Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/22434
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

Conselhos e ordens de fiscalização do exercício profissional: perfil jurídico a partir da jurisprudência do STF

Conselhos e ordens de fiscalização do exercício profissional: perfil jurídico a partir da jurisprudência do STF

Publicado em . Elaborado em .

Mais do que simples divergência conceitual quanto à natureza jurídica dos conselhos e ordens profissionais, o conturbado tratamento dispensado a eles traduz verdadeiro atentado à realização de um importante direito fundamental e, por consequência, verdadeiro atentado à democracia.

Resumo: O exercício profissional é direito fundamental consagrado no inciso XIII, artigo 5º, da Constituição de 1988. Este trabalho analisa a natureza jurídica das entidades criadas para fiscalização do exercício de profissões técnicas e liberais no Brasil. Na pesquisa são consideradas suas atribuições públicas, que englobam o poder de polícia, e os limites admitidos para restrição ao referido direito. O estudo está dividido em 3 Capítulos. O primeiro examina a evolução constitucional do tema, desde a completa omissão estatal até a criação de Conselhos e Ordens de fiscalização profissional. Nesse mesmo capítulo, destaca-se a jurisprudência anterior a 1988 do Supremo Tribunal Federal (STF) que, além de conferir a natureza autárquica de tais entidades, não distinguia os Conselhos de fiscalização e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). No segundo capítulo afirma-se que a natureza autárquica foi mantida pela Constituição de 1988. Com esse objetivo a pesquisa analisou o julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade nº 1.717/DF e 3.026/DF, nas quais o STF estabeleceu, pela primeira vez, distinções constitucionais entre os Conselhos e Ordens e a OAB. Por fim, no terceiro capítulo é defendido que, à luz do sistema brasileiro de fiscalização profissional, os argumentos invocados para diferenciação de sua natureza jurídica não se sustentam . Tal conclusão é obtida na medida em que, segundo a Constituição de 1988, há aspectos e limitações comuns compartilhados pela OAB e pelos demais Conselhos e Ordens de fiscalização, que protegem, do mesmo modo: a) o direito fundamental de livre exercício profissional; e b) o interesse público decorrente da fiscalização da qualidade dos serviços prestados pelas categorias técnicas e profissionais.

Palavras-chave: Exercício profissional. Conselhos e Ordens de Fiscalização. Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Aspectos comuns e limitações. Poder de polícia. Natureza autárquica. Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF).

Sumário: INTRODUÇÃO. 1 CONSELHOS E ORDENS DE FISCALIZAÇÃO: AS HERANÇAS E O CONTEXTO PRÉ-CONSTITUIÇÃO DE 1988. 1.1 Contexto da criação dos Conselhos e Ordens no Brasil. 1.2 Natureza jurídica da atividade fiscalizatória do exercício profissional. 1.3 Natureza jurídica e vinculação dos Conselhos e Ordens de Fiscalização à Administração Direta no período anterior à Constituição de 1988. 1.4 Conselhos e Ordens de fiscalização existentes no Brasil. 2 O PERFIL JURÍDICO DOS CONSELHOS E ORDENS NA CONSTITUIÇÃO DE 1988. 2.1 Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.717/DF: natureza jurídica dos conselhos de fiscalização do exercício profissional. 2.2 Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.026/DF: natureza jurídica da Ordem dos Advogados do Brasil. 3 análise da jurisprudência do STF: os casos das ADI's 1.717/DF e 3.026/DF. 3.1. Fiscalização do exercício profissional como poder de polícia. 3.2. Críticas ao tratamento diferenciado à OAB. 3.3 Incoerências vivenciadas pelos Conselhos e Ordens mesmo depois de definida sua natureza jurídica. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS. Seção A) Publicações. Seção B) Documentos e Sítios Eletrônicos.


INTRODUÇÃO

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/1988), ao consagrar no inciso XIII de seu artigo 5º a liberdade profissional como um dos direitos fundamentais do homem, expressamente admite e assegura a instituição, por lei, de restrições relativas a qualificações profissionais.

A referida possibilidade de se estabelecerem limitações ao exercício do direito profissional, entretanto, é fenômeno relativamente recente no constitucionalismo brasileiro, uma vez que, em substituição ao regime de corporações de ofício, prevaleceu por mais de cem anos (com início na Constituição de 1824) a noção de liberdade extrema, como se extrai dos nos 24 e 25, artigo 179, da Carta Imperial (“nenhum genero de trabalho, de cultura, industria, ou commercio póde ser prohibido, uma vez que não se opponha aos costumes publicos, á segurança, e saude dos Cidadãos”; “ficam abolidas as Corporações de Officios, seus Juizes, Escrivães, e Mestres”), e do § 22, artigo 72, da Constituição de 1891 (“é garantido o livre exercício de qualquer profissão moral, intelectual e industrial”).

Considerados, contudo, os prejudiciais efeitos econômicos e sociais decorrentes de uma postura predominantemente abstencionista, o Estado assumiu um papel ativo, inclusive quanto à fruição da liberdade profissional, sendo exemplo o Decreto nº 20.931, de 11 de janeiro de 1932, que condicionou o exercício de profissões da área da saúde (tais como medicina, odontologia e medicina veterinária) à prévia comprovação da habilitação e ao registro dos diplomas perante o Departamento Nacional de Saúde Pública.

Consequência dessa nova postura foi a elevação, à categoria de interesse estatal, da instituição de condições para o exercício de profissões liberais e técnicas, sendo a referida opção política expressamente inserida na Constituição de 1934 e nas que a sucederam[1].

Embora inicialmente o próprio Executivo tenha desempenhado a fiscalização do exercício profissional, com o intuito de obter uma maior eficiência na satisfação de tal propósito o Estado houve por bem criar pessoas jurídicas e outorgar a elas as atribuições de fiscalização do exercício profissional.

A partir da década de 1930, pois, criaram-se (na maioria das vezes sob a denominação legal de autarquias) os Conselhos e Ordens de Fiscalização do Exercício Profissional[2], entidades que, segundo dados fornecidos por alguns de seus sítios eletrônicos oficiais, são responsáveis diretamente pela fiscalização do exercício profissional de mais de 104.000 Farmacêuticos[3], 344.000 Médicos[4], 295.000 Administradores[5], 52.000 Biólogos[6], 416.000 Contadores e Técnicos em Contabilidade[7], 69.000 Nutricionistas e Técnicos em Nutrição[8], 336.000 Odontólogos[9] e 600.000 Advogados[10].

De tais números ainda é possível deduzir que a atividade realizada pelas referidas entidades afeta um número bem mais expressivo de pessoas, porquanto devem ser consideradas aquelas que se valem ou se beneficiam, mediata ou imediatamente, da atuação dos profissionais, sendo inegável a importância dos Conselhos e Ordens de Fiscalização do Exercício Profissional na estrutura normativa do País.

Nada obstante os pressupostos que ensejaram a criação dos Conselhos e Ordens e, principalmente, as atribuições pelos mesmos desenvolvidas, certo é que a natureza autárquica conferida pela maior parte de suas leis criadoras sempre se fez acompanhada de inúmeros embates doutrinários e jurisprudenciais, porquanto os textos normativos aos poucos distanciou sua realidade do tratamento dispensado às demais autarquias.

Exemplos de tais normas foram o Decreto-lei nº 968, de 1969 (que, além de afastar dos Conselhos e Ordens as normas internas e de pessoal aplicáveis às demais autarquias, limitou o campo de supervisão ministerial exigido pelos artigos 19 e seguintes do Decreto-lei nº 200, de 1967), e a ulterior revogação da mencionada supervisão mitigada pelo Decreto-lei nº 2.299, de 1986.

A CRFB/1988, por sua vez, ao não explicitar a categorização dos Conselhos e Ordens como autarquias[11] e ao conferir à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e aos advogados tratamento constitucional destacado[12], contribuiu para aumentar as discussões quanto à existência de distinções entre as referidas entidades e sua natureza jurídica.

Em 1994, então, a Lei nº 8.906 (Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil), explicitou que a Ordem não manteria com a Administração Pública qualquer vínculo funcional ou hierárquico, bem como expôs que os Conselhos Federal e Seccionais da OAB, embora constituíssem serviço público e gozassem de imunidade tributária, seriam dotados de “personalidade jurídica própria”, estando autorizados a “fixar e cobrar, de seus inscritos, contribuições, preços de serviços e multas”[13].

Seguindo tais passos, em 06 de novembro de 1997 foi a vez dos demais Conselhos e Ordens receberem tratamento específico, quando, na 36ª edição da Medida Provisória (MP) nº 1.549, definiu-se no artigo 58 e §§[14] que os serviços de fiscalização por si desempenhados, embora públicos, seriam regidos em caráter privado por delegação legislativa, sendo extintos os vínculos funcional e hierárquico com a Administração Pública e atribuído aos Conselhos Federais de cada profissão o poder de disciplinar suas respectivas organizações, estruturas e funcionamento.

Não demorou para que, em momentos distintos, a inconstitucionalidade do tratamento diferenciado conferido pelas Leis nº 8.906 e pela MP 1.549-36 fosse suscitada perante o Supremo Tribunal Federal, que, então, deparou-se com a oportunidade de definir a natureza jurídica dos Conselhos e Ordens de Fiscalização do Exercício Profissional à luz dos preceitos e princípios da Carta Cidadã.

Embora cronologicamente posterior, o tratamento dispensado aos Conselhos, excluída a OAB[15], pela MP nº 1.549-36 foi o primeiro a ter sua constitucionalidade questionada, o que se deu por intermédio da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 1.717/DF, ajuizada em 26 de novembro de 1997 pelo Partido Comunista do Brasil (PC do B), Partido dos Trabalhadores (PT) e Partido Democrático Trabalhista (PDT).

Dentre outros argumentos, os autores afirmaram que a fiscalização das profissões seria atribuição de ente federal (competente para sua regulamentação e definição dos meios pelos quais se realiza a inspeção ou a fiscalização) e que os órgãos criados por lei federal para fiscalização do exercício profissional, na medida em que exercem típica atividade estatal e são investidos de poder de polícia, teriam inegável natureza pública de autarquias, não havendo a possibilidade de seu exercício em caráter privado.

Quando do julgamento da Medida Cautelar, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), por 08 (oito) votos a 01 (um)[16], acompanhou os fundamentos apresentados pelo Relator, Ministro Sydney Sanches, quais sejam, que os arts.5º, XIII, 22, XVI, 21, XXIV, 70, parágrafo único, 149 e 175 da CRFB/88, na mesma linha anteriormente definida pelo próprio STF (MS nº 22.643/SC, Rel.Min.Moreira Alves), pareciam impedir delegação, a entidade privada, de atividade típica do Estado, a qual abrangeria poder de polícia, de tributar e de punir no que concerne ao exercício profissional.

Não obstante a divergência registrada no julgamento da Cautelar, o Plenário do STF, quando da análise do mérito, limitou-se a, agora por unanimidade[17], ratificar, sem complementos, os argumentos expostos no voto vencedor, sendo, pois, declarada a inconstitucionalidade da norma e definida a natureza jurídica autárquica dos Conselhos.

Em 28 de outubro de 2003 (sete meses depois de publicada a decisão proferida na ADI nº 1.717/DF), o Procurador-Geral da República, ao questionar na ADI nº 3.026/DF a constitucionalidade de dispositivos do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil[18] e apresentar como premissa voto proferido pelo Ministro Moreira Alves (por ocasião do julgamento da ADI nº 1.707/MT[19]), no qual declarava-se a natureza autárquica da Ordem dos Advogados, oportunizou ao STF discutir a natureza jurídica do outro ente integrante do Sistema de fiscalização de profissões no Brasil, a OAB.

O julgamento da ADI nº 3.026/DF, comparado ao da ADI nº 1.717/DF, foi marcado pelo pronunciamento de 07 (sete) Ministros que não haviam se manifestado anteriormente: Cézar Peluso, Carlos Britto, Joaquim Barbosa, Eros Grau, Ricardo Lewandowski (que não compunham a Suprema Corte na Sessão de julgamento do mérito), Nelson Jobim (ausente quando do julgamento da primeira ADI) e Gilmar Mendes (impedido na primeira ocasião por ter atuado como AGU).

Embora o STF tenha, ao final, definido a OAB como entidade prestadora de serviço público independente, categoria ímpar no elenco das personalidades jurídicas existentes do Direito brasileiro, a análise dos votos e discussões demonstra ter havido divergência e incoerência entre os Ministros, ainda mais se considerados os votos registrados na ADI nº 1.717/DF.

Apesar dessa jurisprudência, deve-se destacar o fato de que os Conselhos existem há 80 (oitenta) anos e sua natureza jurídica ainda é impregnada de incertezas e indefinições, ainda mais quando muitas das peculiaridades destacadas para afastar a OAB do regime jurídico público (não composição os órgãos e entes da Administração Pública; não submissão à direção superior do Presidente da República, à coordenação, supervisão e orientação dos ministros de Estado; não integração de seu patrimônio ao do Estado; não criação, modificação ou extinção de seus cargos e empregos por lei; ausência de repasses pelo Estado; não nomeação de seus dirigentes pelo Executivo; ausência de remuneração para seus dirigentes) encontra-se presente nos demais Conselhos e Ordens.

Pretende-se com este trabalho, portanto, analisar a natureza jurídica dos Conselhos e Ordens a partir do contexto histórico de sua criação, das funções por si desempenhadas, dos pronunciamentos feitos pelo Supremo Tribunal Federal antes e depois da Carta de 1988, do diferenciado tratamento constitucional implementado na Carta Cidadã e, principalmente, à luz de seu inciso XIII, artigo 5º.

Para tanto, o trabalho foi dividido em três partes: a) na primeira procurou-se definir o cenário que deu ensejo à criação dos Conselhos e Ordens, explicitar, a partir das Constituições, a natureza jurídica da atividade pelos mesmos realizadas, apresentar posicionamentos da Suprema Corte quanto à natureza jurídica dos Conselhos no período anterior à Carta de 1988 e, por fim, listar as entidades existentes no País; b) na segunda parte buscou-se precisar as condições admitidas pela jurisprudência e doutrina como legítimas para limitação do exercício profissional e, em seguida, descrever os pronunciamentos e fundamentos apresentados pelos Ministros do STF quando do julgamento das ADIs nº 1.717/DF e 3.026/DF; c) finalmente, na terceira parte foram destacados alguns aspectos não observados pelos Ministros por ocasião da definição da natureza jurídica dos Conselhos e Ordens, bem como apresentadas dificuldades pelos mesmos vivenciadas, mesmo depois do posicionamento adotado pela Suprema Corte.

Apesar de não esgotado o tema, acredita-se que a leitura da natureza jurídica dos Conselhos e Ordens a partir dos fundamentos de sua criação e das funções por si desempenhadas contribuirá para a compreensão de que todos, por atuarem diretamente na concretização do direito fundamental de livre exercício profissional, em essência não se distinguem e merecem receber o mesmo tratamento.


1 CONSELHOS E ORDENS DE FISCALIZAÇÃO: AS HERANÇAS E O CONTEXTO PRÉ-CONSTITUIÇÃO DE 1988

Durante os 186 (cento e oitenta e seis) anos de constitucionalismo no Brasil, somente a partir da Constituição de 1934 é que o direito de exercício profissional sofreu limitações, do que se conclui que, na maior parte da história constitucional brasileira (período de cento e dez anos compreendido entre a Carta Imperial de 1824 e o Texto de 1934), prevaleceu o regime de liberdade incondicional do exercício profissional.

As razões da repentina mudança de tratamento da matéria, então, devem ser buscadas e explicitadas, assim como os meios escolhidos pelo Estado para a restrição do exercício profissional.

Nesse Primeiro Capítulo, pois, será abordada a conjuntura histórica que propiciou o surgimento das entidades de fiscalização do exercício de profissões liberais e técnicas, bem como o tratamento conferido pelas Constituições à limitação do exercício profissional.

Serão, ainda, identificados os Conselhos e Ordens existentes e apresentado o tratamento dispensado pela doutrina e jurisprudência às atividades por si desempenhadas, assim como sua relação com a Administração Central e sua natureza jurídica no período anterior à Constituição de 1988.

1.1 Contexto da criação dos Conselhos e Ordens no Brasil

A liberdade do exercício profissional está prevista no ordenamento pátrio desde a Carta Imperial[20] como decorrência direta das revoluções liberais do final do século XVIII e, principalmente, do novel regime de produção daquelas resultante, que, sujeito unicamente às regras da oferta e procura, tinha na livre apresentação de capital e trabalho um de seus sustentáculos.

A referida garantia veio em resposta a um sistema de privilégios que, por instituir e manter o monopólio do exercício de profissões, restringia o acesso e desempenho de determinadas atividades em proveito exclusivo de pequenos grupos, sendo contrário, por conseguinte, ao desenvolvimento individual.

A extinção do regime das corporações de ofício pela Carta de 1824[21], portanto, proporcionou o que José Afonso da Silva (2007, p. 234) entende como um “(...) processo dinâmico de liberação do homem de vários obstáculos que se antepõem à realização de sua personalidade: obstáculos naturais, econômicos, sociais e políticos”, liberdade essa a ser concretizada em um cenário democrático[22]-[23].

João Barbalho, citado por Cretella Júnior (2006, p. 222), em seu comentários à Constituição de 1891, expôs:

O livre exercício de qualquer profissão é garantido como manifestação do direito inerente a cada indivíduo de, segundo sua própria determinação, aplicar e desenvolver suas faculdades naturais e adquiridas na prática de algum mister, ofício, trabalho de qualquer gênero, à sua escolha e independentemente de licença das autoridades, sendo apenas permitida a ação desta quanto ao que acaso prejudique o bem geral e o direito de terceiros. E assim, consagrado o livre acesso e prática das profissões, proibida está a regulamentação delas, bem como matrículas, registros, inspeção por agentes do governo ou corporações prepostas ao exercício e direção das mesmas e em geral quaisquer medidas de caráter preventivo, salvo as limitadas restrições acima indicadas e que se justificam enquanto indispensáveis para garantir a segurança geral e individual; fora daí, o Estado fere a justiça e coarta o desenvolvimento social.

Pontes de Miranda (1987: p. 545), porém, pondera que o prosseguimento da evolução humana, alicerçado em regras constitucionais que organizem a democracia e assegurem liberdades, deve ser precedido da "inserção da Constituição na vida do povo”, pois o respeito dos seus princípios “pode subir o nível intelectual, moral e econômico das populações, para que se lhes revelem os fins precisos que há de ter o Estado”.

Portanto, a um só tempo, a Carta Imperial assegurou a liberdade positiva do exercício profissional (que engloba, além da livre escolha profissional, como acima dito, o direito de não trabalhar) e a liberdade negativa de o indivíduo ser cerceado, pelo Estado[24], de seu gozo, sendo estabelecida uma série de instrumentos jurídicos tendentes a lhes conferir, ao menos formalmente, a eficácia e o respeito devidos, “...a partir dos quais qualquer indivíduo poderá exigir sua tutela perante o Poder Judiciário com o fim de obedecer a cidadania e concretizar a democracia” (MORAES, 2002, p. 21).

É o que Canotilho (2009, p. 408) denomina de dupla perspectiva da função de defesa dos direitos fundamentais dos cidadãos:

(1) constituem, num plano jurídico-objectivo, normas de competência negativa para os poderes públicos, proibindo fundamentalmente as ingerências destes na esfera jurídica individual; (2) implicam, num plano jurídico-subjectivo, o poder de exercer positivamente direitos fundamentais (liberdade positiva) e de exigir omissões dos poderes públicos, de forma a evitar agressões lesivas por parte dos mesmos (liberdade negativa).

Considerados, contudo, os prejudiciais efeitos econômicos e sociais decorrentes de uma postura estatal predominantemente abstencionista[25], ou seja, como a abolição formal do regime de prerrogativas e vantagens não se mostrou suficiente para por fim à concentração de riqueza e poder e ao fortalecimento e criação de novas oligarquias, o Estado assumiu um papel intervencionista[26].

Roberto Santos Pessoa (2009, p. 152), quanto ao referido período da história brasileira, registra:

A instabilidade da economia capitalista e os imperativos de desenvolvimento econômico, que tinham como motor a industrialização, irão demandar uma intensa atuação do Estado. Surge no Brasil um Estado promotor do desenvolvimento, responsável pela transformação das estruturas sociais e econômicas, incorporando à vida nacional as novas forças sociais. Getúlio Vargas e as forças que o apoiaram desencadeiam um processo de reestruturação e modernização do Estado brasileiro.

(…).

Com as atribuições ampliadas no Estado, o Poder Executivo tornou-se o centro da vida estatal, tornando-se esta centralidade doravante algo marcante na engenharia institucional republicana brasileira. (…).

Será na era Vargas (1930-1964) que se estruturará o “direito administrativo brasileiro”. Este direito administrativo volta-se para a regulação de uma administração pública racional-legal-burocrática, com certas características básicas do ponto de vista organizacional e funcional. Do ponto de vista organizacional, temos uma administração pública bastante hierarquizada, que desempenha atividades ligadas a um “poder de polícia” cada vez mais intenso, à prestação de um crescente número de “serviços públicos” à população, a uma atuação direta como “agente econômico” e ao fomento de certos setores considerados estratégicos ou importantes. Este direito administrativo busca direcionar as práticas administrativas para realização dos “interesses públicos”, frequentemente interpretados como “interesses do Estado”. A expressão “a bem do serviço público” será a principal forma de motivação sumária dos atos administrativos.

Nesse cenário, a Constituição de 1934, ao manter proibido o de privilégios[27] inaugurado na Carta Imperial e repetido no Texto de 1891[28], inovou ao admitir a imposição de condições[29] ao livre exercício profissional à capacidade técnica e outros requisitos estabelecidos em lei, de modo que, a partir de então[30], a liberdade de escolha profissional não mais resultava na automática liberdade de seu exercício, existindo a possibilidade constitucional de limitação de seu gozo.

Dito de outra forma, nada obstante direito fundamental expressamente consagrado no Texto Constitucional, seu exercício, a depender da formação exigida, poderia ser restringido, de modo que a liberdade passou a se sujeitar a interesses de ordem pública, ou melhor, ao poder de polícia do Estado.

Não é só. Paralelamente à reserva legal qualificada, a Constituição de 1934, a fim de lhe dar efetividade, atribuiu à União a competência privativa de legislar[31] sobre condições de capacidade para o exercício de profissões liberais e técnico-científicas[32], bem como exigiu das legislações estaduais o respeito à representatividade das profissões[33].

Ainda, a Carta de 1934, ao conferir especial atenção e importância às organizações profissionais[34]-[35], expressamente ordenou a regulamentação do exercício de todas as profissões[36] e, finalmente, limitou o exercício das profissões liberais aos brasileiros natos e aos naturalizados que tivessem prestado serviço militar no Brasil[37].

A Constituição seguinte, de 1937, embora não tenha sido enfática[38] quanto às profissões liberais, fortaleceu as corporações ao nelas organizar a economia de produção e ao afirmar que, colocadas sob a assistência e proteção do Estado, eram seus órgãos e exerciam funções delegadas do poder público[39].

A Carta de 1946, por sua vez, retomou o espírito de 1934 para se dedicar, com mais vagar, às profissões liberais, tendo, além de reassegurado à União a competência para fixação das “condições de capacidade para o exercício das profissões técnico-científicas e liberais”[40], asseverado literalmente em seu artigo 161 que “a lei regulará o exercício das profissões liberais e a revalidação de diploma expedido por estabelecimento estrangeiro de ensino”.

Dito de outra forma, o artigo 161 assegurou o direito de regulamentação do exercício de profissões liberais em razão de interesses públicos, tendo Pontes de Miranda (1963, 488) assim abordado o tema:

Na Constituição de 1946, ao mesmo tempo que se reconhece a liberdade de profissão, previu-se o direito de legislação, o exercício das profissões liberais, bem como as restrições impostas pelo bem público. Em alguma coisa, portanto, o texto constitucional de 1946 discrepa do texto constitucional de 1891, aproximando-se do texto constitucional de 1934. O que é preciso é que as exigências para o exercício das profissões não criem inacessibilidades, por diferenças de nascimento, de sexo, de raça, de profissão anterior lícita dos indivíduos em causa, ou de qualquer dos pais dêles, de classe social, de riqueza, de crenças religiosas ou de idéias políticas. (…). Sempre que a profissão liberal, para que o público seja bem servido e o interêsse coletivo satisfeito, requeira habilitação, não constituiu violação a legislação que estabeleça o mínimo de conhecimentos necessários.

Foi, pois, nesse cenário de ampliação dos encargos do Estado, de descentralização funcional[41] e de valorização constitucional das profissões liberais que o Poder Público decidiu, além de regulamentar profissões, criar entes para fiscalização de seu exercício: Conselhos e Ordens Profissionais.

1.2 Natureza jurídica da atividade fiscalizatória do exercício profissional

Consequência do liberalismo foi a mitigação da atuação e ingerência do Poder Público sobre interesses privados.

Miguel Reale, apud Maurique et al. (2009, p. 22) noticia que em tal período chegou-se a, por exemplo, “não se subordinar a prática da Medicina à prévia obtenção de diploma universitário, por entender-se tal exigência contrária à liberdade individual”.

Situações como essa, presentes nos demais campos profissionais, comprometiam os interesses da coletividade, motivos pelos quais o Estado viu-se legitimado a definir os anseios sociais e, a partir de tais definições, a desenvolver plenamente sua capacidade normativa de modo a implementar uma intensiva intervenção e regulação nos mais diversos campos de atuação social.

Assim, sepultado pela Constituição Imperial o regime de corporações de ofício, o Estado, a partir da década de 1930, assumiu um papel ativo no que se refere à regulamentação profissional, sendo resultado dessa nova postura a determinação, na Carta de 1934, de regulamentação de todas as profissões[42], inclusive com a instituição de condições de capacidade para o exercício de profissões liberais e técnico-científicas[43]-[44].

Inicialmente o próprio Poder Executivo, por seus órgãos[45], desempenhou o mencionado serviço público, sendo exemplo o Decreto nº 20.931, de 11 de janeiro de 1932, que condicionou o exercício da medicina, da odontologia, da medicina veterinária, das profissões de farmacêutico, parteira e enfermeiro à prévia comprovação da habilitação e ao registro dos diplomas perante o Departamento Nacional de Saúde Pública (órgão criado em 1920, pelo Decreto 3.987, como decorrência da reorganização do sistema sanitário brasileiro capitaneada por Carlos Chagas[46]).

Diz-se serviço público porque este, segundo Dinorá Adelaide Musetti Grotti (2003, p.49), é sempre uma incumbência Estado, sendo sua criação uma opção do Poder Público. Assim, a precitada a autora define que serviço público é o que cada povo diz ser, “é o plano da escolha política, que pode estar fixada na Constituição do país, na lei, na jurisprudência e nos costumes vigentes em um dado momento histórico” (2003, p. 87).

Ao seguir o mesmo raciocínio[47], Celso Antônio Bandeira de Mello (2001, p. 27) assim conceitua serviço público:

Serviço público é a atividade material que o Estado assume como pertinente a seus deveres em face da coletividade para satisfação de necessidades ou utilidades públicas singularmente fruíveis pelos administrados cujo desempenho entende que deva se efetuar sob a égide de um regime jurídico outorgador de prerrogativas capazes de assegurar a preponderância do interesse residentes no serviço de imposições necessárias para protegê-lo contra condutas comissivas ou omissivas de terceiros ou dele próprio gravosas a direitos ou interesses dos administrados em geral e dos usuários dos serviços em particular.

Portanto, a instituição de condições para o exercício de profissões liberais e técnicas foi erigida à categoria de interesse estatal, assim como a assunção, pelo Poder Público, de sua execução demonstrou a inequívoca vontade de se buscar a mais adequada prestação em proveito do público, evitando a prática de excessos, razão pela qual tal mister é definido como serviço público.

Entretanto, com o propósito de obter uma maior eficiência na satisfação dos fins aos quais se propôs, o Estado deu início ao processo de descentralização do poder mediante a criação de sujeitos dotados de personalidade jurídica própria.

Como justificativas para o referido processo de descentralização, Marçal Justen Filho (2009, p. 175) apresenta motivações técnicas e políticas, vinculadas, respectivamente, à eficiência administrativa e à democratização das funções administrativas:

Verificou-se que a acumulação de todas as competências no âmbito do ente político gerava dificuldades insuperáveis na gestão pública. A tomada de decisões e a sua execução tornavam-se extremamente lentas e difíceis. A criação de entes administrativos, titulares de competências específicas, reflete a necessidade de especialização e redução da burocracia.

No entanto, a criação de algumas entidades autônomas decorre também de uma opção política, relacionada com a sofisticação do sistema de freios e contrapesos. A democracia exige a multiplicação de centros de poder, cada qual exercitando controle sobre o outro. A criação de uma autarquia, com garantias de autonomia no desempenho de certas funções de grande relevo, conduz à redução do poder acumulado no poder central.

Assim, por atos infraconstitucionais criaram-se os Conselhos e Ordens, tendo por objetivo, a um só tempo, impedir o restabelecimento do sistema de privilégios prevalecente no liberalismo e proteger a sociedade contra a atuação de maus profissionais, o que era feito mediante a inscrição de tão-somente aqueles que preenchessem as condições definidas em lei e, também, a fiscalização, sob prismas éticos e técnicos, do exercício profissional.

Optou-se, porém, por não outorgar aos Conselhos e Ordens a função de defesa dos direitos e interesses dos profissionais em seus quadros inscritos, tarefa que, pela Constituição de 1934, ficou a encargo dos sindicatos e associações profissionais[48].

Exceções feitas à Ordem dos Músicos do Brasil (já que a Lei nº 3.857, de 22 de dezembro de 1960, expressamente lhe conferiu “a finalidade de exercer, em todo o país, a seleção, a disciplina, a defesa da classe e a fiscalização do exercício da profissão do músico, mantidas as atribuições específicas do Sindicato respectivo”), e à Ordem dos Advogados do Brasil, que, inicialmente criada para disciplina e seleção da classe dos advogados[49], pelo parágrafo único do artigo 1º da Lei nº 4.215, de 27 de abril de 1963, recebeu a competência de “representar, em juízo e fora dêle, os interesses gerais da classe dos advogados e os individuais, relacionados com o exercício da profissão[50]”.

O fim precípuo das novas entidades era, pois, autorizar o exercício profissional àqueles que preenchessem as condições fixadas em lei, bem como verificar se sua atuação se conformava a balizamentos técnicos e éticos, servindo como instância administrativa final do juízo de mérito acerca da prática dos atos, com vistas à obtenção ou preservação do interesse público[51], sob pena de serem aplicadas penalidades em razão do mau exercício[52].

Tais elementos demonstram que os Conselhos e Ordens desempenham poder de polícia, conceituado por Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2007, p. 104) como “a atividade do Estado consistente em limitar o exercício dos direitos individuais em benefício do interesse público”.

Juarez Freitas (2009, p. 209), a seu turno, sugere que o poder de polícia seja assim compreendido:

Como o exercício de um dever (não mera faculdade) que consiste em regular, restringir ou limitar administrativamente, de modo legal e legítimo, o exercício dos direitos fundamentais de propriedade e de liberdade, de maneira a obter, mais positiva que negativamente, uma ordem pública capaz de viabilizar a coexistência dos direitos em sua totalidade, sem render ensejo à indenização, por não impor dano juridicamente injusto.

Diógenes Gasparini (2007, p. 128) afirma que a razão de ser do poder de polícia é um vínculo geral, existente entre o Estado e os administrados, “que autoriza o condicionamento do uso, gozo e disposição da propriedade e do exercício da liberdade em benefício do interesse público ou social”.

Embora distintas sejam as definições para poder de polícia, das mesmas se extrai o seguinte traço semelhante: atuação Estatal voltada a restringir o exercício, por particulares, de direitos em proveito do interesse público.

No que se refere aos Conselhos e Ordens, a referida atuação ocorre em dois momentos distintos: a) verificação do preenchimento das condições impostas por lei para se autorizar o registro e, por consequência, o início do exercício profissional; b) uma vez autorizado o registro, verificação e acompanhamento das aptidões técnica e moral para a continuidade do exercício profissional.

José Cretella Júnior (2006, p. 221) afirma o seguinte sobre o assunto:

Evidentemente que, tratando-se de uma liberdade – liberdade de profissão -, diversas limitações, exigidas pelo interesse coletivo, foram impostas aos profissionais dos diferentes setores para que se alcançasse o máximo de eficiência e de segurança com relação aos indivíduos beneficiados por aquele exercício.

Eis por que os legisladores se preocuparam com a limitação do exercício das profissões, procurando regulamentá-lo de tal modo que, sem prejudicar o direito subjetivo à profissão, consigam salvaguardar o interesse da coletividade.

(…).

Do mesmo modo, tal como o que acontece com as outras liberdades, a de profissões sofre as restrições impostas pelo interesse público, que exige prova prévia da idoneidade e capacidade daqueles que a exercem. O Estado usa, assim, de um verdadeiro poder de polícia, que se poderia enquadrar dentro de um título geral – polícia das profissões (Brandão Cavalcanti, A Constituição Federal Comentada, 2ª ed., 1952, vol.III, p.128).

Pontes de Miranda (1987, p. 537), a seu turno, ao comentar a Emenda Constitucional nº 01, de 1969, ponderou:

A lei pode estabelecer pressupostos necessários (subjetivos) para o exercício (do direito) de qualquer profissão. Há direito de livre escolha de profissão, mas só se pode exercer a profissão escolhida se se satisfazem os pressupostos que a lei exigira. A permissão, título, licença, ou o que seja, não têm a mesma natureza. A inscrição é integrante da produção dos pressupostos, o que afasta a discussão sôbre ser declarativa ou constitutiva: o Estado tem direito de habilitar, e a pessoa tem pretensão de obter a habilitação, na qual e ineliminável o elemento declarativo, e êsse elemento declarativo integra a habilitação, tal como ocorre com o passaporte, que integra um dos pressupostos para o exercício da liberdade de sair e entrar no território. (…). A Constituição dos Estados Unidos da América não tratou da liberdade de profissão. A prática é no sentido de se exigirem provas de habilitação, que, ainda quanto a médicos e advogados, não são sòmente, ou necessàriamente, os diplomas. Para as limitações invocam os juristas o police power. (…). Sob a Constituição de 1934, escrevêramos (Comentários, II, 165 e 66) a propósito da Ordem dos Advogados: “¿Basta, para a permissão da Ordem dos Advogados, que haja texto do ar.5º, XIX, k? O art.5º, XIX, k, não bastaria, mas o art.113, 13), é diferente do art.72, §24, da Constituição de 1891. Certo, a transformação da Ordem dos Advogados em corporação de ofício, medievalmente concebida, seria inconstitucional, e.g., a limitação do número de profissionais, a cooptação, a inscrição no quadro por eleição de conselho. A liberdade econômica só é garantida dentro dos limites traçados pelos princípios e justiça distributiva e pelas necessidades da vida nacional. Está o Poder Legislativo livre das peias que a concepção individualística, causa de graves dissabores nos Estados Unidos da América, antes lhe criava, e os obstáculos maiores, que eram os ligados ao trabalho, foram postos de lado pelos arts.120-123 e outros da Constituição de 1934: 'Compete privativamente ao Congresso Nacional: 28. Legislar sôbre o trabalho'. Na Constituição de 1934, os Estados-membros têm certa competência legislativa a respeito (art.5º, XIX, i, e §3º)”. Depois, sob a Constituição de 1937 (Comentários, III, 427): '...qualquer argumento contra o corporativismo seria fraco, porquanto, no art.140, o legislador constituinte programàticamente estabeleceu que a economia da produção se há de organizar em corporações, e essas, como entidades representativas das fôrças do trabalho nacional, colocadas sob a assistência e a proteção do Estado, são órgãos dêsse e exercem funções delegadas do poder público. Por outro lado, a liberdade de escolha de profissão, ou do gênero de trabalho, indústria, ou comércio, que no inciso 8 se assegurou, não só é dependente das condições de capacidade, que as leis apontarem, como sujeita às restrições impostas pelo bem público, segundo as próprias palavras do inciso 8, cabendo às leis (verbis 'nos têrmos da lei') a definição de bem público e a indicação das restrições. Logo se percebe a que ponto de fluidez chegou, a partir da Constituição de 1891 (art.72, §24) e passando pelo cadinho semi-social-democrata e semifascista da Constituição de 1934 (art.113, 3), o velho princípio liberal da escolha de profissão.

Consideradas tais características, em 1956 o STF (naquele que se apresenta como o primeiro julgamento em que a Suprema Corte abordou a natureza dos serviços realizados pelos entes responsáveis pela fiscalização do exercício profissional), a uma só voz[53], decidiu que o Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura de São Paulo (CREA-SP) exercia serviço público federal.

Não é só. Na mesma assentada definiu a Suprema Corte, ao acompanhar o Relator, Ministro Cândido Motta, que o CREA-SP possuía natureza autárquica e integrava o sistema administrativo do Estado:

Tratava-se, acima de tudo, de uma autarquia federal que substitui ao Estado numa de suas funções, qual a da fiscalização de atividades profissionais, nos termos da Lei n.23.569, de 12 de outubro de 1933. Nessa qualidade, a autora, Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura de S.Paulo, está integrado no sistema administrativo do Estado, exercendo, por todos os títulos, um serviço público federal. Está assim envolvida pelo interesse público, posto em realce na obra de Hugo Forti e principalmente por Chiarelli em seu trabalho La personalite giutica delle associazioni professionali, pgs.120 e seguintes. (…). Portanto, tem ele uma ampla função preventiva e repressiva. (…). A ação ordinária em apreço, foi proposta por uma autarquia que tem legitimidade e indeclinável dever de zelar pela ordem profissional dos engenheiros e arquitetos[54].

Assim, pode-se definir como serviço público federal a fiscalização do exercício profissional realizada pelos Conselhos e Ordens, os quais, para tanto, podem/devem intervir na esfera individual dos profissionais a fim de assegurar o bem estar social, de modo que, em verdade, exercem poder de polícia.

1.3 Natureza jurídica e vinculação dos Conselhos e Ordens de Fiscalização à Administração Direta no período anterior à Constituição de 1988

Viu-se na Seção anterior que, em 1956, a 1ª Turma do STF, no julgamento do MS nº 29.233/SP, além de definir como serviço público federal a atividade desenvolvida pelos Conselhos e Ordens, preconizou serem os mesmos autarquias integradas ao sistema administrativo do Estado.

O referido entendimento foi ratificado em 1963, agora pelo Plenário e de forma unânime, quando, no julgamento do MS nº 10.272/DF[55], cuja relatoria competiu ao Ministro Victor Nunes Leal, os Ministros entenderam que, sendo as autarquias criadas pelo Estado para exercício das funções deste, o Conselho Federal de Medicina, na fiscalização do exercício profissional, seria entidade autárquica que, ao recolher contribuições de seus inscritos, forma patrimônio público sujeitando-se, portanto, a prestação de contas[56].

Contudo, para Nunes Leal, a caracterização dos Conselhos como autarquias decorreria mais da vontade do legislador do que, propriamente, de suas características, o que ficou explicitado no seguinte trecho de seu voto: “Embora, em doutrina, os traços definidores da autarquia sejam imprecisos, os autores são concordes em considerar autarquia a entidade que a lei assim o declare”.

Seguindo o posicionamento acima exposto, em 1966, quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 55.456/PE, o Relator, Ministro Aliomar Baleeiro, no que foi acompanhado à unanimidade pelos membros da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, expôs: “O Conselho Federal de Contabilidade e os Conselhos Regionais de Contabilidade são instrumentalidades federais semelhantes à Ordem dos Advogados, cujo caráter de órgão da União nunca se contestou”[57].

Importante que, para chegar a tal conclusão (semelhança entre Conselhos e OAB), não teve influência o fato de os advogados e a Ordem dos Advogados terem merecido tratamento constitucional[58] e legal[59].

Com o referido julgado, então, afastou-se por completo o errôneo entendimento resultante do julgamento, em 1961 pela 2ª Turma do STF, do Recurso Extraordinário nº 43.585/Guanabara[60], cuja Ementa recebera a seguinte redação: “Ordem dos Advogados – Não é uma autarquia e seus funcionários não se equiparam aos servidores públicos. Recurso não conhecido”[61].

Diz-se errôneo entendimento porque a 2ª Turma, em verdade, não adentrara no mérito recursal, tendo-se limitado a expressar a impossibilidade de conhecimento do recurso por não preenchimento dos pressupostos de admissibilidade, nos termos das seguintes razões apresentadas pelo Relator, Ministro Lafayette de Andrada: “Decidindo que a Ordem dos Advogados não é uma autarquia e seus funcionários não se equiparem aos servidores públicos, o acórdão nenhuma lei federal ofendeu”.

Pois bem, a imprecisão na caracterização das autarquias (como verbalizado pelo Ministro Nunes Leal no MS nº 10.272/DF) começou a ser afastada pelo Decreto-lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967, que no inciso II de seu artigo 4º e no inciso I de seu artigo 5º conceituou autarquia como “serviço autônomo, criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da administração pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada”[62].

Para José dos Santos Carvalho Filho (2009, p. 445), autarquia é “a pessoa jurídica de direito público, integrante da Administração Indireta, criada por lei para desempenhar funções que, despidas de caráter econômico, sejam próprias e típicas do Estado”.

Embora reconheça seja árdua a definição de atividades próprias e típicas da administração, o insigne publicista afirma serem os “serviços públicos de natureza social e de atividades administrativas, com a exclusão dos serviços e atividades de cunho econômico e mercantil” (CARVALHO FILHO, 2009, p. 448).

