Resumo: Este artigo analisa o conceito de abuso de autoridade, levantando historicamente a atividade policial e analisando a evolução da legislação acerca do abuso de autoridade aplicável à atividade policial. Utilizou-se como metodologia a pesquisa de finalidade básica estratégica, com objetivo descritivo, sob o método hipotético dedutivo, com abordagem qualitativa e procedimentos de análise bibliográficos e documentais. Concluiu-se, ao final, que a evolução acerca da norma sobre o abuso de autoridade e as alterações trazidas pela lei 13.869/2019 são de suma importância para coibir ações excessivas cometidas pelos policiais.
Palavras-chave: Abuso. Autoridade. Evolução. Legislação. Atividade policial.
INTRODUÇÃO
São frequentes os casos de abusos em abordagens policiais no Brasil e, com a nova Lei de Abuso de Autoridade, os atos praticados pela polícia passam a ter uma maior rigidez na punição. Foi feito um levantamento em cinco estados (SP, BA, RJ, CE E PE) e, com os dados colhidos pela Rede de Observatórios da Segurança, no período de 12 meses (junho de 2019 a maio de 2020), sobre os excessos cometidos em atuações da polícia, observou-se que grande parte das 191 vítimas foram agredidas fisicamente.
A violência policial no Brasil também é destacada no relatório feito pela organização internacional Human Rights Watch, no qual se constatou que, de acordo com as informações mais recentes disponíveis, compiladas pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, uma organização não-governamental (ONG), mais de 2.200 pessoas foram mortas em operações policiais em todo o Brasil em 2013, uma média de 6 pessoas por dia. Diante disso, com os reiterados casos de abusos cometidos por policiais, percebe-se a importância de se avaliar os impactos que a nova lei de abuso de autoridade traz e em como ela afeta o exercício da atividade policial. Portanto, indaga-se: quais os impactos da nova lei de abuso de autoridade no exercício da atividade policial?
Nesse viés, o objetivo geral da presente pesquisa é analisar a legislação acerca do abuso de autoridade aplicável à atividade policial. Para tanto, foram delineados os seguintes objetivos específicos: compreender o que é o abuso de autoridade; levantar historicamente a atividade policial e descrever a evolução da legislação acerca do abuso de autoridade no Brasil.
Parte-se da hipótese de que, com a nova lei de abuso de autoridade, os policiais devem ter uma maior atenção com relação aos seus comportamentos, não podendo extrapolar o estrito cumprimento do dever legal da atividade policial. A nova norma traz consigo uma maior clareza sobre as atitudes que serão consideradas excessivas e que irão ou não ser caracterizadas como crime.
Na primeira seção, é analisada a definição e a história do abuso de autoridade. Na segunda, levanta-se historicamente a atividade policial, percebendo-se que, com o passar dos anos, os direitos humanos foram relacionados à atividade policial em uma tentativa de humanização das corporações policiais. Na terceira seção, é descrita a evolução da legislação acerca do abuso de autoridade no Brasil, analisando as mudanças trazidas pela nova Lei de Abuso de Autoridade no exercício da atividade policial.
Desse modo, o trabalho agregará conhecimentos sobre a temática, visto que os objetivos buscam ajudar a compreender o que é o abuso de autoridade policial e em como a lei de abuso de autoridade interfere no exercício da atividade policial.
1. ABUSO DE AUTORIDADE
1.1. Conceito
Antes do conceito de abuso de autoridade, precisa-se, primeiramente, entender sobre o poder de polícia que é atribuído ao Estado, usado para frear ações e direitos dos indivíduos em prol da coletividade. Meirelles (1996, p.115) descreve: poder de polícia é a faculdade que dispõe a Administração Pública para condicionar e restringir uso e gozo de bens, atividades e direitos individuais em benefício da coletividade ou do próprio Estado. Nesse sentido, temos ainda:
O Poder de polícia é uma atividade estatal que limita o exercício dos direitos individuais em benefício do interesse público, este poder funciona como um verdadeiro mecanismo de frenagem, onde o Administração Pública através dele pode conter os abusos do direito individual. O Estado condiciona o exercício dos direitos ao bem estar coletivo, usando o poder de polícia. (PIETRO, 2006, p. 128).
