forma de sociedade por ações, para a concessão de garantia a seus sócios participantes. [...] § 3º Os atos da sociedade de garantia solidária serão arquivados no Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins. § 4º É livre a negociação, entre sócios participantes, de suas ações na respectiva sociedade de garantia solidária, respeitada a participação máxima que cada sócio pode atingir. § 5º Podem ser admitidos como sócios participantes os pequenos empresários, microempresários e microempreendedores e as pessoas jurídicas constituídas por esses associados. [...] § 7º Sem prejuízo do disposto nesta Lei Complementar, aplicam-se à sociedade de garantia solidária as disposições da lei que rege as sociedades por ações.

Art. 61-F. O contrato de garantia solidária tem por finalidade regular a concessão da garantia pela sociedade ao sócio participante, mediante o recebimento de taxa de remuneração pelo serviço prestado, devendo fixar as cláusulas necessárias ao cumprimento das obrigações do sócio beneficiário perante a sociedade. Parágrafo único. Para a concessão da garantia, a sociedade de garantia solidária poderá exigir contragarantia por parte do sócio participante beneficiário, respeitados os princípios que orientam a existência daquele tipo de sociedade.

Art. 61-G. A sociedade de garantia solidária pode conceder garantia sobre o montante de recebíveis de seus sócios participantes que sejam objeto de securitização.

Art. 61-H. É autorizada a constituição de sociedade de contragarantia, que tem como finalidade o oferecimento de contragarantias à sociedade de garantia solidária, nos termos a serem definidos por regulamento.

Art. 61-I. A sociedade de garantia solidária e a sociedade de contragarantia integrarão

v) Lei Complementar nº 182/2021 (Marco Legal das Startups e do Empreendedorismo Inovador)[8]

A Lei Complementar nº 182/2021, além implementar o Marco Legal das Startups e do Empreendedorismo Inovador, promoveu alterações que se expressaram nos seguintes artigos da Lei nº 6.404/1976 (Lei das Sociedades por Ações – LSA): art. 143; art. 294; art. 294-A; e 294-B.

Art. 143. A Diretoria será composta por 1 (um) ou mais membros eleitos e destituíveis a qualquer tempo pelo conselho de administração ou, se inexistente, pela assembleia geral, e o estatuto estabelecerá: [...].

Art. 294. A companhia fechada que tiver receita bruta anual de até R$ 78.000.000,00 (setenta e oito milhões de reais) poderá: I – (revogado); II – (revogado); III - realizar as publicações ordenadas por esta Lei de forma eletrônica, em exceção ao disposto no art. 289 desta Lei; e IV - substituir os livros de que trata o art. 100 desta Lei por registros mecanizados ou eletrônicos. [...] § 4º Na hipótese de omissão do estatuto quanto à distribuição de dividendos, estes serão estabelecidos livremente pela assembleia geral, hipótese em que não se aplicará o disposto no art. 202 desta Lei, desde que não seja prejudicado o direito dos acionistas preferenciais de receber os dividendos fixos ou mínimos a que tenham prioridade. § 5º Ato do Ministro de Estado da Economia disciplinará o disposto neste artigo.

Art. 294-A. A Comissão de Valores Mobiliários regulamentará as condições facilitadas para o acesso de companhias de menor porte ao mercado de capitais, e será permitido dispensar ou modular a observância ao disposto: I - no art. 161 desta Lei, quanto à obrigatoriedade de instalação do conselho fiscal a pedido de acionistas; II - no § 5º do art. 170 desta Lei, quanto à obrigatoriedade de intermediação de instituição financeira em distribuições públicas de valores mobiliários, sem prejuízo da competência prevista no inciso III do § 3º do art. 2º da Lei nº 6.385, de 7 de dezembro de 1976; III - no inciso I do caput do art. 109, nos §§ 1º e 2º do art. 111 e no art. 202 desta Lei, quanto ao recebimento de dividendo obrigatório; e IV - no art. 289 desta Lei, quanto à forma de realização das publicações ordenadas por esta Lei.

Art. 294-B. Para fins do disposto nesta Lei, considera-se companhia de menor porte aquela que aufira receita bruta anual inferior a R$ 500.000.000,00 (quinhentos milhões de reais). § 1º A regulamentação editada não prejudica o estabelecimento de procedimentos simplificados aplicáveis às companhias de menor porte, pela Comissão de Valores Mobiliários, com base nas competências previstas na Lei nº 6.385, de 7 de dezembro de 1976, especialmente quanto: I - à obtenção de registro de emissor; II - às distribuições públicas de valores mobiliários de sua emissão; e III - à elaboração e à prestação de informações periódicas e eventuais. § 2º A Comissão de Valores Mobiliários poderá: I - estabelecer a forma de atualização do valor previsto no caput deste artigo e os critérios adicionais para a manutenção da condição de companhia de menor porte após seu acesso ao mercado de capitais; e II - disciplinar o tratamento a ser empregado às companhias abertas que se caracterizem como de menor porte nos termos do caput deste artigo.