Hely Lopes Meirelles (2007, p. 345), ao elencar como características essenciais das entidades autárquicas a criação por lei específica, a personalidade de direito público, patrimônio próprio, auto-administração sob controle estatal e desempenho de atribuições públicas típicas, expressa:

A autarquia não age por delegação; age por direito próprio e com autoridade pública, na medida do jus imperii que lhe foi outorgado pela lei que a criou. Como pessoa jurídica de Direito Público interno, a autarquia traz ínsita, para a consecução de seus fins, uma parcela do poder estatal que lhe deu vida. Sendo um ente autônomo, não há subordinação hierárquica da autarquia para com a entidade estatal a que pertence, porque, se isto ocorresse, anularia seu caráter autárquico. Há mera vinculação à entidade-matriz, que, por isso, passa a exercer um controle legal, expresso no poder de correção finalística do serviço autárquico.

Portanto, não obstante entes detentores de personalidade própria, as autarquias não gozam de autonomia, sendo pertinentes as lições de José Cretella Júnior (1990, p. 174):

Autonomia (…) é faculdade que alguns entes têm de se organizarem juridicamente, de criar direito próprio, direito que não só, como tal, é reconhecido pelo Estado, mas também por ele adotado para fazer parte do seu próprio sistema jurídico e declarado obrigatório como as próprias leis e os próprios regulamentos. (…).

Autarquia, ao contrário, é a faculdade reconhecida ao ente de administrar-se por si mesmo, isto é, de agir para a consecução dos próprios fins, mediante o desdobramento, onde ocorra, de uma atividade administrativa, que tem a mesma natureza e os mesmos efeitos da Administração Pública do Estado. Autonomia e autarquia identificam-se, assim, como formas de legislação e de administração (…).

As autarquias, portanto, desempenham suas atribuições nos exatos termos fixados pelo ente que as criou, competindo à Administração central supervisionar as atividades dos entes autárquicos com vistas a verificar se os preceitos e fins definidos em lei são, ou não, atingidos.

A referida supervisão, por sua vez, dá-se nos termos dos artigos 19 e seguintes do mesmo Decreto-lei nº 200, de 1967:

Art . 19. Todo e qualquer órgão da Administração Federal, direta ou indireta, está sujeito à supervisão do Ministro de Estado competente, excetuados unicamente os órgãos mencionados no art. 32, que estão submetidos à supervisão direta do Presidente da República.

Art. 20. O Ministro de Estado é responsável, perante o Presidente da República, pela supervisão dos órgãos da Administração Federal enquadrados em sua área de competência.

Parágrafo único. A supervisão ministerial exercer-se-á através da orientação, coordenação e contrôle das atividades dos órgãos subordinados ou vinculados ao Ministério, nos têrmos desta lei.

Art . 25. A supervisão ministerial tem por principal objetivo, na área de competência do Ministro de Estado:

I - Assegurar a observância da legislação federal.

II - Promover a execução dos programas do Govêrno.

III - Fazer observar os princípios fundamentais enunciados no Título II.

IV - Coordenar as atividades dos órgãos supervisionados e harmonizar sua atuação com a dos demais Ministérios.

V - Avaliar o comportamento administrativo dos órgãos supervisionados e diligenciar no sentido de que estejam confiados a dirigentes capacitados.

VI - Proteger a administração dos órgãos supervisionados contra interferências e pressões ilegítimas.

VII - Fortalecer o sistema do mérito.

VIII - Fiscalizar a aplicação e utilização de dinheiros, valôres e bens públicos.

IX - Acompanhar os custos globais dos programas setoriais do Govêrno, a fim de alcançar uma prestação econômica de serviços.

X - Fornecer ao órgão próprio do Ministério da Fazenda os elementos necessários à prestação de contas do exercício financeiro.

XI - Transmitir ao Tribunal de Contas, sem prejuízo da fiscalização deste, informes relativos à administração financeira e patrimonial dos órgãos do Ministério.

Art. 26. No que se refere à Administração Indireta, a supervisão ministerial visará a assegurar, essencialmente:

I - A realização dos objetivos fixados nos atos de constituição da entidade.

II - A harmonia com a política e a programação do Govêrno no setor de atuação da entidade.

III - A eficiência administrativa.

IV - A autonomia administrativa, operacional e financeira da entidade.

Parágrafo único. A supervisão exercer-se-á mediante adoção das seguintes medidas, além de outras estabelecidas em regulamento:

a) indicação ou nomeação pelo Ministro ou, se fôr o caso, eleição dos dirigentes da entidade, conforme sua natureza jurídica;

b) designação, pelo Ministro dos representantes do Govêrno Federal nas Assembléias Gerais e órgãos de administração ou contrôle da entidade;

c) recebimento sistemático de relatórios, boletins, balancetes, balanços e informações que permitam ao Ministro acompanhar as atividades da entidade e a execução do orçamento-programa e da programação financeira aprovados pelo Govêrno;

d) aprovação anual da proposta de orçamento-programa e da programação financeira da entidade, no caso de autarquia;

e) aprovação de contas, relatórios e balanços, diretamente ou através dos representantes ministeriais nas Assembléias e órgãos de administração ou contrôle;

f) fixação, em níveis compatíveis com os critérios de operação econômica, das despesas de pessoal e de administração;

g) fixação de critérios para gastos de publicidade, divulgação e relações públicas;

h) realização de auditoria e avaliação periódica de rendimento e produtividade;

i) intervenção, por motivo de interêsse público.

Visando concretizar a referida supervisão, o Decreto nº 60.900, de 26 de junho de 1967, vinculou os Conselhos então existentes, inclusive a OAB, ao Ministério do Trabalho[63]-[64].

A doutrina, então, assim passou a abordar os Conselhos e Ordens:

Com as mesmas características da OAB, desfrutando de personalidade pública expressamente deferida pelas leis de sua criação, nós temos uma série de “ordens” ou “conselhos” dos quais o Tribunal de Contas vem sistematicamente exigindo prestação de contas, a par do que procede em relação a todas as autarquias federais: assim, existem os Conselhos de Engenharia e Arquitetura e os de Medicina – os mais antigos, depois da Ordem dos Advogados -, os de Contabilidade, de Química, de Farmácia, de Biblioteconomia, e, ainda, a Ordem dos Músicos do Brasil. Como exprimimos, a boa tese é a sustentada pela Corte de Contas, tanto que a Justiça não tem amparado as recusas apresentadas por várias dessas entidades, num vão esforço para se colocarem em situação jurídica inominada, à qual nem elas sabem como conceituar.

Autarquias é o que elas efetivamente são, (...). E são até autarquias espontâneas, que, além de exercerem uma função pública, correspondem a um agregado social cimentado pela comunhão espiritual dos homens do mesmo ofício (COTRIM NETO, 1966, p. 269).

Algumas leis referem-se a autarquias de regime especial, sem definir seu conteúdo. Diante dessa imprecisão, conceitual, é de se dizer que autarquia de regime especial é toda aquela a que a lei instituidora conferir privilégios específicos e aumentar sua autonomia comparativamente com as autarquias comuns, sem infringir os preceitos constitucionais pertinentes a essas entidades de personalidade pública.

(...).

Assim, são consideradas autarquias de regime especial o Banco Central do Brasil (Lei 4.595/64), a Comissão Nacional de Energia Nuclear (Lei 4.118/62), a Universidade de São Paulo (Dec.-lei 13.855/44 e Decs.52.326/69 e 52.06/72), bem como as entidades encarregadas, por lei, dos serviços de fiscalização de profissões regulamentadas (OAB, CONFEA e congêneres), dentre outras que ostentam características próprias na sua organização, direção, operacionalidade e gestão de seus bens e serviços (MEIRELLES, 2007, p.348).

Vários critérios costumam ser apresentados para classificar as autarquias.

Alguns consideram o tipo de atividade, falando em autarquias:

5. profissionais ou corporativas, que fiscalizam o exercício das profissões, como a OAB, o CREA, e o CRM;

(...)

Um outro critério considera a estrutura das autarquias e as subdivide em:

(...)

2. corporativas

(...). O Estado pode instituir pessoa jurídica constituída por sujeitos unidos (ainda que compulsoriamente) para a consecução de um fim de interesse público mas que diz respeito aos próprios associados, como ocorre com a OAB e demais entidades corporativas (DI PIETRO, 2007, p.319);

Dentro das atividades típicas do Estado, a que estão preordenadas, as autarquias podem ter diferentes objetivos, classificando-se em:

(...)

d) autarquias profissionais (ou corporativas): incumbidas da inscrição de certos profissionais e de fiscalizar sua atividade. Exemplo: OAB (Ordem dos Advogados do Brasil); CRMV (Conselho Regional de Medicina); CREA (Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura), e outras do gênero (CARVALHO FILHO, 2009, p. 410).

Em 1969, entretanto, o Decreto-lei nº 968, de 13 de outubro de 1969, além de afastar dos Conselhos e Ordens as normas internas e de pessoal existentes para as demais autarquias, limitou o campo de supervisão ministerial sobre os mesmos exercido “à verificação da efetiva realização dos correspondentes objetivos legais de interêsse público”:

Art. 1º As entidades criadas por lei com atribuições de fiscalização do exercício de profissões liberais, que sejam mantidas com recurso, próprios e não recebam subvenções ou transferências à conta do orçamento da união regular-se-ão pela respectiva legislação específica, não se lhes aplicando as normas legais sôbre pessoal e demais disposições de caráter geral, relativas à administração interna das autarquias federais.

Parágrafo único. As entidades de que trata êste artigo estão sujeitas à supervisão ministerial prevista nos artigos 19 e 26 do Decreto-lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967 restrita à verificação da efetiva realização dos correspondentes objetivos legais de interêsse público.

Importantíssimo salientar, neste momento, não ter havido revogação dos artigos 19 e 26 do Decreto-lei nº 200, mas tão-somente a disciplina especial da matéria, o que, aliás, desde 04 de setembro de 1942 é preconizado pelo §2º, artigo 2º, do Decreto-lei nº 4.657 (Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro)[65].

Dessa forma, quanto aos Conselhos e Ordens, a lista de objetivos contida no artigo 26 do Decreto-lei nº 200 ficou limitada à constatação da realização dos objetivos de interesse público elencados em suas leis.

Dito de outro modo, embora desprovidos de autonomia, conferiu-se aos referidos entes uma maior liberdade gerencial, a qual, por certo, visava imprimir maior eficiência à consecução dos fins públicos lhes outorgados.

A referida alteração, porém, não se mostrou suficiente para afastar os Conselhos da Administração central, como ficou definido em 1971 pelo Plenário do STF, ocasião em que, para não conhecer a Ação Cível Originária nº 190/MG ajuizada pelo Conselho Regional de Contabilidade de Minas Gerais em face do estado mineiro, reafirmou integrar o Conselho a Administração Indireta, razão pela qual não teria a Suprema Corte competência originária para apreciar o litígio[66].

O próprio Decreto nº 74.000, de 1º de maio de 1974, ao dispor “sobre a vinculação de entidades e dá outras providências”, vinculou os Conselhos então existentes, inclusive a OAB, ao Ministério do Trabalho[67], vinculação esta expressamente mantida no Decreto nº 74.296, de 16 de julho de 1974 (que dispôs “sobre a estrutura básica do Ministério do Trabalho”)[68].

A realidade acima exposta, porém, modificou-se severamente em 21 de novembro de 1986, quando a supervisão ministerial mitigada imposta pelo parágrafo único do artigo 1º do Decreto-lei nº 968 foi expressamente revogada pelo Decreto-lei nº 2.299.

Tal revogação, então, acarretaria o retorno da supervisão ministerial prevista nos 04 incisos e nas 09 alíneas constantes do artigo 26 do Decreto-lei nº 200, de 1967, porquanto, como acima exposto (art.2º, §2º, da LICC), o parágrafo único do artigo 1º do Decreto-lei nº 968 não revogara os referidos dispositivos.

Todavia, no mesmo dia 21 de novembro de 1986, pelo Decreto nº 93.617 se estabeleceu:

Art. 1º. Não será exercida supervisão ministerial sobre as entidades incumbidas da fiscalização do exercício de profissões liberais, a que se refere o Decreto-lei nº 968, de 13 de outubro de 1969.

Art. 2º. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 3º. Revogam-se as disposições em contrário, em especial o artigo 1º, item II, nºs 6 a 24, do Decreto nº 74.000, de 1º de maio de 1974, e o artigo 3º, item I, do Decreto nº 81.663, de 16 de maio de 1978.

Pois bem, o inciso V, artigo 81, da Emenda Constitucional conferia ao Presidente da República competência para, por Decreto, dispor sobre estruturação, atribuições e funcionamento dos órgãos[69] da administração federal[70].

Acontece que os Conselhos e Ordens não são órgãos, mas entidades dotadas de personalidade jurídica própria, distinta do ente que as criou.

Nos termos da Emenda Constitucional de 1969, portanto, Decreto-lei só poderia ser modificado por lei de iniciativa do Presidente da República ou por outro Decreto-lei[71], de modo que o Chefe do Executivo não dispunha de competência para, por Decreto, alterar o comando do Decreto-lei nº 200, de 1967, e, em verdade, da própria Constituição (que impunha aos Ministros de Estado o dever de supervisionar os órgãos e entidades da administração federal[72]).

Não obstante, na prática o que prevaleceu foi o entendimento de que os Conselhos, a partir de então, não mais seriam supervisionados pelo poder central.

Em outras palavras, os Conselhos e Ordens, a partir do momento em que foram afastados da Administração Direta, tornaram-se, na prática, dotados de autonomia.

1.4 Conselhos e Ordens de fiscalização existentes no Brasil

Definido o campo de atuação e a natureza da atividade realizada pelos Conselhos e Ordens, resta saber quais profissões tiveram seu exercício limitado pela ingerência das referidas entidades.

Embora o Código Brasileiro de Ocupações (CBO)[73] registre mais de 2.560 profissões reconhecidas, nos dias atuais, segundo informações do Ministério do Trabalho e Emprego, aproximadamente 60 encontram-se legalmente regulamentadas[74].

Dessas, apenas 29 contam com entidades incumbidas da fiscalização de seu exercício, que foram criados na seguinte ordem:

a) No período compreendido entre o início da descentralização funcional e toda a vigência da Constituição de 1946, foram criados 13 Conselhos e Ordens: Ordem dos Advogados Brasileiros (Decreto nº 19.408, de 18 de novembro de 1930); Conselhos de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (Decreto nº 23.569, de 11 de dezembro de1933); Conselhos de Medicina (Decreto-lei nº 7.955, de 13 de setembro de 1945); Conselhos de Contabilidade (Decreto-lei nº 9.295, de 27 de maio de 1946); Conselhos de Economia (Lei nº 1.411, de 13 de agosto de 1951); Conselhos de Química (Lei nº 2.800, de 18 de junho de 1956); Conselhos de Farmácia (Lei nº 3.820, de 11 de novembro de 1960); Ordem dos Músicos (Lei nº 3.857, de 22 de dezembro de 1960); Conselhos de Biblioteconomia (Lei nº 4.084, de 30 de junho de 1962); Conselhos de Odontologia (Lei nº 4.324, de 14 de abril de 1964); Conselhos de Estatística (Lei nº 4.739, de 15 de julho de 1965); Conselhos de Administração (Lei nº 4.769, de 09 de setembro de 1965); Conselhos de Representantes Comerciais (Lei nº 4.886, de 09 de dezembro de 1965);

b) Embora a Carta de 1967 e a Emenda nº 01, de 1969, ao contrário do Diploma de 1946, não tenham assegurado especificamente a regulação do exercício das profissões liberais, sob a vigência desses Diplomas deu-se sequência à referida regulação com a criação de 12 outros Conselhos: Conselhos de Medicina Veterinária (Lei nº 5.517, de 23 de outubro de 1968); Conselhos de Profissionais de Relações Públicas (Decreto-lei nº 860, de 11 de setembro de 1969); Conselhos de Psicologia (Lei nº 5.766, de 20 de dezembro de 1971); Conselhos de Enfermagem (Lei nº 5.905, de 12 de julho de 1973); Conselhos de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (Lei nº 6.316, de 17 de dezembro de 1975); Conselhos de Corretores de Imóveis (Lei nº 6.530, de 12 de maio de 1978); Conselhos de Nutricionistas (Lei nº 6.583, de 20 de outubro de 1978); Conselhos de Biologia e Conselhos de Biomedicina (Leis nº 6.684, de 03 de setembro de 1979, e 7.017, de 30 de agosto de 1982); Conselhos de Fonoaudiologia (Lei nº 6.965, de 09 de dezembro de 1981); Conselhos de Museologia (Lei nº 7.287, de 18 de dezembro de 1984); Conselhos de Técnicos em Radiologia (Lei nº 7.394, de 29 de outubro de 1985);

c) Finalmente, já sob as luzes da CRFB/1988 foram criados 04 outros Conselhos: Conselhos de Economistas Domésticos (Lei nº 8.024, de 13 de junho de 1990); Conselhos de Serviço Social (Lei nº 8.662 de 07 de junho de 1993); Conselhos de Educação Física (Lei nº 9.696, de 1º de setembro de 1998); e Conselhos de Despachantes Documentalistas (Lei nº 10.602, de 12 de dezembro de 2002).

Assim, há no Brasil, atualmente, 29 (vinte e nove) Sistemas responsáveis pela fiscalização do exercício profissional, sendo cada Sistema composto por um Conselho Federal e pelos respectivos Conselhos Regionais.

Apresentado o tratamento conferido aos Conselhos e Ordens no período anterior à Constituição de 1988, cumpre analisar a abordagem e a leitura feitas no novo cenário político e jurídico advindo com a Carta Cidadã.


2 O PERFIL JURÍDICO DOS CONSELHOS E ORDENS NA CONSTITUIÇÃO DE 1988

O espírito trazido pela CRFB/1988 de ver a cidadania concretizada no plano prático[75] culminou com a definição da dignidade da pessoa humana[76] como um dos sustentáculos do Estado Democrático de Direito brasileiro[77], razão pela qual os direitos fundamentais tornaram-se expressão normativa do conjunto de valores básicos da sociedade[78].

Ao seguir a opção adotada em 1934, a CRFB/1988 elencou dentre os direitos fundamentais do homem a liberdade do exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, admitindo-se, porém, sua restrição:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer.

Manoel Gonçalves Ferreira Filho (2005, p. 31), quanto ao dispositivo, preconiza:

Outra liberdade reconhecida é a de profissão, que compreende, na sistemática da Constituição vigente (art.5º, XIII), a de trabalho ou de ofício. Como expressão lídima da liberdade individual, cada um tem o direito de trabalhar no ofício que lhe agradar, para o qual tiver aptidão. Rejeita-se assim o privilégio de profissão, anteriormente consagrado em prol das corporações de ofício.

Entretanto, sob pena de a liberdade profissional ser restringida em demasia (ou até mesmo anulada), Gilmar Ferreira Mendes (2007, p. 38), quanto à parte final do inciso XIII, destaca que “restrições à liberdade de exercício profissional somente podem ser levadas a efeito no tocante às qualificações profissionais”.

Tais ensinamentos, por sua vez, seguem o que foi definido pelo Ministro Rodrigues Alckmin, no que foi acompanhado pela maioria do Plenário do Supremo Tribunal Federal quando do julgamento da Representação nº 930/DF[79]-[80]:

a) A Constituição Federal assegura a liberdade de exercício de profissão. O legislador ordinário não pode nulificar ou desconhecer esse direito ao livre exercício profissional (Cooley, Constitutional Limitations, pg.209, ...Nor, where fundamental rights are declared by the constitutions, is it necessary at the same time to prohibit the legislature, in express terms, from taking them away. The declaration is itself a prohibition, and is inserted in the constitution for the express purpose of operating as a restriction upon legislative power). Pode somente limitar ou disciplinar esse exercício pela exigência de condições de capacidade, pressupostos subjetivos referentes a conhecimentos técnicos ou a requisitos especiais, morais ou físicos.

b) Ainda no tocante a essas condições de capacidade, não as pode estabelecer o legislador ordinário, em seu poder de polícia das profissões, sem atender ao critério da razoabilidade, cabendo ao Poder Judiciário apreciar se as restrições são adequadas e justificadas pelo interesse público, para julgá-las legítimas ou não.

Para chegar a tal conclusão, o Ministro Alckmin expôs que as restrições à liberdade de exercício profissional devem se ater aos limites previstos na própria Constituição (condições de capacidade, tais como técnica, moral e física, sempre e somente destinadas à preservação do interesse público e à defesa da sociedade, não à preservação de interesses de grupos) e ao princípio da razoabilidade, competindo ao Judiciário intervir sempre que tais limites forem extrapolados:

Assenta-se, portanto, que a liberdade de exercício de profissão, se pode ser limitada, somente o pode ser com apoio na própria permissão constitucional ("observadas as condições de capacidade que a lei estabelecer") e de maneira razoável.

E no Poder Judiciário cabe, induvidosamente, em face da lei que regulamenta exercício profissional, examinar, à luz desses critérios, a legitimidade da regulamentação.

(...)

Quais os limites que se justificam, nas restrições ao exercício de profissão?

Primeiro, os limites decorrentes da exigência de capacidade técnica. Observa Sampaio Dória: “A lei para fixar as condições de capacidade, terá de inspirar-se em critério de defesa social e não em puro arbítrio. Nem todas as profissões exigem condições legais de exercício. Outras, ao contrário, o exigem. A defesa social decide. Profissões há que, mesmo exercidas por ineptos, jamais prejudicam diretamente direito de terceiro, como a de lavrador. Se carece de técnica, só a si mesmo se prejudica. Outras profissões há, porém, cujo exercício por quem não tenha capacidade técnica, como a de condutor de automóveis, piloto de navios ou aviões, prejudica diretamente direito alheio. (...). Daí em defesa social, exigir a lei condições de capacidade técnica para as profissões cujo exercício possa prejudicar diretamente direitos alheios, sem culpa das vítimas” (Comentários à Constituição de 1946, v. IV, pág.637). São legítimas, consequentemente, as restrições que imponham demonstração de capacidade técnica, para o exercício de determinadas profissões. De profissões que, realmente, exijam conhecimentos técnicos para o seu exercício. Aliás, na Constituinte, sustentava Mário Masagão que somente esses requisitos de capacidade técnica poderiam ser exigidos por lei ordinária. E ponderava que, se se mantivesse a autorização ao legislador ordinário para estabelecer as condições de capacidade técnica unicamente, “já teremos assegurado o interesse público. Há profissões cujo exercício diz diretamente com a vida, a saúde, a liberdade, a honra e a segurança do cidadão, e por isso, a lei cerca seu exercício de determinadas condições de capacidade. Fora deste terreno, não podemos admitir exceções, porque estaríamos mutilando o regime democrático de Constituição e o Estado Jurídico em que pretendemos ingressar, dando à lei ordinária uma força que não deve e não pode ter” (v.José Duarte, 'A Constituição Brasileira', de 1946, v.3º p.33/34).

Prevaleceu emenda de Ivo de Aquino, porém, que excluiu, do texto o restritivo “técnica”. E daí a referência a poder, a lei ordinária, exigir condições de capacidade (não somente condições de capacidade técnica) para o exercício de profissões. Essa emenda, de n. 3.078, que prevaleceu finalmente, obteve parecer favorável, ponderando a Comissão que tinha ela a vantagem de permitir “atender às condições de capacidade moral, física e outras” (v.Rev. dos Tribunais, 201/76).

(...)

Mas se a lei ordinária pode exigir, regulamentando o exercício profissional, condições de capacidade que não sejam atinentes exclusivamente à técnica, nem por isso as condições podem ser arbitrárias ou ilimitadamente estabelecidas pelo legislador ordinário. Tais condições (de capacidade técnica, moral, física, ou outras) hão de ser sempre exigidas pelo interesse público, jamais pelos interesses de grupos profissionais ou de determinados indivíduos.

(…)

O primeiro e capital valor que se tutela, na aludida previsão constitucional, é o livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, valor que especialmente se protege com o erigir-se em direito individual o desempenho, por qualquer cidadão, do mister pelo qual se inclinar, por vocação ou por necessidade. O segundo valor é o interesse público, em cujo nome se autoriza o legislador a estipular condições de capacidade. Unicamente quando o interesse público imponha a observância de condições de capacidade, tomado o vocábulo em acepção ampla, para o desempenho deste ou daquele trabalho, ofício ou profissão, é lícito, por conseguinte, ao legislador regulamentar, pelo estabelecimento dos requisitos que se configurarem adequados, o desempenho deste ou daquele mister, que deixa, então, de ser livre para se tornar acessível somente aos que preencherem os pressupostos estipulados em lei.

Passará a constituir letra morta o direito individual ao livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão se deixado ao alvedrio do legislador trancar o acesso ao desempenho de qualquer atividade a quem para isso não preencher os requisitos que, a seu talante, venha a reclamar.

Fixadas as premissas relativas à limitação ao exercício profissional (condições de capacidade e princípio da razoabilidade), José Afonso da Silva (2005, p. 108) leciona ser regra geral o reconhecimento da liberdade de escolha e de exercício profissional, sendo admitido ao legislador ordinário federal sujeitá-la à observância de qualificações especiais, porquanto determinadas profissões dependem de capacidades de ordem técnica, científica ou moral.

Inexistindo, porém, tais sujeições legais, a eficácia e a aplicabilidade da liberdade profissional são amplas e diretas, porquanto derivadas diretamente do texto constitucional.

Para que a referida restrição se afigure legítima, então, André Ramos Tavares (2007, p. 560), ao discorrer sobre o inciso XIII, artigo 5º, da CRFB/1988, pondera que não basta versar sobre qualificações profissionais:

Trata-se de norma constitucional de eficácia contida, pois prevê a possibilidade de lei regulamentadora restritiva, vale dizer, que estabelecerá as qualificações e requisitos necessários para exercer determinadas profissões.

Mas essa legislação apenas poderá prever condições que apresentem nexo lógico com as funções a serem desempenhadas. Não se tolera condição discriminatória, injustificada, o que, além de violar a liberdade de profissão, fere igualmente o princípio da igualdade.

A limitação imposta pela parte final do inciso XIII, artigo 5º, da Carta Democrática de 1988, portanto, refere-se ao que Canotilho denomina reserva de lei restritiva[81] e ao que José Afonso da Silva (2007, p. 269) conceitua como norma de eficácia contida, presente quanto o legislador ordinário, autorizado pela Constituição, “intervém para restringir o direito de liberdade conferido”.

Por conseguinte, condições para o exercício de ofício, trabalho ou profissão, para serem tidas como legais e constitucionais, além de instituídas por lei em sentido estrito e voltadas exclusivamente ao estabelecimento dos requisitos de capacidade para desempenho[82], devem ser sopesadas à luz do princípio constitucional da proporcionalidade[83]-[84].

Portanto, os Conselhos e Ordens, haja vista lhes terem sido outorgadas por lei as funções de registro dos profissionais habilitados na forma da lei e de acompanhamento do exercício profissional sob os aspectos técnicos e éticos, agem de modo a conferir eficácia ao direito fundamental previsto no inciso XIII, artigo 5º, da CRFB/1988.

Nesse novo contexto, em 1989, por ocasião do julgamento do Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 20.976/DF, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, à unanimidade[85], a despeito do Decreto nº 93.617, de 1986, ratificou a possibilidade de supervisão ministerial sobre os Conselhos no que se refere ao cumprimento de sua atividade-fim, nos termos do voto do Relator, Ministro Sepúlveda Pertence:

Daí, concluo, enquanto se mantiver na esfera do exercício regular dessa atividade-fim de interesse público, não ha espaço nos lindes que lhe traçou o Dec.-lei 968/69, para que a supervisão ministerial intervenha: nem para decidir, em grau de recurso hierárquico, posto que impróprio, sobre decisões concretas da autarquia, nem para dar-lhe instruções in abstracto sobre como decidir determinada questão jurídica[86].

Interessante que, para chegar a tal conclusão, o STF considerou válida[87] a supervisão mitigada instituída pelo parágrafo único, artigo 1º, do Decreto-lei nº 968, de 1969, esquecendo-se, contudo, que tal dispositivo fora revogado três anos antes, em 1986, pelo Decreto-lei nº 2.299.

De todo modo, à luz da CRFB/1988 o STF reafirmou a supervisão ministerial sobre os Conselhos, ainda que excepcional e específica.

Não obstante, em 1994 a Lei nº 8.906, (Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil), ao definir as atribuições da OAB[88] (único serviço de fiscalização profissional expressamente previsto na Constituição[89]), explicitou no §1º de seu artigo 44 que a Ordem “não mantém com órgãos da Administração Pública qualquer vínculo funcional ou hierárquico”.

Ainda, a mesma Lei expôs que os Conselhos Federal e Seccionais da OAB, bem como suas Caixas de Assistência, seriam dotados de “personalidade jurídica própria”, além de que a OAB, “por constituir serviço público, goza de imunidade tributária total em relação a seus bens, rendas e serviços”, sendo ainda competente para “fixar e cobrar, de seus inscritos, contribuições, preços de serviços e multas”[90].

Seguindo tais passos, em 1997 foi a vez dos demais Conselhos e Ordens receberem, na 36ª edição da Medida Provisória (MP) nº 1.549, tratamento específico, quando, então, definiu-se no artigo 58 e §§[91] que os serviços de fiscalização por si desempenhados seriam regidos “em caráter privado, por delegação do poder público, mediante autorização legislativa”, sendo atribuída aos Conselhos Federais de cada profissão a competência para disciplinar sobre suas respectivas organizações, estruturas e funcionamento.

A MP, em seguida, ao ponderar que os Conselhos, assim como a OAB, não manteriam com a Administração Pública qualquer vínculo funcional ou hierárquico, fixou o regime celetista como o regente das relações mantidas com seus empregados.

Finalmente, na MP conferiu-se aos Conselhos a atribuição de “cobrar e executar as contribuições anuais devidas por pessoas físicas ou jurídicas, bem como taxas e emolumentos instituídos em lei” e, igualmente, o poder de fiscalização administrativa e financeira.

Tais dispositivos, então, foram objeto de Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) em momentos distintos.

Embora cronologicamente posterior, a MP nº 1.549-36 foi a primeira a ter sua constitucionalidade questionada (o que se deu em 1997 pela ADI nº 1.717/DF), quando almejou-se retirar do ordenamento jurídico o já citado artigo 58 e respectivos parágrafos.

Deparou-se o Supremo Tribunal Federal, então, com a oportunidade de, em sede de controle concentrado e à luz da Carta Cidadã, definir a natureza jurídica dos Conselhos de Fiscalização do Exercício Profissional, excluída a OAB[92], à luz dos preceitos e princípios da Carta Cidadã.

O Pretório Excelso, quase 06 (seis) anos depois do ajuizamento da ação, posicionou-se, definitivamente, pela natureza autárquica dos Conselhos e Ordens de Fiscalização do Exercício profissional.

Muito embora definida a natureza jurídica dos Conselhos, permaneceu um vácuo no ordenamento jurídico, já que a entidade responsável pela fiscalização da advocacia não havia sido objeto de análise.

Tal lacuna, porém, começou a ser preenchida 07 (sete) meses depois de publicada a decisão proferida na ADI nº 1.717/DF, quando o Procurador-Geral da República ingressou com a ADI nº 3.026/DF para ver declarada a inconstitucionalidade de parte do §1º, artigo 79, da Lei nº 8.906, de 1994[93], que dispunha: "sendo assegurado aos optantes o pagamento de indenização, quando da aposentadoria, correspondente a cinco vezes o valor da última remuneração", bem como para se dar ao caput do mesmo artigo 79 da mesma lei[94] interpretação conforme o inciso II do artigo 37 da CRFB/1988.

Embora o cerne da referida discussão não se relacionasse diretamente à natureza jurídica da OAB, a Suprema Corte, para decidir em 2006 o mérito da questão, adentrou nas especificidades da Ordem e, também, de sua personalidade e natureza, inclusive com menções a traços que a aproximariam ou distinguiriam dos demais Conselhos.

Portanto, as ADIs nº 1.717/DF e 3.026/DF são marcos para conhecimento da visão que o Supremo Tribunal Federal tem sobre as entidades criadas na década de 1930 e que, nos dias atuais, sob a égide da Carta de 1988, ainda desempenham um papel ativo na efetivação de direitos fundamentais do homem, especificamente o da liberdade do exercício profissional.

2.1 Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.717/DF: natureza jurídica dos conselhos de fiscalização do exercício profissional

Em 26/11/1997 o Partido Comunista do Brasil (PC do B), o Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido Democrático Trabalhista (PDT), atendendo a reivindicações externadas pela Federação Nacional dos Servidores das Autarquias de Fiscalização do Exercício Profissional (FENASERA), pela Federação Nacional dos Enfermeiros (FNE), pelo Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) e pela Associação Brasileira de Enfermagem (ABEn), propuseram a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 1.717/DF, com medida liminar, para ver declarada a inconstitucionalidade do artigo 58 e parágrafos da MP nº 1.549-36, de 06/11/1997[95].

Arguiu-se violação ao princípio da segurança jurídica, pois os referidos dispositivos, além de destoarem do objeto central da norma[96], só foram inseridos na MP a partir de sua 35ª edição[97].

A insegurança e incerteza jurídicas eram ressaltadas pelo fato de, já na 36ª edição, terem ocorrido alterações substanciais na redação dada pela 35ª edição ao artigo 58 e a seus parágrafos, sendo trazidos na inicial os seguintes exemplos:

a) enquanto na 35ª edição o caput do artigo 58 fazia menção a conselhos de fiscalização de profissões liberais dotados de personalidade jurídica de direito privado e forma federativa, na 36ª remetia-se a serviços de fiscalização de profissões regulamentadas exercidos em caráter privado, por delegação do poder público, mediante autorização legislativa;

b) se na 35ª edição o §1º atribuía à assembleia geral da respectiva categoria profissional a competência para definir a organização, estrutura e o funcionamento dos Conselhos, na 36ª a competência foi dada aos Plenários dos Conselhos Federais;

c) na 36ª edição ao §2º foi acrescida a vedação a "qualquer forma de transposição, transferência ou deslocamento para o quadro da Administração Pública direta ou indireta".

Ainda, por estar à época do ajuizamento pendente, no STF, o julgamento do Mandado de Segurança nº 21.797/RJ[98], afirmaram os autores que a inclusão na MP dos dispositivos impugnados afigurava-se tentativa de o Executivo interferir diretamente no Judiciário[99].

Assim, segundo os postulantes[100][101], sendo finalidade institucional das Medidas Provisórias evitar perturbações ou instabilidades jurídicas, a reedição por três anos da MP nº 1549, com as alterações e inovações mencionadas, demonstrava a falta de clareza acerca da normatização pretendida, sendo caracterizados o desvio de finalidade legislativa e o exercício arbitrário do poder previsto no artigo 62 da CRFB/1988[102].

Em sequência, os proponentes definiram que o artigo 58 e parágrafos violariam expressamente os seguintes preceitos e regras constitucionais: a) a competência da União de organizar, manter e executar a inspeção do trabalho (artigo 21, XXIV[103]); b) a competência privativa da União de legislar sobre organização do sistema nacional de emprego e condições para o exercício das profissões (artigo 22, XVI[104]); c) o regime jurídico único (caput do artigo 39[105]); d) o poder fiscalizatório do Tribunal de Contas da União - TCU - (artigos 70 e 71, II[106]), e, finalmente; e) a competência exclusiva da União de instituir contribuições sociais (artigo 149[107]).

Isso porque sendo atribuição da União dispor sobre as condições para o exercício profissional, o inciso XVI do artigo 22 daria fundamento constitucional aos serviços de fiscalização de profissões e viabilizaria o direito ao livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão (artigo 5º, XIII[108]), sendo estes os parâmetros limitadores da regulamentação e da definição dos meios pelos quais a União inspeciona e fiscaliza o trabalho (artigo 21, XXIV).

Portanto, segundo os postulantes, os órgãos criados por lei federal para fiscalização do exercício profissional, na medida em que desempenham típica atividade estatal, possuiriam inegável natureza pública, não havendo a possibilidade de seu exercício em caráter privado[109].

A inicial também trouxe como fundamento a assertiva de que as contribuições pelos Conselhos cobradas teriam natureza tributária, assim como a assertiva de que sua sujeição ao TCU decorreria do fato de seu patrimônio ser bem público e de sua natureza autárquica (como reconhecido pelo próprio STF[110]).

Partindo da premissa de que os Conselhos seriam autarquias, entenderam os requerentes que decorrência lógica seria sua submissão ao princípio do concurso público para contratação de seus empregados (artigo 39, II), resultando daí a inconstitucionalidade do §3º do artigo 58.

O §4º do artigo 58 foi apresentado na inicial como incongruente e inconstitucional porque autorizava aos Conselhos (transformados pela MP em entes privados) a realização das atribuições típicas da Administração Pública de cobrança e execução de contribuições, taxas e emolumentos.

Por entenderem que os Conselhos seriam entidades da Administração Indireta, os postulantes concluíram que o §5º do artigo 58 colidiria com a Constituição, porquanto retirava do TCU a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial das referidas entidades.

Após registrarem que os Conselhos de Fiscalização deteriam o poder de editar normas voltados à regulação de condutas éticas e técnicas e, igualmente, estariam investidos de poder de polícia - suficiente, inclusive, para cassação do exercício profissional -, os autores ponderaram que tais entes, por objetivarem, a um só tempo, a defesa da profissão, dos interesses da sociedade e do cidadão usuários dos serviços profissionais, desempenhariam relevante e prioritária função social na orientação, fiscalização e normatização do exercício profissional.

Assim, em sede liminar solicitou-se na inicial a suspensão dos efeitos do artigo 58 e seus parágrafos, sendo apresentado, além das argumentações acima sintetizadas, o seguinte:

No que se refere ao risco iminente de difícil reparação, importa anotar o perigo de que os Conselhos de Fiscalização de Profissões venha a demitir servidores e contratar outros, gerando inegável insegurança em todos os servidores destes órgãos, considerando ainda o risco de difícil reparação decorrente de apressadas mudanças na organização e funcionamento destes órgãos.

A suspensão liminar dos efeitos da norma impugnada, também sob o aspecto da conveniência, merece consideração, tendo em vista que a aplicação da norma tenderá a acarretar maior prejuízo, no que se refere a insegurança jurídica decorrente de sua aplicação, do que a suspensão de seus efeitos, até o julgamento final desta ação direta de inconstitucionalidade[111].

Por fim, quanto ao mérito os postulantes requereram “a declaração de inconstitucionalidade do disposto no art.58 da Medida Provisória nº 1549-36, de 06 de novembro de 1997”.

Em razão da 42ª edição da MP (agora sob nº 1651-42), que alterara os parágrafos 2º, 4º e 6º e acrescentara os 7º e 8º, os autores aditaram a inicial para expressar que as inovações simplesmente ressaltaram a inconstitucionalidade do artigo 58.

Especificamente quanto às alterações do §6º e inserção do §8º[112], expuseram:

Os autores não podem deixar de consignar a indignação em relação a esta conduta do Presidente da República, por significar, além de maior tumulto no tratamento desordenado que vem tendo em relação às Medidas Provisórias, denota conduta irresponsável no trato das questões normativas, ensejando apenas instabilidade e insegurança jurídica na sociedade brasileira.

Urge frear esta sanha legisferante (sic.) do Chefe do Poder Executivo, por extrapolar por completo os limites do razoável.

A par destas considerações, as inovações introduzidas, conforme assinalado anteriormente, têm como único benefício o reforço na demonstração da incongruência geradora da inconstitucionalidade em discussão nestes autos.

Com efeito, a imunidade tributária prevista no novo §6º e a fixação da competência da Justiça Federal, no §8º evidenciam a inegável natureza autárquica dos conselhos de fiscalização de profissões, porquanto somente tais entes possuem tais prerrogativas[113].

Quase 15 meses depois do ajuizamento da ação, o Ministro Sydney Sanches, em Sessão realizada em 1º/02/1999[114]-[115], apresentou voto no qual, depois de entender prejudicada[116] a análise do §3º do artigo 58, deferia o pedido cautelar para suspender, até decisão final da Suprema Corte, a cabeça do artigo 58 e de seus parágrafos 1º, 2º, 4º a 8º da Lei nº 9.649, de 1998[117].

Quanto aos demais dispositivos, Sanches expôs que os artigos 5º, XIII, 22, XVI, 21, XXIV, 70, parágrafo único, 149 e 175, todos da CRFB/1988[118], pareciam impedir delegação a entidade privada de atividade típica do Estado, que, relativamente ao exercício profissional, abrangia o poder de polícia, de tributar e de punir:

11. Com efeito, não me parece possível, a um primeiro exame, em face de nosso ordenamento constitucional, mediante a interpretação conjugada dos artigos 5º, XIII, 22, XVI, 21, XXIV, 70, parágrafo único, 149 e 175 da Constituição Federal, a delegação, a uma entidade privada, de atividade típica de Estado, que abrange até poder de polícia, de tributar e punir no que concerne ao exercício de atividades profissionais[119].

 O Relator citou como precedente o MS nº 22.643/SC, relatado pelo Ministro Moreira Alves, quando o STF, ao manter decisão do TCU que ordenara o afastamento do Presidente de determinado Conselho, decidiu, a uma só voz, pelo caráter tipicamente público da fiscalização de exercício profissional, pela natureza autárquica dos Conselhos de Medicina e por sua sujeição à Corte de Contas.

Assim, ao vislumbrar a incompatibilidade entre a Constituição e a delegação de serviço público a ente privado (fumus boni iuris) e por entender haver o risco de ruptura do sistema então vigente e a consequente vulnerabilidade da Administração e do próprio exercício das profissões regulamentadas (periculum in mora)[120], Sydney Sanches votou pelo deferimento da liminar a fim de suspender os dispositivos impugnados (ressalvado, como já dito, o §3º).