Com esse poder de polícia que é concedido ao Estado, os seus agentes possuem a prerrogativa do uso do poder, que deve ser usado de acordo com as suas finalidades e em conformidade com o interesse público. Sendo assim, ao extrapolar esse poder estatal, utilizando-o de forma abusiva, fora do que está na lei e sem uma utilidade pública, esse ato será considerado ilícito:
O uso do poder é prerrogativa da autoridade. Mas o poder há de ser usado normalmente, sem abuso. Usar normalmente do poder é empregá-lo segundo as normas legais, a moral da instituição, a finalidade do ato e as exigências do interesse público. Abusar do poder é empregá-lo fora da lei, sem utilidade pública. O poder é confiado ao administrador público para ser usado em benefício da coletividade administrada, mas usado nos justos limites que o bem-estar social exigir. A utilização desproporcional do poder, o emprego arbitrário da força, da violência contra o administrado constituem formas abusivas do uso do poder estatal, não toleradas pelo Direito e nulificadoras dos atos que as encerram. O uso do poder é lícito; o abuso, sempre ilícito. Daí por que todo ato abusivo é nulo, por excesso ou desvio de poder" (LOPES MEIRELLES, 1995, p. 94)
Diante disso o poder de polícia é limitado, pois ao se usá-lo de forma inadequada, incorrerá o abuso de poder, visto que ele não pode violar os direitos fundamentais assegurados pela Constituição da República:
Do mesmo modo que os direitos individuais são relativos, assim também acontece com o poder de polícia que, longe de ser onipotente, incontrolável, é circunscrito, jamais podendo pôr em perigo a liberdade e a propriedade. Importando, regra geral, o poder de polícia, restrições a direitos individuais, a sua utilização não deve ser excessiva ou desnecessária, para que não se configure o abuso de poder. Não basta que a lei possibilite a ação coercitiva da autoridade para justificação do ato de polícia. É necessário, ainda, que se objetivem condições materiais que solicitem ou recomendem a sua inovação. (CRETELA JÚNIOR, p. 31-32)
Ante o exposto, pode-se entender o abuso de autoridade como o conjunto de ações realizadas pelo agente público que, no exercício de sua função, abuse do poder que lhe tenha sido atribuído, com a finalidade específica de prejudicar outrem ou beneficiar a si mesmo ou a terceiro ou ainda por mero capricho ou satisfação pessoal.
Através da história sabe-se que houve movimentos autoritários pelo mundo, como o nazismo na Alemanha, por exemplo, no qual pessoas se aproveitaram de sua posição de autoridade, ultrapassando o seu poder, agindo de forma desumana, prejudicando a vida de milhares de pessoas para alcançar determinados fins. Essas ações foram tão cruéis que ocasionaram trágicas consequências na vida de milhões de pessoas. A esse respeito, têm-se:
O crime de abuso de autoridade é implantado em decorrência de flagrantes casos em que o detentor do poder extrapola os seus limites, em alguns casos, indo contra a própria sociedade. De todo modo, existem diversas razões e fatores que contribuem para devida preocupação com esse tipo penal, sejam fatores históricos como regimes absolutistas, sejam a proximidade com movimentos filosóficos que à sua forma se opuseram às autoridades (LIMA; MOLOSSI, 2020).
No Brasil não foi diferente, pois nos anos de 1964 até 1985 enfrentou-se o período da ditadura militar, momento da história marcado pelos exageros praticados por militares.