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[1] As sociedades reguladas pelo Código Civil são denominadas de sociedades por quotas, justamente porque tem o capital social dividido em quotas. As sociedades por ações, disciplinadas pela Lei nº 6.404/1976 são assim chamadas pois tem o capital social fracionado em ações. As ações são, portanto, as unidades representativas do capital social dessas sociedades. Existem, nesse contexto, duas espécies de sociedades por ações: as sociedades anônimas (ou companhias) e as sociedades em comandita por ações, ambas disciplinadas na Lei nº 6.404/1976.

[2] Sobre as características básicas da sociedade anônima confira BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito societário. 9ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 141 e seguintes.

[3] Ainda permanecem em vigor algumas regras que tratam das sociedades anônimas dependente de autorização, nos termos dos artigos 59 a 73.

[4] Dispõe sobre as publicações obrigatórias e ampliar para R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais) o valor máximo admitido de patrimônio líquido para que a sociedade anônima de capital fechado faça jus ao regime simplificado de publicidade de atos societários. Altera os artigos 289 e 294 da Lei nº 6.404/1976 (LSA).

[5] Dispõe sobre as assembleias e as reuniões de sociedades anônimas, de sociedades limitadas, de sociedades cooperativas e de entidades de representação do cooperativismo durante o exercício de 2020; altera as Leis nºs 5.764/1971 (Sociedades Cooperativas), 6.404/1976 (Sociedades por ações), e 10.406/2002 (Código Civil).

[6] Além de promover ampla alteração da legislação, a Lei nº 14.195/2021, resultante da conversão da Medida Provisória nº 1.040/2021, dispõe sobre a facilitação para abertura de empresas, sobre a proteção de acionistas minoritários, sobre a facilitação do comércio exterior, sobre o Sistema Integrado de Recuperação de Ativos (Sira), sobre as cobranças realizadas pelos conselhos profissionais, sobre a profissão de tradutor e intérprete público, sobre a obtenção de eletricidade, sobre a desburocratização societária e de atos processuais e a prescrição intercorrente no Código Civil.

[7] Autoriza a constituição de sociedade de garantia solidária (SGS), sob a forma de sociedade por ações, para a concessão de garantia a seus sócios participantes. Inclui na Lei Complementar nº123/2006 (Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte) os artigos 61-E a 61-I.

[8] Art. 1º Esta Lei Complementar institui o marco legal das startups e do empreendedorismo inovador. A Lei Complementar: Estabelece os princípios e as diretrizes para a atuação da administração pública no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; apresenta medidas de fomento ao ambiente de negócios e ao aumento da oferta de capital para investimento em empreendedorismo inovador; e disciplina a licitação e a contratação de soluções inovadoras pela administração pública.

[9] Art. 61-F. O contrato de garantia solidária tem por finalidade regular a concessão da garantia pela sociedade ao sócio participante, mediante o recebimento de taxa de remuneração pelo serviço prestado, devendo fixar as cláusulas necessárias ao cumprimento das obrigações do sócio beneficiário perante a sociedade. Parágrafo único. Para a concessão da garantia, a sociedade de garantia solidária poderá exigir contragarantia por parte do sócio participante beneficiário, respeitados os princípios que orientam a existência daquele tipo de sociedade; Art. 61-G. A sociedade de garantia solidária pode conceder garantia sobre o montante de recebíveis de seus sócios participantes que sejam objeto de securitização.

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Sobre o autor
Antonio Evangelista de Souza Netto

Juiz de Direito de Entrância Final do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Pós-doutor em Direito pela Universidade de Salamanca - Espanha. Pós-doutor em Direito pela Universitá degli Studi di Messina - Itália. Doutor em Filosofia do Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP (2014). Mestre em Direito Empresarial pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP (2008). Coordenador do Núcleo de EAD da Escola da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná - EMAP. Professor da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados - ENFAM. Professor da Escola da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo - EMES. Professor da Escola da Magistratura do TJ/PR - EMAP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA NETTO, Antonio Evangelista. Disciplina jurídica e as recentes alterações da Lei 6.404/1976 (Lei das Sociedades por Ações – LSA). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6666, 1 out. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/93447. Acesso em: 3 dez. 2024.

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