Após o voto do Ministro Nelson Jobim (que limitou-se acompanhar in totum o Relator), em razão do pedido de vista formulado pelo Ministro Maurício Corrêa, o julgamento da Medida Cautelar foi retomado na Sessão de 22/09/2000, ou seja, quase 08 meses depois de seu início.

Em seu voto-vista, Corrêa acompanhou o entendimento da prejudicialidade do §3º e, considerando que a MP ensejadora da ADI havia sido convertida em Lei, afastou a ofensa ao artigo 62 da CRFB/1988.

Quanto aos demais dispositivos apontados na vestibular como violados, porém, Maurício Corrêa divergiu nos seguintes termos:

a) O artigo 58 objeto de questionamento, ao dispor sobre organização, estrutura, funcionamento e controle dos órgãos fiscalizadores das profissões, não violaria o inciso XIII do artigo 5º, pois este se refere às condições prévias para o exercício profissional;

b) O inciso XXIV do artigo 21 da CRFB/1988, de igual sorte, não se afiguraria ofendido porque a função de organizar, manter e executar a inspeção do trabalho nele prevista diz respeito às condições dos ambientes físicos e psíquicos em que o trabalho é exercido, em nada se relacionando à fiscalização do exercício de profissão regulamentada.;

c) O inciso XVI do artigo 22 (que se refere à competência legislativa da União quanto às prévias condições para o exercício de profissões) não se mostraria contrariado porque o artigo 58 em nenhum momento estabelecera condição para o exercício de profissão regulamentada, tendo se limitado a versar sobre organização, estrutura, funcionamento e controle dos órgãos fiscalizadores;

d) Diante da nova perspectiva e realidade impostas pelo artigo 58 da Lei nº 9.649, de 1998 (privatização dos Conselhos de Fiscalização), a fiscalização do TCU exigida pelo artigo 70 da CRFB/1988 (incidente sobre a Administração Indireta) deixaria automaticamente de ser aplicada;

e) Quanto ao parágrafo único do artigo 70 e ao inciso II do 71, a nova natureza jurídica atribuída pela lei aos Conselhos tornaria sua verba não mais pública, sua receita passaria a ser própria e, ainda, cessariam completamente os vínculos funcional e hierárquico com a Administração;

f) O artigo 159 da Constituição, por sua vez, manter-se-ia íntegro na medida em que a contribuição de interesse da categoria profissional, criada pela própria lei, deixaria de ser instrumento de atuação da União na respectiva área para se transformar em meio próprio de atuação da entidade;

g) A delegação do poder público, mediante autorização legislativa, dos serviços de fiscalização de profissões a entes privados não se afiguraria contrária à Constituição a delegação do poder público, pois tal experiência já era vivenciada, sem perplexidades, com os serviços notariais e de registro (artigo 236[121]):

Posto que o exercício de profissões está sujeito a condições prévias que são fixadas pela União, o desate da questão consiste em saber se os serviços de fiscalização de profissões regulamentadas podem ser exercidos em caráter privado, por delegação do poder público, mediante autorização legislativa.

Neste superficial exame cabível em juízo liminar não vejo impedimento a tal delegação legislativa, até porque a própria Constituição a prevê expressamente para os serviços notariais e de registro, de conotação muito mais ampla do que a fiscalização do exercício de determinada profissão, ao dispor no caput do seu artigo 236 “os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado por delegação do poder público”, sem que tal disposição cause qualquer perplexidade[122].

g) A Constituição não fixa e impõe a natureza autárquica para os entes responsáveis pela fiscalização do exercício profissional, sendo do legislador a competência para manter o encargo junto à Administração Direta ou, ao contrário, para criar autarquia;

h) A delegação da função fiscalizatória do exercício profissional a ente privado já existiria em relação à advocacia e a OAB[123], sendo semelhantes os termos do artigo 58 impugnado e os dispositivos do Estatuto da Advocacia (Lei nº 8.906, de 1994)[124];

i) A constitucionalidade aparente do §8º do artigo 58 (que definia a competência da Justiça Federal) seria demonstrada pelo fato de que, mesmo privados, os Conselhos desempenhariam serviço público federal;

j) Depois do ajuizamento da ADI nº 1.717/DF, o artigo 26 da EC nº 19/1998[125] possibilitara a revisão da natureza jurídica das entidades da administração indireta, de modo que a Constituição expressamente trouxera norma geral suficiente a autorizar a adequação dos Conselhos à personalidade jurídica de direito privado;

k) A imunidade tributária concedida pelo §6º do artigo 58 conflitaria com a Constituição, porquanto, além de restrita a impostos, o referido benefício só poderia ser concedido pelo constituinte originário, sendo, ainda, vedado a lei federal invadir área reservada a Estados e Municípios.

Assim, por entender que o legislador pode/deve atribuir às entidades responsáveis pela fiscalização do exercício profissional a natureza jurídica que preferir (pública – direta ou indireta – ou privada), em juízo liminar votou Corrêa pela desnecessidade de suspensão cautelar do artigo 58, ressalvado o §6º, que, a seu juízo, deveria ser interpretado como isenção tributária, não imunidade.

Em sequência, o Ministro Sepúlveda Pertence, para ao final acompanhar o Relator, verbalizou:

(...) a onda neoliberal, ou qual nome tenha, ainda não chegou ao ponto de privatizar o poder de polícia. E o que se discute aqui é uma das modalidades do poder de polícia mais sérios, porque envolve uma das liberdades fundamentais do cidadão, a do exercício profissional, acrescido, ademais, com poder tributário; e como se não bastasse, com imunidade tributária[126].

Pertence ainda afastou a semelhança levantada por Corrêa quanto aos serviços notariais e à OAB, pois, enquanto no primeiro caso a Constituição teve de ser expressa em seu artigo 236, no segundo a Ordem, desde 1963, sempre lutou para não ser caracterizada como autarquia, tanto que, ao contrário dos demais Conselhos, nunca teve supervisão ministerial[127].

Os demais Ministros presentes à Sessão[128], por sua vez, não expuseram quaisquer outras considerações, limitando-se a acompanhar o Relator, de modo que a divergência ficou restrita ao Ministro Maurício Corrêa.

O julgado, então, recebeu a seguinte Ementa:

DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 58 E SEUS PARÁGRAFOS DA LEI FEDERAL Nº 9.649, DE 27.05.1998, QUE TRATAM DOS SERVIÇOS DE FISCALIZAÇÃO DE PROFISSÕES REGULAMENTADAS. 1. Está prejudicada a Ação, no ponto em que impugna o parágrafo 3º do art. 58 da Lei nº 9.649, de 27.05.1988, em face do texto originário do art. 39 da C.F. de 1988. É que esse texto originário foi inteiramente modificado pelo novo art. 39 da Constituição, com a redação que lhe foi dada pela E.C. nº 19, de 04.06.1988. E, segundo a jurisprudência da Corte, o controle concentrado de constitucionalidade, mediante a Ação Direta, é feito em face do texto constitucional em vigor e não do que vigorava anteriormente. 2. Quanto ao restante alegado na inicial, nos aditamentos e nas informações, a Ação não está prejudicada e por isso o requerimento de medida cautelar é examinado. 3. No que concerne à alegada falta dos requisitos da relevância e da urgência da Medida Provisória (que deu origem à Lei em questão), exigidos no art. 62 da Constituição, o Supremo Tribunal Federal somente a tem por caracterizada quando neste objetivamente evidenciada. E não quando dependa de uma avaliação subjetiva, estritamente política, mediante critérios de oportunidade e conveniência, esta confiada aos Poderes Executivo e Legislativo, que têm melhores condições que o Judiciário para uma conclusão a respeito. 4. Quanto ao mais, porém, as considerações da inicial e do aditamento de fls. 123/125 levam ao reconhecimento da plausibilidade jurídica da Ação, satisfeito, assim, o primeiro requisito para a concessão da medida cautelar ("fumus boni iuris"). Com efeito, não parece possível, a um primeiro exame, em face do ordenamento constitucional, mediante a interpretação conjugada dos artigos 5º, XIII, 22, XVI, 21, XXIV, 70, parágrafo único, 149 e 175 da C.F., a delegação, a uma entidade privada, de atividade típica de Estado, que abrange até poder de polícia, de tributar e de punir, no que tange ao exercício de atividades profissionais. 5. Precedente: M.S. nº 22.643. 6. Também está presente o requisito do "periculum in mora", pois a ruptura do sistema atual e a implantação do novo, trazido pela Lei impugnada, pode acarretar graves transtornos à Administração Pública e ao próprio exercício das profissões regulamentadas, em face do ordenamento constitucional em vigor. 7. Ação prejudicada, quanto ao parágrafo 3º do art. 58 da Lei nº 9.649, de 27.05.1998. 8. Medida Cautelar deferida, por maioria de votos, para suspensão da eficácia do "caput" e demais parágrafos do mesmo artigo, até o julgamento final da Ação[129].

Concedida a medida cautelar[130], oportunizou-se ao Advogado-Geral da União e ao Procurador-Geral da República a apresentação das respectivas manifestações[131].

O então Advogado-Geral da União, Gilmar Ferreira Mendes, manifestou-se pela constitucionalidade dos dispositivos impugnados e, consequentemente, pela total improcedência da ADI.

Fê-lo por entender que o objetivo dos dispositivos foi justamente tornar mais transparente a natureza jurídica dos Conselhos de Fiscalização de Profissões, “já que autarquias propriamente ditas, no sentido corrente do vocábulo para o Direito Administrativo (…), em rigor não seriam[132]”.

Prosseguiu afirmando que tais entidades, por exercerem atividade de utilidade pública de interesse da coletividade (e não atividade estatal típica), aproximam-se dos entes paraestatais, por si compreendidos como pessoas jurídicas de direito privado criadas por autorização legal, com patrimônio público ou misto, para realização de atividades, obras ou serviços de interesse coletivo, sob normas e controle do Estado.

Por desempenharem atividades de interesse público, o AGU entendeu que os atos de seus dirigentes seriam revestidos de “certa autoridade” e, por conseguinte, sujeitar-se-iam a Mandados de Segurança e ações populares.

Escorado no magistério de Hely Lopes Meirelles, Gilmar Mendes prosseguiu definindo entes paraestatais como o meio-termo entre o público e o privado, justapostos ao Estado (sem integrá-lo) e atuando em atividades de utilidade pública impróprias do Poder Público, razão pela qual seriam por este fomentadas.

Ainda amparado nas lições de Meirelles, o Advogado-Geral da União salientou serem espécies de entes paraestatais as empresas públicas e sociedades de economia misa (ambas da Administração Indireta) e os serviços sociais autônomos e as entidades disciplinadoras das profissões liberais (entes de cooperação[133]).

Conclui, pois, caracterizando as entidades de fiscalização de profissões regulamentadas como entes de cooperação, espécie do gênero entidades paraestatais.

Ponderou que, ainda que se admitisse a natureza autárquica dos entes, o conjunto das ideias contidas na Medida Provisória e na lei desta resultante permaneceria válido, pois a Constituição não pode ser interpretada “a partir da legislação ordinária que nela encontra fundamento, ou de meros conceitos doutrinários infensos à evolução do Estado[134]”.

Assim, para o Advogado-Geral da União, como a Constituição não define como requisito de autarquia a personalidade jurídica de direito público[135], legítimo seira que lei lhe conferisse natureza jurídica privada:

Conquanto possa enfrentar resistências, num primeiro instante, o certo é que a tese mostra-se plenamente harmônica com a corrente doutrinária pródiga em acentuar o caráter sui generis das autarquias corporativas. Dentre as peculiaridades que distinguiriam o gênero, bem poderia destacar a lei a índole privada de sua personalidade[136].

Prosseguindo em sua manifestação, o AGU afastou a inconstitucionalidade dos parágrafos §§6º e 8º do artigo 58 (imunidade tributária e competência da Justiça Federal) por entender serem as normas simples reproduções de regras constitucionais, assim como refutou afronta ao artigo 149 da Carta Republicana, já que o próprio STF admitira, na Representação nº 1169/DF, que a cobrança de contribuições de interesse das categorias profissionais, em forma de anuidades, poderia ser feita diretamente pelo Estado ou por delegação aos Conselhos.

Ao reputar pertinentes as consideração divergentes levantadas quando do julgamento da Medica Cautelar, Gilmar Mendes definiu que o reconhecimento da constitucionalidade do artigo 58 não afastaria ou excluiria os Conselhos de Fiscalização do controle externo exercido pelo Congresso Nacional, pois a própria Lei Orgânica do Tribunal de Contas (nº 8.443, de 1992), no inciso V de seu artigo 5º[137] submete à jurisdição da Corte os responsáveis por entidades dotadas de personalidade jurídica de direito privado que recebam contribuições parafiscais e prestem serviços de interesse público ou social.

Após fixar que tais entidades deveriam obediência aos princípios norteadores da Administração Pública elencados no caput do artigo 37 da CRFB/1988, Gilmar Mendes concluiu:

Como visto, não é defeso ao legislador instituir, mediante lei, peculiar regime jurídico de entidades paraestatais, ainda quando abrangidas pelo termo autarquias, dotando-as até mesmo de privilégios administrativos e prerrogativas públicas inerentes ao Estado. Não há, enfim, ilegitimidade constitucional na legislação que assim eventualmente disponha[138].

Por sua vez, o então Procurador-Geral da República, Geraldo Brindeiro, disse que a transformação da personalidade jurídica dos Conselhos (de pública para privada) seria vedada pelo artigo 21, XXIV, da CRFB/1988, pois os serviços por si desenvolvidos se caracterizariam como atividades típicas do Estado e de competência da União.

A PGR seguiu asseverando que, por possuírem as contribuições natureza tributária, a capacidade de ser sujeito ativo da obrigação, por força do artigo 119 do Código Tributário Nacional (CTN)[139], não poderia ser delegada a ente dotado de personalidade jurídica de direito privado por lei ordinária (caso da Lei nº 9.649), mas somente por lei complementar.

Geraldo Brindeiro ainda sustentou a inconstitucionalidade do afastamento da fiscalização pela Corte de Contas, pois o STF havia decidido nos Mandados de Segurança nº 21.797/RJ e 22.643/SC que os Conselhos devem prestar contas ao TCU.

Definido que só a Constituição poderia versar sobre imunidade tributária e sobre competência da Justiça Federal, o que acarretaria a inconstitucionalidade dos §§ 6º e 8º impugnados, concluiu o Parquet pela parcial procedência da ADI, restando prejudicada apenas quanto ao §3º, artigo 58.

Requerida a inclusão do feito em pauta para julgamento[140], em Sessão realizada em 07/11/2002[141], Sydney Sanches, depois de apresentar relatório, limitou-se a expor:

No mais, porém, ou seja, quanto ao art.58 e seus parágrafos 1º, 2º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º, a medida cautelar de sua suspensão foi deferida e o mérito da ADI pode agora ser julgado.

...

E agora, ao ensejo deste julgamento de mérito, não me convenci do contrário, sobretudo em face do parecer da Procuradoria Geral da República,...:

Por todas essas razões, estando prejudicada a Ação, quanto ao §3º do art.58, da Lei nº 9.649, de 27.05.1998, como já decidiu o Plenário, quando apreciou o pedido de medida cautelar, julgo-a, no mais, PROCEDENTE, para declarar a inconstitucionalidade do caput e dos parágrafos 1º, 2º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º do mesmo art.58[142].

Os demais Ministros, por sua vez, acompanharam à unanimidade[143] o Relator, sem, contudo, apresentarem quaisquer registros em separado, destaques ou complementos.

Interessante que Maurício Corrêa, para afastar a divergência por si suscitada quando do julgamento da Medida Liminar e rever seu posicionamento inicial, cingiu-se a expor:

Sr. Presidente, no caso da cautelar, fui vencido, porque entendia, naquela ocasião, não haver conveniência de deferir-se o pedido, sobretudo porque me transpareceu alguma dúvida com relação ao §8º, que dava competência à Justiça Federal para apreciar as controvérsias que envolvam os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, quando no exercício de serviços a eles delegados. Superada a fase de delibação, acompanho o Relator[144].

Assim, frustradas as expectativas de que a mencionada divergência acarretaria longos e fundamentados debates, o julgamento final do STF quanto à natureza jurídica dos Conselhos e Ordens de fiscalização do exercício profissional recebeu a seguinte Ementa:

DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 58 E SEUS PARÁGRAFOS DA LEI FEDERAL Nº 9.649, DE 27.05.1998, QUE TRATAM DOS SERVIÇOS DE FISCALIZAÇÃO DE PROFISSÕES REGULAMENTADAS. 1. Estando prejudicada a Ação, quanto ao § 3º do art. 58 da Lei nº 9.649, de 27.05.1998, como já decidiu o Plenário, quando apreciou o pedido de medida cautelar, a Ação Direta é julgada procedente, quanto ao mais, declarando-se a inconstitucionalidade do "caput" e dos § 1º, 2º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º do mesmo art. 58. 2. Isso porque a interpretação conjugada dos artigos 5°, XIII, 22, XVI, 21, XXIV, 70, parágrafo único, 149 e 175 da Constituição Federal, leva à conclusão, no sentido da indelegabilidade, a uma entidade privada, de atividade típica de Estado, que abrange até poder de polícia, de tributar e de punir, no que concerne ao exercício de atividades profissionais regulamentadas, como ocorre com os dispositivos impugnados. 3. Decisão unânime[145].

Apresentados os fundamentos utilizados pelo STF para conferir a natureza autárquica aos Conselhos, para se dar continuidade à abordagem da matéria expor-se-ão as razões explicitadas pela Suprema Corte quanto à natureza jurídica da OAB.

2.2 Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.026/DF: natureza jurídica da Ordem dos Advogados do Brasil

Em 28/10/03 o Procurador-Geral da República, Cláudio Fonteles, ajuizou a ADI nº 3.026, com pedido de liminar, contra parte do §1º, artigo 79, do Estatuto da OAB (Lei nº 8.906, de 1994[146]), que dispunha: "sendo assegurado aos optantes o pagamento de indenização, quando da aposentadoria, correspondente a cinco vezes o valor da última remuneração".

Fê-lo por entender que o referido dispositivo estaria a violar o princípio da moralidade administrativa.

Ainda, requereu fosse dada ao caput do artigo 79[147] da mesma lei interpretação conforme o inciso II do artigo 37 da CRFB/1988.

Embora o cerne da referida discussão se relacionasse ao regime jurídico dos empregados da OAB, à indenização devida quando de sua aposentadoria e à (des)necessidade de submissão ao princípio do concurso público, a Suprema Corte deparou-se com nova oportunidade para discutir a natureza jurídica dos entes responsáveis pela fiscalização de profissões.

Isso por ter a PGR defendido que a OAB, por exercer serviço público de fiscalização da profissão de advogado (indispensável à administração da justiça – art.133 da CRFB/1988), seria pessoa jurídica de direito público, sujeita, pois, aos princípios da Administração.

Segundo a vestibular, quando do julgamento da ADI 1.707/MT o Ministro Moreira Alves destacara em seu voto expressamente a natureza autárquica da OAB:

Ora, a Ordem dos Advogados do Brasil, em face do disposto na Lei 8.906/94, é expressamente declarada com serviço público, dotada de personalidade jurídica e forma federativa, tendo por finalidade, dentre outras 'defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas, bem como a de promover com exclusividade, entre outras, a seleção e a disciplina dos advogados' (artigo 44). Portanto. por essa Lei, é, em última análise, a OAB uma federação de pessoas jurídicas de direito público (autarquias) que têm atribuições que estão intimamente ligadas à prestação jurisdicional por parte do Estado, certo como é, inclusive, que o advogado, segundo o preceituado na parte inicial do artigo 133 da Constituição, é 'indispensável à administração da justiça'[148].

Como reforço, Cláudio Fonteles defendeu que a Ordem, além de possuir personalidade jurídica própria, deteria autoadministração e atuaria no exercício de atividade pública e específica do Estado (art.44, I e II, §§1º e 2º, da Lei nº 8.906, de 1994[149]), desfrutando, para tanto, de prerrogativas inerentes à condição de pessoa jurídica de direito público (tais como a imunidade tributária e o repasse de verbas públicas).

Para deferimento da medida cautelar e suspensão do §1º, art.79, da Lei nº 8.906, de 1994, expôs a PGR:

Assim, resta demonstrada a inconstitucionalidade material da expressão “sendo assegurado aos optantes o pagamento de indenização, quando da aposentadoria, correspondente a cinco vezes o valor da última remuneração” do §1º do art.79 da Lei nº 8.906/94, consubstanciando o fumus boni iuris das alegações anteriormente expendidas. Relativamente ao periculum in mora, é evidente o prejuízo irreparável ou de dificílima reparação, uma vez que, com a produção de efeitos pela norma alvejada, ainda está a permitir que aqueles servidores que à época não optaram pelo regime trabalhista, permanecendo submetidos ao regime da Lei nº 8.112/90, que venham a se aposentar, percebam indenização no valor de cinco vezes sua última remuneração, de forma contrária à moralidade administrativa[150].

Quanto ao mérito, Cláudio Fonteles requereu a declaração da inconstitucionalidade da expressão “sendo assegurado aos optantes o pagamento de indenização, quando da aposentadoria, correspondente a cinco vezes o valor da última remuneração” do §1º, artigo 79, do Estatuto da OAB, bem como a conformação da interpretação do caput do artigo 79 ao princípio do concurso público exigido no inciso II, artigo 37, da CRFB/1988.

Submetida a ação ao rito do artigo 12 da Lei nº 9.868, de 1999[151], e prestadas as informações pelo Presidente da República e pelo Congresso Nacional, o então Advogado-Geral da União, Álvaro Augusto Ribeiro Costa, manifestou-se pela improcedência da ADI.

Para tanto, ponderou que as normas do artigo 37 da CRFB/1988, por incidirem somente sobre a Administração Direta e Indireta, não alcançariam a OAB, porquanto “entidade corporativa autônoma, pelo menos, e, neste ponto, extreme de dúvidas, no que diz respeito ao seu funcionamento interno e estrutura, que compreendem o regime de pessoal[152]”.

O AGU, depois de dizer que a Lei nº 8.906, de 1994, em nenhum momento definira a OAB como autarquia, com respaldo em lições de Paulo Luiz Neto Lôbo (Comentários ao Novo Estatuto da Advocacia e da OAB, Brasília: Brasília Jurídica, 1994), aduziu que o funcionamento interno das ordens profissionais (possuidoras de natureza jurídica de direito público e de privado – mista, portanto), dentre as quais a Ordem dos Advogados, escaparia ao Direito Administrativo.

Quando muito, Álvaro Augusto Ribeiro Costa admitiu que as normas contidas nos artigos 37 e 38 da Constituição poderiam reger o exercício do poder de polícia administrativa da profissão, nunca sua estrutura ou seu funcionamento interno, sujeitos às normas de direito privado.

Ponderou a AGU, ainda:

Interessante colacionar de parecer do então Consultor-Geral da República, Dr.Luiz Rafael Mayer, posteriormente Ministro do Supremo Tribunal Federal, entendimento, ainda atual, sustentado a partir do disposto no §1º do art.139 do antigo Estatuto da OAB (Lei nº 4.215, de 1963), no sentido de que, “pela própria lei institucional, se conferia (e ainda se confere) à OAB uma situação peculiar, excepcional, divergente da que se atribuíra às suas congêneres, compreendidas no estalão comum” (Parecer nº L-69, de 09.05.1075, cópia anexa).

Vale conferir, ainda, a doutrina de Orlando de Assis Corrêa, que também assinala a desvinculação da OAB a qualquer ministério ou órgão governamental, repudiando, ainda, a classificação da OAB como autarquia: “A OAB não está subordinada, nem mesmo ligada, de qualquer forma, a qualquer ministério ou órgão governamental. (…). Embora alguns a queiram como uma autarquia, pensamos que a OAB é uma entidade autônoma, devendo obediência tão-somente às leis do País, e, seja na representação de seus inscritos, seja na competência institucional, agir com plena liberdade, limitada esta pelas leis vigentes, que deve respeitar e tentar aprimorar, e pela decisão soberana de seus inscritos, nas Assembléias Gerais que devem decidir, afinal, seus rumos maiores” (Comentários ao Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, 2ª ed., AIDE: Rio de Janeiro, 2003, p.163, original sem destaques)[153].

Ainda, ao acrescentar que a existência de servidores sujeitos ao regime estatuário seria situação excepcional, uma vez que o referido regime deixara de ser aplicado à OAB desde o Decreto-lei nº 968, de 1969, o Advogado-Geral observou que o artigo 37 da CRFB/1988 se aplicaria aos cargos e empregos públicos, os quais deveriam ser criados por lei. Assim, como os empregos da OAB não são criados por lei, o artigo 37 da CRFB/1988 não lhe seria aplicável.

Por fim, ao ponderar que a expressão atacada na ADI não contrariaria o princípio da moralidade administrativa, a Advocacia-Geral da União manifestou-se pelo reconhecimento da constitucionalidade do §1º, art.79, da Lei nº 8.906, de 1994, e, também, pela impossibilidade de se conferir ao caput do art.79 da mesma norma a interpretação conforme pretendida.

O Procurador-Geral da República, Cláudio Fonteles, instado pelo artigo 12 da Lei nº 9.868, de 1999, a se manifestar, posicionou-se[154] pela procedência do pedido.

Fê-lo por entender que, à luz do Decreto-lei nº 200, de 1967, e do magistério de Hely Lopes Meirelles, inexistiriam dúvidas quanto à natureza pública e autárquica da OAB, pois, além de ter sido criada por lei (Decreto nº 19.408, de 1930) e ser detentora de personalidade jurídica própria, seu patrimônio, proveniente de contribuições de seus membros, seria público.

Ainda, Fonteles destacou que, segundo posicionamento adotado pelo STF quando do julgamento da ADI nº 1.707MC/MT, a OAB estaria investida do exercício de atividade típica do Estado vinculado à prestação jurisdicional.

Por fim, segundo o Parquet, a ausência de vínculo funcional ou hierárquico com a Administração Pública não seria fundamento para caracterizá-la como ente privado, porquanto a ausência dos referidos vínculos seria justamente a razão de sua classificação como autarquia.

Poder-se-ia argumentar que a OAB possui natureza de pessoa jurídica de direito privado, uma vez que esta não mantém com órgãos da Administração Pública qualquer vínculo funcional ou hierárquico, conforme a norma do §1º do art.44 da Lei nº 8.906/94, entretanto, tal raciocínio não se sustenta.

Na lição de CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, “sendo, como são, pessoas jurídicas, as autarquias gozam de liberdade administrativa nos limites da lei que as criou; não são subordinadas a órgão algum do Estado, mas apenas controladas”. Sendo assim, a ausência de vínculo funcional ou hierárquico da OAB ao qualquer órgão da Administração Pública, é justamente o fundamento para classificar-lhe como autarquia[155].

Assim, partindo da premissa de que a OAB possuiria natureza jurídica de autarquia, concluiu a PGR estar a Ordem sujeita aos princípios gerais da Administração Pública, devendo ser reconhecida a inconstitucionalidade do §1º, art.79, da Lei nº 8.906, de 1994, bem como declarado que os empregados da OAB somente devem ser contratados depois de aprovados em concurso público.

O julgamento da ADI, que teve relatoria do Ministro Eros Grau, iniciou-se em Sessão realizada em 23/02/2005 e se findou em 08/06/2006[156].

O Relator iniciou ressaltando que a criação de entidade por lei não seria causa suficiente para sua caracterização como autarquia, posto que a própria Constituição admite nos incisos XIX e XX do artigo 37[157] a criação, pela União e também por lei, de pessoas jurídicas de direito privado.

Para Eros Grau, a autonomia e independência da OAB seria percebida na medida em que seus serviços não teriam como destinatária a comunidade, de modo que, inexistente a coesão social, não poderia a Ordem ser considerada serviço público.

Após transcrever trechos de parecer de autoria de Dario de Almeida Magalhães[158], Eros Grau afirmou que a OAB não compõe a Administração Indireta da União, tanto que os diplomas que a estruturam (Decreto nº 19.408, 1930; Lei 4215, de 1963; Lei nº 8.906, de 1994) não a enquadraram como autarquia.

Nesse cenário, a despeito da irrelevância quanto à qualificação das entidades como autarquias, fundações e sociedades de economia mista, a OAB não seria entidade da Administração e não estaria adstrita ao princípio do concurso público (próprios dos entes integrantes da Administração), peculiaridade essa que, a juízo do Relator, deveria permanecer inalterada, inclusive, para afirmação do princípio republicano.

Por fim, para o Relator, enquanto as autarquias (nada obstante responsáveis por seus próprios comportamentos e não subordinadas ao Estado) estariam sujeitas à tutela administrativa (elemento fundamental para sua caracterização e que autoriza a Administração Direta a interferir em sua atividade de modo a garantir o cumprimento dos objetivos institucionais), o controle e a interferência não seria formal ou materialmente necessária em relação à OAB, pois sua finalidade (vinculada à essencialidade do advogado para a administração da Justiça – artigo 133 da CRFB/1988) não poderia vincular-se ou se subordinar a qualquer órgão público:

Ora, a OAB não é, evidenciadamente, uma entidade da Administração Indireta. Não está sujeita a controle da Administração, nem a qualquer das suas partes está vinculada.

Essa não-vinculação é formal e materialmente necessária. A OAB ocupa-se de atividades atinentes aos advogados, que exercem função constitucionalmente privilegiada na medida em que são indispensáveis à administração da Justiça, nos termos do que dispõe o artigo 133 da Constituição do Brasil. Entidade cuja finalidade é afeita a atribuições, interesses e seleção de advogados não poderia vincular-se ou subordinar-se a qualquer órgão público.

A Ordem dos Advogados do Brasil é, em verdade, entidade autônoma, porquanto autonomia e independência são características próprias dela, que, destarte, não pode ser tida como congênere dos demais órgãos de fiscalização profissional. Ao contrário deles, a Ordem dos Advogados do Brasil não está voltada exclusivamente a finalidades corporativas, mas, nos termos do art.44, I da lei, tem por finalidade “defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas. Esta é, iniludivelmente, finalidade institucional e não corporativa.

A Constituição do Brasil confere atribuições de extrema relevância à OAB, bastando para ratificar a assertiva ressaltar o disposto no inciso VIII do artigo 103 da Constituição, que confere legitimidade ao Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade, bem assim a definição de advogado como essencial á promoção da Justiça, ao qual é assegurada inviolabilidade no que tange aos seus atos e manifestações no exercício da profissão[159].

Carlos Velloso, embora não tenha proferido Voto em razão de não mais integrar a Suprema Corte quando da continuidade do julgamento, durante os debates fez questão de expôr que os julgadores, para decidirem as controvérsias, no mister de tipificar devem valer-se das categorias jurídicas existentes, razão pela qual a classificação das entidades e institutos, ainda que possuidores de peculiaridades e especificidades (como é o caso dos Conselhos e Ordens), deveria observar o tratamento consagrado.

Joaquim Barbosa, por sua vez, começou atestando que o Direito Comparado não possui situação semelhante à desfrutada pela OAB no ordenamento jurídico pátrio, pois, aqui, além de participar da formação do Estado, reúne a única categoria que tem o direito constitucional de ingressar em suas fileiras.

Segundo Barbosa, existiria em relação à Ordem uma espécie de regime público, pois, além da sujeição ou subordinação à Administração Direta, as autarquias também seriam caracterizadas pelo exercício de missões públicas típicas:

O que caracteriza a natureza de uma autarquia – há diversas modalidades de autarquias – não é simplesmente, como disse o ministro Eros Grau, sua sujeição ou subordinação a um órgão ou entidade da Administração; é o fato de que ela assume ou exerce atividades, missões típicas de serviço público. E todos esses elementos contidos na nossa Constituição e nas leis referentes à OAB indicam, sim, que esta é regida por um regime de direito público, e não de direito privado[160].

O fato de a OAB congregar profissionais considerados essenciais à Justiça, continuou Barbosa em seu voto-divergente, enfatizaria sua natureza pública e sua sujeição a um regime de direito público.

Joaquim Barbosa, por fim, arrebatou com a certeza de que a OAB não se distinguiria, em essência, dos demais Conselhos, não podendo ser o tratamento constitucional lhe dispensado utilizado como argumento para privilégio[161].

Carlos Ayres Britto, por sua vez, iniciou alertando que somente a OAB e a advocacia mereceram tratamento constitucional, razão pela qual gozaria de singularidades enquanto pessoa jurídica e não se submeteria a tutela e controle do Estado.

O referido tratamento constitucional, continuou Britto, a faria ir além da tarefa corporativa para atingir a função institucional de defesa da ordem jurídica e da Constituição, sendo essa a essência para sua comparação aos demais Conselhos.

Depois de registrar que, segundo Aristóteles, os homens padecem do vício de tentar adaptar realidades diferenciadas em escaninhos conceituais preexistentes, Carlos Ayres Britto reforçou que a OAB seria mais uma situação heterodoxa do Direito, sendo exemplos de suas especificidades: seus cargos e empregos não são criados, modificados ou extintos por lei; os vencimentos não são fixados por lei; não se integra nos órgãos e entes da Administração Pública e, portanto, não se submete à direção do Chefe do Executivo ou à coordenação, supervisão e orientação de Ministros de Estado; e seu patrimônio não pertence ao Estado.

Assim, Britto definiu a Ordem como instituição da sociedade civil de natureza bifronte regida por normas de direito público e privado e que, assim como a imprensa, para exercer seu munus público, deveria permanecer absolutamente desatrelada do Poder Público, competindo-lhe fiscalizar o Estado, não ser por ele fiscalizado:

…, o pensamento jurídico ortodoxo sobre a OAB encontra sérias dificuldades pela heterodoxia da natureza da OAB, que eminentemente é uma instituição da sociedade civil, não é uma instituição da sociedade estatal, daí por que aparelhada pela própria Constituição, “n” vezes a fim de exercer um munus que a coloca ao lado da Imprensa como as duas grandes instituições da sociedade civil. E por natureza infensas, ambas, imprensa e OAB, a controles estatais[162].

Para diferenciá-la dos demais Conselhos, Ayres Britto reiterou o fato de a OAB congregar profissionais – advogados - que desempenham função constitucionalmente considerada essencial à jurisdição e à justiça.

O Ministro Nelson Jobim, pois, ao expressar que o Ministério Público, em verdade, pretendia com a propositura da ADI medir forças e disputar espaço institucional com a OAB, alertou que a Corte não poderia se esquecer do processo histórico-político que desenhara a OAB para colocá-la sobre as categorias de direito administrativo consagradas, sob pena de se “pegar um processo histórico político clássico, claramente sui generis em face da realidade política e institucional do País, (...), para outro objetivo que não fazer com que se traia esse processo político”.

Jobim propôs, então, que as categorias jurídicas existentes, ao contrário do que preconizou Carlos Velloso, deveriam ser vistas a partir da história, porquanto o dinamismo social exigiria uma reinterpretação dos modelos jurídicos.

Cezar Peluso, a seu turno, definiu que as dificuldades no julgamento da ADI repousavam na tentativa de se analisar a OAB a partir das compreensões e conceitos predefinidos e preexistentes, por si definidos como “escaninhos preestabelecidos”.

Ao salientar que a OAB seria regida por normas de direito público e de direito privado, Peluso indagou: “o regime de pessoal da Ordem está sujeito a regras de direito público? Os cargos são criados por lei? Há necessidade de lei para regular qualquer circunstância do regime jurídico de pessoal?”[163].

A suas próprias perguntas respondeu que ao pessoal da OAB não se aplicariam as normas de direito público.

Para tanto, Peluso definiu que, sendo escopo da regra do concurso público (sedimentado no princípio da impessoalidade, não da eficiência) impedir que o poder político caia na tentação de submeter a máquina e o serviço públicos a suas ambições e projetos pessoais, a OAB “não tem nenhuma afinidade ou familiaridade com essa problemática do poder político como tal, porque ela não é objeto do poder político no sentido rigoroso da palavra”[164].

Prosseguiu fixando que, embora a função da Ordem tenha nítido caráter público, este “não tem alcance de tentar equipará-la à natureza orgânica da Administração Pública para efeito de atrair para sua administração interna as mesmas regras da Administração Pública em geral”[165], de modo que não se exige dela o concurso público.

Prosseguindo o julgamento, o Ministro Gilmar Ferreira Mendes houve por bem pedir vista dos autos.

Em seu destacado voto-vista, apresentado na Sessão de 08/06/2006, Gilmar Mendes definiu preliminarmente estar a questão sob análise intimamente relacionada à conformação constitucional e legal conferida à OAB e a sua atuação no sistema constitucional de 1988.

Ponderou, porém, que a análise da matéria (regime dos servidores da OAB) deveria ser feita independentemente dos 'rótulos jurídicos', formas e conceitos predefinidos, já que “o nomen iuris aplicável é insuficiente para que, por si só, se tenha a dimensão das garantias constitucionais envolvidas, assim como da função institucional desempenhada pela entidade”[166].

Embora na inicial da ADI o Procurador-Geral da República tenha exposto que o STF, quando do julgamento da ADI nº 1.707/MT[167], houvera atribuído à OAB a natureza autárquica, tal definição, segundo Gilmar Mendes, decorreu não das peculiaridades da Ordem, mas da relevância do serviço público por si prestado.

Assim é que, segundo Mendes, “da leitura de toda a argumentação expendida pelo Ministro Moreira Alves, portanto, constata-se a dificuldade de sustentar, de modo absoluto, a efetiva configuração do caráter autárquico da OAB”[168].

Ratificou a referida dificuldade com os seguintes argumentos: a) a manifestação do STF se deu em caráter liminar; b) “embora a ementa do julgado indevidamente faça pressupor a caracterização da OAB como autarquia, em nenhum momento pode-se dizer que esse fundamento tenha sido decisivo para o indeferimento da liminar[169]”; c) impossibilidade de se invocar vinculação à decisão proferida na ADI nº 1.707/MT, porquanto desprovida de “definitividade e profundidade do pronunciamento realizado naquela assentada”[170].

Assim, fixada a premissa de que a natureza jurídica da OAB não fora objeto das devidas considerações por parte do STF, Gilmar Mendes sustentou que a Ordem, por se tratar de organização pública que executa papel institucional de cunho estatal e público (cadastramento de habilitados, fixação de critérios avaliativos para ingresso na profissão, fiscalização da qualidade dos serviços prestados e aplicação de sanções disciplinares), constituiria serviço público stricto sensu, ainda que não hierárquica ou funcionalmente sujeita à Administração Pública:

A OAB, ainda que não esteja diretamente submetida a vínculo funcional ou hierárquico quanto aos órgãos da Administração Pública (Lei nº 8.906/1994, art.55, §1º), é responsável por atividades de inegável relevância pública, tais como, a título meramente exemplificativo:

a) “defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas;” (Lei nº 8.906/1994, art.44, I);

b) “promover, com exclusividade, a representação, a defesa, a seleção e a disciplina dos advogados em toda a República Federativa do Brasil.” (Lei nº 8.906/1994, art.44, II);

c) a competência da OA para “fixar e cobrar de seus inscritos, contribuições, preços de serviços e multas”, cujos créditos, uma vez reconhecidos por “certidão passada pela diretoria do Conselho competente”, “constitui título executivo extrajudicial” (Lei nº 8.906/1994, art.46, caput e parágrafo único);

d) a titularidade para o recolhimento de pagamento da contribuição anual à OAB, o qual “isenta os inscritos nos seus quadros do pagamento obrigatório da contribuição sindical” (Lei nº 8.906/1994, art.47 – dispositivo sub judice, impugnado na ADI nº 2.522/DF, Rel.Eros Grau);

e) “por constituir serviço público, [a OAB] goza de imunidade tributária total em relação a seus bens, rendas e serviços” (Lei nº 8.906/1994, art.45, §5º);

f) “Os atos conclusivos dos órgãos da OAB, salvo quando reservados ou de administração interna, devem ser publicados na imprensa oficial ou afixados no fórum, na íntegra ou em resumo” (Lei nº 8.906/1994, art.45, §6º);

g) o Conselho Federal da OAB possui competência para “representar, com exclusividade, os advogados brasileiros nos órgãos e eventos internacionais da advocacia;” (Lei nº 8.906/1994, art.54, IV); e

h) a vinculação dos advogados públicos à OAB e a conseqüente possibilidade de aplicação de sanções[171].

Para Mendes, portanto, a função institucional da OAB abrangeria o dever de definição das condições para o legítimo exercício do poder de polícia lhe atribuído pela Constituição, de modo que, à luz do inciso XIII, artigo 5º, da CRFB/1988, as atribuições lhe conferidas pela Lei nº 8.906, de 1994, assumiriam contornos fortemente estatais, inclusive em relação aos vários campos de atuação jurídica do Estado.

Em sequência, a relevante e destacada atuação histórica da OAB não poderia resultar na instituição de um regime de privilégios, devendo a Ordem atuar segundo o contexto republicano definido no artigo 1º da CRFB/1988.

Desse modo, prosseguiu o Ministro, consequência do exercício de atividade pública seria o respeito, pelos agentes investidos nas respectivas funções públicas, aos postulados ético-jurídicos vinculados à adequada fiscalização e responsabilidade, e a legitimação para atuação da OAB pressuporia “uma burocracia estável escolhida por métodos objetivos”[172].

A aplicação do princípio republicano a esse caso envolve a premissa de que todo e qualquer agente, ao atuar para a realização de interesse eminentemente público-estatal, não se pode furtar obediência à Constituição, nem pretender eximir seus atos e omissões da pertinente fiscalização exercida pelas instâncias críticas da sociedade[173].