Após o golpe de 1964, o Brasil iniciou uma longa ditadura que perdurou até 1985. Lideranças políticas e sindicais foram presas, parlamentares cassados, militantes políticos exilados. A ditadura fechou os partidos políticos existentes e criou dois novos: Aliança Renovadora Nacional (ARENA) e Movimento Democrático Brasileiro (MDB) um partido de situação e outro de oposição consentida. O novo governo editou Atos Institucionais com os quais criava condições excepcionais de funcionamento legal para atos ilegais e arbitrários (2013, p. 19)
Sobre a ditadura militar, afirma-se que:
A lei anterior, editada na época da ditadura militar, carecia de reforma integral, adaptando-se aos tempos atuais. Nesse perfil, é extremamente relevante destacar que os tipos penais da lei 4.898/65 eram muito mais abertos e não taxativos do que o cenário ofertado pela lei 13.869/19. Para se certificar disso, basta a leitura do art. 3º, a, da lei anterior: constitui abuso de autoridade qualquer atentado à liberdade locomoção. Seria perfeitamente amoldável a esse tipo penal toda e qualquer prisão preventiva decretada sem justa causa ou até mesmo uma condução coercitiva fora das hipóteses legais. (Nucci, 2019)
Em decorrência disso, foi-se necessário colocar em nosso ordenamento jurídico uma norma que definisse tais atitudes como crime. Entrando assim em vigor a Lei n° 4.898 em 1965 com o objetivo de penalizar e limitar as ações excessivas praticadas pelos agentes públicos. Inovadora, ela foi editada em um período conturbado do país, trazendo definições importantes como o conceito do que seria considerado abuso de autoridade, quem poderia ser o sujeito ativo e o que seria autoridade. Para Santana (2016, p. 01) a criação dessa lei é garantir que ninguém, nenhum cidadão, venha ser vítima de abuso de autoridade e, caso seja vítima, garante-lhe o direito de levar ao conhecimento de autoridade competente para defender seus direitos. Considera-se que:
Na verdade, a Lei de Abuso de autoridade, não é novidade no Brasil. No ano de 1965, foi regida pela Lei 4898 que tratava do mesmo tema, apesar de que, na aplicabilidade dessa lei, durante 54 anos, foi considerada pela sociedade, como uma lei solta, branda, vazia, não punitiva e não taxativa, além disso era tão destinada ao Poder Executivo. A nova Lei 13.869/2019, [...] expandiu o texto da lei anterior, abarcando os poderes: Legislativo, Executivo, Judiciário e inclusive o Ministério Público e as forças de segurança, ou seja, atinge diretamente todos os agentes públicos do Brasil. (ALVES; ANGELO, 2020).
Contudo, com o passar dos anos e a modificação da sociedade, essa lei passou a ser ineficaz. Além de não ser aplicada adequadamente, as leis previstas nela eram muito abertas, possuindo na prática pouca força, o que evidenciou a necessidade de reformulação.
Dessa forma foi-se necessário criar uma nova lei sobre o tema, contudo, essa reformulação da norma não foi nada fácil. Ela foi alvo de muitas polêmicas e debates, até que se chegasse ao seu modelo final:
A nova Lei de Abuso de Autoridade, sancionada no início de setembro (Lei 13.869), é resultado de dois anos de debates no Congresso Nacional. Esse tempo não foi suficiente para dispersar as polêmicas em torno do tema. O texto enviado pelo Congresso ao presidente Jair Bolsonaro foi amplamente vetado, mas parte significativa das supressões acabaram sendo derrubadas pelos parlamentares em meio a disputas acaloradas. Das 53 condutas definidas pela lei como abusos de autoridade, 23 haviam sido vetadas pelo presidente. Dessas 23, porém, 15 acabaram restauradas ao texto, com a derrubada dos vetos. (AGÊNCIA SENADO, 2019)
Em 2016 foi apresentado o projeto de Lei n° 280/260 que foi aprovada, porém sancionada com vetos. Com isso, ela foi reformulada e apresentada como um novo projeto de Lei (PL 7.596/2017), sendo também alvo de vetos e críticas. Foram muitas as discussões acerca dessas mudanças. Sendo, então, no dia 5 de setembro de 2019, promulgada a nova Lei n° 13.869 sobre o abuso de autoridade, que substituiu a Lei n° 4.898/65, trazendo significativas alterações sobre o tema.
A nova lei de abuso de autoridade trouxe uma maior clareza das ações que serão consideradas como crime e uma maior limitação ao poder dos agentes público, abrangendo um maior número de pessoas que podem ser penalizadas e com uma maior rigidez.
2. HISTÓRICO DA ATIVIDADE POLICIAL
A ação da polícia militar é orientada pelo art. 144, inciso V da Constituição Federal de 1988. Sendo um órgão responsável pela segurança pública, tendo como principal papel exercer a polícia ostensiva, preservar a ordem pública, incumbindo ainda a execução de atividade de defesa. Elas são subordinadas aos Governadores dos Estados e do Distrito Federal, sendo também forças auxiliares e reversa do Exército.