Gilmar Mendes, ainda, apontou que, na prática, direitos constitucionalmente previstos são, em grande medida, reconhecidos justamente em razão da atuação em juízo de advogados (capacidade postulatória), o que realçaria a necessidade de se preverem instrumentos e procedimentos de controle e fiscalização da advocacia e, por consequência, exigiria maior segurança, transparência e legitimidade da OAB quanto aos serviços públicos por si desempenhados.

Afirmou Gilmar Mendes, pois, que a OAB corresponderia a instituição civil que, legal e constitucionalmente, “exerce atividade pública de extrema relevância: a habilitação, o controle, a fiscalização e a aplicação de penalidades na área profissional da advocacia”, mas que, “exatamente por seu caráter de autonomia com relação à estrutura hierárquica do Estado (Lei nº 8.906/1994, art.44, §1º), não pode ser enquadrado especificamente na disciplina típica do art.175 da CF”[174].

Para sedimentar sua posição, registrou Gilmar Mendes que a experiência estadunidense dos state actions nos the public function cases[175] levou a Suprema Corte norteamericana a reconhecer o exercício de função pública por entes privados.

Tal experiência, prosseguiu, admitiria que atores aparentemente privados (seemingly private actors) exercessem funções típicas dos poderes públicos (powers or functions governmental in nature), sendo, por conseguinte, equiparados ao aparato estatal, inclusive para fins de responsabilização à luz da ordem constitucional[176].

A razão de ser da OAB, pois, deveria ser analisada a partir da concretização e da viabilização de direitos individuais, coletivos e difusos constitucionalmente reconhecidos (artigo 5º, XIII e XXXVI), sendo a abertura ao controle social medida republicana para legitimação de sua atuação:

O poder de polícia delegado à OAB, assim como no caso das empresas estatais prestadoras de serviços públicos em geral, corresponde a serviço público de sede constitucional e legal, e que poderia até mesmo, caso assim entendesse o constituinte originário, ter sido diretamente atribuído a algum dos poderes constituídos.

Logo, para o caso em apreço, a imposição da aplicação do princípio do concurso público não decorre necessariamente da natureza jurídica da entidade em questão. É preciso levar em conta, ademais, a premissa normativa de que o serviço público delegado à OAB apresenta dimensão de relevância não apenas pública, mas também estatal (ou paraestatal)[177].

E prosseguiu:

... - acredito que já estamos cansados dessas formas jurídicas de autarquias - na qual acho bom que se divise, sim, um tertium genus ou um modelo que não tenha de reproduzir essas características já conhecidas de Administração direta ou indireta. É bom que a Ordem seja considerada uma entidade civil, com esse forte perfil institucional. Isso faz bem ao próprio processo de independência que ela deva ter[178].

Finalizou Gilmar Mendes, então, com a seguinte consideração:

Não acho que devamos nos aferrar, inclusive, às formas jurídicas existentes, no caso, senão seria muito fácil perfilhar a tese do caráter autárquico e, a partir daí, assumir todas as consequências desse modelo. (…). Agora, é inegável, a Ordem, como os demais conselhos que fiscalizam profissões, exerce poder estatal inequívoco, inclusive temos jurisprudência sobre o assunto, a partir do célebre caso julgado pelo Ministro Rodrigues Alckmin, sobre a liberdade de exercício profissional. Na verdade, esses órgãos cumprem uma função eminente de regulação de profissão, e é nesse contexto que se coloca, portanto, a necessidade, a meu ver, diante desse caráter e, também, do modelo de financiamento, público, sabemos bem, das entidades ter-se esse padrão republicano, tão-somente isso[179].

Ricardo Lewandowski, a seu turno, consignou que as corporações de advogados, desde a Roma Antiga, nunca tiveram qualquer vínculo com o Estado, o que se repetiu no Brasil em toda a história da OAB.

Embora de natureza controvertida, entendeu ser a Ordem uma federação de corporações que presta munus público definido na Constituição, o que não se confunde com serviço público stricto sensu:

Concordo, data venia, com o eminente Ministro Eros Grau quando diz que a OAB não presta, a rigor, serviço público stricto sensu. Na medida em que é uma corporação e seus membros desempenham múnus público, ela desempenha o múnus público, taxativamente determinado, aqui e acolá, na Constituição.

Trago aqui definição da sempre magistral Professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro, (…), na qual diz o seguinte: “Serviço público é toda atividade que a administração pública executa direta ou indiretamente para satisfazer a necessidade coletiva, sob regime predominantemente público”.

A partir dessa definição, com todo o respeito, não posso enxergar na atividade da OAB um serviço público, pelo menos tal como definem os doutrinadores – à frente de todos, aqui, a nossa Professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro[180].

Ao ponderar não serem os cargos da OAB criados por lei, Lewandowski prosseguiu dizendo que o exercício de poder de polícia e a administração de certames públicos para o ingresso de seus membros nos respectivos quadros não seriam suficientes para alterar o raciocínio de que de serviço público stricto sensu não se trata, já que as universidades privadas também exercem atividade fiscalizatória e, nem por isso, cogita-se que seus quadros devam ser providos mediante concurso público.

Lewandowski encerrou, então, afirmando ser incompatível com a natureza histórica da OAB entendê-la vinculada, controlada e tutelada pela Administração Indireta.

Durante os debates Marco Aurélio fez questão de ressaltar que com a ADI nº 3.026/DF o STF estaria a julgar, indiretamente, todo o Sistema de Fiscalização do Exercício Profissional, pois a OAB e os demais Conselhos e Ordem foram todos criados por lei, são detentores do poder de polícia e podem impor contribuições obrigatórias.

Assim, segundo Marco Aurélio, caso se entendesse pela natureza privada da OAB, igual raciocínio deveria ser estendido às demais entidades.

Questionou, todavia, a referida natureza privada, pois foi precisamente a criação por lei (com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios) que lhe conferira o poder de executar atividades típicas da Administração, de modo que sua atuação, além do simples cadastramento de advogados, abrangeria a fiscalização da profissão e, principalmente, o uso do Poder de Polícia, suficiente inclusive a inviabilizar a fruição do direito fundamental de exercício profissional (artigo 5º, XIII).

Nada obstante a Constituição tenha dado especial atenção à Ordem, segundo Marco Aurélio, isso não significa estar ela acima do próprio Estado, sob pena de ser considerada “órgão todo-poderoso”.

Ainda, depois de dizer que o maior destaque da OAB em relação aos demais Conselhos de Fiscalização decorreria do simples fato de a capacidade postulatória (instrumento de acesso ao Judiciário e exercício de cidadania) depender do registro dos advogados em seus quadros, Marco Aurélio concluiu não ser possível equipará-la aos partidos políticos, já que, enquanto a adesão a partido político não é obrigatória, para o exercício da advocacia exige-se a prévia inscrição dos advogados nos quadros da OAB.

Sepúlveda Pertence, por sua vez, observou que, como na ADI nº 1.717/DF decidiu-se pela natureza pública de todos os Conselhos de Fiscalização, as autarquias (por força do Decreto-lei nº 200, de 1967) estariam sujeitas à tutela da Administração e, por consequência, ao princípio do concurso público (sendo irrelevante para tanto o regime – estatutário ou trabalhista – de seus servidores).

Entretanto, após asseverar que no referido julgamento não se analisara especificamente a natureza jurídica da OAB, Pertence ponderou que a Ordem, assim como os partidos políticos, teria 'personalidade bifronte' (entidade que, por exercer munus público, possui natureza pública - aspecto funcional -, mas no plano de composição de seus quadros, formação de sua diretoria, recrutamento de seus servidores, é privada), razão pela qual o concurso, embora desejável, não seria uma imposição constitucional:

Senhora Presidente, de minha parte faço votos pra que, por deliberação própria da entidade ou da sua lei orgânica, a Ordem venha, sim, a submeter-se à regra do concurso público. No campo interno da Ordem, é indiscutível que a ausência do concurso público pode, sim, comprometer o caráter de impessoalidade, enfatizado no antológico voto do Ministro Cezar Peluso, a que Sua Excelência se remeteu.

Agora, não consegui me convencer, sem embargo do brilho dos votos dissidentes dos Ministros Joaquim Barbosa e Gilmar Mendes, de que essa necessidade decorra da Constituição Federal[181].

Por fim, a Ministra Ellen Gracie, Presidente do STF, limitou-se a expor:

Senhores Ministros, também eu, com vênia dos Ministros Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa, julgo improcedente a ação, fazendo por adotar, também, os bons votos e bons augúrios agora manifestados pelo Ministro Sepúlveda Pertence de que a Ordem, voluntariamente, venha a se curvar à regra democrática do concurso público[182].

O Plenário do STF[183], então, vencidos parcialmente os Ministros Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa, entenderam que a OAB fundado nas referidas razões, não está sujeita à regra do concurso público, recebendo o Acórdão a seguinte Ementa:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. § 1º DO ARTIGO 79 DA LEI N. 8.906, 2ª PARTE. "SERVIDORES" DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. PRECEITO QUE POSSIBILITA A OPÇÃO PELO REGIME CELESTISTA. COMPENSAÇÃO PELA ESCOLHA DO REGIME JURÍDICO NO MOMENTO DA APOSENTADORIA. INDENIZAÇÃO. IMPOSIÇÃO DOS DITAMES INERENTES À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DIRETA E INDIRETA. CONCURSO PÚBLICO (ART. 37, II DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL). INEXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO PARA A ADMISSÃO DOS CONTRATADOS PELA OAB. AUTARQUIAS ESPECIAIS E AGÊNCIAS. CARÁTER JURÍDICO DA OAB. ENTIDADE PRESTADORA DE SERVIÇO PÚBLICO INDEPENDENTE. CATEGORIA ÍMPAR NO ELENCO DAS PERSONALIDADES JURÍDICAS EXISTENTES NO DIREITO BRASILEIRO. AUTONOMIA E INDEPENDÊNCIA DA ENTIDADE. PRINCÍPIO DA MORALIDADE. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 37, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. NÃO OCORRÊNCIA. 1. A Lei n. 8.906, artigo 79, § 1º, possibilitou aos "servidores" da OAB, cujo regime outrora era estatutário, a opção pelo regime celetista. Compensação pela escolha: indenização a ser paga à época da aposentadoria. 2. Não procede a alegação de que a OAB sujeita-se aos ditames impostos à Administração Pública Direta e Indireta. 3. A OAB não é uma entidade da Administração Indireta da União. A Ordem é um serviço público independente, categoria ímpar no elenco das personalidades jurídicas existentes no direito brasileiro. 4. A OAB não está incluída na categoria na qual se inserem essas que se tem referido como "autarquias especiais" para pretender-se afirmar equivocada independência das hoje chamadas "agências". 5. Por não consubstanciar uma entidade da Administração Indireta, a OAB não está sujeita a controle da Administração, nem a qualquer das suas partes está vinculada. Essa não-vinculação é formal e materialmente necessária. 6. A OAB ocupa-se de atividades atinentes aos advogados, que exercem função constitucionalmente pr ivilegiada, na medida em que são indispensáveis à administração da Justiça [artigo 133 da CB/88]. É entidade cuja finalidade é afeita a atribuições, interesses e seleção de advogados. Não há ordem de relação ou dependência entre a OAB e qualquer órgão público. 7. A Ordem dos Advogados do Brasil, cujas características são autonomia e independência, não pode ser tida como congênere dos demais órgãos de fiscalização profissional. A OAB não está voltada exclusivamente a finalidades corporativas. Possui finalidade institucional. 8. Embora decorra de determinação legal, o regime estatutário imposto aos empregados da OAB não é compatível com a entidade, que é autônoma e independente. 9. Improcede o pedido do requerente no sentido de que se dê interpretação conforme o artigo 37, inciso II, da Constituição do Brasil ao caput do artigo 79 da Lei n. 8.906, que determina a aplicação do regime trabalhista aos servidores da OAB. 10. Incabível a exigência de concurso público para admissão dos contratados sob o regime trabalhista pela OAB. 11. Princípio da moralidade. Ética da legalidade e moralidade. Confinamento do princípio da moralidade ao âmbito da ética da legalidade, que não pode ser ultrapassada, sob pena de dissolução do próprio sistema. Desvio de poder ou de finalidade. 12. Julgo improcedente o pedido[184].

Apresentados em linhas gerais os argumentos prevalecentes no julgamento de ambas as Ações Diretas de Inconstitucionalidade, passemos à análise das referidas teses.


3 análise da jurisprudência do STF: os casos das ADI's 1.717/DF e 3.026/DF

O Supremo Tribunal Federal, para atribuir na ADI nº 1.717/DF a natureza autárquica aos Conselhos, valeu-se essencialmente da premissa de que a fiscalização do exercício profissional, por abranger inclusive poder de polícia, é atividade tipicamente estatal, indelegável à iniciativa privada.

Ao fazê-lo, reconheceu o STF estarem os Conselhos sujeitos a um regime jurídico peculiar, no qual prevalece a supremacia do interesse público sobre o privado[185].

Por outro lado, no julgamento da ADI nº 3.026/DF os fundamentos utilizados para definição da natureza autônoma da OAB e de sua distinção em relação às demais entidades de fiscalização fixaram-se, basicamente, no papel de destaque assumido pela Ordem e pelos advogados na Constituição de 1988 (que imporiam sua atuação livre e independente), nas atribuições elencadas em seu Estatuto e, por fim, nas peculiaridades por si desfrutadas, especificamente a forma de composição de sua estrutura orgânica e a inexistência de vínculo com a Administração (elementos esses que, porém, se fazem presentes nos demais Conselhos).

A função de disciplina do exercício profissional, que, vale registrar, foi a razão da criação da OAB em 1930[186], não foi detidamente analisada.

Assim, nas próximas linhas serão apresentadas algumas incoerências e divergências nas razões que culminaram com o estabelecimento de diferenças entre os Conselhos e a OAB.

Por fim, serão listadas algumas realidades vivenciadas pelos Conselhos, as quais prejudicam o desempenho de suas atribuições e ampliam, ilegitimamente, o campo de restrições ao exercício profissional admitido no inciso XIII, artigo 5º, da CRFB/1988.

Antes, porém, relevantes se mostram algumas considerações complementares acerca do Poder de Polícia exercido pelos Conselhos e Ordens.

3.1. Fiscalização do exercício profissional como poder de polícia

Mendes et al. (2008, p. 302) afirmam que restrições a direitos fundamentais só são permitidas por “expressa disposição constitucional (restrição imediata) ou mediante lei ordinária promulgada com fundamento imediato na própria Constituição (restrição mediata)”.

Embora possível se mostre a limitação do direito consagrado no inciso XIII, artigo 5º, da CRFB/1988, certo é que, para se afigurar legítima, a restrição deve se ater ao campo das qualificações profissionais.

Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins (1989, p. 77), ao comentarem a Constituição de 1988, asseveram:

Para que uma determinada atividade exija qualificações profissionais para o seu desempenho, duas condições são necessárias: uma, consistente no fato de a atividade em pauta implicar conhecimentos técnicos e científicos avançados. (…).

Outro requisito a ser atendido para regulamentação e que a profissão a ser regulamentada possa trazer um sério dano social.

É óbvio que determinadas atividades ligadas à medicina, à engenharia, nas suas diversas modalidades, ao direito, poderão ser geradoras de grandes malefícios, quer quanto aos danos materiais, quer quanto à liberdade e quer quanto à saúde do ente humano. Nestes casos, a exigência de cumprimentos de cursos específicos se impõe como uma garantia oferecida à sociedade.

Em outros casos, a própria pessoa interessada pode perfeitamente acautelar-se contra o profissional desqualificado, obtendo informações sobre o mesmo. É certo que a evolução tecnológica recente torna cada vez mais complexas certas profissões. Alguma sorte de curso faz-se quase sempre necessária. Nestes casos, no entanto, em que inexistem grandes riscos para a sociedade, é preferível manter-se atividade livre em nome precisamente do direito à livre opção profissional. O excesso de regulamentação nega este direito.

(…).

A atual redação deste artigo deixa claro que o papel da lei na criação de requisitos para o exercício da profissão há de ater-se exclusivamente às qualificações profissionais. Trata-se portanto de um problema de capacitação, técnica, científica ou moral. Não há dúvida que dentre as qualificações profissionais hão de compreender-se requisitos pertinentes à idoneidade moral do profissional.

(…)

O que é preciso ter em mente é que este é um dispositivo que, como dito inicialmente, visa assegurar a sociedade quanto à capacitação daqueles que exercem profissões técnico-científicas. Mas ele é de outra parte inspirado no princípio eminentemente liberal de que a cada um cabe a escolha da sua profissão.

É, portanto, a supremacia do interesse público sobre o privado que autoriza o Estado a restringir o campo de proteção da liberdade de profissão.

Pois bem, as leis que criaram os Conselhos e Ordens de fiscalização e que regulamentaram as respectivas profissões estabelecem normas genéricas e abstratas para o exercício profissional, sendo o registro profissional a corporificação da vontade do Estado. Ainda, os Conselhos e Ordens se estruturam de modo a possibilitar a fiscalização profissional e, finalmente, impõem sanções àqueles que não cumprirem o comando legal.

Outorgaram-se a tais entes poderes para, unilateralmente, exigir obrigações, cobrar providências e impor sanções aos particulares com o fim único de ver a sociedade protegida contra a atuação de pessoas não habilitadas ou capacitadas para o exercício profissional[187], ou seja, poder de polícia, que, segundo Cretella Júnior (1990, p. 25), se delegado a particulares acarretaria a falência virtual do Estado[188].

Ricardo Teixeira do Valle Pereira, apud Bozzi (2006, p.36), quanto aos Conselhos e Ordens, expõe:

Não há dúvida de que os conselhos de fiscalização profissional exercem atividade de polícia administrativa por outorga do Estado. Por outro lado, e isso é extremamente importante também, em razão de sua natureza, por representarem a mais clara expressão do poder estatal, as atividades de polícia não podem ser delegadas a particulares, mesmo porque, como reconhece a doutrina, gozam elas de coercibilidade e auto-executoriedade, atributos que são desconhecidos, como regra, nas relações de direito privado.

Liliam Bozzi (2006, p.37), no mesmo sentido, afirma:

Revestem-se, segundo as suas leis de criação, os Conselhos, de personalidade jurídica de direito público com autonomia administrativa e patrimonial, motivo pelo qual são típicas autarquias, que recebem do Estado a incumbência de fiscalizar o exercício das profissões liberais regulamentadas, porque compete à União, nos termos do art.21, inciso XXIV, da Constituição Federal, 'organizar, manter e executar a inspeção do trabalho', executando, pois, atividades típicas e de responsabilidade do Estado, possuindo, para o exercício desse mister, o poder de polícia, a delegação, para exigir dos contribuintes submetidos à sua fiscalização o pagamento das taxas e contribuições, para aplicar sanções, entre outras atividades tipicamente estatais.

Os Conselhos atuam no campo da responsabilização administrativa relativa aos comportamentos éticos e técnicos dos profissionais, esfera que, ao lados da civil e da criminal, é assim abordada por Nalini (2002, p. 141):

Todas elas são autônomas, embora possam interpenetrar-se. Assim, o mesmo fato (...) pode configurar infração administrativa, não apenas para a hipótese de a prática vir a ocorrer no âmbito do serviço público, mas também quando vier a ser acionado o organismo profissional sancionador de infrações ético-disciplinares.

Na verdade, a esfera ético-disciplinar é subjacente às demais. (...). Aliás, a preocupação ética tem permeado todas as atividades profissionais e sempre impregnada de contornos jurídicos. A cada dia, o direito é mais invocado para responder às angústias morais.

Dito de outro modo, embora seja competência das entidades de fiscalização a verificação prévia do preenchimento das condições exigidas em lei para o exercício profissional, sua atuação ganha relevo quando são instadas a se manifestar sobre o comportamento dos profissionais, e respectivas consequências, no plano prático.

A atuação dos Conselhos e Ordens, pois, culmina com a delimitação, vedação e repreensão de condutas dos particulares, ou seja, efetivo exercício do poder de policia, guardando estreita relação entre a atividade de tais entidades e a concretização do princípio da supremacia do interesse público.

3.2. Críticas ao tratamento diferenciado à OAB

Como afirmado anteriormente, na CRFB/1988 (consideradas as alterações nela implementadas até a Emenda Constitucional nº 62, de 2009) a OAB e os advogados receberam tratamento específico, sendo citados inúmeras vezes[189].

Tal situação, porém, não é prerrogativa da atual Carta, porquanto, desde 1934 (inclusive no período de exceção militar), a importância do advogado é reconhecida no ordenamento jurídico ao se ter previsto e exigido sua participação ativa na formação e composição da estrutura do Estado brasileiro[190].

Nesse jaez, pertinente destacar que a previsão constitucional nos Diplomas anteriores e a disciplina e atribuições próprias (inclusive de defesa da ordem jurídica e da Constituição, da boa aplicação das leis e rápida administração da justiça) lhe conferidas nos artigos 18, 20 e 139 de seu antigo Estatuto[191] não impediram que o STF reconhecesse a identidade entre a Ordem e os demais Conselhos, o que ocorreu em 1966 quando o Relator, Ministro Aliomar Baleeiro, em voto proferido no RE nº 55.456/PE (no que foi acompanhado à unanimidade por seus pares), definiu que o “Conselho Federal de Contabilidade e os Conselhos Regionais de Contabilidade são instrumentalidades federais semelhantes à Ordem dos Advogados, cujo caráter de órgão da União nunca se contestou”[192].

Isso se deu porque, como apresentado no tópico anterior, a atuação dos Conselhos e da própria OAB é revelada essencialmente pela limitação de um direito fundamental (liberdade profissional) em proveito da sociedade, sendo admitido e exigido o controle prévio relativo ao preenchimento de condições previstas em lei ou os controles concomitante e superveniente referentes ao correto exercício do mencionado direito.

Não se pretende com isso ignorar o fato de que, com a CRFB/1988, o advogado passou a ser considerado “indispensável à administração da justiça” e a Ordem dos Advogados do Brasil foi legitimada a provocar o controle concentrado de constitucionalidade sem a exigência de demonstrar pertinência temática.

Acontece que o referido tratamento não implica na afirmação de que a fiscalização exercida pela OAB sobre os advogados seja distinta daquela realizada pelas demais entidades sobre as outras profissões.

Pelo contrário, a imprescindibilidade dos advogados só reforça a importância da fiscalização exercida sobre tais profissionais e, portanto, dá maior ênfase ao caráter público do mister exercido pela OAB sobre os mesmos.

Por outro lado, a legitimidade ativa para provocação do controle de constitucionalidade não é suficiente para atribuir à OAB o referido caráter autônomo.

Isso porque a ampla legitimação instituída no artigo 103 da CRFB/1988[193] decorreu da postura assumida pelo PGR de, no regime pré-1988, não instaurar, a pedido do MDB, controle concentrado de normas e, mais, da ratificação de tal posição pelo STF quando do julgamento da Reclamação nº 849/DF[194].

Mendes et al. (2008, p. 1055), quanto ao referido fenômeno, dizem:

Se a intensa discussão sobre o monopólio da ação por parte do Procurador-Gral da República não levou a uma mudança na jurisprudência consolidada sobre o assunto, é fácil constatar que ela foi decisiva para a alteração introduzida pelo constituinte de 1988, com a significativa ampliação do direito de propositura da ação direta.

O constituinte assegurou o direito do Procurador-Geral da República de propor a ação de inconstitucionalidade. Este é, todavia, apenas um dentre os diversos órgãos ou entes legitimados a propor a ação direta de inconstitucionalidade.

Os autores precitados expõem (2008, p. 1.105) que a lista de legitimados presentes no artigo 103 “fortalece a impressão de que o constituinte pretendeu reforçar o controle abstrato de normas no ordenamento jurídico brasileiro”, ou seja, tal medida decorreu da opção feita de, a um só tempo, reduzir o significado do controle difuso e permitir que mais controvérsias constitucionais relevantes fossem submetidas ao STF mediante processo de controle abstrato.

Como demonstração de que a inclusão da OAB no rol do artigo 103 nada teve a ver com sua natureza jurídica, devem ser destacados os votos proferidos quando do julgamento, em 1991, da ADI nº 641/DF[195].

Néri da Silveira, nesse jaez, disse:

Se é exato, de um lado, que a Ordem dos Advogados do Brasil é entidade, também, de disciplina profissional, de defesa das prerrogativas da classe dos advogados, à semelhança dos demais Conselhos Federais, no que concerne às diversas profissões liberais regulamentadas, não é menos procedente, de outra parte, que há razões históricas, remotas e próximas, que justificam a decisão constituinte,...

Celso de Mello, por sua vez, embora ao final tenha entendido que as autarquias profissionais não dispõem de legitimidade ativa para ajuizamento de ADIs, preliminarmente fixou a premissa de que a OAB se enquadra na referida categoria, decorrendo sua legitimidade exclusivamente da expressa disposição constitucional:

Os Conselhos e as Ordens profissionais constituem pessoas dotadas de capacidade meramente administrativa. Submetem-se, por isso mesmo, à tutela administrativa do Ministro de Estado a cujo poder de controle estão juridicamente sujeitos.

O reconhecimento, aos Conselhos e às Ordens profissionais, da qualidade para agir – ressalvada a hipótese da Ordem dos Advogados do Brasil, cujo poder deriva de explícita previsão constitucional (art.103, VII) – significa conferir legitimidade ativa, na esfera da fiscalização normativa abstrata, a entes autárquicos, quando falece, no plano do direito positivo, ao próprio Ministro de Estado – a cuja supervisão estão sujeitos – o exercício dessa mesma e excepcional prerrogativa de índole constitucional.

Sepúlveda Pertence, na mesma assentada, expôs:

Impressiona, em termos de exegese rotineira, o argumento extraído da menção expressa a uma das ordens profissionais, a uma dessas autarquias corporativas, no caso, a Ordem dos Advogados do Brasil.

(…)

A menção expressa à OAB, serve, sim, na linha da jurisprudência aqui firmada a propósito do requisito da pertinência, para mostrar que ele não se aplica àquela instituição, mas somente às outras entidades de classe: enquanto a legitimação das entidades de classe se fez, mal ou bem, como qualificação de setores identificados por sua atividade profissional, a legitimação da Ordem se fez, historicamente, como reconhecimento do seu papel político de defesa da Constituição.

Paulo Brossard, a seu turno, registrou que a inclusão da OAB “no elenco de autoridades e entidades que podem ajuizar ação direta, tem, evidentemente outras motivações que não dizem respeito à sua natureza jurídica”.

Assim, o argumento de que a natureza autônoma da OAB decorreria da legitimidade ativa lhe conferida para iniciar o controle concentrado de constitucionalidade não se sustenta, pois sua inclusão foi resultado de premissas político-históricas, não jurídicas.

Por fim, para distinguir a OAB dos demais Conselhos suscitou-se: a) não integração aos órgãos e entes da Administração Pública; b) não submissão à direção superior do Presidente da República; c) não coordenação, supervisão e orientação dos ministros de Estado; d) não integração de seu patrimônio ao do Estado; e) não criação, modificação ou extinção de seus cargos e empregos por lei; f) ausência de repasses pelo Estado; e f) não nomeação de seus dirigentes pelo Executivo.

Tais argumentos igualmente não se sustentam na medida em que todas essas peculiaridades são presenciadas pelos outros 28 Conselhos e Ordem.

Assim, ausentes razões que justificam a diferenciação da natureza jurídica dos Conselhos em relação à da OAB.

3.3 Incoerências vivenciadas pelos Conselhos e Ordens mesmo depois de definida sua natureza jurídica

Não obstante a incoerência retratada no tópico anterior, a definição da natureza jurídica dos Conselhos e Ordens (implementada na ADI nº 1.717/DF) e a distinção em relação à OAB (aparentemente declarada na ADI nº 3.026/DF) pôs fim às incertezas então reinantes, sendo gerada a expectativa de que, a partir de então, os Conselhos, exceção feita à OAB, poderiam executar com maior força e legitimidade as atribuições lhes outorgadas.

Entretanto, outra foi a realidade instaurada, não sendo poucas as ilegalidades constatadas.

A partir deste momento, o trabalho apresentará esquematicamente alguns dos exemplos dessas imprecisões e, logo em seguida, far-se-ão breves considerações acerca dos pontos destacados:

a) O Decreto nº 6.129, de 20 de junho de 2007[196], ao asseverar categoricamente em seu artigo 1º que “a vinculação das autarquias, ..., aos Ministérios e a outros órgãos da administração pública federal fica estabelecida na forma do Anexo a este Decreto”, em nenhum momento fez menção a Conselhos de Fiscalização do Exercício Profissional.

Tal fato, pois, demonstra que, ao invés de se seguir o pronunciamento do STF na ADI nº 1.717/DF, preferiu o Executivo dar continuidade a uma equivocada interpretação dada a partir de 1986 com o Decreto nº 93.617 e mantido nos Decretos nº 801, de 20 de abril de 1993[197], nº 3.131, de 09 de agosto de 1999[198], nº 3.280, de 08 de dezembro de 1999[199] e nº 4.566, de 1º de janeiro de 2003[200].

Assim, o próprio Executivo Federal reconhece que os Conselhos não integram sua estrutura administrativa e, ao fazê-lo, deixa de exercer o dever de supervisão ministerial elencado nos artigos 19 e 26 do Decreto-lei nº 200, de 1967.

b) Embora se exija que o preenchimento dos quadros dos Conselhos se dê mediante concurso público (inciso II, artigo 37, da CRFB/88[201]), os demais requisitos constitucionais (prévia criação dos empregos por lei de iniciativa do Presidente da República e fixação dos subsídios e da remuneração por lei[202]) intimamente relacionados à citada exigência não são observados.

Assim, em verdade os Conselhos e Ordens desfrutam de autonomia legislativa para, por Resoluções ou outros atos próprios, criar empregos, fixar remunerações e disciplinar outros elementos atrelados à relação mantida com seus empregados.

c) Ainda quanto à admissão de seus servidores (lato sensu), embora o STF não tenha modulado os efeitos da decisão proferida na ADI nº 1.717/DF, o Tribunal de Contas da União passou a considerar regulares as contratações efetuadas sem concurso sob as regras da Carta de 1988, valendo-se, para tanto, não da ADI nº 1.717/DF (que tem eficácia erga omnes e efeito vinculante), mas da decisão proferida no MS nº 21.797/RJ[203].

Assim, o TCU entende válidas (e constitucionais) as contratações sem concurso realizadas antes de 18 de maio de 2001 (data da publicação, no Diário de Justiça, do resultado do julgamento), esquecendo-se que a eficácia da referida decisão se restringe aos litigantes (efeito inter partes), ou seja, ao Conselho Federal de Odontologia e ao TCU.

d) Outra situação peculiar vivenciada se refere ao regime do vínculo existente entre os Conselhos e seus servidores.

Isso porque a extinção do regime jurídico único[204] pela Emenda Constitucional nº 19, de 04 de junho 1998[205], resultou na prejudicialidade da análise do §3º, artigo 58, da Lei nº 9.649, de 1998 (que fixara o regime celetista como regente das relações entre os Conselhos e seus empregados), e, por consequência, na não definição quanto ao regime jurídico aplicável no período compreendido entre a promulgação da CRFB/1988 e a EC nº 19[206] (a instituição do regime jurídico único pela redação original do artigo 39 da Constituição não impediu que os empregados dos Conselhos fossem regidos não pelas normas dos Estatutos dos Funcionários e Servidores Públicos - Leis nº 1.711, de 28 de outubro de 1952, e nº 8.112, de 11 de novembro de 1990 -, mas pela Consolidação das Leis do Trabalho - Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943).

Assim, após o julgamento da ADI nº 1.717/DF, os Conselhos e Ordens continuaram a aplicar a seus empregados o regime celetista, o que fizeram com suporte no artigo 1º do Decreto-lei nº 968, de 1969.

Entretanto, o retorno do regime jurídico único em decorrência do deferimento da Medida Cautelar na ADI nº 2.135/DF[207] (que culminou com a suspensão da eficácia da redação dada ao caput do artigo 39 pela EC nº 19) não impediu que os Conselhos continuassem e continuem a se valer da CLT para reger as relações com seus empregados, o que é explicitado nos Editais dos concursos públicos realizados.

O Superior Tribunal de Justiça, nesse aspecto, por sua Quinta Turma considera aplicável a Lei nº 8.112, de 1990[208].

O Tribunal Superior do Trabalho, embora também se manifeste pela submissão à Lei nº 8.112[209] e, portanto, pela impossibilidade de celebração de acordos ou convenções coletivas[210], contraditoriamente afirma que as regras previstas no inciso II do artigo 37 e no artigo 41, todos da CRFB/1988, não lhes são aplicáveis[211].

e) Os Conselhos, ainda, não recebem subvenção ou transferências à conta do orçamento da União, seu orçamento fiscal, ao contrário do que verbaliza o artigo 165, §5º, I, CRFB/88[212], não está compreendido na lei orçamentária anual e, finalmente, seu orçamento não é aprovado pelo Executivo e não se sujeita às regras dos artigos 107 a 110 da Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964[213].

f) Do mesmo modo, sendo sua receita oriunda principalmente das contribuições pagas pelas pessoas (físicas e jurídicas) inscritas em seus quadros (verbas estas de caráter tributário – art.149, caput, CRFB/88[214]), a dupla revogação[215] da legislação que disciplinava a matéria (Lei nº 6.994, de 26 de maio de 1982[216]) resultou na fixação, pelos próprios Conselhos, dos valores das contribuições, multas e outros encargos por si arrecadados.

A colmatação da referida lacuna legislativa pela Lei nº 11.000, de 15 de dezembro de 2004, por outro lado, não alterou o aspecto da ilegitimidade dos Conselhos e Ordens para auferirem, em nome próprio, o valor correspondente a essas receitas, porquanto o artigo 2º[217] do novel diploma, além de não estabelecer a alíquota e a base de cálculo do tributo, conferiu aos próprios Conselhos Federais o poder de fixar os valores, ou seja, competência tributária.

Embora a constitucionalidade da precitada Lei nº 11.000, de 2004 tenha sido questionada em 15 de fevereiro de 2005 pela Confederação Nacional das Profissões Liberais (CNPL) por intermédio da ADI nº 3.408/DF (cuja Relatoria atual compete ao Ministro Dias Toffoli[218]), não foi proferida qualquer decisão, monocrática ou colegiada, pelo Supremo Tribunal Federal.

Assim, enquanto não julgada a ação, os diversos juízos, em sede do controle difuso, têm declarado a inconstitucionalidade[219] da norma e determinado a repetição de valores[220], situação essa que, aliada à ausência de repasses pela Administração Direta, vulnerabilizam a situação financeira dos Conselhos.

Alguns juízos, ainda, têm decidido que, enquanto não editada lei específica, devem ser aplicados os parâmetros da revogada Lei nº 6.994 para fixação dos valores das anuidades[221], o que, além de contrariar as regras básicas de eficácia temporal das normas, acarretaria os limites de R$ 38,00 e R$ 190,04[222], valores estes insuficientes para manutenção da estrutura dos Conselhos, custeio de seu pessoal e cumprimento de suas finalidades legais.

g) O Tribunal de Contas da União, embora entenda que os Conselhos sejam autarquias e integrem o rol de seus jurisdicionados[223], aos poucos tem se afastado do dever constitucional de fiscalização[224] sobre os mesmos, pois, no §1º, artigo 2º, de sua Instrução Normativa nº 57, de 27 de agosto de 2008, expressamente dispensa os responsáveis pelas entidades de fiscalização do exercício profissional de lhe apresentar prestação de contas ordinárias[225]-[226].

Demonstração de que o TCU aos poucos tem flexibilizado a fiscalização exercida sobre os Conselhos é o Acórdão nº 570/2007-Plenário[227], no qual os Ministros da Corte de Contas autorizaram os próprios Conselhos a normatizarem o valor das diárias, jetons e auxílios de representação por si pagos em valores superiores aos fixados pela Administração Central no Decreto nº 5.992, de 19 de dezembro de 2006, sendo, inclusive, superiores aos valores definidos em proveito do Presidente da República.

h) Muito embora o inciso XVII, artigo 1º, da Lei nº 8.443 de 16 de julho de 1992[228], garanta o direito de se formularem consultas ao TCU quanto à aplicação de dispositivos e regras relacionadas à fiscalização por si exercida, o exercício de tal direito pelos Conselhos é impedido na medida em que a Corte de Contas, com respaldo no rol de pessoas legitimadas fixado em seu Regimento Interno[229], nega conhecimento às consultas pelos mesmos formuladas[230], negativa esta que elimina um importante instrumento de controle prévio das ações e atos administrativos.

i) A Lei nº 9.289, de 04 de julho de 1996, haja vista a divergência quanto à natureza jurídica dos Conselhos de Fiscalização do Exercício Profissional, havia determinado no parágrafo único de seu artigo 4º que a isenção das custas judiciais não era gozada por essas entidades[231].

Acontece que o posicionamento adotado pelo STF no julgamento da ADI nº 1.717/DF extirpou do ordenamento as razões que motivaram a exceção da regra de isenção de custas, o que se ratifica pelo fato de, em 2001, ou seja, depois de julgada a Cautelar na ADI, ter sido acrescido à Lei nº 9.028, de 12 de abril de 1995, o artigo 24-A[232], dispositivo no qual se instituía a regra de isenção de custas sem qualquer ressalva.

Não obstante, os juízos ainda exigem dos Conselhos o recolhimento de custas processuais[233], exigência que, aliada à ausência de repasses orçamentários e à precariedade das receitas por si arrecadadas, acaba por dificultar a defesa dos interesses e atribuições públicos lhes outorgados.

j) A autonomia conferida aos Conselhos em razão da completa ausência de supervisão ministerial acaba por gerar a edição de diversos atos normativos voltados não à defesa da sociedade, mas das próprias profissões, sendo importante citar matéria veiculada pelo Superior Tribunal de Justiça sob o título “Profissões regulamentadas disputam no STJ espaço de atuação”[234].

Em tal notícia, ao serem ressaltadas intensas e frequentes disputas entre médicos, enfermeiros e psicólogos, ou entre químicos, farmacêuticos e biólogos, ou entre veterinários e agrônomos etc., foi citado estudo realizado pela cientista social ceres Pizzato Favieira, no qual se constatou que “as antigas profissões não querem perder poder que já adquiriram, retroceder em fronteiras já conquistadas, abrir espaço para novas profissões”.

Igual entendimento é exposto por Sólon Cordeiro de Araújo em seu “Os Conselhos Profissionais e o Engessamento do Conhecimento”[235], quando diz:

Hoje o conhecimento é, essencialmente, multidisciplinar e quanto mais permeabilidade houver entre profissões, melhor para a sociedade. Mas os conselhos profissionais são, essencialmente, reducionistas e agem como se o conhecimento coubesse em caixas, feudos, castelos artificialmente construídos. Logicamente que determinadas profissões exigem um maior rigor em sua fiscalização, mas outras devem ser mais abertas a vários tipos de conhecimentos e permitir uma maior interação entre diversas profissões. Acaba que os conselhos tornam-se órgãos que lutam por uma reserva de mercado que, se aparentemente benéfica para os profissionais a ele filiados compulsoriamente, é danosa para a sociedade como um todo, pois se torna limitante à difusão de conhecimentos.

k) A referida autonomia dos Conselhos gera em seus administradores a confiança de que podem limitar o exercício profissional às condições por si fixadas em atos próprios, sendo exemplo o Conselho Federal de Contabilidade, que, por Resolução[236], condicionou a inscrição em seus quadros e, consequentemente, o exercício profissional à prévia submissão e aprovação em exame de certificação profissional.

Embora o STJ tenha declarado a ilegalidade do referido ato regulamentar[237], vê-se que há a limitação ao livre exercício profissional em situações diversas das fixadas na parte final do inciso XIII, artigo 5º, da CRFB/1988.

l) Na mesma linha da autonomia, os Conselhos acabam por impor à sociedade, por Resoluções, obrigações não previstas em leis, forçando os particulares a buscarem o amparo do Judiciário para ver afastadas as exigências infralegais[238]-[239] que cerceiam o livre exercício de atividade econômica garantido no parágrafo único, artigo 170, da CRFB/1988[240].

Essas são, pois, algumas das realidades vivenciadas pelas entidades de fiscalização do exercício profissional (exceção feita à OAB), as quais comprometem o desempenho de suas atribuições institucionais ou acarretam, na prática, uma autonomia legislativa suficiente a ferir seu patrimônio e direitos e interesses dos profissionais e da sociedade.

Percebe-se que o Supremo Tribunal Federal, ao conferir aos Conselhos, excetuada a OAB, a natureza autárquica não se afastou de seu entendimento há muito sedimentado de que a fiscalização do exercício profissional. Pelo contrário, confirmou-o, porquanto o poder de polícia por tais entidades exercido pode restringir o gozo de direito fundamental, o que, à luz da Constituição de 1988, só pode ser exercitado pelo Poder Público, sem delegação a ente privado.

Entretanto, os mesmos argumentos não foram sopesados por ocasião da análise da natureza jurídica da OAB, dando início a uma tormentosa e inexplicável distinção entre pessoas que, em essência, desempenham o mesmo papel.


CONCLUSÃO

Desde a primeira Constituição brasileira, o exercício profissional é elencado dentre os direitos fundamentais do homem.

Embora inicialmente tal direito não tenha sofrido limitações, a partir da década de 1930, fez-se a escolha política de, no que se refere às profissões liberais e técnicas, condicionar seu gozo ao preenchimento de condições fixadas em lei.

Os motivos que conduziram à limitação constitucional do exercício profissional no Diploma de 1934 (vulnerabilidade da sociedade frente à atuação livre, em atividades extremamente técnicas, de pessoas não detentoras de conhecimentos específicos), por sua vez, permaneceram presentes nas Cartas seguintes, inclusive na de 1988, que na parte final do inciso XIII de seu artigo 5º explicitamente admite a observância de qualificações previstas em lei.

Tais motivos, portanto, a um só tempo reforçam a importância da liberdade profissional e revelam a excepcionalidade da interferência do Estado no gozo de tal direito, pois somente para as atividades que exijam conhecimentos técnicos e que possam pôr em risco a sociedade se admite a fixação de restrições, o que, aliás, foi definido pelo Supremo Tribunal Federal em 1976 quando do julgamento da Representação nº 930/DF.

Nesse jaez, importante registrar a relevância do julgamento do RE nº 511.961/SP, quando o STF, ao afastar a exigência do diploma de jornalista para exercício da profissão, acabou por enfatizar a importância das profissões regulamentadas e, em especial, dos Conselhos e Ordens responsáveis por sua fiscalização.

Também merecedora de destaque a iniciativa da Procuradora-Geral da República, Deborah Macedo Duprat de Britto Pereira, que, ao ajuizar a Arquição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 183/DF para ver reconhecida a não-recepção de alguns dispositivos da Lei nº 3.857, de 1960 (que condiciona o exercício da profissão de músico à prévia inscrição na Ordem dos Músicos do Brasil), deu início ao processo de discussão quanto à legalidade e juridicidade de regulamentação de determinadas profissões e da fiscalização de seu exercício pelos respectivos Conselhos.

Ora, os Conselhos e Ordens, ao receberem as incumbências de verificação do preenchimento das condições exigidas por lei, de acompanhamento do regular exercício profissional sob os prismas técnicos e éticos e, principalmente, de imposição de sanções no caso de descumprimento da vontade estatal, desempenham importante e único papel de intervir (inclusive suspender e cassar) no âmbito de proteção de direitos de particulares em proveito do interesse público.

Noutras palavras, os Conselhos e Ordens, ao exercerem poder de polícia, são legitimados a interferir, diretamente e por atos próprios, na fruição de direito fundamental, razão pela qual não se tem como admissível o desempenho de tal mister por ente privado ou estranho ao aparato estatal.

Tal cenário não se modifica pelo fato de a legislação infraconstitucional ter conferido maior independência administrativa em relação à entidade que os criaram, já que a referida ampliação apenas flexibiliza (não extingue) seu regime jurídico e impede que motivações políticas, não técnicas, interfiram na condução da atividade por si desenvolvida com vistas à defesa da sociedade contra a atuação de pessoas não capacitadas ou habilitadas em áreas especializadas.

Assim, maior independência administrativa não pode ser confundida com autonomia.

O referido quadro também não se altera pelo fato de uma das profissões e um dos entes criados para sua fiscalização, advogado e Ordem dos Advogados do Brasil, respectivamente, terem recebido tratamento constitucional específico.

A essencialidade dos advogados à administração da Justiça, como preconizado no artigo 133 da CRFB/1988, em verdade só amplia a necessidade de o exercício da advocacia ser acompanhado com mais atenção, porquanto a capacidade postulatória que autoriza tais profissionais à defesa em juízo de interesses e direitos está intimamente ligada à própria noção e concretização da cidadania.

Por outro lado, o tratamento conferido à OAB e aos advogados na CRFB/1988 e os encargos institucionais lhe repassados na Lei nº 8.906, de 1994, não são suficientes para atingir a natureza jurídica do serviço de fiscalização desempenhado pela Ordem em relação aos advogados e, por consequência, a intromissão direta no exercício de direito fundamental.

Isso porque a natureza jurídica decorre, precipuamente, do conteúdo da atividade fiscalizatória exercida pelos Conselhos e Ordens, sendo exemplo o julgamento do RE nº 55.456, de 1966, quando o STF, a despeito da menção constitucional do advogado e da OAB (iniciada em 1934) e das atribuições de defesa da ordem jurídica e da Constituição previstas na Lei nº 4.215, afirmou ser a Ordem dos Advogados, assim como os demais Conselhos de fiscalização, órgão da União.

Na mesma linha, a inclusão do Conselho Federal da OAB na lista das entidades e órgãos legitimados ao ajuizamento do controle concentrado de constitucionalidade deveu-se não a motivos jurídicos relacionados à atividade fiscalizatória por si exercitada, mas a questões históricas, como exposto nos votos proferidos por ocasião do julgamento da ADI nº 641/DF.

As entidades responsáveis pela fiscalização do exercício profissional, pois, são braços da Administração Pública que, inspirados pelo princípio da supremacia do interesse público, estão autorizados a limitar a fruição de direito fundamental em benefício da sociedade.

Quando um cidadão se vale, por exemplo, dos serviços prestados por um médico ou um advogado, ele recebe indiretamente a informação de que o Estado, por intermédio dos Conselhos e Ordens, autorizou aquele profissional a exercer a profissão e que sua atuação será acompanhada à luz de parâmetros técnicos e éticos, sob pena de responsabilização no âmbito administrativo.

Assim, por se referir diretamente ao gozo e à fruição de direito fundamental (livre exercício profissional), a atuação dos Conselhos deve ser disciplinada, interpretada e aplicada nos exatos termos da Constituição, sob pena de advirem prejuízos aos profissionais fiscalizados, às empresas que se valem dos serviços dos referidos profissionais e, finalmente, à sociedade, destinatária última da fiscalização desempenhada pelas mencionadas entidades.

Não bastasse o difícil acesso aos ensinos básico, médico e superior, a má-preparação dos professores que resulta na irregular formação dos estudantes, a má-qualidade das Instituições de Ensino Superior, a insuficiente valorização de profissões etc, a concretização do direito consagrado no inciso XIII, artigo 5º, da CRFB/1988, é dificultada pelo tratamento omissivo ou diferenciado dispensado pelo Estado aos Conselhos e Ordens lhes, que, além de não observarem ou não verem ser observados os princípios e regras elencados na Constituição, sentem-se dotados de autonomia para ampliar o já excepcional campo de restrição ao exercício profissional.

Pouco importa a denominação dada a tais entidades à luz da categorização jurídica existente, já que, para classificá-las como entes da administração indireta, deve-se voltar os olhos para seu cerne, para a natureza do serviço por si realizado.

Não se pode é perder de vista que as atribuições lhes outorgadas e os encargos por si desempenhados, atrelados intimamente à concretização do direito fundamental do exercício profissional, são serviços públicos próprios do Estado e que, portanto, não podem ser atingidos segundo motivações privadas ou independentes, mas somente à luz do princípio da supremacia do interesse público.

Muito mais do que uma simples divergência conceitual quanto à natureza jurídica dos Conselhos e Ordens, o conturbado tratamento lhes dispensado traduz verdadeiro atentado à realização de um importante direito fundamental e, por consequência, verdadeiro atentado à democracia.


REFERÊNCIAS

Seção A) Publicações

BARROSO, Luís Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas: limites e possibilidades da Constituição brasileira. 9.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2009.

BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil promulgada em 5 de outubro de 1988: arts.5º a 17, v.2. São Paulo: Saraiva, 1989.

_____. Comentários à Constituição do Brasil promulgada em 5 de outubro de 1988: arts.18 a 23, v.3. São Paulo: Saraiva, 2001.

BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 24.ed. São Paulo: Malheiros, 2009.

BOZZI, Liliam Cristina de Moraes Guimarães. A Compatibilidade da Lei nº 11.000/2004 com o Ordenamento Jurídico Tributário Atual e os Seus Efeitos para os Conselhos de Fiscalização Profissional. Revista de Estudos Tributários, Porto Alegre, n. 51, p.34-51, set./out. 2006.

BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Juízo de ponderação na jurisdição constitucional. São Paulo: Saraiva, 2009.

CAMPANHOLE, Adriano; CAMPANHOLE, Hilton Lôbo. Profissões regulamentadas: leis, decretos-lei e decretos que disciplinam todas as profissões. São Paulo: Atlas, 1971.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 7.ed., 6 reimp. Coimbra: Almedina, 2009.

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 22.ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.

CAVALCANTE, Jouberto de Quadros Pessoa; JORGE NETO, Francisco Ferreira . O empregado público. São Paulo: LTr, 2002, p.13-25, 37-203.

COSTA, José Rubens. Profissões liberais: autonomia. Rio de Janeiro: Forense, 1987.

COTRIM NETO, Alberto Bittencourt. Direito administrativo da autarquia: um estudo sobre expedientes de administração indireta no estado contemporâneo. São Paulo: Freitas Bastos, 1966.

CRETELLA JÚNIOR, José. Tratado de direito administrativo, v.5: poder de polícia e política. Rio de Janeiro: Forense, 2006.

_____. Administração indireta brasileira de acordo com a Constituição de 1988: autarquia, concessionária, subconcessionária, permissionária, fundação pública, corporação pública, empresa pública, sociedade de economia mista, autorização, atividade do particular. 3.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1990.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 20 ed. São Paulo: Atlas, 2007.

GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 12.ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

GROTTI. Dinorá Adelaide Musetti. O serviço público e a Constituição brasileira de 1988. São Paulo: Malheiros, 2003.

FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional. 31.ed. São Paulo: Saraiva, 2005.

FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de direito administrativo. 9.ed. São Paulo: Malheiros, 2008.

FREITAS, Juarez. O controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. 4.ed. São Paulo: Malheiros, 2009.

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

LACOMBE, Américo Masset. Contribuições profissionais. São Paulo: RT, 1987.

MADEIRA, José Maria Pinheiro. Servidor público na atualidade. 6.ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.

MAURIQUE, Jorge Antônio; GAMBA, Luísa Hickel; PAMPLONA, Otávio Roberto; PEREIRA, Ricardo Teixeira do Valle; FREITAS, Vladimir Passos (Coord). Consehos de fiscalização profissional: doutrina e jurisprudência. 2.ed. São Paulo: RT, 2009.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 33.ed. São Paulo: Malheiros, 2007.

MELO, Frederico Jorge Gouveia de. Admissão de pessoal no serviço público: procedimentos, restrições e controles (de acordo com a lei de responsabilidade fiscal). Belo Horizonte: Editora Fórum, 2006.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 19.ed. São Paulo: Malheiros, 2005.

______. Regime constitucional dos servidores da administração direta e indireta. 2ªed. São Paulo: RT, 1991.

______. Natureza e regime jurídico das autarquias. São Paulo: RT, 2008.

MELLO, Celso Antônio Bandeira. MODESTO, Paulo; MENDONÇA, Oscar (Coord.). Serviço Público e sua feição constitucional no Brasil. São Paulo: Atlas, 2001.

MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade: estudos de direito constitucional. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

MIRANDA, Pontes de. Comentários à Constituição de 1967 com a emenda nº 1 de 1969, tomo V: arts.153, §2º-159. Rio de Janeiro: Forense, 1987.

______. Comentários à Constituição de 1946, tomo IV: arts.129-141, §14, 4.ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1963.

MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral: comentários aos arts.1º a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil: doutrina e jurisprudência, 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002.

PESSOA, Roberto Santos. Constitucionalismo, Estado e direito administrativo no Brasil. Interesse Público: revista bimestral de direito público. Belo Horizonte: Fórum, ano 11, n.53, jan-fev. 2009.

PINHEIRO, Pedro Paulo de Castro; PEREIRA, Adilson da Silva. Autarquias corporativas: conselhos de fiscalização do exercício profissional. Rio de Janeiro: Mondrian, 200(?).

POLETTI, Ronaldo. Constituições brasileiras, v.III: 1934. Brasília: Senado Federal e Ministério da Ciência e Tecnologia, Centro de Estudos Estratégicos, 2001.

QUINTINO, Elísio A.; LIMA, Marconde Alencar de; QUINTINO, Rosana Fernandes A. A verdadeira natureza jurídica dos conselhos de fiscalização profissional e seus aspectos polêmicos: aprofundamento e reflexões. Rio de Janeiro: Fernão Juris, 2008.

SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à constituição. São Paulo: Malheiros, 2005.

______. Curso de direito constitucional positivo. 28.ed.. São Paulo: Malheiros, 2007.

SUNDFELD, Carlos Ari. Fundamentos de direito público. 4ªed., 9ªtir. São Paulo: Malheiros, 2008.

TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. 5.ed.. São Paulo: Saraiva, 2007.

VALE, André Rufino do. Estrutura das normas de direitos fundamentais: repensando a distinção entre regras, princípios e valores. São Paulo: Saraiva, 2009.

Seção B) Documentos e Sítios Eletrônicos

ARAÚJO, Sólon Cordeiro de. Os Conselhos Profissionais e o Engessamento do Conhecimento. Disponível em <http://www.administradores.com.br/artigos/os_ conselhos_profissionais_e_o_engessamento_do_conhecimento/22946/>. Acesso em 18 mai. 2009.

CONSELHO FEDERAL DE ADMINISTRAÇÃO. Disponível em <http://www.cfa. org.br/arquivos/selecionaitem.php?p=selecionaitem.php&coditem=170>. Acesso em 3 nov. 2009.

CONSELHO FEDERAL DE BIOLOGIA. Disponível em <http://www.cfbio.gov.br/ arquivos/balanco-2008.pdf>. Acesso em 3 nov. 2009.

CONSELHO FEDERAL DE CONTABILIDADE. Disponível em <http://www.cfc.org .br/uparq/Ativos_20 0912.pdf>. Acesso em 5 dez. 2009.

CONSELHO FEDERAL DE FARMÁCIA. Disponível em <http://www.cff.org.br/#[ajax] pagina& id=139>. Acesso em 3 nov. 2009.

CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Disponível em <http://www.portalmedico. org.br/novoportal /index5.asp>. Acesso em 3 nov. 2009.

CONSELHO FEDERAL DE NUTRIÇÃO. Disponível em <http://www.cfn.org.br/ novosite/arquivos/ ESTATISTICO-3-TRIMESTRE-2009.pdf>. Acesso em 5 dez. 2009.

CONSELHO FEDERAL DE ODONTOLOGIA. Disponível em <http://cfo.org.br/wp-content/uploads/2009/10/municipios_brasil.pdf>. Acesso em 5 dez. 2009.

CONSTITUIÇÃO de 34. Portal São Franciso. Disponível em <http://www.portalsao francisco.com.br/alfa/governo-getulio-vargas/constituicao-de-34 .php>. Acesso em: 07 dez. 2009.

MINISTÉRIO DA SAÚDE. Cronologia histórica: Uma visão histórica da saúde brasileira. Disponível em <http://www.funasa.gov.br/internet/museuCronHis.asp>. Acesso em 03 nov. 2009.

MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. CBO – Código Brasileiro de Ocupações. Disponível em: <http://www.mtecbo.gov.br/cbosite/pages/saibaMais.jsf>. Acesso em: 16 jan. 2010.

MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. Disponível em <http://www.mtecbo.gov .br/cbosite/ pages/regulamentacao.jsf#topo>. Acesso em: 16 jan.2010.

ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. Disponível em <http://www.oab.org.br /relatorioAdvOAB.asp>. Acesso em 23 jan. 2010.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Disponível em <http://www.stj.jus.br/ portal_ stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=93307&tmp.area_an terior=44& tmp.argumento_pesquisa=>. Acesso em 24 ago. 2009.


Notas

[1] O artigo 113, nº 13, da Carta de 34 garantia o livre exercício de qualquer profissão, desde que "observadas as condições de capacidade técnica e outras que a lei estabelecer, ditadas pelo interesse público". A Constituição de 1937, no nº 8 de seu artigo 122, assegurava: “A liberdade de escolha de profissão ou do gênero de trabalho, indústria ou comércio, observadas as condições de capacidade e as restrições impostas pelo bem público, nos termos da lei". A Constituição de 1946 manteve a ressalva no §14 de seu artigo 141 (“É livre o exercício de qualquer profissão, observadas as condições de capacidade que a lei estabelecer"), o que também permaneceu no art.153, §23, da Constituição de 1967 e da Emenda Constitucional nº 1, de 1969 (“É livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, observadas as condições de capacidade que a lei estabelecer"). A Constituição de 1988, finalmente, verbaliza no inciso XIII de seu artigo 5º: “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”.

[2] A primeira entidade criada foi a Ordem dos Advogados Brasileiros (Decreto nº 19.408, de 18 de novembro de 1930), sendo seguida pelos Conselhos de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (Decreto nº 23.569, de 11 de dezembro de1933), Conselhos de Medicina (Decreto-lei nº 7.955, de 13 de setembro de 1945), Conselhos de Contabilidade (Decreto-lei nº 9.295, de 27 de maio de 1946), Conselhos de Economia (Lei nº 1.411, de 13 de agosto de 1951), Conselhos de Química (Lei nº 2.800, de 18 de junho de 1956), Conselhos de Farmácia (Lei nº 3.820, de 11 de novembro de 1960), Ordem dos Músicos (Lei nº 3.857, de 22 de dezembro de 1960), Conselhos de Biblioteconomia (Lei nº 4.084, de 30 de junho de 1962), Conselhos de Odontologia (Lei nº 4.324, de 14 de abril de 1964), Conselhos de Estatística (Lei nº 4.739, de 15 de julho de 1965), Conselhos de Administração (Lei nº 4.769, de 09 de setembro de 1965), Conselhos de Representantes Comerciais (Lei nº 4.886, de 09 de dezembro de 1965), Conselhos de Medicina Veterinária (Lei nº 5.517, de 23 de outubro de 1968), Conselhos de Profissionais de Relações Públicas (Decreto-lei nº 860, de 11 de setembro de 1969), Conselhos de Psicologia (Lei nº 5.766, de 20 de dezembro de 1971), Conselhos de Enfermagem (Lei nº 5.905, de 12 de julho de 1973), Conselhos de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (Lei nº 6.316, de 17 de dezembro de 1975), Conselhos de Corretores de Imóveis (Lei nº 6.530, de 12 de maio de 1978), Conselhos de Nutricionistas (Lei nº 6.583, de 20 de outubro de 1978), Conselhos de Biologia e Conselhos de Biomedicina (Leis nº 6.684, de 03 de setembro de 1979, e 7.017, de 30 de agosto de 1982), Conselhos de Fonoaudiologia (Lei nº 6.965, de 09 de dezembro de 1981), Conselhos de Museologia (Lei nº 7.287, de 18 de dezembro de 1984), Conselhos de Técnicos em Radiologia (Lei nº 7.394, de 29 de outubro de 1985), Conselhos de Economistas Domésticos (Lei nº 8.024, de 13 de junho de 1990), Conselhos de Serviço Social (Lei nº 8.662 de 07 de junho de 1993), Conselhos de Educação Física (Lei nº 9.696, de 1º de setembro de 1998) e, finalmente, Conselhos de Despachantes Documentalistas (Lei nº 10.602, de 12 de dezembro de 2002).

[3] CONSELHO FEDERAL DE FARMÁCIA. Disponível em <http://www.cff.org.br/#[ajax]pagina& id=139>. Acesso em 3 nov. 2009.

[4] CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Disponível em <http://www.portalmedico.org.br/novoportal /index5.asp>. Acesso em 3 nov. 2009.

[5] CONSELHO FEDERAL DE ADMINISTRAÇÃO. Disponível em <http://www.cfa.org.br/arquivos/sele cionaitem.php?p=selecionaitem.php&coditem=170>. Acesso em 3 nov. 2009.

[6] CONSELHO FEDERAL DE BIOLOGIA. Disponível em <http://www.cfbio.gov.br/arquivos/balanco-2008.pdf>. Acesso em 3 nov. 2009.

[7] CONSELHO FEDERAL DE CONTABILIDADE. Disponível em <http://www.cfc.org.br/uparq/Ativos_20 0912.pdf>. Acesso em 5 dez. 2009.

[8] CONSELHO FEDERAL DE NUTRIÇÃO. Disponível em <http://www.cfn.org.br/novosite/arquivos/ ESTATISTICO-3-TRIMESTRE-2009.pdf>. Acesso em 5 dez. 2009.

[9] CONSELHO FEDERAL DE ODONTOLOGIA. Disponível em <http://cfo.org.br/wp-content /uploads/2009/10/municipios_brasil.pdf>. Acesso em 5 dez. 2009.

[10] ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. Disponível em <http://www.oab.org.br/relatorioAdvOAB. asp>. Acesso em 23 jan. 2010.

[11] “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: XIX - somente por lei específica poderá ser criada autarquia e autorizada a instituição de empresa pública, de sociedade de economia mista e de fundação, cabendo à lei complementar, neste último caso, definir as áreas de sua atuação”.

[12] A OAB e a advocacia são citadas nos seguintes dispositivos da CRFB/1988, até a Emenda Constitucional nº 62, de 09 de novembro de 2009: “Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios: I - ingresso na carreira, cujo cargo inicial será o de juiz substituto, mediante concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as fases, exigindo-se do bacharel em direito, no mínimo, três anos de atividade jurídica e obedecendo-se, nas nomeações, à ordem de classificação; Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: § 3º O ingresso na carreira do Ministério Público far-se-á mediante concurso público de provas e títulos, assegurada a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em sua realização, exigindo-se do bacharel em direito, no mínimo, três anos de atividade jurídica e observando-se, nas nomeações, a ordem de classificação. Art. 132. Os Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, organizados em carreira, na qual o ingresso dependerá de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, exercerão a representação judicial e a consultoria jurídica das respectivas unidades federadas. Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade: VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; Art. 103-B. O Conselho Nacional de Justiça compõe-se de quinze membros com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e seis anos de idade, com mandato de dois anos, admitida uma recondução, sendo: XII - dois advogados, indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; Art. 130-A. O Conselho Nacional do Ministério Público compõe-se de quatorze membros nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal, para um mandato de dois anos, admitida uma recondução, sendo: § 4º O Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil oficiará junto ao Conselho”.

[13] “Art. 44. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), serviço público, dotada de personalidade jurídica e forma federativa, tem por finalidade: (…). § 1º A OAB não mantém com órgãos da Administração Pública qualquer vínculo funcional ou hierárquico. (…). Art. 45. São órgãos da OAB: I - o Conselho Federal; II - os Conselhos Seccionais; III - as Subseções; IV - as Caixas de Assistência dos Advogados. § 1º O Conselho Federal, dotado de personalidade jurídica própria, com sede na capital da República, é o órgão supremo da OAB. § 2º Os Conselhos Seccionais, dotados de personalidade jurídica própria, têm jurisdição sobre os respectivos territórios dos Estados-membros, do Distrito Federal e dos Territórios. § 3º As Subseções são partes autônomas do Conselho Seccional, na forma desta lei e de seu ato constitutivo. § 4º As Caixas de Assistência dos Advogados, dotadas de personalidade jurídica própria, são criadas pelos Conselhos Seccionais, quando estes contarem com mais de mil e quinhentos inscritos. § 5º A OAB, por constituir serviço público, goza de imunidade tributária total em relação a seus bens, rendas e serviços. § 6º Os atos conclusivos dos órgãos da OAB, salvo quando reservados ou de administração interna, devem ser publicados na imprensa oficial ou afixados no fórum, na íntegra ou em resumo. Art. 46. Compete à OAB fixar e cobrar, de seus inscritos, contribuições, preços de serviços e multas. Parágrafo único. Constitui título executivo extrajudicial a certidão passada pela diretoria do Conselho competente, relativa a crédito previsto neste artigo. Art. 47. O pagamento da contribuição anual à OAB isenta os inscritos nos seus quadros do pagamento obrigatório da contribuição sindical”.

[14] “Art. 58. Os serviços de fiscalização de profissões regulamentadas serão exercidos em caráter privado, por delegação do poder público, mediante autorização legislativa. § 1º A organização, a estrutura e o funcionamento dos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas serão disciplinados mediante decisão do plenário do Conselho Federal da respectiva profissão. § 2º Os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas não manterão com os órgãos da Administração Pública qualquer vínculo funcional ou hierárquico. § 3º Os empregados dos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas são regidos pela legislação trabalhista, sendo vedada qualquer forma de transposição, transferência ou deslocamento para o quadro da Administração Pública direta ou indireta. § 4º Os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, existentes até 10 de outubro de 1997, ficam autorizados a cobrar e executar as contribuições anuais devidas por pessoas físicas ou jurídicas, bem como taxas e emolumentos instituídos em lei. § 5º O controle das atividades financeiras e administrativas dos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas será realizado pelos seus órgãos internos, devendo os conselhos regionais prestar contas, anualmente, ao conselho federal da respectiva profissão. § 6º Os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, existentes até 10 de outubro de 1997, promoverão, no prazo de noventa dias contados a partir de 7 de novembro de 1997, a adaptação de seus estatutos e regimentos ao estabelecido neste artigo”.

[15] A exclusão da OAB deveu-se por estar a mesma disciplinada em ato próprio (Lei nº 8.906, de 1994) e, também, pelo fato de posteriormente ter sido acrescido ao 58 da MP impugnada o §9º (“o disposto neste artigo não se aplica à entidade de que trata a Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994”), parágrafo este que não foi objeto da ADI.

[16] Quando do julgamento da Medida Cautelar o STF era composto pelos Ministros Carlos Velloso (Presidente), Sydney Sanches (Relator), Moreira Alves, Néri da Silveira, Octavio Gallotti, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Marco Aurélio, Ilmar Galvão, Nelson Jobim e Maurcío Corrêa (vencido). Ausentes os Ministros Nelson Jobim e Marco Aurélio.

[17] Quando do julgamento do mérito, integravam o STF os seguintes Ministros: Marco Aurélio (Presidente), Moreira Alves, Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso, Ilmar Galvão, Maurício Corrêa, Nelson Jobim, Ellen Gracie (sucessora de Octávio Gallotti) e Gilmar Mendes (sucessor de Néri da Silveira).

[18] Lei nº 8.906, de 1994: “Art. 79. Aos servidores da OAB, aplica-se o regime trabalhista. § 1º Aos servidores da OAB, sujeitos ao regime da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, é concedido o direito de opção pelo regime trabalhista, no prazo de noventa dias a partir da vigência desta lei, sendo assegurado aos optantes o pagamento de indenização, quando da aposentadoria, correspondente a cinco vezes o valor da última remuneração”.

[19] "Ora, a Ordem dos Advogados do Brasil, em face do disposto na Lei 8.906/94, é expressamente declarada com serviço público, dotada de personalidade jurídica e forma federativa, tendo por finalidade, dentre outras 'defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas, bem como a de promover com exclusividade, entre outras, a seleção e a disciplina dos advogados' (artigo 44). Portanto. por essa Lei, é, em última análise, a OAB uma federação de pessoas jurídicas de direito público (autarquias) que têm atribuições que estão intimamente ligadas à prestação jurisdicional por parte do Estado, certo como é, inclusive, que o advogado, segundo o preceituado na parte inicial do artigo 133 da Constituição, é 'indispensável à administração da justiça'".

[20] A Constituição de 1824 previa: “Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte. XXIV. Nenhum genero de trabalho, de cultura, industria, ou commercio póde ser prohibido, uma vez que não se opponha aos costumes publicos, á segurança, e saude dos Cidadãos”. A Constituição de 1891, igualmente, assegurou o referido direito: “Art. 72 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes: § 24 - É garantido o livre exercício de qualquer profissão moral, intelectual e industrial”.

[21] A Carta Imperial expressamente aboliu o regime de privilégios decorrente das Corporações de Ofício: “Art. 179. (…) XXV. Ficam abolidas as Corporações de Officios, seus Juizes, Escrivães, e Mestres”.

[22] “Ao pressupor a participação igual dos cidadãos, o princípio democrático entrelaça-se com os direitos subjectivos de participação e associação, que se tornam, assim, fundamentos funcionais da democracia. Por sua vez, os direitos fundamentais como direitos subjectivos de liberdade, criam um espaço pessoal contra o exercício de poder antidemocrático, e, como direitos legitimadores de um domínio democrático, asseguram o exercício da democracia mediante a exigência de garantias de organização e de processos com transparência democrática (…). Por fim, como direitos subjectivos a prestações sociais, económicas e culturais, os direitos fundamentais constituem dimensões impositivas para o preenchimento intrínseco, através do legislador democrático, desses direitos.” (CANOTILHO, 2009, p. 290).

[23] “Já vimos que o regime democrático é uma garantia geral da realização dos direitos humanos fundamentais. Vale dizer, portanto, que é na democracia que a liberdade encontra campo de expansão. É nela que o homem dispõe da mais ampla possibilidade de coordenar os meios necessários à realização de sua felicidade pessoal. Quanto mais o processo de democratização avança, mais o homem se vai libertando dos obstáculos que o constrangem, mais liberdade conquista" (SILVA, 2007, p. 234).

[24] “Os direitos de primeira geração ou direitos da liberdade têm por titular o indivíduo, são oponíveis ao Estado, traduzem-se como faculdades ou atributos da pessoa e ostentam uma subjetividade que é seu traço mais característico; enfim, são direitos de resistência ou de oposição perante o Estado. Entram na categoria do status negativus da classificação de Jellinek e fazem também ressaltar na ordem dos valores políticos a nítida separação entre a Sociedade e o Estado”. (BONAVIDES, 2009, p. 563).

[25] “O mundo vinha de grandes transformações. O século XX nascera em meio ao otimismo da técnica e da ciência. Colocados de lado os valores da Cultura e da Filosofia, não tardou que a Primeira Grande Guerra, e suas terríveis conseqüências, deitassem por terra as esperanças do cientificismo. O mundo do Estado Liberal começara a ruir. (…). De repente, o mundo tomara consciência de situações dramáticas que iriam pôr em risco a felicidade imaginada por abstrações liberais. Não! O mundo não vai por si só! Não é possível deixar fazer e assistir à passagem da vida. O Estado precisa intervir” (POLETTI, 2001, p. 16).

[26] “A Constituição de 1934, influenciada pela Constituição de Weimar, de 1919, e pelo corporativismo, continha inovações e virtudes. Dedicou um título à Ordem Econômica e Social, iniciando a era da intervenção estatal” (BARROSO, 2009, p. 20).

[27] “Art 113 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à subsistência, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes: 1) Todos são iguais perante a lei. Não haverá privilégios, nem distinções, por motivo de nascimento, sexo, raça, profissões próprias ou dos pais, classe social, riqueza, crenças religiosas ou idéias políticas”.

[28] “Art 72 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes: § 22 - Éé garantido o livre exercício de qualquer profissão moral, intelectual e industrial”.

[29] “Art 113 (…): 13) É livre o exercício de qualquer profissão, observadas as condições de capacidade técnica e outras que a lei estabelecer, ditadas pelo interesse público”.

[30] Restrição esta mantida nas Cartas seguintes, a ver: a Constituição de 1937, no nº 8 de seu artigo 122, assegurava: “A liberdade de escolha de profissão ou do gênero de trabalho, indústria ou comércio, observadas as condições de capacidade e as restrições impostas pelo bem público, nos termos da lei"; a Constituição de 1946 manteve a ressalva no §14 de seu artigo 14: “É livre o exercício de qualquer profissão, observadas as condições de capacidade que a lei estabelecer"; o §23, art.153 do Texto de 1967 possuía a seguinte redação: “É livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, observadas as condições de capacidade que a lei estabelecer”; por fim, a Emenda Constitucional nº 01, de 1969, repetiu no mesmo artigo 153, §23, integramente, o texto de sua antecessora.

[31] “Art. 5º - Compete privativamente à União: XIX - legislar sobre: k) condições de capacidade para o exercício de profissões liberais e técnico-científicas assim como do jornalismo”.

[32] “A nosso ver, profissional liberal é a pessoa que, credenciada por diploma outorgado por estabelecimento de ensino superior autorizado, presta à sociedade serviços relevantes, concernentes a bens fundamentais do homem – honra, dignidade, liberdade, segurança, saúde – recebendo, em contraprestação de quem o consulta, remuneração insuscetível de padronização e tabelamento por outrem, mas pelo próprio prestador da atividade. No Brasil, cabe à União, em texto de lei federal nacional, determinar as condições de capacidade para o exercício de profissões liberais, como as profissões de médico, advogado, engenheiro, cirurgião dentista. Entre essas condições, verdadeiro pressuposto para o exercício, é o diploma expedido por estabelecimento de ensino credenciado. (…). A expressão técnico-científica abrange apenas certa categoria de atividades, de profissões, de cargos públicos ou privados, os eminentemente técnicos – fundamentados em regras científicas, não compreendendo, por exemplo, as atividades teóricas, científicas, mas não técnicas (…). Em nossos dias, ciência e técnica andam estreitamente unidas” (CRETELLA JÚNIOR, José. 2006, p.225/226).

[33] “Art 7º - Compete privativamente aos Estados: I - decretar a Constituição e as leis por que se devam reger, respeitados os seguintes princípios: h) representação das profissões”.

[34] “Em 14 de maio de 1932, pouco menos de dois meses antes do início da Revolução de 1932, Getúlio publicou o Decreto nº 21.402 criando uma comissão incumbida de elaborar o anteprojeto da Constituição. (…). Em 20 de abril seguinte, um novo decreto assinado por Getúlio, regulava a representação profissional na Constituinte. Seriam quarenta deputados eleitos por uma assembléia composta de delegados eleitos por sindicatos e associações profissionais reconhecidas pelo Ministério do Trabalho, sendo que vinte deles representando os trabalhadores, dois deles representando os funcionários públicos e vinte deputados originários dos sindicatos patronais. Desses últimos, três deputados representariam as profissões liberais. Para muitos autores, era política a motivação da criação dos constituintes representantes de categorias profissionais. O Governo Federal reconhecia que as elites econômicas ainda detinham o controle eleitoral nos grandes estados, especialmente em São Paulo e em Minas Gerais e inventara a representação classista para contar com uma bancada mais ligada a seus interesses, buscando evitar que as oligarquias tradicionais se tornassem francamente hegemônicas na Constituinte”. (Constituição de 34. Portal São Francisco. Disponível em: <http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/governo-getulio-vargas/constituicao-de-34.php>. Acesso em: 07 dez. 2009).

[35] A Constituição de 1934 inovou ao criar a figura dos deputados federais profissionais, parlamentares que representavam não o povo, mas determinadas categorias profissionais (lavoura, pecuária, indústria, comércio, transportes, profissões liberais e funcionários públicos): “Art 23 - A Câmara dos Deputados compõe-se de representantes do povo, eleitos mediante sistema proporcional e sufrágio universal, igual e direto, e de representantes eleitos pelas organizações profissionais na forma que a lei indicar. § 1º - O número dos Deputados será fixado por lei: os do povo, proporcionalmente à população de cada Estado e do Distrito Federal, não podendo exceder de um por 150 mil habitantes até o máximo de vinte, e deste limite para cima, de um por 250 mil habitantes; os das profissões, em total equivalente a um quinto da representação popular. Os Territórios elegerão dois Deputados. § 2º (…). § 3º - Os Deputados das profissões serão eleitos na forma da lei ordinária por sufrágio indireto das associações profissionais compreendidas para esse efeito, e com os grupos afins respectivos, nas quatro divisões seguintes: lavoura e pecuária; indústria; comércio e transportes; profissões liberais e funcionários públicos. § 4º - O total dos Deputados das três primeiras categorias será no mínimo de seis sétimos da representação profissional, distribuídos igualmente entre elas, dividindo-se cada uma em círculos correspondentes ao número de Deputados que lhe caiba, dividido por dois, a fim de garantir a representação igual de empregados e de empregadores. O número de círculos da quarta categoria corresponderá ao dos seus Deputados. § 5º - Excetuada a quarta categoria, haverá em cada círculo profissional dois grupos eleitorais distintos: um, das associações de empregadores, outro, das associações de empregados. §§ 6º e 7º (…). § 8º - Ninguém poderá exercer o direito de voto em mais de uma associação profissional. Art 24 - São elegíveis para a Câmara dos Deputados os brasileiros natos, alistados eleitores e maiores de 25 anos; os representantes das profissões deverão, ainda, pertencer a uma associação compreendida na classe e grupo que os elegerem”.

[36] “Art 121 - A lei promoverá o amparo da produção e estabelecerá as condições do trabalho, na cidade e nos campos, tendo em vista a proteção social do trabalhador e os interesses econômicos do País. § 1º - A legislação do trabalho observará os seguintes preceitos, além de outros que colimem melhorar as condições do trabalhador: i) regulamentação do exercício de todas as profissões; § 2º - Para o efeito deste artigo, não há distinção entre o trabalho manual e o trabalho intelectual ou técnico, nem entre os profissionais respectivos”.

[37] “Art 133 - Excetuados quantos exerçam legitimamente profissões liberais na data da Constituição, e os casos de reciprocidade internacional admitidos em lei, somente poderão exercê-las os brasileiros natos e os naturalizados que tenham prestado serviço militar ao Brasil; não sendo permitido, exceto, aos brasileiros natos, a revalidação de diplomas profissionais expedidos por institutos estrangeiros de ensino”.

[38] Afora a previsão do direito à liberdade de escolha e exercício profissional nos termos da lei (“Art 122 - A Constituição assegura aos brasileiros e estrangeiros residentes no País o direito à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes: 8º) a liberdade de escolha de profissão ou do gênero de trabalho, indústria ou comércio, observadas as condições de capacidade e as restrições impostas pelo bem público nos termos da lei“), a Carta de 37, que não fixou a competência legislativa para definição das condições para o exercício profissional, só fez menção às profissões liberais em seu artigo 150: “Só poderão exercer profissões liberais os brasileiros natos e os naturalizados que tenham prestado serviço militar no Brasil, excetuados os casos de exercício legítimo na data da Constituição e os de reciprocidade internacional admitidos em lei. Somente aos brasileiros natos será permitida a revalidação, de diplomas profissionais expedidos por institutos estrangeiros de ensino.

[39] “Art 140 - A economia da população será organizada em corporações, e estas, como entidades representativas das forças do trabalho nacional, colocadas sob a assistência e a proteção do Estado, são órgãos destes e exercem funções delegadas de Poder Público”.

[40] “Art 5º - Compete à União: XV - legislar sobre: p) condições de capacidade para o exercício das profissões técnico-científicas e liberais”.

[41] “É fato incontestável a complexidade extrema do Estado moderno, resultante da multiplicação progressiva e incessante dos serviços públicos. Por mais que se ampliem os sistemas gestores de serviços administrativos, por mais que se aprimorem dia a dia os órgãos da administração direta e se relacionem os agentes integrantes do quadro, o Estado cresce, amplia suas funções, congestiona-se, asfixia-se mesmo, no afã de a tudo atender, de ajustar-se às exigências extraordinárias dos administrados. (…). Nestas circunstâncias, procura o poder público central remover de si determinadas atribuições, transferindo-as para outros órgãos ou para outras pessoas. Descentralizam-se os serviços. (…). Descentralização é, assim, de modo genérico, a transferência de atribuições, em maior ou menor número, de entidades centrais para entidades locais, sendo estas pessoas, físicas ou jurídicas; ou órgãos” (CRETELLA JÚNIOR, 1990, p.76 e 78).

[42] “Art 121 - A lei promoverá o amparo da produção e estabelecerá as condições do trabalho, na cidade e nos campos, tendo em vista a proteção social do trabalhador e os interesses econômicos do País. § 1º - A legislação do trabalho observará os seguintes preceitos, além de outros que colimem melhorar as condições do trabalhador: i) regulamentação do exercício de todas as profissões; § 2º - Para o efeito deste artigo, não há distinção entre o trabalho manual e o trabalho intelectual ou técnico, nem entre os profissionais respectivos”.

[43] “Art. 5º - Compete privativamente à União: XIX - legislar sobre: k) condições de capacidade para o exercício de profissões liberais e técnico-científicas assim como do jornalismo”.

[44] “A nosso ver, profissional liberal é a pessoa que, credenciada por diploma outorgado por estabelecimento de ensino superior autorizado, presta à sociedade serviços relevantes, concernentes a bens fundamentais do homem – honra, dignidade, liberdade, segurança, saúde – recebendo, em contraprestação de quem o consulta, remuneração insuscetível de padronização e tabelamento por outrem, mas pelo próprio prestador da atividade. No Brasil, cabe à União, em texto de lei federal nacional, determinar as condições de capacidade para o exercício de profissões liberais, como as profissões de médico, advogado, engenheiro, cirurgião dentista. Entre essas condições, verdadeiro pressuposto para o exercício, é o diploma expedido por estabelecimento de ensino credenciado. (…). A expressão técnico-científica abrange apenas certa categoria de atividades, de profissões, de cargos públicos ou privados, os eminentemente técnicos – fundamentados em regras científicas, não compreendendo, por exemplo, as atividades teóricas, científicas, mas não técnicas (…). Em nossos dias, ciência e técnica andam estreitamente unidas”. (CRETELLA JÚNIOR, 2006, p.225).

[45] A execução de serviços por órgãos despersonalizados do próprio ente estatal é denominado desconcentração. Hely Lopes Meirelles, nesse aspecto, entende serviço desconcentrado como “todo aquele que a Administração executa centralizadamente, mas o distribui entre vários órgãos da mesma entidade, para facilitar sua realização e obtenção pelos usuários. A desconcentração é uma técnica administrativa de simplificação e aceleração do serviço dentro da mesma entidade (..)” (2007, p. 342).

[46] MINISTÉRIO DA SAÚDE. Cronologia histórica: Uma visão histórica da saúde brasileira. Disponível em <http://www.funasa.gov.br/internet/museuCronHis.asp>. Acesso em 03 nov. 2009.

[47] “Sabe-se que certas atividades (…) destinadas a satisfazer a coletividade em geral, são qualificadas como serviços públicos quando em dado tempo e lugar, o Estado reputa que não convém relegá-las simplesmente à livre iniciativa; ou seja, que não é socialmente desejável fiquem tão só assujeitadas à fiscalização e controles que exerce sobre a generalidade das atividades privadas (…)” (MELLO, 2005, p. 632).