Os primeiros modelos de polícia criados no Brasil foram a Intendência Geral de Polícia (1808) e a Guarda Real de Polícia (1809), subordinadas ao Ministério da Guerra e à Justiça Portuguesa:
A guarda real era uma força de tempo integral, organizada em moldes militares e subordinada ao Ministério da guerra e a intendência de polícia pagava seus uniformes e salários, tinham como função atribuição de patrulha para reprimir o contrabando, manter a ordem, capturar e prender escravos, desordeiros, criminosos [...]. (MUNIZ, 2001:192)
Com a guerra do Paraguai, as forças policiais passam a servir nas unidades de infantaria do exército e a atuar na defesa do Estado. Com essa aproximação de ambos, as policias militares adotaram o modelo militar e a estrutura organizacional do Exército, ficando muito semelhante a eles e atuando como força auxiliar do Exército. Conforme Mezzomo (2005, p. 31), observa-se que sempre tiveram grande proximidade com o próprio Exército, com destaque para a adoção do modelo militar, a estrutura organizacional, e empregadas como forças auxiliares do Exército regular (grifos do autor).
Em 1889, quando o Brasil se torna uma República e é desmembrada da centralização do Império, os estados-membros buscam uma maior autonomia, que começa a ser conquistada com a constituição de 1891. Para assegurar essa autonomia os estados começam a criar forças públicas no intuito de garantir a defesa do Estado dos excessos cometidos pelo poder central, tendo-se a partir desse momento a polícia como uma organização militar dos Estados.
Com a Proclamação da República, foi empregado aos Corpos de Polícia, que já possuía traços do Exército e o tinha como inspiração e exemplo, o termo militar. O que com o passar do tempo deixou mais marcante as características peculiares militares nas corporações das policias.
Os governantes então passam a investir na expansão dessas forças públicas, tornando-as mais hierarquizadas e disciplinadas, reforçando-a e profissionalizando-a cada vez mais com o passar dos anos. Diante da necessidade das recém-formadas forças públicas, os governantes investem na sua expansão, um modelo adotado para a formação policial nesse momento é o modelo da polícia francesa (BICUDO, 1994, p. 38-39)
Ante o exposto, destaca-se o momento da ditadura militar no Brasil, que ficou marcado por torturas e desaparecimento de muitas pessoas, momento em que foram cerceados e violados direitos básicos, tendo-se a polícia como forma de aparelho repressor do Estado. Em decorrência desse histórico violento da polícia com a sociedade, criou-se um abismo entres ambos, que até hoje é percebido. A população enxerga os policiais, não como servidores, mas como um instrumento de dominação do Estado. Segundo Mesquita Neto (1999, p. 135-136), há três tipos de explicação sobre a violência policial a partir de estudos, principalmente, das ciências sociais:
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A primeira é a explicação estrutural: enfatiza as causas da violência policial, geralmente de natureza social, econômica, cultural, psicológica e/ou política. Este tipo de explicação dirige a atenção para características da sociedade por exemplo, desigualdades sociais e particularmente econômicas, e políticas, culturas, personalidades e atitudes autoritárias , cuja presença está positivamente associada à presença da violência policial
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A segunda explicação é a funcional: enfatiza as funções da violência policial, geralmente do ponto de vista da preservação, mas possivelmente do ponto de vista da mudança de estruturas sociais, econômicas, culturais, psicológicas e/ou políticas. Este tipo de explicação dirige a atenção para problemas e crises em determinados sistemas por exemplo, sistema social e/ou político, ou mais especificamente sistema de segurança pública , em relação aos quais a violência policial seria um sintoma e uma resposta; e
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A terceira explicação é a processual: enfatiza as razões ou motivações da violência policial, do ponto de vista das organizações policiais e/ou dos agentes policiais, geralmente de natureza instrumental mas possivelmente de natureza expressiva. Este tipo de explicação dirige a atenção para conflitos de diversos tipos individuais, sociais, políticos, dentro e fora das organizações policiais , em cujo contexto a violência seria utilizada por organizações ou agentes policiais como um instrumento para a resolução de conflitos ou como forma de expressão destes conflitos.
Diante disso, é extremamente necessária a integração dos direitos humanos na atividade policial, para que o histórico de violência policial mude e a população não mais veja a polícia como uma forma de repressão. Salienta-se ainda que o papel das polícias militares é de grande importância, pois quando ocorre algum problema ou perigo à segurança pública, ela é quem deve ser acionada para resolver tais questões.
O modelo de polícia foi repensado, segundo Nelson Werneck Sodré (1979), somente com o fim dessa fase, momento em que as Polícias Militares passaram a delinear melhor suas funções específicas e a traçar metas e projetos mais modernos voltados para segurança pública, sendo chefiadas, desde então, pelos governadores.
Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, que tornou o Brasil um país democrático, pautado na valorização do ser humano, verifica-se que ele passou a ser signatário de Tratados Internacionais de Direitos Humanos, com o objetivo de prevenir as pessoas de eventuais abusos. Para tanto, levou-se em consideração essa mudança de comportamento para a atividade policial. Contudo, não é uma tarefa fácil, por se tratar de uma instituição fechada, tradicional e hierarquizada. Para que se tenha a mudança é necessário que se mude a visão que os policiais têm sobre os direitos humanos. Para muitos policiais, os direitos humanos dificultam o trabalho da polícia pois servem apenas para defender bandidos:
A polícia não está apenas obrigada a exercer sua limitada autoridade em conformidade com a Constituição e, por meios legais, aplicar suas restrições: também está obrigada a observar que outros não infrinjam as liberdades garantidas constitucionalmente. Essas exigências introduzem na função policial a dimensão única que torna o policiamento neste país um ofício seríssimo. (GOLDSTEIN, 2003, p. 28. - 29)
Contudo, essa nova relação da polícia com os direitos humanos deve ser vista como um benefício para a sociedade, pois desrespeitar a lei e violar direitos não é uma prática eficiente da polícia. Quando se viola uma norma, a função é distorcida e a atividade policial passa a ser associada à criminalidade, e não à redução dela. Com isso, os agentes policiais devem desempenhar suas funções de forma a agir no estrito cumprimento do dever legal, para que a sociedade tenha admiração pela polícia. Nesse sentido, o policial deve ser visto como promotor de direitos, e não como um repressor deles.
Tavares (2005) afirma que a polícia representa o aparelho repressivo do Estado que tem sua atuação pautada no uso da violência legítima. É essa a característica principal que distingue o policial do marginal. Mas essa violência legítima está ancorada no modelo de "ordem sob a lei", ou seja, a polícia tem a função de manter a ordem, prevenindo e reprimindo crimes, mas tem que atuar sob a lei, dentro dos padrões de respeito aos direitos fundamentais do cidadão - como direito à vida e a integridade física.
Com essas mudanças e adaptações sociais, a polícia procura cada vez mais se aproximar da sociedade, para que possa atuar em parceria com ela. Um exemplo disso é polícia comunitária, na qual existe uma maior cooperação entre a população e os agentes policiais. Nesse modelo busca-se que a polícia se aproxime da comunidade para conhecer as dificuldades e problemas enfrentados por ela. A comunidade por sua vez deve se reunir com os agentes da polícia daquela localidade para emitir opinião sobre o trabalho policial e ajudá-los a resolver os problemas existentes.
Desse modo, com uma maior organização, o trabalho do policial se volta para a resolução do problema, deixando de lado o comportamento repressivo, buscando a diminuição da criminalidade, melhorando dessa forma as condições de vida daquelas pessoas, fortalecendo a parceria da polícia com a sociedade.
Fazer polícia, ao contrário do que muitos apregoam, não consiste somente na colocação intuitiva de policiais e viaturas nas vias públicas. Há outra dimensão, tão ou mais importante que esta, fundamentada no pensamento estratégico, no planejamento das operações táticas e na otimização dos recursos humanos e materiais (BULOS, 2012).
O policial, pela autoridade moral, traz consigo o potencial de ser o mais marcante promotor dos direitos humanos, o que reverte o quadro de descrédito social que atinge e qualifica como um dos mais centrais protagonistas da democracia brasileira (BALESTRERI, 2003, p.37).
Os artigos previstos na constituição que tratam da polícia militar são o art. 144, parágrafo 5° e 6° e artigo 42. Neles é possível perceber que as funções constitucionais da polícia, além de zelar pela segurança pública, é também o de subordinação ao Exército.
Ante o exposto, compreende-se que a polícia tem um longo histórico de repressão, uma parte em virtude da história brasileira que a usou como um meio de violência; outra parte pela própria instituição em decorrência desse histórico, ter sido construída com preceitos de crueldade, muitas vezes extrapolando do uso da força e atentando contra os direitos humanos.
Ainda são vistos casos de abuso por parte da polícia, porém muito já se avançou com relação a esse comportamento agressivo. Busca-se hoje em dia uma polícia mais cidadã que, além de observar os direitos humanos, preocupe-se também em ter uma boa relação com a sociedade.
Ainda está muito longe do que deve ser considerado ideal, contudo, com esses pequenos avanços, seja por uma norma mais rígida para punir quem comete esses abusos ou por meio de uma maior conscientização dos agentes policiais, a relação polícia e sociedade vai melhorando - por mais que seja feita a passos lentos.