[48] “Art 120 - Os sindicatos e as associações profissionais serão reconhecidos de conformidade com a lei”.

[49] Decreto nº 19.408, de 1930: “Art. 17. Fica criada a Ordem dos Advogados Brasileiros, orgão de disciplina e seleção da classe dos advogados, que se regerá pêlos estatutos que forem votados pelo Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros, com a colaboração dos Institutos dos Estados, e aprovados pelo Governo”.

[50] “Art. 1º A Ordem dos Advogados do Brasil, criada pelo art. 17 do Decreto nº 19.408, de 18 de novembro de 1930, com personalidade jurídica e forma federativa, é o órgão de seleção disciplinar e defesa da classe dos advogados em tôda a República (artigo 139). Parágrafo único. Cabe à Ordem representar, em juízo e fora dêle, os interesses gerais da classe dos advogados e os individuais, relacionados com o exercício da profissão”.

[51] “Interesse público, infelizmente, constitui-se em um desses conceitos que são tratados como se fossem despidos de qualquer conteúdo e passíveis de receber aquele que se lhes queira emprestar. É de se notar que o conceito de interesse público, como conceito pragmático que é, terá conotações diversas, dependendo da época, da situação sócio-econômica, das metas a atingir etc.” (FIGUEIREDO, 2008, p.67).

[52] Cite-se como exemplo o Decreto nº 23.569, de 1933, que, ao limitar o exercício das profissões de engenheiro, arquiteto e agrimensor aos portadores dos respectivos diplomas, conferiu aos Conselhos Federal e Regionais de Engenharia e Arquitetura, criados pelo mesmo Decreto, a função de registro dos profissionais e, mais, de aplicação de penalidades em razão do mau exercício: “Art. 1º O exercício das profissões de engenheiro, de arquiteto e de agrimensor será sòmente permitido, respectivamente: a) nos diplomados pelas escolas ou cursos de engenharia, arquitetura ou agrimensura, oficiais, da União Federal, ou que sejam, ou tenham sido ao tempo da conclusão dos seus respectivos cursos, oficializadas, eqüiparadas às da União ou sujeitas ao regimen do inspeção do Ministério da Educação e Saúde Pública; b) aos diplomados, em data anterior à respectiva oficialização ou equiparação às da União, por escolas nacionais de engenharia, arquitetura ou agrimensura cujos diplomas hajam sido reconhecido em virtude de lei federal; c) àqueles que, diplomadas por escolas ou institutos técnicos superiores estrangeiros de engenharia, arquitetura ou agrimensura, após curso regular e válido para exercicio da profissão em todo o país onde se acharem situados, tenham revalidado os seus diplomas, de acôrdo com a legislação federal do ensino superior; d) àqueles que, diplomados por escolas ou institutos estrangeiros de engenharia. arquitetura ou agrimensura, tenham registrado seus diplomas até 18 de junho de 1915, de acôrdo com o decreto n. 3.001, de 9 de outubro de, 1880, ou os registraram consoante o disposto no art. 22, da lei n. 4.793, de 7 de janeiro de 1924. (…) Art. 14. A todo profissional registrado de acôrdo com este decreto, será entregue uma carteira profissional, numerada, registrada e visada no Conselho Regional respectivo, a qual conterá: (…). Art. 18. A fiscalização do exercício da engenharia, da arquitetura e da agrimensura será, exercida pelo Conselho Federal de Engenharia e Arquitetura e pelos Conselhos Regionais a que se referem os arts. 25 a 27. (…) Art. 22. São atribuições do Conselho Federal de Engenharia e Arquitetura: (…); c) examinar, decidindo a respeito em última instância, e podendo até anular, o registro de qualquer profissional licenciado que não estiver de acôrdo com o presente. Decreto; e) julgar em última instância os recursos de penalidades impostas pelos Conselhos Regionais; f) publicar o relatório anual dos seus trabalhos, em que deverá figurar a relação de todos os profissionais registrados. (…). Art. 26. São atribuições dos Conselho Regionais: a) examinar os requerimentos e processos de registro de licenças profissionais, resolvendo como convier; b) examinar reclamações e representações escritas acêrca dos serviços de registro e das infrações do presente decreto, decidindo a respeito; c) fiscalizar o exercício das profissões de engenheiro, de arquiteto e de agrimensor, impedindo e punindo as infrações dêste decreto, bem como enviando às autoridades competentes minucioso e documentados relatórios sôbre fatos que apurarem e cuja solução ou repressão não seja de sua alçada; d) publicar relatórios anuais de seus trabalhos e a relação dos profissionais registrados; (…); g) expedir a carteira profissional prevista no art. 14; (…). Art. 38. As penalidades aplicáveis por infração do presente decreto serão as seguintes : a) multas de 500$ (quinhentos mil réis) a 1:000$ (um conto de réis) aos infratores dos arts. 1º, 3º, 4º, 5º, 6º e seu seu parágrafo único, e 7º e seu parágrafo único; b) multas de 500$ (quinhentos mil réis) a 1:000$ (um conto de reis) aos profissionais, e de 1:000$ (um conto de réis) a 5:000$ (cinco contos de réis) às firmas, sociedades, associações, companhias e empresas, quando se tratar de infração do art. 8º e seus parágrafos e do art. 17; c) multas de 200$ (duzentos mil réis) a 500$ (quinhentos mil réis) aos infratares de disposições não mencionadas nas alíneas a e b dêste artigo ou para os quais não haja indicação de penalidade em artigo ou alínea especial; d) suspensão do exercício da profissão, pelo prazo de seis meses a um ano, ao profissional que, em virtude de erros técnicos, demonstrar incapacidade, a critério do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura; e) suspensão de exercício, pelo prazo de quinze dias a um mês, às autoridades administrativas ou judiciárias que infringirem ou permitirem se infrinjam o art. 9º e demais disposições dêste decreto. Art. 39. São considerados como exercendo ilegalmente a profissão e sujeitos à pena estabelecida na alínea a do art. 38: a) os profissionais que, embora diplomados e registrados, realizarem atos que não se enquadrem nos de sua atribuição, especificados no capítulo IV dêste decreto; b) os profissionais licenciados e registrados que exercerem atos que não se enquadrem no limite de suas licenças. Art. 40. As penalidades estabelecidas neste capítulo não isentam de outras, em que os culpados. hajam porventura incorrido, consignadas nos Códigos Civil e Penal”.

[53] Cuida-se do Recurso Extraordinário nº 29.233/SP, em cujo julgamento votaram os Ministros Barros Barreto (Presidente da Turma), Cândido Motta Filho (Relator), Sampaio Costa, Macedo Ludolf e Afrânio Costa.

[54] O julgado recebeu a seguinte Ementa: “Recurso Extraordinário. Legítimo Interesse do Conselho Regional de Engenharia como Autarquia Federal. Os limites da ação popular” (RE 29.233, Relator(a): Min. Candido Motta, Primeira Turma, Diário de Justiça de 13 de dezembro de 1956, Ementário Vol-00283-01, pp-00219).

[55] O mandamus fora impetrado pelo Presidente do Conselho Federal de Medicina contra ato do Tribunal de Contas da União que, em razão da não prestação de contas relativamente ao exercício de 1959, o suspendera.

[56] O julgado recebeu a seguinte Ementa: “Definido por lei como autarquia federal, o Conselho Federal de Medicina está sujeito a presta contas ao Tribunal de Contas da União”. (Julgado em 08 de maio de 1963, Diário de Justiça de 11 de julho de 1963, pp-00053, Ementário volume -00544-01, pp-00052). Votaram os Ministros Ribeiro da Costa (Presidente), Victor Nunes Leal (Relator), Pedro Chaves, Gonçalves de Oliveira, Vilas Boas, Candido Filho, Ary Franco e Hahnemann Guimarães. Ausentes os Ministros Luiz Gallotti e Barros Monteiro. Impedido o Ministro Lafayette de Andrada.

[57] Da Sessão participaram, além do Relator, os Ministros Vilas Boas e Adalício Nogueira. O julgado, por sua vez, recebeu a seguinte Ementa: “Conselho Regional de Contabilidade. Seu caráter de órgão ou instrumentalidade da União. Foro competente para seus litígios com os Estados” (Julgado em 08 de novembro de 1966, Diário de Justiça de 16 de março de 1967).

[58] “Art 103 - O Tribunal Federal de Recursos, com sede na Capital federal compor-se-á de nove Juízes, nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pelo Senado Federal, sendo dois terços entre magistrados e um terço entre advogados e membros do Ministério Público, com os requisitos do art. 99. (…). Art 124 - Os Estados organizarão a sua Justiça, com observância dos arts. 95 a 97 e também dos seguintes princípios: (…); III - o ingresso na magistratura vitalícia, dependerá de concurso de provas, organizado pelo Tribunal de Justiça com a colaboração do Conselho Secional da Ordem dos Advogados; do Brasil, e far-se-á a indicação dos candidatos, sempre que for possível, em lista tríplice; (…); V - na composição de qualquer Tribunal, um quinto dos lugares será preenchido por advogados e membros do Ministério Público, de notório merecimento e reputação ilibada, com dez anos, pelo menos, de prática forense. Para cada vaga, o Tribunal, em sessão e escrutínio secretos, votará lista tríplice. Escolhido um membro do Ministério Público, a vaga seguinte será preenchida por advogado”.

[59] “Art. 139. A Ordem dos Advogados do Brasil constitui serviço público federal, gozando os seus bens, rendas e serviços de imunidade tributária total (art. 31. inciso V, letra a da Constituição Fedaral), e tendo êstes franquia postal e telegráfica. § 1º Não se aplicam à Ordem as disposições legais referentes às autarquias ou entidades paraestatais”.

[60] À Sessão realizada em 17 de janeiro de 1961 compareceram os Ministros Victor Nunes Leal, Vilas Bôas, Hahnemann Guimarães, Ribeiro da Costa e Lafayette de Andrada.

[61] Diário de Justiça de 02 de outubro de 1961, pp-00352, Ementário volume -00466-02, pp-00450.

[62] “Art. 4° A Administração Federal compreende: I - A Administração Direta, que se constitui dos serviços integrados na estrutura administrativa da Presidência da República e dos Ministérios. II - A Administração Indireta, que compreende as seguintes categorias de entidades, dotadas de personalidade jurídica própria: a) Autarquias; b) Emprêsas Públicas; c) Sociedades de Economia Mista. d) fundações públicas. Parágrafo único. As entidades compreendidas na Administração Indireta vinculam-se ao Ministério em cuja área de competência estiver enquadrada sua principal atividade. Art. 5º Para os fins desta lei, considera-se: I - Autarquia - o serviço autônomo, criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da Administração Pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada”.

[63] “Art. 1º As entidades da Administração Indireta, das categorias constantes do art. 4º, inciso II, do Decreto-lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967, passam, de acôrdo com o artigo 154 do mesmo Decreto-lei, a vincular-se aos Ministérios em cuja área de competência se enquadram, de acôrdo com a seguinte discriminação: (…); IX - MINISTÉRIO DO TRABALHO E PREVIDÊNCIA SOCIAL 1. Conselho Federal de Contabilidade; 2. Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia; 3. Conselho Federal de Economistas Profissionais; 4. Conselho Federal de Química; 5. Conselho Federal de Medicina; 6. Conselho Federal de Biblioteconomia; 7. Instituto Nacional de Previdência Social; 8. Instituto de Previdência e Assistência aos Servidores do Estado; 9. Ordem dos Advogados do Brasil; 10. Serviço de Assistência e Seguro Social dos Economiários”.

[64] Embora a ilegalidade do Decreto nº 60.900 tenha sido defendida no Parecer H-753, de lavra do então Consultor-Geral da República, Adroaldo Mesquita da Costa, o Judiciário não declarou ou reconheceu a referida ilegalidade. A Ementa do retrocitado parecer recebeu a seguinte redação: “Não se aplica à Ordem dos Advogados a legislação referente às Autarquias, em obediência ao disposto no §1º do art.139 da Lei 4215/63. O Decreto número 60.900/67, ao vincular a Ordem ao Ministério do Trabalho, em atenção ao que dispõe a Reforma Administrativa relativamente às Autarquias, viola o precitado dispositivo do seu Estatuto. Impõe-se, no particular, a decretação de nulidade do referido Decreto 60.900/67”.

[65] “Art. 2º Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue. (…). § 2º A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior”.

[66] O julgado recebeu a seguinte Ementa: “Ação Cível Originária. Não configura litígio da competência originária do Supremo Tribunal Federal os travados entre os Estados e os órgãos de administração indireta. Competência da Justiça federal. Precedentes. Ação não conhecida” (Relator Min. Amaral Santos, julgado em 16 de junho de 1971, Diário de Justiça de 15 de outubro de 1971, pp-05671, Ementário volume 00851-01, pp-00001). Votaram os Ministros Aliomar Baleeiro (Presidente, Luiz Gallotti, Adalício Nogueira, Oswaldo Trigueiro, Eloy da Rocha, Djaci Falcão, Amaral Santos (Relator), Thompson Flores, Bilac Pinto e Antônio Neder. Ausente o Min.Barros Monteiro.

[67] “Art. 1º - As entidades abaixo relacionadas passam a vincular-se, para os fins dos artigos 19 e 26 do Decreto-lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967, e 3º do Decreto-lei nº 900, de 29 de dezembro de 1969, aos seguintes Ministérios: (…); II - Ministério do Trabalho: 6. Conselho Federal e Conselhos Regionais de Assistentes Sociais; 7. Conselho Federal e Conselhos Regionais de Biblioteconomia; 8. Conselho Federal e Conselhos Regionais de Contabilidade; 9. Conselho Federal e Conselhos Regionais de Corretores de Imóveis; 10. Conselho Federal e Conselhos Regionais de Economia; 11. Conselho Federal e Conselhos Regionais de Enfermagem; 12. Conselho Federal e Conselhos Regionais de Engenharia, Arquitetura e Agronomia; 13. Conselho Federal e Conselhos Regionais de Estatística; 14. Conselho Federal e Conselhos Regionais de Farmácia; 15. Conselho Federal e Conselhos Regionais de Medicina; 16. Conselho Federal e Conselhos Regionais de Medicina Veterinária; 17. Conselho Federal e Conselhos Regionais de Odontologia, 18. Conselho Federal e Conselhos Regionais de Profissionais de Relações Públicas; 19. Conselho Federal e Conselhos Regionais de Psicologia; 20. Conselho Federal e Conselhos Regionais de Química; 21. Conselho Federal e Conselhos Regionais de Técnicos de Administração; 22. Conselho Federal e Conselhos Regionais de Representantes Comerciais; 23. Conselho Federal e Conselhos Seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil; 24. Ordem dos Músicos do Brasil”.

[68] No Parecer L-069 a Consultoria-Geral da União, assim como fizera em relação ao Decreto nº 60.900/1967, defendeu a insubsistência jurídica do Decreto nº 74.296/74, insubsistência que, por sua vez, não foi declarada ou reconhecida pelo Judiciário.

[69] Celso Antônio Bandeira de Mello (2005, p. 128) assim define órgãos: “Órgãos são unidades abstratas que sintetizam os vários círculos de atribuições do Estado. (…). Os órgãos não passam de simples partições internas da pessoa cuja intimidade estrutural integram, isto é, não têm personalidade jurídica. (…). Em síntese, juridicamente falando, não há, em sentido próprio, relações entre os órgãos, e muito menos entre eles e outras pessoas, visto que, não tendo personalidade, os órgãos não podem ser sujeitos de direitos e obrigações”.

[70] “Art. 81. Compete privativamente ao Presidente da República: V - dispor sôbre a estruturação, atribuições e funcionamento dos órgãos da administração federal”.

[71] “Art. 57. É da competência exclusiva do Presidente da República a iniciativa das leis que: (…); IV - disponham sôbre organização administrativa e judiciária, matéria tributária e orçamentária, serviços públicos e pessoal da administração do Distrito Federal, bem como sôbre organização judiciária, administrativa e matéria tributária dos Territórios”. Ademais, a Emenda Constitucional nº 01, de 1969, não elencava a organização administrativa como matéria passível de disciplina por intermédio de Decreto-lei: (“Art. 55. O Presidente da República, em casos de urgência ou de interêsse público relevante, e desde que não haja aumento de despesa, poderá expedir decretos-leis sôbre as seguintes matérias: I - segurança nacional; II - finanças públicas, inclusive normas tributárias; e III - criação de cargos públicos e fixação de vencimentos”). Ainda que se valesse o Presidente da República da genérica redação do inciso I (segurança nacional), o Decreto-lei deveria ser submetido ao Congresso Nacional (“Art.55 (…). § 1º - Publicado o texto, que terá vigência imediata, o decreto-lei será submetido pelo Presidente da República ao Congresso Nacional, que o aprovará ou rejeitará, dentro de sessenta dias a contar do seu recebimento, não podendo emendá-lo, se, nesse prazo, não houver deliberação, aplicar-se-á o disposto no § 3º do art. 51. § 2º A rejeição do decreto-lei não implicará a nulidade dos atos praticados durante a sua vigência”).

[72] “Art. 85. Compete ao Ministro de Estado, além das atribuições que a Constituição e as leis estabelecerem: I - exercer a orientação, coordenação e supervisão dos órgãos e entidades da administração federal na área de sua competência, e referendar os atos e decretos assinados pelo Presidente”.

[73] “A Classificação Brasileira de Ocupações - CBO, instituída por portaria ministerial nº. 397, de 9 de outubro de 2002, tem por finalidade a identificação das ocupações no mercado de trabalho, para fins classificatórios junto aos registros administrativos e domiciliares. (...)Por meio desta publicação o Ministério do Trabalho e Emprego - MTE disponibiliza à sociedade a nova Classificação Brasileira de Ocupações - CBO, que vem substituir a anterior, publicada em 1994. Desde a sua primeira edição, em 1982, a CBO sofreu alterações pontuais, sem modificações estruturais e metodológicas. A edição 2002 utiliza uma nova metodologia de classificação e faz a revisão e atualização completas de seu conteúdo. A CBO é o documento que reconhece, nomeia e codifica os títulos e descreve as características das ocupações do mercado de trabalho brasileiro. Sua atualização e modernização se devem às profundas mudanças ocorridas no cenário cultural, econômico e social do País nos últimos anos, implicando alterações estruturais no mercado de trabalho.” (MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. CBO – Código Brasileiro de Ocupações. Disponível em: <http://www.mtecbo.gov.br/ cbosite/pages/saibaMais.jsf>. Acesso em: 16 jan. 2010).

[74] MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. Disponível em <http://www.mtecbo.gov.br/cbosite/ pages/regulamentacao.jsf#topo>. Acesso em: 16 jan.2010.

[75] “É inegável que a Constituição de 1988 tem a virtude de espelhar a reconquista dos direitos fundamentais, notadamente os de cidadania e os individuais, simbolizando a superação de um projeto autoritário, pretensioso e intolerante que se impusera ao País. Os anseios de participação, represados à força nas duas décadas anteriores, fizeram da constituinte uma apoteose cívica, (...)” (BARROSO, 2009, p. 41).

[76] “Dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida. 'Concebido como referência constitucional unificadora de todos os direitos fundamentais [observam Gomes Canotilho e Vital Moreira], o conceito de dignidade da pessoa humana obriga a uma densificação valorativa que tenha em conta o seu amplo sentido normativo-constitucional e não uma qualquer idéia apriorística do homem, não podendo reduzir-se o sentido da dignidade humana à defesa dos direitos pessoais tradicionais, esquecendo-a nos caos de direitos sociais, ou invocá-la para construir teoria do núcleo da personalidade individual, ignorando-a quando se trate de garantir as bases da existência humana'” (SILVA, 2007 p. 105)

[77] “Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político”.

[78] “(...) as normas que consagram direitos fundamentai não são apenas constitutivas de direitos subjetivos (em sentido amplo), mas operam também como valores objetivos do sistema jurídico. Isso leva a crer que os direitos fundamentais não podem ser entendidos apenas do ponto de vista de certas concepções individualistas, pelo que acabariam sendo resumidos a um emaranhado de posições jurídico-subjetivas em face do Estado. Os direitos fundamentais são a expressão normativa do conjunto de valores básicos de uma sociedade” (VALE, 2009, p. 167). Paulo Gustavo Gonet Branco, no mesmo raciocínio, afirma que “dessa perspectiva decorre a irradiação dos direitos fundamentais sobre todo o ordenamento jurídico, tornando-os marcos interpretativos de todos os preceitos jurídicos, operando, pois, como limite do Poder Público. Essa dimensão objetiva faz com que os direitos fundamentais transcendam 'a perspectiva da garantia de posições individuais, para alcançar a estatura de normas que filtram os valores básicos da sociedade política e os expandem para todo o direito positivo, [formando] a base do ordenamento jurídico de um Estado democrático'” (2009, p. 62).

[79] O julgamento se deu à luz do §23, artigo 153, da Emenda Constitucional nº 1, de 1969: “É livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, observadas as condições de capacidade que a lei estabelecer”.

[80] O então Procurador-Geral de Justiça, Moreira Alves, ingressara com a Representação nº 930/DF para ver declarada a inconstitucionalidade da Lei nº 4.116, de 1962, que disciplinava a profissão de corretores de imóveis. A referida Representação foi julgada procedente pelo STF, nos termos da divergência iniciada pelo Ministro Rodrigues Alckmin, no que foi acompanhado integralmente por Leitão de Abreu, Thompson Flores, Eloy da Rocha e Djaci Falcão (Presidente), e parcialmente por Xavier de Albuquerque e Bilac Pinto. Restaram vencidos Cordeiro Guerra (Relator) e Cunha Peixoto. O Ministro Antônio Neder não votou e Moreira Alves, por ter proposto a Representação na qualidade de Procurador-Geral, estava impedido. O julgado recebeu a seguinte Ementa: “Lei n. 4.116, de 27.8.62. Inconstitucionalidade. Exercício livre de qualquer trabalho, ofício ou profissão (C.F., art. 153, par. 23). É inconstitucional a lei que atenta contra a liberdade consagrada na Constituição federal, regulamentando e consequentemente restringindo exercício de profissão que não pressupõe 'condições de capacidade'. Representação procedente in totum” (Rp 930, Relator(a): Min. Cordeiro Guerra, Relator(a) p/ Acórdão: Min. Rodrigues Alckmin, Tribunal Pleno, julgado em 05/05/1976, Diário de Justiça de 02 de setembro de 1977, pp-05969, Ementário Vol-01068-01, pp-00009).

[81] “Há três 'universos' de restrições de direitos recortados por actos normativos com valor de lei: (1) restrições feitas directamente pela Constituição; (2) restrições feitas por lei mas expressamente autorizadas pela Constituição; (3) restrições operadas através de lei mas sem autorização expressa da Constituição. Na hipótese (1) fala-se de restrições constitucionais directas. É a lei constitucional que, de forma expressa, procede a um primeiro recorte restritivo do conteúdo juridicamente garantido de um direito fundamental (…). No caso (2) alude-se a reserva de lei restritiva. A Constituição autoriza a lei (…) a estabelecer restrições ao conteúdo juridicamente garantido de um direito (…). No caso (3) a doutrina fala de restrições não expressamente autorizadas pela Constituição. Trata-se de restrições ao conteúdo juridicamente garantido de um direito sem qualquer autorização constitucional expressa” (CANOTILHO, 2009, p. 450).

[82] “Tem-se uma reserva legal ou restrição legal qualificada quando a Constituição não se limita a exigir que eventual restrição ao âmbito de proteção de determinado direito seja prevista em lei, estabelecendo, também, as condições especiais, os fins a serem perseguidos ou os meios a serem utilizados” (MENDES; COELHO; BRANCO, 2008, p. 309).

[83] Após a II Guerra Mundial os direitos fundamentais passaram a ocupar papel central no ordenamento jurídico, tendo, então, o princípio da proporcionalidade (antes próprio do Direito Administrativo) assumido estatura constitucional. Paulo Bonavides, ao discorrer sobre o princípio da proporcionalidade e afirmar ser seu escopo estabelecer relações adequadas entre fim, meio e situação para proteção eficaz da formação, atualização e consolidação dos direitos fundamentais, define serem seus elementos parciais (ou sub-princípios): a) a pertinência ou aptidão - instrumento certo para se atingir o fim, sempre respaldado no interesse público; b) a necessidade - a medida não deve exceder os limites indispensáveis à conservação do fim legítimo almejado (escolha do meio mais suave); c) a proporcionalidade em sentido estrito- a escolha recai sobre meio ou meios que, no caso específico, levarem em conta o conjunto de interesses em jogo (BONAVIDES, 2009, p.392-434).

[84] “Utilizado, de ordinário, para aferir a legitimidade das restrições de direitos – muito embora possa aplicar-se, também, para dizer do equilíbrio na concessão de poderes, privilégios ou benefícios – o princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade, em essência, consubstancia uma pauta de natureza axiológica que emana diretamente das idéias de justiça, eqüidade, bom senso, prudência, moderação, justa medida, proibição de excesso, direito justo e valores afins; precede e condiciona a positivação jurídica, inclusive a de nível constitucional; e, ainda, enquanto princípio geral do direito, serve de regra de interpretação para todo o ordenamento jurídico. No âmbito do direito constitucional, que o acolheu e reforçou, a ponto de impô-lo à obediência não apenas das autoridades administrativas, mas também de juízes e legisladores, esse princípio acabou se tornando consubstancial à própria idéia de Estado de Direito pela sua íntima ligação com os direitos fundamentais, que lhe dão suporte e, ao mesmo tempo, dele dependem para se realizar” (MENDES; COELHO; BRANCO, 2008, p. 120).

[85] Participaram do julgamento os Ministros Néri da Silveira (Presidente), Sepúlveda Pertence (Relator), Aldir Passarinho, Sydney Sanches, Octavio Gallotti, Carlos Madeira, Paulo Brossard e Celso de Mello. Ausentes os Ministros Moreira Alves, Francisco Rezek e Célio Borja.

[86] O julgado recebeu a seguinte Ementa: “Mandado de Segurança: Recurso Ordinário Constitucional (CF, art. 102, II, 'a'). 1. Devolução ao STF, a exemplo da apelação (CPC, 515 e parágrafos), do conhecimento de toda a matéria impugnada, que pode abranger todas as questões suscitadas e discutidas no processo de natureza constitucional ou não e ainda que a sentença não as tenha julgado por inteiro. 2. Autarquias de fiscalização profissional: Supervisão Ministerial (DL 968/69). Enquanto se mantenha a autarquia profissional no exercício regular de suas atividades finalísticas, carece o Ministro do Trabalho de Competência tutelar, seja para decidir, em grau de recurso hierárquico, posto que impróprio, sobre as decisões concretas da entidade corporativa, seja para dar-lhe instruções normativas sobre como resolver determinada questão jurídica de sua alçada. 3. Administração de imóvel: prestação de serviço, cuja inclusão no âmbito profissional dos técnicos de administração depende do exame de circunstâncias do caso concreto”. (Julgado em 07 de dezembro de 1989, Diário de Justiça de 16 de fevereiro de 1990, pp-00928, Ementário volume -01569-01, pp-00184).

[87] É o que se extrai da seguinte premissa exposta pelo Relator em seu voto: “Essa finalidade restrita – 'verificação da efetiva realização dos correspondentes objetivos legais de interesse público' – demarca rigidamente o âmbito da tutela da administração central sobre essas autarquias especiais e não se pode identificar, data venia, com o amplo controle que o Dec.lei 200 comete ao Ministro de Estado sobre 'todo e qualquer órgão da Administração Federal direta, ou indireta', da área de seu Ministério (art.19), com vistas a 'assegurar a observância da legislação federal' (art.25, I)”.

[88] “Art. 44. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), serviço público, dotada de personalidade jurídica e forma federativa, tem por finalidade: I - defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas; II - promover, com exclusividade, a representação, a defesa, a seleção e a disciplina dos advogados em toda a República Federativa do Brasil”.

[89] A OAB e a advocacia são citadas nos seguintes dispositivos da CRFB/1988, até a Emenda Constitucional nº 62, de 09 de novembro de 2009: “Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios: I - ingresso na carreira, cujo cargo inicial será o de juiz substituto, mediante concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as fases, exigindo-se do bacharel em direito, no mínimo, três anos de atividade jurídica e obedecendo-se, nas nomeações, à ordem de classificação; Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: § 3º O ingresso na carreira do Ministério Público far-se-á mediante concurso público de provas e títulos, assegurada a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em sua realização, exigindo-se do bacharel em direito, no mínimo, três anos de atividade jurídica e observando-se, nas nomeações, a ordem de classificação. Art. 132. Os Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, organizados em carreira, na qual o ingresso dependerá de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, exercerão a representação judicial e a consultoria jurídica das respectivas unidades federadas. Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade: VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; Art. 103-B. O Conselho Nacional de Justiça compõe-se de quinze membros com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e seis anos de idade, com mandato de dois anos, admitida uma recondução, sendo: XII - dois advogados, indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; Art. 130-A. O Conselho Nacional do Ministério Público compõe-se de quatorze membros nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal, para um mandato de dois anos, admitida uma recondução, sendo: § 4º O Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil oficiará junto ao Conselho”.

[90] “Art. 45. São órgãos da OAB: I - o Conselho Federal; II - os Conselhos Seccionais; III - as Subseções; IV - as Caixas de Assistência dos Advogados. § 1º O Conselho Federal, dotado de personalidade jurídica própria, com sede na capital da República, é o órgão supremo da OAB. § 2º Os Conselhos Seccionais, dotados de personalidade jurídica própria, têm jurisdição sobre os respectivos territórios dos Estados-membros, do Distrito Federal e dos Territórios. § 3º As Subseções são partes autônomas do Conselho Seccional, na forma desta lei e de seu ato constitutivo. § 4º As Caixas de Assistência dos Advogados, dotadas de personalidade jurídica própria, são criadas pelos Conselhos Seccionais, quando estes contarem com mais de mil e quinhentos inscritos. § 5º A OAB, por constituir serviço público, goza de imunidade tributária total em relação a seus bens, rendas e serviços. § 6º Os atos conclusivos dos órgãos da OAB, salvo quando reservados ou de administração interna, devem ser publicados na imprensa oficial ou afixados no fórum, na íntegra ou em resumo. Art. 46. Compete à OAB fixar e cobrar, de seus inscritos, contribuições, preços de serviços e multas. Parágrafo único. Constitui título executivo extrajudicial a certidão passada pela diretoria do Conselho competente, relativa a crédito previsto neste artigo. Art. 47. O pagamento da contribuição anual à OAB isenta os inscritos nos seus quadros do pagamento obrigatório da contribuição sindical”.

[91] “Art. 58. Os serviços de fiscalização de profissões regulamentadas serão exercidos em caráter privado, por delegação do poder público, mediante autorização legislativa. § 1º A organização, a estrutura e o funcionamento dos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas serão disciplinados mediante decisão do plenário do Conselho Federal da respectiva profissão. § 2º Os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas não manterão com os órgãos da Administração Pública qualquer vínculo funcional ou hierárquico. § 3º Os empregados dos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas são regidos pela legislação trabalhista, sendo vedada qualquer forma de transposição, transferência ou deslocamento para o quadro da Administração Pública direta ou indireta. § 4º Os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, existentes até 10 de outubro de 1997, ficam autorizados a cobrar e executar as contribuições anuais devidas por pessoas físicas ou jurídicas, bem como taxas e emolumentos instituídos em lei. § 5º O controle das atividades financeiras e administrativas dos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas será realizado pelos seus órgãos internos, devendo os conselhos regionais prestar contas, anualmente, ao conselho federal da respectiva profissão. § 6º Os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, existentes até 10 de outubro de 1997, promoverão, no prazo de noventa dias contados a partir de 7 de novembro de 1997, a adaptação de seus estatutos e regimentos ao estabelecido neste artigo”.

[92] A exclusão da OAB deveu-se por estar a mesma disciplinada em ato próprio (Lei nº 8.906, de 1994) e, também, pelo fato de posteriormente ter sido acrescido ao 58 da MP impugnada o §9º (“o disposto neste artigo não se aplica à entidade de que trata a Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994”), parágrafo este que não foi objeto da ADI.

[93] “Art.79 (…). § 1º Aos servidores da OAB, sujeitos ao regime da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, é concedido o direito de opção pelo regime trabalhista, no prazo de noventa dias a partir da vigência desta lei, sendo assegurado aos optantes o pagamento de indenização, quando da aposentadoria, correspondente a cinco vezes o valor da última remuneração”.

[94] “Art. 79. Aos servidores da OAB, aplica-se o regime trabalhista”.

[95] Inicialmente editada em 1º de janeiro de 1995 sob o nº 813, a ADI foi ajuizada contra sua 36ª edição. Antes da MP nº 1.549, os Conselhos de Fiscalização do Exercício Profissional foram mencionados expressamente em suas leis criadoras e, ainda: a) no Decreto-lei nº 968, de 13 de outubro de 1969, que dispunha: “Art. 1º As entidades criadas por lei com atribuições de fiscalização do exercício de profissões liberais, que sejam mantidas com recurso, próprios e não recebam subvenções ou transferências à conta do orçamento da união regular-se-ão pela respectiva legislação específica, não se lhes aplicando as normas legais sôbre pessoal e demais disposições de caráter geral, relativas à administração interna das autarquias federais. Parágrafo único. As entidades de que trata êste artigo estão sujeitas à supervisão ministerial prevista nos artigos 19 e 26 do Decreto-lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967 restrita à verificação da efetiva realização dos correspondentes objetivos legais de interêsse público”; b) na Lei nº 6.838, de 29 de outubro de 1980, que dispunha sobre o prazo prescricional para a punibilidade de profissional liberal, pelos órgãos de fiscalização, por falta sujeita a processo disciplinar; c) na Lei nº 6.839, de 30 de outubro de 1980, que dispunha “sobre o registro de empresas nas entidades fiscalizadoras do exercício de profissões”; d) no Decreto-lei nº 2.299, de 21 de novembro de 1986, que expressamente revogou o parágrafo único do Decreto-Lei nº 968, de 1969; e) e na Lei nº 6.994, de 26 de maio de 1982, que dispunha “sobre a fixação do valor das anuidades e taxas devidas aos órgãos fiscalizadores do exercício profissional e dá outras providencias”.

[96] A MP dispunha sobre a organização da Presidência da República.

[97] Na 35ª edição a redação do artigo 58 e parágrafos era: “Art. 58. Os conselhos de fiscalização de profissões liberais, instituídos por lei, datados de personalidade jurídica de direito privado e forma federativa, prestam atividades de serviço público. § 1º A organização, e a estrutura e o funcionamento dos conselhos serão regulados mediante decisão da assembléia geral da respectiva categoria profissional, ficando vedados o estabelecimento de vínculo com a Administração Pública ou qualquer forma de intervenção por parte do Poder Público. § 2º Os empregados dos conselhos de fiscalização serão regidos pela legislação trabalhista. § 3º Constituirão receitas dos conselhos as contribuições anuais devidas por pessoas físicas ou jurídicas, fixadas pela assembléia geral, bem como multas, taxas e emolumentos estabelecidos em lei. § 4º O controle das atividades financeiras e administrativas dos conselhos será realizado exclusivamente pelos seus órgãos internos de controle. § 5º Os conselhos de fiscalização de profissões liberais, existentes até 10 de outubro de 1997, promoverão, no prazo de sessenta dias, a adaptação de seus estatutos e regimentos ao estabelecido neste artigo”.

[98] Trata-se de Mandado de Segurança impetrado pelo Conselho Federal de Odontologia (CFO) contra ato do Tribunal de Contas da União (TCU) e no qual se discutia a natureza jurídica dos Conselhos.

[99] Expôs-se igualmente que o artigo 58 e §§ decorreram de supostas pressões políticas exercidas por Presidentes de Conselhos Federais de Fiscalização do Exercício Profissional, que se reuniram e se autodenominaram “Conselhão”.

[100] ”A provisoriedade da norma fundada na possibilidade prevista no art.62 da Constituição decorre do seu prazo de validade estabelecido no parágrafo único do referido dispositivo constitucional e não em razão da incerteza quanto ao teor ou ao conteúdo da medida provisória, que por ter força de lei, exige a garantia da estabilidade jurídica, sob pena do país viver submetido a transtornos jurídicos causados pela imprecisão ou mau humor do Chefe do Poder Executivo” (fl.05 da peça inicial da ADI nº 1.717/DF).

[101] As referências processuais realizadas pelo autor seguiram dois critérios distintos: para as iniciais e manifestações e votos proferidos pelos Ministros fez-se menção à paginação contida no arquivo virtual obtido no sítio eletrônico oficial do Supremo Tribunal Federal. Já para as demais manifestações (PGR, AGU e aditamentos), fez-se referência ao número da página do processo físico. A distinção deveu-se ao fato de as manifestações dos Ministros estarem disponíveis para consulta, sendo facilitada a conferência dos trechos transcritos neste trabalho.

[102] “Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional, que, estando em recesso, será convocado extraordinariamente para se reunir no prazo de cinco dias. Parágrafo único. As medidas provisórias perderão eficácia, desde a edição, se não forem convertidas em lei no prazo de trinta dias, a partir de sua publicação, devendo o Congresso Nacional disciplinar as relações jurídicas delas decorrentes”.

[103] “Art. 21. Compete à União: XXIV - organizar, manter e executar a inspeção do trabalho”.

[104] “Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: XVI - organização do sistema nacional de emprego e condições para o exercício de profissões”.

[105] “Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas”.

[106] “Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder. Parágrafo único. Prestará contas qualquer pessoa física ou entidade pública que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária. Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete: II - julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público”.

[107] “Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo”.

[108] “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”.

[109] Como fundamento, na vestibular da ADI foi transcrito parecer do Ministério Público Federal (aprovado pelo Procurador-Geral da República, Dr.Aristides Junqueira Alvarenga) dantes apresentado nos autos do MS nº 21797/RJ: “(...). 4.5. Tem-se, portanto, como inequívoco, que a atividade de fiscalização do exercício profissional constitui função intrinsecamente ESTATAL e da natureza dessa função é que os agentes fiscalizadores extraem a sua autoridade, assim como, nela, as entidades corporativas encontram a sua ratio essendi. 4.6. Bem por isso, afigura-se, data venia, desarrazoado o pensamento de que os Conselhos - Federais ou Regionais - das entidades fiscalizadoras de exercício profissional sejam simplesmente conceituados como sendo constituídos por: '...um agrupamento de indivíduos que, em assembléia, elegem seus administradores sem nenhuma interferência governamental'. 4.7. Suponha-se - exclusivamente ad argumentandum - que assim fosse, antes do advento da Carta de 1988: de qualquer sorte, com a sua promulgação, nenhum sentido mais haveria, em atribuir-se às entidades fiscalizadoras de exercício profissional, esse feitio de agremiação privada, instituída por iniciativa e para o desfrute de seus associados. 4.8. De fato, sob a égide da Constituição Federal de 1988 - à luz da qual deve ser examinada a postulação do Impetrante -, parece inafastável a conclusão de que tais entes fiscalizadores exercem funções tipicamente PÚBLICAS e, por essa razão, regem-se pelas regras de Direito Público. 4.9. Já desde antes de 1988, entretanto, as entidades de fiscalização do exercício profissional - a despeito de suas características sui generis - integravam a Administração Pública" (fls.13 e 14 da peça inicial da ADI nº 1.717/DF).

[110] Quando do julgamento da Representação nº 1169/DF (Rel.Min.Soares Munoz, DJ de 06/09/84, Ementário nº 13.48-1), o STF decidiu serem os Conselhos e Ordens “autarquias corporativas mantidas por contribuições instituídas pela União e cobradas dos respectivos profissionais”.

[111] Fl.17 da peça inicial da ADI nº 1.717/DF.

[112] “§6º Os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, por constituírem serviço público, gozam de imunidade tributária total em relação aos seus bens, rendas e serviços. (…). §8º Compete à Justiça Federal a apreciação das controvérsias que envolvam os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, quando no exercício dos serviços a eles delegados, conforme disposto no caput”.

[113] Fl.124 dos autos da ADI nº 1.717/DF.

[114] Por ter sido formulado pedido liminar, observou-se o rito do artigo 10 da Lei nº 9.868, de 10 de novembro de 1999, que dispõe: “Art. 10. Salvo no período de recesso, a medida cautelar na ação direta será concedida por decisão da maioria absoluta dos membros do Tribunal, observado o disposto no art. 22, após a audiência dos órgãos ou autoridades dos quais emanou a lei ou ato normativo impugnado, que deverão pronunciar-se no prazo de cinco dias. § 1º O relator, julgando indispensável, ouvirá o Advogado-Geral da União e o Procurador-Geral da República, no prazo de três dias. § 2º No julgamento do pedido de medida cautelar, será facultada sustentação oral aos representantes judiciais do requerente e das autoridades ou órgãos responsáveis pela expedição do ato, na forma estabelecida no Regimento do Tribunal. § 3º Em caso de excepcional urgência, o Tribunal poderá deferir a medida cautelar sem a audiência dos órgãos ou das autoridades das quais emanou a lei ou o ato normativo impugnado”. No caso, porém, não se abriu prazo para manifestação da AGU e da PGR.

[115] Quando do julgamento da Medida Cautelar o STF era composto pelos Ministros Carlos Velloso (Presidente), Moreira Alves, Néri da Silveira, Sydney Sanches, Octavio Gallotti, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Marco Aurélio, Ilmar Galvão, Nelson Jobim e Maurcío Corrêa.

[116] A prejudicialidade fundamentou-se na modificação implementada no caput do artigo 39 da CRFB/1988 pela EC nº 19/1998 e que pusera fim ao regime jurídico único, não havendo, portanto, espaço para manifestação quanto à inconstitucionalidade do regime celetista imposto pelo §3º, artigo 58, aos empregados dos Conselhos.

[117] O artigo 58 e parágrafos da Lei nº 9.649, de 1998, resultado da conversão da MP nº 1.651-43, de 1998, e que também foram objeto de aditamento (ressalvado o §9º, que não teve sua constitucionalidade analisada), dispunham: “Art. 58. Os serviços de fiscalização de profissões regulamentadas serão exercidos em caráter privado, por delegação do poder público, mediante autorização legislativa. § 1º A organização, a estrutura e o funcionamento dos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas serão disciplinados mediante decisão do plenário do conselho federal da respectiva profissão, garantindo-se que na composição deste estejam representados todos seus conselhos regionais. § 2º Os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, dotados de personalidade jurídica de direito privado, não manterão com os órgãos da Administração Pública qualquer vínculo funcional ou hierárquico. § 3º Os empregados dos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas são regidos pela legislação trabalhista, sendo vedada qualquer forma de transposição, transferência ou deslocamento para o quadro da Administração Pública direta ou indireta. § 4º Os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas são autorizados a fixar, cobrar e executar as contribuições anuais devidas por pessoas físicas e jurídicas, bem como preços de serviços e multas, que constituirão receitas próprias, considerando-se título executivo extrajudicial a certidão relativa aos créditos decorrentes. § 5º O controle das atividades financeiras e administrativas dos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas será realizado pelos seus órgãos internos, devendo os conselhos regionais prestar contas, anualmente, ao conselho federal da respectiva profissão, e estes aos conselhos regionais. § 6º Os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, por constituírem serviço público, gozam de imunidade tributária total em relação aos seus bens, rendas e serviços. § 7º Os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas promoverão, até 30 de junho de 1998, a adaptação de seus estatutos e regimentos ao estabelecido neste artigo. § 8º Compete à Justiça Federal a apreciação das controvérsias que envolvam os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, quando no exercício dos serviços a eles delegados, conforme disposto no caput.§ 9º O disposto neste artigo não se aplica à entidade de que trata a Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994”.

[118] “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer; Art. 21. Compete à União: XXIV - organizar, manter e executar a inspeção do trabalho; Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: XVI - organização do sistema nacional de emprego e condições para o exercício de profissões; Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder. Parágrafo único. Prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária.(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo. Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos”.

[119] Fl.36 do Acórdão proferido na ADI nº 1.717MC/DF.

[120] “Quanto ao requisito do periculum in mora, também me parece presente, no caso, pois a ruptura do sistema atual e a implantação do novo, trazido pela Lei impugnada, pode acarretar graves transtornos à Administração Pública e ao próprio exercício das profissões regulamentadas, em face do ordenamento constitucional em vigor” (fl.39 do Acórdão proferido na ADI nº 1.717MC/DF).

[121] “Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público. § 1º - Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário. § 2º - Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro. § 3º - O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de seis meses”.

[122] Fl.45 do Acórdão proferido na ADI nº 1.717MC/DF.

[123] “(...), no direito positivo temos exemplos marcantes do exercício do serviço público de fiscalização de profissão por delegação, como é o caso da Ordem dos Advogados do Brasil, sem que se tenha concluído pela inconstitucionalidade desta delegação. Neste sentido a Lei nº 4.215, de 27.04.63 (antigo Estatuto da OAB), que lhe atribuía personalidade jurídica (artigo 1º) e determinava que 'não se aplicam à Ordem as disposições legais referentes às autarquias ou entidades paraestatais' (artigo 139, § 1º). Ainda neste sentido, pode ser lembrada a Lei nº 8.906, de 04.07.94 (atual Estatuto da Advocacia), quando lhe atribui 'personalidade jurídica e forma federativa' e lhe outorga competência, por delegação legislativa, para 'a disciplina dos advogados' (artigo 44, e inciso II), ressalvando que 'a OAB não mantém com órgãos da Administração Pública qualquer vínculo funcional ou hierárquico' (artigo 44, §1º)” (fls.45 e 46 do Acórdão proferido na ADI nº 1.717MC/DF).

[124] “Neste ponto é importante verificar a correspondência entre o artigo 58 impugnado e diversas disposições do atual Estatuto da Advocacia (Lei nº 8.906/94): o §1º eqüivale ao artigo 53, caput, quanto à estrutura e ao funcionamento, e ao artigo 45, caput, e §§ 1º, 2º e 3º, quanto à organização; o §2º ao artigo 44, §1º; o §3º ao artigo 79; o §4º ao artigo 46 e seu parágrafo único; o §5º aos artigo 54, XI e XII, e 58, IV, com mecanismo equivalente; o §6º ao artigo 45, §5º; o §7º, que trás disposição transitória, foi constitucionalizado no artigo 26 da Emenda Constitucional nº 19/98; o §8º, que fixa a competência da justiça federal, com aparente suporte no artigo 109, I, da Constituição, por se tratar de serviço público federal, e na jurisprudência do STJ (Conflito de Competência nº 869-SC); e, finalmente, o §9º, que ressalva, precisamente, que as normas impugnadas não são aplicáveis à OAB” (fls.46 e 47 do Acórdão proferido na ADI nº 1.717MC/DF).

[125] “Art. 26. No prazo de dois anos da promulgação desta Emenda, as entidades da administração indireta terão seus estatutos revistos quanto à respectiva natureza jurídica, tendo em conta a finalidade e as competências efetivamente executadas”.

[126] Fl.50 do Acórdão proferido na ADI nº 1.717MC/DF.

[127] Nada obstante a referida assertiva, certo é que o Decreto nº 19.408, de 1930 (que criou a Ordem dos Advogados) era omisso quanto à vinculação da OAB à Administração Pública. Por outro lado, embora o artigo 139 da Lei nº 4.215, de 1963, expressamente determinasse a não aplicação, à Ordem, das disposições legais relativas às autarquias ou entidades paraestatais, tal fato não impediu, como acima exposto, que o STF, quando do julgamento do RE nº 55.456/PE, equiparasse a OAB aos demais Conselhos e Ordens. Somente em 1994, com a Lei nº 8.906, é que houve dispositivo que, expressamente, afastava a Ordem dos Advogados do Brasil da estrutura da Administração Pública: “Art. 44. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), serviço público, dotada de personalidade jurídica e forma federativa, tem por finalidade: (…). § 1º A OAB não mantém com órgãos da Administração Pública qualquer vínculo funcional ou hierárquico”.

[128] Carlos Velloso, Moreira Alves, Néri da Silveira, Octavio Gallotti, Celso de Mello, Marco Aurélio e Ilmar Galvão.

[129] Publicada no Diário de Justiça de 25 de fevereiro de 2000, pp-00050, Ementário Vol-01980-01, pp-00063.

[130] Lei nº 9.868, de 1999. “Art. 11. Concedida a medida cautelar, o Supremo Tribunal Federal fará publicar em seção especial do Diário Oficial da União e do Diário da Justiça da União a parte dispositiva da decisão, no prazo de dez dias, devendo solicitar as informações à autoridade da qual tiver emanado o ato, observando-se, no que couber, o procedimento estabelecido na Seção I deste Capítulo”.

[131] Lei nº 9.868, de 1999: “Art. 8º Decorrido o prazo das informações, serão ouvidos, sucessivamente, o Advogado-Geral da União e o Procurador-Geral da República, que deverão manifestar-se, cada qual, no prazo de quinze dias”.

[132] Fl.224 dos autos da ADI nº 1.717/DF.

[133] À oportunidade o AGU transcreveu a seguinte definição dada por Hely Lopes Meirelles: “Os Entes de Cooperação são pessoas de Direito Privado, criados ou autorizados por lei, geridos em conformidade com seus estatutos, geralmente aprovados por decreto, podendo ser subvencionados pela União ou arrecadar em seu favor contribuições parafiscais para prestar serviço de interesse social ou de utilidade pública, sem, entretanto, figurarem entre os órgãos da Administração direta ou entre as entidades da indireta. Realmente, os Entes de Cooperação, na sistemática da Lei da Reforma, não se enquadram entre os órgãos integrados na Administração direta nem entre as entidades compreendidas na Administração indireta (autarquias, empresas públicas e sociedades de economia mista, exclusivamente). Todavia, existem, e em grande número, na Administração Federal, cooperando com o Governo na realização de atividades técnicas, científicas, educacionais, assistenciais e outras que refogem dos misteres burocráticos as repartições estatais centralizadas. Daí por que preferimos agrupá-los sob a denominação genérica de Entes de Cooperação. Exemplo típico de Entes de Cooperação encontramos nos Serviços Sociais Autônomos (…) e nas entidades disciplinadoras das profissões liberais (Ordens e Conselhos Profissionais), a que se refere o Dec.-lei 968, de 13.10.69” (fls.227 e 228 dos autos da ADI nº 1.717/DF). Hodiernamente a obra “Direito Administrativo Brasileiro”, de Hely Lopes Meirelles, traz o seguinte conceito para os entes de cooperação: “Pode-se dizer, hoje, que os entes de cooperação são as verdadeiras entidades paraestatais, como o Autor as conceituava: pessoas jurídicas de Direito Privado dispostas paralelamente ao Estado, ao lado do Estado, para executar cometimentos de interesse do Estado, mas não privativos do Estado. Entre as espécies de entes de cooperação – que podem ser compreendidas na expressão entidade paraestatal – estão os serviços sociais autônomos, já existentes há muito tempo, e as organizações sociais, figura jurídica recentemente criada pela Lei 9.637, de 15.5.98.” (MEIRELLES, 2007, p. 382).

[134] Fl.228 dos autos da ADI nº 1.717/DF.

[135] Segundo a AGU, além de o próprio Decreto-lei nº 200, de 1967, não trazer a personalidade jurídica pública como requisito das autarquias (Art.4° A Administração Federal compreende: II - A Administração Indireta, que compreende as seguintes categorias de entidades, dotadas de personalidade jurídica própria: a) Autarquias; Art. 5º Para os fins desta lei, considera-se: I - Autarquia - o serviço autônomo, criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da Administração Pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada), a Carta de 1967 subordinava ao regime privado, além das empresas públicas e sociedades de economia mista, as autarquias.

[136] Fl.229 dos autos da ADI nº 1.717/DF.

[137] “Art. 5° A jurisdição do Tribunal abrange: V - os responsáveis por entidades dotadas de personalidade jurídica de direito privado que recebam contribuições parafiscais e prestem serviço de interesse público ou social”.

[138] Fl.237 dos autos da ADI nº 1.717/DF.

[139] “Art. 119. Sujeito ativo da obrigação é a pessoa jurídica de direito público, titular da competência para exigir o seu cumprimento”.

[140] Lei nº 9.868 de 1999: “Art. 9º Vencidos os prazos do artigo anterior, o relator lançará o relatório, com cópia a todos os Ministros, e pedirá dia para julgamento. § 1º Em caso de necessidade de esclarecimento de matéria ou circunstância de fato ou de notória insuficiência das informações existentes nos autos, poderá o relator requisitar informações adicionais, designar perito ou comissão de peritos para que emita parecer sobre a questão, ou fixar data para, em audiência pública, ouvir depoimentos de pessoas com experiência e autoridade na matéria. § 2º O relator poderá, ainda, solicitar informações aos Tribunais Superiores, aos Tribunais federais e aos Tribunais estaduais acerca da aplicação da norma impugnada no âmbito de sua jurisdição. § 3º As informações, perícias e audiências a que se referem os parágrafos anteriores serão realizadas no prazo de trinta dias, contado da solicitação do relator”.

[141] Quando do julgamento do mérito, integravam o STF os seguintes Ministros: Marco Aurélio (Presidente), Moreira Alves, Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso, Ilmar Galvão, Maurício Corrêa, Nelson Jobim, Ellen Gracie (sucessora de Octávio Gallotti) e Gilmar Mendes (sucessor de Néri da Silveira).

[142] Fls.08 a 14 do Acórdão proferido na ADI nº 1.717/DF.

[143] Os Ministros Nelson Jobim e Gilmar Mendes não votaram, aquele por não estar presente e esse por impedimento.

[144] Fl.15 do Acórdão proferido na ADI nº 1.717/DF.

[145] Publicada no Diário de Justiça de 28 de março de 2003, pp-00061, Ementário Vol-02104-01, pp-00149.

[146] “Art.79 (…). § 1º Aos servidores da OAB, sujeitos ao regime da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, é concedido o direito de opção pelo regime trabalhista, no prazo de noventa dias a partir da vigência desta lei, sendo assegurado aos optantes o pagamento de indenização, quando da aposentadoria, correspondente a cinco vezes o valor da última remuneração”.

[147] “Art. 79. Aos servidores da OAB, aplica-se o regime trabalhista”.

[148] Fl.02 da peça inicial da ADI nº 3.026/DF.

[149] “Art. 44. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), serviço público, dotada de personalidade jurídica e forma federativa, tem por finalidade: I - defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas; II - promover, com exclusividade, a representação, a defesa, a seleção e a disciplina dos advogados em toda a República Federativa do Brasil. § 1º A OAB não mantém com órgãos da Administração Pública qualquer vínculo funcional ou hierárquico. § 2º O uso da sigla OAB é privativo da Ordem dos Advogados do Brasil”.

[150] Fls.05 e 06 da inicial da ADI nº 3.026/DF.

[151] “Art. 12. Havendo pedido de medida cautelar, o relator, em face da relevância da matéria e de seu especial significado para a ordem social e a segurança jurídica, poderá, após a prestação das informações, no prazo de dez dias, e a manifestação do Advogado-Geral da União e do Procurador-Geral da República, sucessivamente, no prazo de cinco dias, submeter o processo diretamente ao Tribunal, que terá a faculdade de julgar definitivamente a ação”.

[152] Fl.89 dos autos da ADI nº 3.026/DF.

[153] Fl.92 dos autos da ADI nº 3.026/DF.

[154] O Parecer do PGR (de nº 1.524/CF) recebeu a seguinte Ementa: “Inconstitucionalidade do §1º do art.79 da Lei nº 8.906/94, violação do princípio da moralidade administrativa, art.37, caput da Constituição Federal. Ordem dos Advogados do Brasil, natureza de autarquia especial. Interpretação conforme o art.37, II da Carta da República para deixar explícito que os servidores da OAB, mesmo que contratados sob o regime trabalhista, devem se submeter a prévio concurso público. Parecer pela procedência da ação” (fl.101 dos autos da ADI nº 3.026/DF).

[155] Fl.103 dos autos da ADI nº 3.026/DF.

[156] Compunham o STF na 1ª Sessão os Ministros Nelson Jobim (Presidente), Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio, Ellen Gracie, Gilmar Mendes, Cezar Peluso, Carlos Ayres Britto, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Já na 2ª Sessão, o STF era integrado pelos Ministros Ellen Gracie (Presidente), Nelson Jobim, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Marco Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Ayres Britto, Joaquim Barbosa, Eros Grau, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski (sucessor de Carlos Velloso).

[157] Art.37 (…): XIX - somente por lei específica poderá ser criada autarquia e autorizada a instituição de empresa pública, de sociedade de economia mista e de fundação, cabendo à lei complementar, neste último caso, definir as áreas de sua atuação; XX - depende de autorização legislativa, em cada caso, a criação de subsidiárias das entidades mencionadas no inciso anterior, assim como a participação de qualquer delas em empresa privada.

[158] “Na realização de sua tarefa, e no exercício de seus poderes, a Ordem não está subordinada senão à lei. Não se colocou na dependência hierárquica de qualquer outro órgão ou entidade. Não conhece ela qualquer outra forma de 'contrôle', senão o jurisdicional, que pertence à justiça ordinária, na sua missão de preservar inviolável o 'rule of law', assegurado na maior amplitude pela Constituição - art.141, §4º. De outro lado, garantido-lhe plena independência e íntegro auto-govêrno, todos os órgãos de direção da Ordem são eleitos pelos membros da corporação (arts.65, §1º, 83, parágrafo único, 84 e 88 do regulamento). [...]. Entre nós, as autarquias existentes tem finalidades acentuadamente econômica; destinam-se, salvo raras exceções, ao desempenho de serviços de natureza industrial ou comercial, ou atender à previdência social, através de organismos que operam também como verdadeiros bancos de investimentos. O patrimônio delas é um patrimônio público; os seus serviços são mantidos, pelo menos parcialmente, com recursos fornecidos pelo Tesouro Público; os membros da sua diretoria, senão todos, os que nela tem maior autoridade, são nomeados pelo poder executivo. Nada disso se verifica com a Ordem. Não lhe foi atribuída a gestão de qualquer parcela do patrimônio público, que se houvesse destacado do patrimônio geral da União. Não recebe qualquer ajuda, auxílio ou subvenção do Tesouro Nacional; custeia os seus serviços exclusivamente com a modesta contribuição pecuniária dos inscritos nos seus quadros. Todos os seus órgãos de direção são eleitos pelos advogados; e os seus componentes desempenham os seus deveres, sem remuneração de qualquer espécie. Não tem a Ordem nenhum objetivo econômico: executa apenas tarefa de natureza ética, cultural e profissional, como a de zelar pelo exercício probo e eficiente da advocacia. Qual a razão, pois, qual a vantagem de se enquadrar a nossa corporação (a que sem dúvida atribuíram largos poderes, a fim de que cabalmente se desincumbisse dos seus encargos) na mesma chave ou esquema das autarquias administrativas, para submeter ao mesmo regime comum, entidades tão diversas, sob múltiplos aspectos? O que cumpre fazer é, pois, ampliar as nomenclaturas de classificação, estabelecer distinções legítimas, apoiadas em dados indesconhecíveis da realidade. Se a Ordem é, assim, uma entidade 'sui generis', porque assim a criou o legislador (como de igual modo procedeu em outros casos), nada mais resta senão fugir das esquematizações sumárias, que falseiam a situação real. [...].Creio ser análoga a situação da nossa Ordem: corporação investida de funções e poderes públicos, reclamando um nomen iuris, adequado ao seu regime peculiar. Pouco importa, a nomenclatura, a etiqueta, desde que esta não lhe desnature a índole ou lhe altere a substância. [...]. A posição da Ordem, o papel que lhe foi destinado, a autoridade de que se reveste, as responsabilidades que lhe incumbem, não se coadunam, porém,com qualquer forma de tutela administrativa. A sua independência lhe é essencial, não só à dignidade da instituição, como a própria eficiência de sua atividade peculiar. A independência da Ordem protege a independência do advogado; e sem esta a profissão decai de sua grandeza e de sua utilidade social” (fls.07 a 09 do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF).

[159] Fls.11 e 12 do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF.

[160] Fl.45 do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF.

[161] A referida conclusão é retirada do seguinte debate travado entre Joaquim Barbosa e Carlos Ayres Britto e contida às fls.89 e ss. do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF: “O SENHOR MINISTRO JOAQUIM BARBOSA – Ministro Carlos Britto, em que a OAB se distingue dos demais conselhos fiscalizadores de profissões? (…).Qual a distinção essencial entre a OAB e esses conselhos? O SR.MINISTRO CARLOS BRITTO – Basta lembrar que a Constituição não fala de nenhum outro conselho nenhuma vez, em nenhuma outra oportunidade. Da OAB a Constituição fala numerosas vezes. O SENHOR MINISTRO JOAQUIM BARBOSA – Daí podemos tirar a conclusão de que a OAB tem direito a um status de privilégio?” (grifos no original).

[162] Fls.54 e 55 do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF.

[163] Fl.53 do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF.

[164] Fl.107 do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF.

[165] Fl.108 do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF.

[166] Fl.60 do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF.

[167] A Ementa do julgado recebeu a seguinte reação: “Ação direta de inconstitucionalidade. Lei nº 5.607, de 31 de maio de 1990, do Estado de Mato Grosso que atribui em favor da OAB, Seção daquele Estado, parcela de custas processuais. - Exercendo a OAB, federal ou estadual, serviço público, por se tratar de pessoa jurídica de direito público (autarquia), e serviço esse que está ligado à prestação jurisdicional pela fiscalização da profissão de advogado que, segundo a parte inicial do artigo 133 da Constituição, é indispensável à administração da justiça, não tem relevância, de plano, a fundamentação jurídica da argüição de inconstitucionalidade da lei em causa no sentido de que o serviço por ela prestado não se vincula à prestação jurisdicional, desvirtuando-se, assim, a finalidade das custas judiciais, como taxa que são. - Ausência, também, do periculum in mora ou da conveniência em suspender-se, liminarmente, a eficácia dessa Lei estadual. Pedido de liminar indeferido” (ADI 1.707MC/MT, Relator Min. MOREIRA ALVES, Tribunal Pleno, julgado em 01/07/1998, publicado no Diário da Justiça de 16 de novembro de 1998, pp-00006, Ementário Vol-01927-01, pp-00043).

[168] Fl.62 do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF.

[169] Fl.62 do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF.

[170] Fl.63 do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF.

[171] Fls.64 e 65 do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF.

[172] Fl.67 do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF.

[173] Fl.67 do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF.

[174] Fls.69 e 70 do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF.

[175] “Sem o compromisso de detalhar e desenvolver toda a discussão teórica envolvida nos public function cases, deve-s enfatizar que a jurisprudência da Suprema Corte pauta-se pela tentativa, ainda não realizada em sua plenitude, de distinguir funções essencialmente públicas daquelas meramente privadas” (Fl.71 do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF).

[176] “Destarte, a partir da caracterização do status público da atuação institucional de ator privado, seria possível que o próprio exercício dessa função fosse diretamente submetido aos limites da Constituição” (Fl.71 do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF).

[177] Fl.75 do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF.

[178] Fl.86 do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF.

[179] Fls.108 e 109 do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF).

[180] Fls.96 e 97 do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF.

[181] Fl.117 do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF.

[182] Fl.118 do Acórdão proferido na ADI nº 3.026/DF.

[183] Embora conste no extrato da Ata das Sessões dos dias 23/02/2005 e 08/06/2006 a presença do Ministro Celso de Mello, não há registro, quer em voto, quer em notas taquigráficas, de seu posicionamento quanto ao mérito. O extrato final da Ata traz: “Decisão: O Tribunal, por maioria, vencidos os Senhores Eros Grau (Relator), Carlos Britto, Celso de Mello, Sepúlveda Pertence e o Presidente, conheceu do pedido relativamente ao caput do artigo 79 da Lei nº 8.906/94. Prosseguindo no julgamento, após os votos dos Senhores Ministros Relator, Carlos Britto e Cesar Peluso, que negavam a interpretação conforme a Constituição, no artigo 79, por entender não exigível o concurso público, e do voto do Senhor Ministro Joaquim Barbosa, que entendia exigir concurso público, pediu vista dos autos o Senhor ministro Gilmar Mendes. Falou pelo interessado, amicus curiae, o Dr.Luiz Carlos Lopes Madeira. Presidência do Senhor Ministro Nelson Jobim. Plenário, 23.02.2005. Decisão: renovado o pedido de vista do Senhor Ministro Gilmar Mendes, justificadamente, nos termos do §1º do artigo 1º da Resolução nº 278, de 15 de dezembro de 2003. Presidência do Senhor Ministro Nelson Jobim. Plenário, 08.06.2005. Decisão: O Tribunal, por maioria, julgou improcedente o pedido, vencidos, parcialmente, os Senhores Ministros Joaquim Barbosa e Gilmar Mendes, que o julgavam procedente com relação ao caput do artigo 79, ao qual davam interpretação conforme de modo apenas a excetuarem-se, da regra do concurso público, cargos de chefia e assessoramento, isso com efeito ex nunc. Votou a Presidente, Ministra Ellen Gracie. O relator retificou parcialmente o voto proferido anteriormente. Plenário, 08.06.2006. Presidência da Senhora Ministra Ellen Gracie. Presentes à sessão os Senhores Ministros Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Cezar Peluso, Carlos Britto, Joaquim Barbosa, Eros grau e Ricardo Lewandowski. Vice-Procurador-Geral da República, Dr.Roberto Monteiro Gurgel Santos”.

[184] Publicada no Diário de Justiça de 29 de setembro de 2006, pp-00031, Ementário Vol-02249-03, pp-00478.

[185] “Juridicamente esta caracterização consiste, no Direito Administrativo, segundo nosso modo de ver, na atribuição de uma disciplina normativa peculiar que, fundamentalmente, se delineia em função da consagração de dois princípios: a) supremacia do interesse público sobre o privado; b) indisponibilidade, pela Administração, dos interesses públicos. Interessam-nos, aqui, repita-se, estes aspectos, porque pertinentes ao regime público especificamente administrativo. Concernem à função estatal, exercitada tanto através do corpo de órgãos não personalizados que compõem a chamada Administração em sentido orgânico – coincidindo grosso modo com os órgãos do Poder Executivo – quanto através das pessoas públicas exclusivamente administrativas, designadas na técnica do Direito italiano e brasileiro como 'autarquias'” (MELLO, 2005, p. 45).

[186] “Art. 17. Fica criada a Ordem dos Advogados Brasileiros, orgão de disciplina e seleção da classe dos advogados, que se regerá pêlos estatutos que forem votados pelo Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros, com a colaboração dos Institutos dos Estados, e aprovados pelo Governo”.

[187] Presentes, pois, os elementos descritos no artigo 78 do Código Tributário Nacional para conceituação de poder de polícia: “Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos. (Redação dada pelo Ato Complementar nº 31, de 28.12.1966) Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder”.

[188] "Em síntese, exceto dois tipos de atividades - o exercício do poder de polícia e a distribuição da justiça que, regra geral, são serviços públicos indelegáveis sob pena de falência virtual do Estado, outras atividades - instrução, educação, transporte, telecomunicação - tanto podem ser desempenhadas pela Administração direta, que, para isso, utilizará o próprio pessoal do quadro, das repartições governamentais (Ministérios, Secretarias), como podem ser prestados pelas entidades da Administração indireta - pessoas jurídicas governamentais ou particulares -, cada uma das quais com peculiar regime jurídico, como ainda, por fim, pelo próprio cidadão".

[189] “Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios: I - ingresso na carreira, cujo cargo inicial será o de juiz substituto, mediante concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as fases, exigindo-se do bacharel em direito, no mínimo, três anos de atividade jurídica e obedecendo-se, nas nomeações, à ordem de classificação; Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: § 3º O ingresso na carreira do Ministério Público far-se-á mediante concurso público de provas e títulos, assegurada a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em sua realização, exigindo-se do bacharel em direito, no mínimo, três anos de atividade jurídica e observando-se, nas nomeações, a ordem de classificação. Art. 132. Os Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, organizados em carreira, na qual o ingresso dependerá de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, exercerão a representação judicial e a consultoria jurídica das respectivas unidades federadas. Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade: VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; Art. 103-B. O Conselho Nacional de Justiça compõe-se de quinze membros com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e seis anos de idade, com mandato de dois anos, admitida uma recondução, sendo: XII - dois advogados, indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; Art. 130-A. O Conselho Nacional do Ministério Público compõe-se de quatorze membros nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal, para um mandato de dois anos, admitida uma recondução, sendo: § 4º O Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil oficiará junto ao Conselho”.

[190] Dispunha a Carta de 1934 em seu artigo 104 e no artigo 11 de suas Disposições Transitórias: “Art 104 - Compete aos Estados legislar sobre a sua divisão e organização judiciárias e prover os respectivos cargos, observados os preceitos dos arts. 64 a 72 da Constituição, mesmo quanto à requisição de força federal, ainda os princípios seguintes: § 6º - Na composição dos Tribunais superiores serão reservados lugares, correspondentes a um quinto do número total, para que sejam preenchidos por advogados, ou membros do Ministério Público de notório merecimento e reputação ilibada, escolhidos de lista tríplice, organizada na forma do § 3º. DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS Art 11 - O Governo, uma vez promulgada esta Constituição, nomeará uma comissão de três juristas, sendo dois ministros da Corte Suprema e um advogado, para, ouvidas as Congregações das Faculdades de Direito, as Cortes de Apelações dos Estados e os Institutos de Advogados, organizar dentro em três meses um projeto de Código de Processo Civil e Comercial; e outra para elaborar um projeto de Código de Processo Penal”. A Constituição de 1937, por sua vez, previa: “Art 105 - Na composição dos Tribunais superiores, um quinto dos lugares será preenchido por advogados ou membros do Ministério Público, de notório merecimento e reputação ilibada, organizando o Tribunal de Apelação uma lista tríplice”. Já a Carta de 1946 dispunha: “Art 103 - O Tribunal Federal de Recursos, com sede na Capital federal compor-se-á de nove Juízes, nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pelo Senado Federal, sendo dois terços entre magistrados e um terço entre advogados e membros do Ministério Público, com os requisitos do art. 99. Art 124 - Os Estados organizarão a sua Justiça, com observância dos arts. 95 a 97 e também dos seguintes princípios: III - o ingresso na magistratura vitalícia, dependerá de concurso de provas, organizado pelo Tribunal de Justiça com a colaboração do Conselho Secional da Ordem dos Advogados; do Brasil, e far-se-á a indicação dos candidatos, sempre que for possível, em lista tríplice; V - na composição de qualquer Tribunal, um quinto dos lugares será preenchido por advogados e membros do Ministério Público, de notório merecimento e reputação ilibada, com dez anos, pelo menos, de prática forense. Para cada vaga, o Tribunal, em sessão e escrutínio secretos, votará lista tríplice. Escolhido um membro do Ministério Público, a vaga seguinte será preenchida por advogado”. Os Textos de 1967 e de 1969, finalmente, asseguravam, respectivamente: ”Art 116 - O Tribunal Federal de Recursos compõe-se de treze Ministros vitalícios nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pelo Senado Federal, sendo oito entre magistrados e cinco entre advogados e membros do Ministério Público, todos com os requisitos do art. 113, § 1º. Art 124 - O Tribunal Superior Eleitoral, com sede na Capital da União compor-se-á: II - por nomeação do Presidente da República, de dois entre seis advogados de notável saber jurídico e idoneidade moral, indicados pelo Supremo Tribunal Federal. Art 133 - Os órgãos da Justiça do Trabalho são os seguintes: § 1 º - O Tribunal Superior do Trabalho compor-se-á de dezessete Juízes com a denominação de Ministros, sendo: a) onze togados e vitalícios, nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pelo Senado Federal: sete entre magistrados da Justiça do Trabalho, dois entre advogados no efetivo exercício da profissão; e dois entre membros do Ministério Público da Justiça do Trabalho, todos com os requisitos do art. 113, § 1º; § 5 º - Os Tribunais Regionais do Trabalho serão compostos de dois terços de Juízes togados vitalícios e um terço de Juízes classistas temporários, assegurada, entre os Juízes togados, a participação de advogados e membros do Ministério Público da Justiça do Trabalho, nas proporções estabelecidas na aliena a do § 1º. Art 136 - Os Estados organizarão a sua Justiça, observados os arts. 108 a 112 desta Constituição e os dispositivos seguintes: I - o ingresso na magistratura de carreira dar-se-á mediante concurso de provas e de títulos, realizado pelo Tribunal de Justiça, com participação do Conselho Secional da Ordem dos Advogados do Brasil respectivamente, por advogados ou membros do Ministério Público, indicadas em lista tríplice”. “Art. 121 - O Tribunal Federal de Recursos compõe-se de vinte e sete Ministros vitalícios, nomeados pelo Presidente da República, sendo quinze dentre juízes federais, indicados em lista tríplice pelo próprio Tribunal; quatro dentre membros do Ministério Público Federal; quatro dentre advogados que satisfaçam os requisitos do parágrafo único do art. 118; e quatro dentre magistrados ou membros do Ministério Público dos Estado, do Distrito Federal e dos Territórios. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 16, de 1980) Art. 131. O Tribunal Superior Eleitoral, com sede na Capital da União, compor-se-á: II - por nomeação do Presidente da República, de dois entre seis advogados de notável saber jurídico e idoneidade moral, indicados pelo Supremo Tribunal Federal. Art. 141. Os órgãos da Justiça do Trabalho são os seguintes: § 1º O Tribunal Superior do Trabalho compor-se-á de dezessete juízes com a denominação de ministros, sendo: a) onze togados e vitalícios, nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pelo Senado Federal; sete entre magistrados da Justiça do Trabalho; dois entre advogados no efetivo exercício da profissão; e dois entre membros do Ministério Público da Justiça do Trabalho, que satisfaçam os requisitos do parágrafo único do artigo 118; e § 5º Os Tribunais Regionais do Trabalho serão compostos de dois terços de juízes togados vitalícios e um têrço de juízes classistas temporários, assegurada, entre os juízes togados, a participação de advogados e membros do Ministério Público da Justiça do Trabalho, nas proporções estabelecidas na alínea a do § 1º. Art. 144. Os Estados organização a sua justiça, observados os artigos 113 a 117 desta Constituição, a Lei Orgânica da Magistratura Nacional e os dispositivos seguintes: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 7, de 1977) I - o ingresso na magistratura de carreira dar-se-á mediante concurso público de provas e títulos, realizado pelo Tribunal de Justiça, com a participação do Conselho Secional da Ordem dos Advogados do Brasil, podendo a lei exigir dos candidatos prova de habilitação em curso de preparação para a magistratura; a indicação dos candidatos far-se-á, sempre que possível, em lista tríplice; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 7, de 1977) IV - na composição de qualquer Tribunal, um quinto dos lugares será preenchido por advogados, em efetivo exercício da profissão, e membros do Ministério Público, todos de notório merecimento e idoneidade moral, com dez anos, pelo menos, de prática forense Os lugares reservados a membros do Ministério Público ou advogados serão preenchidos, respectivamente, por membros do Ministério Público ou advogados, indicados em lista tríplice, (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 7, de 1977) Art. 202. Os Estados adaptarão sua organização judiciária aos preceitos estabelecidos nesta Constituição e na Lei Orgânica da Magistratura Nacional, dentro de seus meses contados a partir da vigência desta última, ficando extintos os cargos de juiz substituto de segunda instância, qualquer que seja sua denominação. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 7, de 1977) § 2º No Estado do Rio de Janeiro, a critério do Governador, poderão ser previamente aproveitados os atuais desembargadores em disponibilidade, observada sempre, quanto ao quinto reservado a advogados e membros do Ministério Público, a condição com que ingressaram no Tribunal de Justiça. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 7, de 1977)”.

[191] “Art. 18. Compete ao Conselho Federal: I - defender a ordem jurídica e a Constituição da República, pugnar pela boa aplicação das leis e pela rápida administração da justiça e contribuir para o aperfeiçoamento das instituições jurídicas (art. 145). II - colaborar com os Podêres Judiciário, Legislativo e Executivo no estudo dos problemas da profissão de advogado seu exercício, propondo as medidas adequadas à sua solução; Art. 20. À Seção incumbe exercer, no território respectivo, as funções e atribuições da Ordem dos Advogados do Brasil. Art. 139. A Ordem dos Advogados do Brasil constitui serviço público federal, gozando os seus bens, rendas e serviços de imunidade tributária total (art. 31. inciso V, letra a da Constituição Fedaral), e tendo êstes franquia postal e telegráfica. § 1º Não se aplicam à Ordem as disposições legais referentes às autarquias ou entidades paraestatais”.

[192] Da Sessão participaram, além do Relator, os Ministros Vilas Boas e Adalício Nogueira. O julgado, por sua vez, recebeu a seguinte Ementa: “Conselho Regional de Contabilidade. Seu caráter de órgão ou instrumentalidade da União. Foro competente para seus litígios com os Estados” (Julgado em 08 de novembro de 1966, Diário de Justiça de 16 de março de 1967).

[193] “Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) I - o Presidente da República; II - a Mesa do Senado Federal; III - a Mesa da Câmara dos Deputados; IV - a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) V - o Governador de Estado ou do Distrito Federal; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) VI - o Procurador-Geral da República; VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VIII - partido político com representação no Congresso Nacional; IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional”.

[194] A Ementa do julgado recebeu a seguinte redação: “Reclamação. Desprezada a preliminar do seu não conhecimento, por maioria de votos deu-se, no mérito, pela sua improcedência, ainda por maioria, visto caber ao Dr.Procurador-Geral da República a iniciativa de encaminhar ao Supremo Tribunal Federal a representação de inconstitucionalidade. Jurisprudência do STF que se harmoniza com esse entendimento” (Reclamação nº 849 primeira, Plenário, Relator Ministro Adalício Nogueira, Julgamento em 10 de março de 1971, Diário de Justiça de 13 de dezembro de 1971, pp-07096, Ementário volume -00859-01, pp-00036).

[195] Na ADI 641/DF o STF entendeu faltar legitimidade ativa para o Conselho Federal de Farmácia provocar o controle concentrado de constitucionalidade. O julgado recebeu a seguinte Ementa: “LEGITIMIDADE - AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - CONSELHOS - AUTARQUIAS CORPORATIVISTAS. O rol do artigo 103 da Constituição Federal e exaustivo quanto a legitimação para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade. Os denominados Conselhos, compreendidos no genero "autarquia" e tidos como a consubstanciar a espécie corporativista não se enquadram na previsão constitucional relativa as entidades de classe de âmbito nacional. Da Lei Basica Federal exsurge a legitimação de Conselho único, ou seja, o Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. Dai a ilegitimidade "ad causam" do Conselho Federal de Farmacia e de todos os demais que tenham idêntica personalidade jurídica - de direito público”. (ADI nº 641, Plenário, Relator Ministro Néri da Silveira. Relator para Acórdão Ministro Marco Aurélio, Julgamento em 11 de dezembro de 1991, Diário de Justiça de 12 de março de 1993, pp-03557, Ementário volume 01695-02, pp-00223). Presentes à Sessão os Ministros Sydney Sanches (Presidente), Neri da Silveira (Relator), Octavio Gallotti, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio e Ilmar Galvão. Ausentes os Ministros Moreira Alves e Célio Borja.

[196] “Dispõe vinculação das entidades integrantes da administração pública federal indireta”.

[197] “Dispõe sobre a vinculação das entidades integrantes da Administração Pública Federal Indireta aos órgãos da Presidência da República e aos Ministérios”

[198] “Dispõe sobre a vinculação de entidades integrantes da Administração Pública Federal Indireta, e dá outras providências”.

[199] “Dispõe sobre a vinculação de entidades integrantes da Administração Pública Federal Indireta e revoga o Decreto 3.131, de 9 de agosto de 1999”.

[200] “Dispõe sobre a vinculação de entidades integrantes da Administração Pública Federal Indireta, e dá outras providências”.

[201] “Art.37 (...): II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)”.

[202] “Art.37. (...). X - a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998). Art. 61. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição. § 1º - São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que: II - disponham sobre: a) criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração”.

[203] Diversos são os pronunciamentos do TCU nesse sentido, sendo citada neste trabalho a decisão mais recente, Acórdão nº 624/2009 - Plenário: "ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão Plenária, ante as razões expostas pelo Relator, em: (...) 9.4. determinar ao Conselho Regional de Educação Física de Minas Gerais - CREF6ª/MG, nos termos do art. 250, inciso II, do RI/TCU, que: 9.4.1. no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, a contar da ciência deste Acórdão, adote as medidas necessárias para a rescisão: 9.4.1.1. dos contratos de trabalho firmados sem concurso público, a partir de 18/05/2001, data da publicação no Diário da Justiça do julgamento do mérito do Mandado de Segurança n. 21.797-9, pelo Supremo Tribunal Federal" (Julgamento em 1º de abril de 2009, Ata nº 12/2009-Plenário, Diário Oficial da União de 03 de abril de 2009). Compareceram à sessão os Ministros Ubiratan Aguiar (Presidente), Valmir Campelo, Benjamin Zymler, Augusto Nardes, Aroldo Cedraz, Raimundo Carreiro e José Jorge, bem como os Auditores Augusto Sherman Cavalcanti, Marcos Bemquerer Costa, André Luís de Carvalho e Weder de Oliveira.

[204] “Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas”.

[205] “Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão conselho de política de administração e remuneração de pessoal, integrado por servidores designados pelos respectivos Poderes (redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)”.

[206] O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do MS nº 21.797/RJ, definiu que os servidores do Conselho Federal de Odontologia deveriam se submeter à Lei nº 8.112, de 1990: “EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. ENTIDADES FISCALIZADORAS DO EXERCÍCIO PROFISSIONAL. CONSELHO FEDERAL DE ODONTOLOGIA: NATUREZA AUTÁRQUICA. Lei 4.234, de 1964, art. 2º. FISCALIZAÇÃO POR PARTE DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. I. - Natureza autárquica do Conselho Federal e dos Conselhos Regionais de Odontologia. Obrigatoriedade de prestar contas ao Tribunal de Contas da União. Lei 4.234/64, art. 2º. C.F., art. 70, parágrafo único, art. 71, II. II. - Não conhecimento da ação de mandado de segurança no que toca à recomendação do Tribunal de Contas da União para aplicação da Lei 8.112/90, vencido o Relator e os Ministros Francisco Rezek e Maurício Corrêa. III. - Os servidores do Conselho Federal de Odontologia deverão se submeter ao regime único da Lei 8.112, de 1990: votos vencidos do Relator e dos Ministros Francisco Rezek e Maurício Corrêa. IV. - As contribuições cobradas pelas autarquias responsáveis pela fiscalização do exercício profissional são contribuições parafiscais, contribuições corporativas, com caráter tributário. C.F., art. 149. RE 138.284-CE, Velloso, Plenário, RTJ 143/313. V. - Diárias: impossibilidade de os seus valores superarem os valores fixados pelo Chefe do Poder Executivo, que exerce a direção superior da administração federal (C.F., art. 84, II). VI. - Mandado de Segurança conhecido, em parte, e indeferido na parte conhecida”.

[207] “O Tribunal, por maioria, vencidos os Senhores Ministros Nelson Jobim, Ricardo Lewandowski e Joaquim Barbosa, deferiu parcialmente a medida cautelar para suspender a eficácia do artigo 39, caput, da Constituição Federal, com a redação da Emenda Constitucional nº 19, de 04 de junho de 1998, tudo nos termos do voto do relator originário, Ministro Néri da Silveira, esclarecido, nesta assentada, que a decisão – como é próprio das medidas cautelares – terá efeitos ex nunc, subsistindo a legislação editada nos termos da emenda declarada suspensa. Votou a Presidente, Ministra Ellen Gracie, que lavrará o acórdão. Não participaram da votação a Senhora Ministra Cármen Lúcia e o Senhor Ministro Gilmar Mendes por sucederem, respectivamente, aos Senhores Ministros Nelson Jobim e Néri da Silveira. Plenário, 02.08.2007”.

[208] “ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. CONSELHO REGIONAL DE CONTABILIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. NATUREZA JURÍDICA. AUTARQUIA FEDERAL. PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO. SERVIDORA. REGIME JURÍDICO ESTATUTÁRIO. DEMISSÃO. AUSÊNCIA DO REGULAR PROCESSO ADMINISTRATIVO. DIREITO À REINTEGRAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. Os conselhos de fiscalização profissional possuem natureza jurídica de autarquia, sujeitando-se, portanto, ao regime jurídico de direito público. Precedentes do STF e do STJ. 2. Até a promulgação da Constituição Federal de 1988, era possível, nos termos do Decreto-Lei 968/69, a contratação de servidores, pelos conselhos de fiscalização profissional, tanto pelo regime estatutário quanto pelo celetista, situação alterada pelo art. 39, caput, em sua redação original. 3. Para regulamentar o disposto na Constituição, o legislador inseriu na Lei 8.112/90 o art. 253, § 1º, pelo qual os funcionários celetistas das autarquias federais passaram a ser servidores estatutários, não mais sendo admitida a contratação em regime privado, situação que perdurou até a edição da Emenda Constitucional 19/98 e da Lei 9.649/98. 4. No julgamento da ADI 1.717/DF, o Supremo Tribunal Federal reafirmou a natureza jurídica de direito público dos conselhos fiscalizadores, ao declarar a inconstitucionalidade do art. 53 da Lei 9.649/98, com exceção do § 3º, cujo exame restou prejudicado pela superveniente Emenda Constitucional 19, de 4 de junho de 1998, que extinguiu a obrigatoriedade do Regime Jurídico Único. 5. Em 2 de agosto de 2007, porém, o Supremo Tribunal Federal deferiu parcialmente medida liminar na ADI 2.135/DF, com efeitos ex nunc, para suspender a vigência do art. 39, caput, da Constituição Federal, com a redação atribuída pela referida emenda constitucional. Com essa decisão, subsiste, para a administração pública direta, autárquica e fundacional, a obrigatoriedade de adoção do regime jurídico único, ressalvadas as situações consolidadas na vigência da legislação editada nos termos da emenda declarada suspensa. 6. No caso, a recorrida foi contratada pelo Conselho de Contabilidade em 7 de fevereiro de 1980, tendo sido demitida em 27 de fevereiro de 1998 (fl. 140), antes, portanto, da edição da Emenda Constitucional 19/98, sem a observância das regras estatutárias então em vigor, motivo por que faz jus à reintegração pleiteada. Precedentes do STJ em casos análogos. 8. Recurso especial conhecido e improvido”. (Recurso Especial nº 820696/RJ, 5ª Turma, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, Diário de Justiça de 17 de novembro de 2008).

[209] É o que se extrai do voto da Ministra Dora Maria da Costa (no que foi acompanhada à unanimidade pelos demais membros da Seção Especializada em Dissídios Coletivos do TST) proferido quando do julgamento do Recurso Ordinário em Dissídio Coletivo (RODC) nº 20113/2006-000-02-00.4: “Conclui-se, pelos trechos das decisões acima transcritas, a natureza autárquica das entidades fiscalizadoras do exercício profissional, que se caracterizam, consequentemente, como pessoas jurídicas de direito público específico. Também aos empregados daquelas entidades, independentemente de se sujeitarem ao regime trabalhista ou ao estatutário, do mesmo modo que aos agentes públicos, foram impostas as limitações pertinentes aos princípios básicos da Administração Pública, traçadas pelo art. 37 da Carta Magna. Estando, pois, regidos pela Lei 8.112/1990, não lhes sendo reconhecido o direito a firmarem acordos ou convenções coletivas, permitido aos demais trabalhadores urbanos e rurais pelo inciso XXVI do art. 7º da Constituição Federal de 1988, e conforme disposto no § 3º do art. 39 também da CF” (Julgamento em 13 de abril de 2009, Diário de Justiça de 30 de abril de 2009).

[210] Nesse sentido: “Ementa: REMESSA NECESSÁRIA. DISSÍDIO COLETIVO. CONSELHO DE FISCALIZAÇÃO DO EXERCÍCIO PROFISSIONAL. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. Natureza autárquica dos conselhos de fiscalização do exercício profissional. Personalidade jurídica de direito público. Impossibilidade de negociação coletiva e de ajuizamento de dissídio coletivo, nos termos da Orientação Jurisprudencial nº 05 da Seção Especializada em Dissídios Coletivos deste Tribunal. Precedentes desta Corte. Extinção do processo sem resolução do mérito que se decreta, com fundamento no art. 267, inc. VI, do Código de Processo Civil” (TST, RXOF e RODC 3503900-49.2002.5.02.0900, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Relator Ministro Fernando Eizo Ono, Julgamento em 11 de setembro de 2008, Diário de Justiça de 03 de outubro de 2008).

[211] Nesse sentido: “RECURSO DE REVISTA. CONSELHO FEDERAL DE FISCALIZAÇÃO DO EXERCÍCIO PROFISSIONAL. NATUREZA JURÍDICA. ESTABILIDADE. A jurisprudência uníssona desta C. Corte perfilha do entendimento de que os conselhos federais e regionais de fiscalização do exercício profissional, por deterem autonomia administrativa e financeira, não se submetem ao mandamento constitucional inserto nos artigos 37, inciso II, e 41 da Constituição da República. Por conseguinte, seus empregados não usufruem de estabilidade no emprego, sendo cabível a dispensa imotivada. Precedentes deste c. Tribunal Superior do Trabalho. Recurso de revista conhecido e provido” (Recurso de Revista nº 127500-19.2008.5.10.0017, 6ª Turma, Relator Ministro Aloysio Corrêa da Veiga, Julgamento em 09 de dezembro de 2009, Diário de Justiça de 18 de dezembro de 2009).

[212] “Art. 165. Leis de iniciativa do Poder Executivo estabelecerão: I - o plano plurianual; II - as diretrizes orçamentárias; III - os orçamentos anuais. § 5º - A lei orçamentária anual compreenderá: I - o orçamento fiscal referente aos Poderes da União, seus fundos, órgãos e entidades da administração direta e indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público”.

[213] “Art. 107. As entidades autárquicas ou paraestatais, inclusive de previdência social ou investidas de delegação para arrecadação de contribuições parafiscais da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal terão seus orçamentos aprovados por decreto do Poder Executivo, salvo se disposição legal expressa determinar que o sejam pelo Poder Legislativo. Parágrafo único. Compreendem-se nesta disposição as emprêsas com autonomia financeira e administrativa cujo capital pertencer, integralmente, ao Poder Público. Art. 108. Os orçamentos das entidades referidas no artigo anterior vincular-se-ão ao orçamento da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, pela inclusão: I - como receita, salvo disposição legal em contrário, de saldo positivo previsto entre os totais das receitas e despesas; II - como subvenção econômica, na receita do orçamento da beneficiária, salvo disposição legal em contrário, do saldo negativo previsto entre os totais das receitas e despesas. § 1º Os investimentos ou inversões financeiras da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, realizados por intermédio das entidades aludidas no artigo anterior, serão classificados como receita de capital destas e despesa de transferência de capital daqueles. § 2º As previsões para depreciação serão computadas para efeito de apuração do saldo líquido das mencionadas entidades. Art. 109. Os orçamentos e balanços das entidades compreendidas no artigo 107 serão publicados como complemento dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal a que estejam vinculados. Art. 110. Os orçamentos e balanços das entidades já referidas, obedecerão aos padrões e normas instituídas por esta lei, ajustados às respectivas peculiaridades. Parágrafo único. Dentro do prazo que a legislação fixar, os balanços serão remetidos ao órgão central de contabilidade da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, para fins de incorporação dos resultados, salvo disposição legal em contrário”.

[214] “Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo”.

[215] Lei nº 8.906, de 1994: “Art. 87. Revogam-se as disposições em contrário, especialmente a Lei nº 4.215, de 27 de abril de 1963, a Lei nº 5.390, de 23 de fevereiro de 1968, o Decreto-Lei nº 505, de 18 de março de 1969, a Lei nº 5.681, de 20 de julho de 1971, a Lei nº 5.842, de 6 de dezembro de 1972, a Lei nº 5.960, de 10 de dezembro de 1973, a Lei nº 6.743, de 5 de dezembro de 1979, a Lei nº 6.884, de 9 de dezembro de 1980, a Lei nº 6.994, de 26 de maio de 1982, mantidos os efeitos da Lei nº 7.346, de 22 de julho de 1985”. Lei nº 9.649, de 1998: “Art. 66. Revogam-se as disposições em contrário, especialmente as da Lei nº 8.490, de 19 de novembro de 1992, os §§ 1º, 2º e 3º do art. 22 da Lei nº 5.227, de 18 de janeiro de 1967, a Lei nº 5.327, de 2 de outubro de 1967, o parágrafo único do art. 2o do Decreto-Lei no 701, de 24 de julho de 1969, os arts. 2o e 3o do Decreto-Lei no 1.166, de 15 de abril de 1971, os §§ 1o e 2o do art. 36 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973, a Lei nº 6.994, de 26 de maio de 1982, a Lei nº 7.091, de 18 de abril de 1983, os arts. 1o, 2o e 9o da Lei no 8.948, de 8 de dezembro de 1994, o § 2o do art. 4o e o § 1o do art. 34 da Lei no 9.427, de 26 de dezembro de 1996”.

[216] “Dispõe sobre a fixação do valor das anuidades e taxas devidas aos órgãos fiscalizadores do exercício profissional e dá outras providencias”.

[217] “Art. 2º Os Conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas são autorizados a fixar, cobrar e executar as contribuições anuais, devidas por pessoas físicas ou jurídicas, bem como as multas e os preços de serviços, relacionados com suas atribuições legais, que constituirão receitas próprias de cada Conselho. § 1º Quando da fixação das contribuições anuais, os Conselhos deverão levar em consideração as profissões regulamentadas de níveis superior, técnico e auxiliar. § 2º Considera-se título executivo extrajudicial a certidão relativa aos créditos mencionados no caput deste artigo e não pagos no prazo fixado para pagamento. § 3º Os Conselhos de que trata o caput deste artigo ficam autorizados a normatizar a concessão de diárias, jetons e auxílios de representação, fixando o valor máximo para todos os Conselhos Regionais”.

[218] Substituto do Ministro Menezes Direito que, por sua vez, substituíra o Ministro Sepúlveda Pertence.

[219] “EMENTA: TRIBUTÁRIO. ANUIDADES DOS CONSELHOS DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL. ART. 2º, CAPUT E § 1º, DA LEI 11.000/04. INCONSTITUCIONALIDADE. As contribuições do interesse de categorias profissionais ou econômicas submetem-se às limitações ao poder de tributar, a começar pela legalidade estrita, tal como estabelecido pelo art. 150, I, da CF. O art. 2º da Lei 11.000/04, ao autorizar os Conselhos de Fiscalização Profissional a fixação das anuidades, incorreu em evidente afronta à garantia da legalidade tributária, reincidindo no vício que já acometera de inconstitucionalidade o art. 58, § 4º, da Lei 9.649/98, já declarado inconstitucional pelo STF por ocasião do julgamento da ADIN 1.717-6. Declarada a inconstitucionalidade da expressão "fixar", constante do art. 2º da Lei nº 11.000/04, e do § 1º do mesmo artigo, por violação ao art. 150, I, da Constituição Federal de 1988, pela Corte Especial deste Tribunal. (TRF4, AMS 2006.72.00.001284-9, Segunda Turma, Relator Eloy Bernst Justo, D.E. 23/01/2008)”. “EMENTA: TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. CONTRIBUIÇÃO DE INTERESSE DAS CATEGORIAS PROFISSIONAIS OU ECONÔMICAS. DELEGAÇÃO. INCIDENTE DE ARUIÇÃO DE CONSTITUCIONALIDADE. 1. Havendo hesitação quanto à constitucionalidade de determinado preceptivo relevante ao escorreito desate da lide, é lícito a quaisquer dos Juízes integrantes do respectivo Órgão Colegiado suscitar a instauração do incidente de inconstitucionalidade de lei, por se tratar de matéria de cognição oficial afeta à reserva de plenário (cf. CF: art. 97). 2. O cerne da controvérsia radica em desvelar se compete aos Conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas fixar, mediante resolução, o valor das contribuições anuais, devidas por pessoas físicas ou jurídicas, relacionadas diretamente com suas atribuições legais. 3. A propósito, estabelece o art. 2º, PARÁGRAFO1º e PARÁGRAFO2º., da Lei 11.000/2004: Art. 2o Os Conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas são autorizados a fixar, cobrar e executar as contribuições anuais, devidas por pessoas físicas ou jurídicas, bem como as multas e os preços de serviços, relacionados com suas atribuições legais, que constituirão receitas próprias de cada Conselho. PARÁGRAFO 1o Quando da fixação das contribuições anuais, os Conselhos deverão levar em consideração as profissões regulamentadas de níveis superior, técnico e auxiliar. PARÁGRAFO 2o Considera-se título executivo extrajudicial a certidão relativa aos créditos mencionados no caput deste artigo e não pagos no prazo fixado para pagamento. 4. Entretanto, considerando a natureza autárquica de que se revestem os conselhos de fiscalização de atividade profissional, de par com o caráter tributário da exação, subsumida na espécie de contribuições de interesse das categorias profissionais ou econômicas, vislumbra-se uma aparente antinomia entre o indigitado preceptivo com a previsão constitucional de que a exigência ou majoração de tributo só pode ser realizada mediante lei que o estabeleça (cf. CF: arts. 149 e 150, I). 5. Corrobora a ilação o fato de que disposição de igual teor (art. 58, PARÁGRAFO4º, da Lei 9.649/1998) já foi submetida à apreciação do Excelso Pretório (ADI nº 1.717/DF), sendo declarado inconstitucional. 6. Oportune tempore, acrescente-se ainda que a constitucionalidade do dispositivo em tela está sendo questionada perante o Supremo Tribunal Federal, em sede da ADI nº 3.408-DF, inclusive, com parecer da Procuradoria Geral da República, opinando pela procedência do pedido. 7. Pela instauração do incidente de inconstitucionalidade perante o Plenário deste Tribunal (CF: art. 97; CPC: art. 480/482; RITRF da 5ª Região: art. 137-138)” (TRF5ª. AC 2004.83.00.019585-0, Primeira Turma, Relator Francisco Cavalcanti, D.E. 28/06/2007).

[220] Nesse sentido: “Ementa - TRIBUTÁRIO. CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA. ANUIDADE. LEI Nº 6.994/82. LIMITE. VALORES DE ANUIDADE ACIMA DO LIMITE PREVISTO NA LEI. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. 1. As anuidades devidas aos conselhos de fiscalização profissional constituem contribuições parafiscais, instituídas no interesse de uma categoria profissional. Portanto, pertencem ao campo tributário, estando jungidas ao princípio da legalidade. Assim sendo, não é permitido aos conselhos, substituindo-se ao legislador, estabelecer os critérios de fixação do valor da anuidade por meio de Resolução diversos daqueles previstos em lei. 2. A Lei 6.994/82 limitou o valor das anuidades cobradas pelos conselhos de fiscalização profissional em duas MVR para pessoa física e entre duas e dez MVR, de acordo com as classes de capital social, para as pessoas jurídicas. 3. Os valores cobrados por anuidades nos cinco anos que precederam ao ajuizamento da ação, que estiverem além do limite previsto na Lei 6.994/82, devem ser objeto de repetição pelo autor com incidência da taxa SELIC” (TRF4ª, AC 2007.72.00.005023-5/SC, Segunda Turma, Relatora Marciane Bonzanini, D.E.23/04/2008).

[221] “EMENTA: PROCESSO CIVIL. TRIBUTÁRIO. ADMINISTRATIVO. PRELIMINAR FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL AFASTADA. CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. ANUIDADE CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA. MAJORAÇÃO ANUIDADE E MULTA POR MEIO DE ATO ADMNISTRATIVO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Possibilidade de ajuizamento de ação de consignação em pagamento por ser meio de extinção da obrigação com a liberação do devedor através da quitação do débito se a ação for julgada procedente "No tocante à ação de consignação em pagamento em matéria tributária, (...) o parágrafo 1º, do art. 164, do CTN, ao dispor que a consignação só pode versar sobre o crédito que o consignante se propõe a pagar, estaria amparando as situações em que o contribuinte se propõe a pagar um quantum inferior ao que lhe é exigido pelo Fisco, porquanto, sob essa ótica, exigir valor maior seria o mesmo que recusar o recebimento do tributo por valor inferior ao que se estipulou." (TRF - 5a Região, AC 336497/PB, Primeira Turma, Rel. Des. Federal Jose Maria Lucena, DJ 29/09/2006 - Pág. 872, Decisão Unânime)"Preliminar afastada. 2. As contribuições em destaque estão submetidas aos princípios que regem o direito tributário não podendo então sofrer aumento sem lei que o estabeleça dentro do princípio da estrita legalidade tributária. OS Conselhos Profissionais não podem estipular as anuidades e as multas por meio de ato administrativo. 3. Logicamente as resoluções que apenas promovem a atualização monetária das anuidades dentro dos limites fixados em lei não atingem o princípio da legalidade sendo certo que o artigo 2º da lei 11000/04 ao autorizar aos Conselhos a fixação das anuidades incorreu em afronta á garantia da legalidade tributária, inclusive já tendo sido tal inconstitucionalidade declarada por meio de decisão deste Tribunal Federal na Argüição de inconstitucionalidade 4. Os valores estabelecidos no artigo 1º da lei 6994/82 devem ser seguidos até a edição de novo ato normativo. Tal dispositivo legal instituiu um índice de atualização das anuidades, o Maior Valor de Referência MVR. Tal índice foi extinto em 1991 com o advento da UFIR, passando os valores a serem convertidos pelo último índice.A lei 8178/91 em seu artigo 21, inciso II estabeleceu a conversão do MRV em valores diferenciados por regiões e sub-regiões como definidas no decreto 75679/75. Torna-se necessário então a modificação dos valores na moeda em curso no país. 5. "(...) 5. É vedado a Conselho Regional estipular os valores das anuidades e multas, por meio de ato administrativo. No entanto, as anuidades cobradas em observância ao disposto na Lei nº 6.994/82, que foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988, não afrontam dito princípio constitucional. 6. Situação fática em que os valores monetariamente atualizados, a partir da utilização de 3 (três) índices distintos, dentre os que podem servir para a correção das referidas anuidades, e multas, divergem substancialmente do constante nos boletos de cobrança de anuidade, acostados aos autos, ficando claro que o CRF/PB não se limitou, em tese, a atualizar monetariamente o valor das anuidades e suas multas, o que não é legalmente admitido. (...)Apelação Civel nº 437193, DJU 17.04.2009, Rel. Des Fed Geraldo Apoliano). 6. Apelação não provida” (TRF5ª. AC 2003.82.00.008821-2, Segunda Turma, Relator Frederico Pinto de Azevedo, D.E. 05/10/2009).

[222] “EMENTA: TRIBUTÁRIO. ANUIDADES. CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA. LEI Nº 6.994/82. LIMITE. 1.A anuidade devida aos conselhos regionais que fiscalizam as categorias profissionais tem natureza de contribuição social e não pode ser fixada por Resolução, mas por lei. 2. A Lei 6.994/82 limitou o valor das anuidades cobradas pelos conselhos de fiscalização profissional em duas vezes o Maior Valor de Referência para pessoa física. 3. A fixação do valor das anuidades devidas aos Conselhos Profissionais pela Lei n.º 6.994/82 deve, com a extinção da MVR pela Lei n. 8.177/91, levar em consideração a fixação em cruzeiros pela Lei n.º 8.178/91 e, posteriormente, a sua transformação em UFIR's com o advento da Lei n.º 8.383/91. 4. A partir da extinção da UFIR, aplica-se o IPCA-E, face à inexistência de fixação de outro índice legal de atualização monetária. VOTO: (...). A Lei nº 6.994/82 limitou o valor das anuidades, para as pessoas físicas, em 2 (duas) vezes o Maior Valor de Referência. Ocorre que a Lei nº 8.177/91 extinguiu o MVR em fevereiro/91, transformando os valores em cruzeiros, sendo, a partir da Lei nº 8.383, de 30-12-91, fixados em UFIR. A evolução da disciplina legal relativa ao valor da contribuição é a seguinte: o MVR , ao ser extinto, teve seu valor convertido em moeda corrente para Cr$ 2.266,17 (Leis 8.177 e 8.178, ambas de 01-03-91, art. 3º, III e art. 21, respectivamente). Portanto, o valor da contribuição passou a estar fixado em moeda corrente, correspondendo a duas vezes o montante antes referido. Extinto o MVR e fixado o valor da contribuição em moeda, a legislação não previu qualquer forma de indexação ou de correção monetária do valor da contribuição até o advento da Lei 8.383, de 30-12-91, que instituiu a UFIR, novo indexador em matéria tributária. Com a adoção da UFIR a partir de 01-01-92, o valor da contribuição, então expresso em moeda corrente, foi convertido naquela unidade (…). Vale dizer: se a UFIR correspondia, em 02/91, a Cr$ 126,8621, e o MVR correspondia a Cr$ 2.266,17, cada MVR corresponderia a 17,86 UFIR. (…). Com efeito, no cálculo dos valores deve ser utilizado o fator R$1,0641, último fixado antes de a UFIR ter sido extinta (27/10/2000), em decorrência do art. 3º do art. 29 da Medida Provisória 2095-76, nos termos do art. 6º, parágrafo único da Lei nº 10.192/01, (…). Assim, o valor da anuidade deve variar entre R$38,00 e R$190,04, observadas as situações específicas” (TRF4ª, REOMS 2008.72.00.001748-0/SC, Segunda Turma, Relatora Vânia Hack de Almeida, D.E. 09/07/2008).

[223] É o que se extrai de inúmeras manifestações dos Ministros e Auditores do TCU, sendo exemplo recente voto proferido pelo Ministro André Luiz de Carvalho formador do Acórdão nº 2105/2009-Plenário: “(...). 7. E, a respeito dos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas, a farta jurisprudência desta Corte é no sentido de que tais entidades têm natureza autárquica sui generis; arrecadam e gerenciam recursos públicos de natureza parafiscal; sujeitam-se aos princípios constitucionais aplicáveis à Administração Pública; integram, por força constitucional e legal, o rol dos jurisdicionados deste Tribunal; estão obrigadas a realizar concurso público previamente à contratação de pessoal; e devem observar a licitação prévia para as obras, serviços, compras, alienações e locações (v.g. Acórdãos 2.562/2008, 168/2002 e 202/2002, do Plenário, Decisões 701/1998 e 920/2001, do Plenário, Acórdãos 42/2002 e 176/2002, da 1ª Câmara, e Acórdãos 367/2009, 209/1998 e 27/2002, da 2ª Câmara). (...)”. (Julgamento em 28 de abril de 2009, Ata nº 12/2009-Plenário). Compareceram à sessão os Ministros Benjamin Zymler (Presidente), Aroldo Cedraz, Raimundo Carreiro e José Jorge, bem como os Auditores André Luís de Carvalho (Relator) e Augusto Sherman Cavalcanti.

[224] “CRFB/1988. Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete: II - julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público”.

[225] “Art. 2º Para os efeitos desta instrução normativa, constituem unidades jurisdicionadas ao Tribunal, cujos responsáveis estão sujeitos à apresentação de relatório de gestão ou de processo de contas: I. os órgãos e entidades da administração pública federal direta e indireta, incluídas as fundações e empresas estatais, bem como suas unidades internas; II. os fundos cujo controle se enquadre como competência do Tribunal; III. os serviços sociais autônomos; IV. as contas nacionais das empresas supranacionais de cujo capital social a União participe, de forma direta ou indireta, nos termos do respectivo tratado constitutivo; V. as empresas encampadas, sob intervenção federal ou que, de qualquer modo, venham a integrar, provisória ou permanentemente, o patrimônio da União ou de entidade pública federal; VI. as entidades cujos gestores, em razão de previsão legal, devam prestar contas ao Tribunal. § 1º Os responsáveis pelas entidades de fiscalização do exercício profissional estão dispensados de apresentar relatório de gestão ou processo de contas ordinárias ao Tribunal, sem prejuízo da manutenção das demais formas de fiscalização exercidas pelo controle externo. § 2º Os estados, o Distrito Federal, os municípios e as pessoas físicas ou entidades privadas, quando beneficiários de transferência voluntária de recursos federais sob qualquer forma, responderão perante o órgão ou entidade repassador pela boa e regular aplicação desses recursos, apresentando os documentos, informações e demonstrativos necessários à composição dos relatórios de gestão e dos processos de contas dos responsáveis por essas unidades jurisdicionadas”.

[226] A dispensa da prestação de contas ordinária pelos dirigentes máximos dos Conselhos e Ordens também foi prevista no §1º, artigo 2º, da IN TCU nº 47, de 27 de outubro de 2004, e no §3º, artigo 18, a IN TCU nº 12, de 24 de abril de 1996.

[227] “VISTOS, relatados e discutidos estes autos referentes a pedidos de reexame interpostos pelo Conselho Federais de Biblioteconomia, de Economia, de Química e de Administração, em face do Acórdão n.º 745/2005, proferido em Sessão Plenária de caráter reservado, na data de 8/6/2005, que expediu determinação aos conselhos federais de fiscalização de profissões regulamentadas para que passassem a observar os parâmetros aplicáveis à Administração Pública Federal, quando da normatização da concessão de diárias. ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão do Plenário, ante as razões expostas pelo Relator em: 9.1. conhecer dos presentes pedidos de reexame, com fundamento no art. 48, c/c o art. 33, ambos da Lei 8.443/92, 9.2. dar provimento aos recursos interpostos pelos Conselhos Federais de Biblioteconomia, de Economia, de Química e de Administração, de forma a tornar insubsistentes as determinações constantes dos subitens 1.1.1, 1.1.2 e 1.1.3 da deliberação recorrida, bem como considerar improcedente a denúncia no que tange à concessão de diárias acima dos valores permitidos pela legislação em vigor; 9.3. determinar aos Conselhos Federais de Fiscalização de Profissões Regulamentadas que a normatização da concessão de diárias, mormente a fixação de seus valores, deve pautar-se pelo crivo da razoabilidade, do interesse público e da economicidade dos atos de gestão, bem como pelos demais princípios que regem a Administração Pública; 9.4. determinar aos Conselhos Federais de Fiscalização de Profissões Regulamentares que normatizem e publiquem anualmente o valor das diárias, jetons e auxílios de representação, com base no § 3º do art. 2º da Lei 11.000/2004, alertando que a adoção de valores desarrazoados, assim entendidos os que injustificadamente excedem aqueles praticados por outros órgãos e entidades da administração pública federal, poderá ensejar a aplicação de medidas sancionadoras por este Tribunal” (Julgamento em 11 de abril de 2007, Ata nº 14/2007-Plenário, Diário Oficial da União de 13 de abril de 2007). Compareceram à sessão os Ministros Walton Alencar Rodrigues (Presidente), Marcos Vinicios Vilaça, Valmir Campelo, Guilherme Palmeira, Ubiratan Aguiar, Benjamin Zymler (Relator), Augusto Nardes, Aroldo Cedraz e Raimundo Carreiro, bem como os Auditores Augusto Sherman Cavalcanti e Marcos Bemquerer Costa.

[228] “Art. 1° Ao Tribunal de Contas da União, órgão de controle externo, compete, nos termos da Constituição Federal e na forma estabelecida nesta lei: (…) XVII - decidir sobre consulta que lhe seja formulada por autoridade competente, a respeito de dúvida suscitada na aplicação de dispositivos legais e regulamentares concernentes a matéria de sua competência, na forma estabelecida no regimento interno”.

[229] “Art. 264. O Plenário decidirá sobre consultas quanto a dúvida suscitada na aplicação de dispositivos legais e regulamentares concernentes à matéria de sua competência, que lhe forem formuladas pelas seguintes autoridades: I – presidentes da República, do Senado Federal, da Câmara dos Deputados e do Supremo Tribunal Federal; II – Procurador-Geral da República; III – Advogado-Geral da União; IV – presidente de comissão do Congresso Nacional ou de suas casas; V – presidentes de tribunais superiores; VI – ministros de Estado ou autoridades do Poder Executivo federal de nível hierárquico equivalente; VII – comandantes das Forças Armadas. § 1º As consultas devem conter a indicação precisa do seu objeto, ser formuladas articuladamente e instruídas, sempre que possível, com parecer do órgão de assistência técnica ou jurídica da autoridade consulente. § 2º Cumulativamente com os requisitos do parágrafo anterior, as autoridades referidas nos incisos IV, V, VI e VII deverão demonstrar a pertinência temática da consulta às respectivas áreas de atribuição das instituições que representam. § 3º A resposta à consulta a que se refere este artigo tem caráter normativo e constitui prejulgamento da tese, mas não do fato ou caso concreto. Art. 265. O relator ou o Tribunal não conhecerá de consulta que não atenda aos requisitos do artigo anterior ou verse apenas sobre caso concreto, devendo o processo ser arquivado após comunicação ao consulente”.

[230] Acórdão 384/2004 – Plenário: “VISTOS, relatados e discutidos estes autos de consulta formulada pelo Dr. Sérgio Henrique Nascente Costa, Vice-Presidente do Conselho Regional de Biomedicina - 3ª Região, acerca da possibilidade do pagamento antecipado de honorários advocatícios de ações ajuizadas, por ocasião da rescisão contratual de assessora jurídica, ou se tais valores somente poderão ser pagos quando do efetivo recebimento do valor ajuizado; ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão do Plenário, em: 9.1. não conhecer da consulta, em face da inobservância dos requisitos de admissibilidade, nos termos do art. 265 do Regimento Interno/TCU, dado haver sido formulada por autoridade carecedora de legitimidade para fazê-lo e por versar sobre caso concreto; 9.2. encaminhar cópia deste Acórdão, bem como do Relatório e Voto que o fundamentam, ao consulente; 9.3. arquivar este processo” (Julgamento em 07 de abril de 2004, Ata nº 11/2004-Plenário, Diário Oficial da União de 20 de abril de 2004). Compareceram à sessão os Ministros Valmir Campelo (Presidente), Marcos Vinicios Vilaça, Humberto Guimarães Souto (Relator), Adylson Motta, Walton Alencar Rodrigues, Guilherme Palmeira, Ubiratan Aguiar e Benjamin Zymler, bem como o Auditor Marcos Bemquerer Costa.

[231] “Art. 4° São isentos de pagamento de custas: I - a União, os Estados, os Municípios, os Territórios Federais, o Distrito Federal e as respectivas autarquias e fundações; II - os que provarem insuficiência de recursos e os beneficiários da assistência judiciária gratuita; III - o Ministério Público; IV - os autores nas ações populares, nas ações civis públicas e nas ações coletivas de que trata o Código de Defesa do Consumidor, ressalvada a hipótese de litigância de má-fé. Parágrafo único. A isenção prevista neste artigo não alcança as entidades fiscalizadoras do exercício profissional, nem exime as pessoas jurídicas referidas no inciso I da obrigação de reembolsar as despesas judiciais feitas pela parte vencedora”.

[232] “Art. 24-A. A União, suas autarquias e fundações, são isentas de custas e emolumentos e demais taxas judiciárias, bem como de depósito prévio e multa em ação rescisória, em quaisquer foros e instâncias”.

[233] Nesse sentido: “Ementa: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CONSELHO DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL. AUSÊNCIA DE PREPARO. DESERÇÃO. PORTE DE REMESSA E RETORNO. RECOLHIMENTO OBRIGATÓRIO. ART. 4º, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI 9.289/1996. 1. Conforme orientação desta Corte, “é deserto o recurso interposto para o Superior Tribunal de Justiça quando o recorrente não recolhe, na origem, a importância das despesas de remessa e retorno dos autos.” (Súmula 187/STJ). 2. Segundo o art. 4º, parágrafo único, da Lei 9.289/1996, não se aplica às entidades fiscalizadoras do exercício profissional a isenção do pagamento das custas conferida aos entes públicos relacionados no caput do mesmo artigo. 3. Recurso Especial de que não se conhece” (STJ, Recurso Especial 200800993095, 1055406, 2ª Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, Diário de Justiça de 27 de fevereiro de 2009); “Ementa: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO POR CONSELHO DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL. OBRIGATORIEDADE DO RECOLHIMENTO DO PORTE DE REMESSA E RETORNO. LEI 9289/96, ART. 4º, PARÁGRAFO ÚNICO. DESERÇÃO. 1. Inobstante a natureza jurídica de autarquia conferida aos Conselhos Profissionais, a eles não se aplica a isenção de recolhimento de custas conferida aos entes públicos relacionados no caput do art. 4º da Lei 9.289/96, conforme dispõe expressamente o parágrafo único do referido dispositivo (Parágrafo único. A isenção prevista neste artigo não alcança as entidades fiscalizadoras do exercício profissional, nem exime as pessoas jurídicas referidas no inciso I da obrigação de reembolsar as despesas judiciais feitas pela parte vencedora). 2. Agravo regimental a que se nega provimento”. (STJ, Agravo Regimental no Agravo de Instrumento 200702602367, 990116, 1ª Turma, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, Diário de Justiça de 22 de outubro de 2008).

[234] Disponível em <http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto =93307&tmp.area_an terior=44&tmp.argumento_pesquisa=>. Acesso em 24 ago. 2009.

[235] Disponível em <http://www.administradores.com.br/artigos/os_conselhos_profissionais_e_o_ engessamento_do_conhecimento/22946/>. Acesso em 18 mai. 2009.

[236] Trata-se da Resolução CFC nº 853, de 28 de julho de 1999, que “Institui o Exame de Suficiência como requisito para obtenção de Registro Profissional em CRC”.

[237] “Ementa: RECURSO ESPECIAL. CONSELHO REGIONAL DE CONTABILIDADE. NATUREZA JURÍDICA. AUTARQUIA FEDERAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. RESOLUÇÃO DO CONSELHO FEDERAL DE CONTABILIDADE. APROVAÇÃO EM EXAME DE SUFICIÊNCIA PROFISSIONAL PARA REGISTRO NOS CONSELHOS REGIONAIS DE CONTABILIDADE. EXIGÊNCIA NÃO PREVISTA EM LEI. NÃO CABIMENTO. "O Superior Tribunal de Justiça entende que os Conselhos Regionais de fiscalização do exercício profissional têm natureza jurídica de autarquia federal e, como tal, atraem a competência da Justiça Federal nos feitos de que participem (CF/88, Art. 109, IV)" (AGREsp n. 314.237/DF, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 09.06.2003). O Conselho Federal de Contabilidade extrapolou a previsão legal ao estabelecer, por Resolução, a aprovação em exame de suficiência profissional como requisito para o registro nos Conselhos Regionais. Com efeito, tal exigência não está prevista no Decreto-lei n. 9.295/46, que apenas dispõe, em seu artigo 10, que cabe aos referidos órgãos fiscalizar o exercício da profissão e organizar o registro dos profissionais. A atividade de fiscalizar é completamente distinta do poder de dizer quem está ou não apto ao exercício de determinada atividade profissional. Trata-se, pois, de entidades distintas, não se subsumindo uma no conceito de outra, nem mesmo quanto à possibilidade de atividades concêntricas. De qualquer forma, impende frisar que somente a lei poderá atribuir a outras entidades, que não escolas e faculdades, capacidade e legitimidade para dizer sobre a aptidão para o exercício dessa ou daquela profissão. O legislador, quando entende ser indispensável a realização dos aludidos exames para inscrição no respectivo órgão de fiscalização da categoria profissional, determina-o de forma expressa. Nesse sentido, cite-se o artigo 8º, IV, da Lei n. 8.906/94 (Estatuto da Advocacia), que exige a aprovação em Exame de Ordem para inscrição como advogado na Ordem dos Advogados do Brasil. Recurso especial não conhecido”. (Recurso Especial nº 503918/MT, 2ª Turma, Relator Ministro Franciulli Netto, Julgamento em 24 de junho de 2003, Diário de Justiça de 08 de setembro de 2003).

[238] Nesse sentido: “Ementa: ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA, ARQUITETURA E AGRONOMIA. REGISTRO. DESCABIMENTO. 1. O registro nos Conselhos Regionais de Engenharia, Arquitetura e Agronomia somente é obrigatório para aquelas pessoas jurídicas, cuja atividade básica seja a prestação de serviços relacionados com as três atividades disciplinadas pelos referidos conselhos. 2. É firme a jurisprudência no sentido de destacar-se a atividade preponderante da empresa para que se vincule a mesma ao Conselho encarregado pela fiscalização profissional. 3. A empresa, que desempenha o comércio de chaves e de recarga de extintores, não é obrigada a se submeter ao registro no CREA, cuja atividade-fim é diversa da função inerente à engenharia. 4. Deveras, a imposição do registro não pode ser inaugurada por Resolução, pelo que, muito embora seja ato administrativo de caráter normativo, subordina-se ao ordenamento jurídico hierarquicamente superior, in casu, à lei e à Constituição Federal, não sendo admissível que o poder regulamentar extrapole seus limites, ensejando a edição dos chamados "regulamentos autônomos", vedados em nosso ordenamento jurídico. 5. Recurso especial provido” (STJ, Recurso Especial nº 761.423/SC, 1ª turma, Relator Ministro Luiz Fux, Julgamento em 10 de outubro de 2006, Diário de Justiça de 13 de novembro de 2006).

[239] Do mesmo modo: “Ementa: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO - EXIGÊNCIA DE INSCRIÇÃO E COBRANÇA DE ANUIDADES DE PROFISSIONAIS E PESSOAS JURÍDICAS DA ÁREA DE INFORMÁTICA - DESCABIMENTO - LEI 4.769/65 - RESOLUÇÃO NORMATIVA CFA 125/92. 1. A jurisprudência firmou entendimento de que é a atividade preponderante do profissional ou da empresa que determina qual o conselho que tem competência para a fiscalização. 2. A atividade preponderante do profissional da área de informática é a utilização de sistemas e aplicativos (que têm base teórica específica, técnicas, metodologias e ferramentas próprias) a serem utilizados via computadores ou outros meios eletrônicos. 3. O art. 2º da Lei 4.769/65, ao enumerar as atividades privativas do administrador, não faz qualquer referência às atividades desenvolvidas pelo pessoal da área de informática, tendo a Resolução Normativa CFA 125/92 exorbitado da previsão legislativa. 4. Descabimento da exigência de inscrição e pagamento de anuidades, não se submetendo o profissional de informática às penalidades do art. 16 da Lei 4.769/65 e art. 52 do Decreto 61.934/67. 5. Recurso especial improvido. (STJ, Recurso Especial nº 488.441/RS, 2ª Turma, Relatora Ministra Eliana Calmon, Julgamento em 03 de junho de 2006, Diário de Justiça de 20 de setembro de 2004).

[240] “Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I - soberania nacional; II - propriedade privada; III - função social da propriedade; IV - livre concorrência; V - defesa do consumidor; VI - defesa do meio ambiente; VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego; IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 6, de 1995) Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei”.


Abstract: Free professional activity is a fundamental right enshrined in section XIII, Article 5 of the Brazilian Constitution of 1988. This work analyzes the legal entities created for monitoring the performance of technical and liberal professional categories in Brazil. This research considers its public functions, which include the police power, and the limits allowed for restrictions of free professional activity’s rights. This study is divided into 3 chapters. The first examines the evolution of the constitutional issue, from the complete omission of the Brazilian State to the creation of Professional Monitoring Councils and Orders. In this first chapter, we highlight the jurisprudence prior to 1988 the Supreme Court (STF) which, besides defining the legislative nature of such professional entities, did not made a strict distinction between the Professional Monitoring Councils and Orders and the Lawyers Association of Brazil (OAB). The second chapter states that the nature of professional entities was preserved by the Constitution of 1988. With this objective the research examined the trial of two actions nº 1.717/DF and 3.026/DF, in which the Brazilian Supreme Court established, for the first time, constitutional distinctions between the Professional Monitoring Councils and Orders when compared with OAB. Finally, in the third chapter, it is argued that this distinction does not make sense in Brazilian monitoring professional activity system. This conclusion is obtained in order to clarify that, according to the Brazilian Constitution, there are common aspects and limitations, shared by OAB and the other Professional Monitoring Councils and Orders, that protects, in the same way: i) the fundamental right of free professional activity; and ii) a public space for monitoring the quality of the services that are offered by these technical and professional categories.

Key words: Free professional activity. Monitoring Councils and Orders. Lawyers Association of Brazil (OAB). Common aspects and limitations. Police power. Legislative nature. Jurisprudence of Brazilian Supreme Court


Autor


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VALENTINO, Cyrlston Martins. Conselhos e ordens de fiscalização do exercício profissional: perfil jurídico a partir da jurisprudência do STF. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3334, 17 ago. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22434. Acesso em: 18 abr. 2024.