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Princípio da proteção

Princípio da proteção

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A imperatividade da norma trabalhista decorre diretamente da proteção que se opera inclusive contra a vontade do trabalhador.

Resumo: Neste artigo, investigamos a noção de princípio, assente na doutrina, para desmistificá-la, a fim de identificar, no âmbito do Direito do Trabalho, a existência de um único princípio: o da proteção ao trabalho humano. Isso, porém, não retira a importância das noções de imperatividade ou irrenunciabilidade das normas trabalhistas. Antes, sublinha essa importância, na medida em que afasta a possibilidade de ponderação do princípio da proteção, que deve sempre justificar a aplicação da regra jurídica trabalhista, a partir da premissa de que essa norma é justamente o resultado da soma da regra com seu princípio inspirador.

Sumário: INTRODUÇÃO. 1. Os Princípios no âmbito dos Direitos Fundamentais: novo conteúdo.2. No princípio: uma definição de princípios.3. O Princípio da Proteção e o Papel da Linguagem no Direito. CONCLUSÃO. OBRAS CONSULTADAS.


INTRODUÇÃO

A doutrina trabalhista, especialmente desde Plá Rodriguez, reconhece o princípio da proteção como vetor que orienta e justifica a existência do Direito do Trabalho. Poucos, porém, são os autores que se preocupam em investigar o conceito de princípio, a fim de compreender a razão porque a noção de proteção figura como tal. Soma-se a isso, o fato de que a doutrina insiste em arrolar um número de princípios do Direito do Trabalho, que variam de acordo com a vontade de quem escreve. Este artigo tem por objetivo investigar o que torna (ou não) a noção de proteção um princípio, no âmbito do Direito do Trabalho. A partir dessa primeira investigação, tentaremos demonstrar deva a proteção figurar como único verdadeiro princípio no âmbito trabalhista.

A “inflação principiológica”, dando o nome de princípio ao que é regra ou valor, esvazia de conteúdo e função, os verdadeiros princípios. Daí a importância do tema. É essa, uma das razões pelas quais parece hoje tão fácil invocar princípios contrários à proteção ou simplesmente afastá-la, em nome dessa ou daquela necessidade imediata. Por isso, antes de definir o princípio da proteção ou de reconhecê-lo como razão de ser e norte do Direito do Trabalho (e como verdadeiro princípio), temos de estabelecer o que é um princípio, distinguindo-o (ou não) das regras jurídicas. Precisamos reconhecê-lo dentre as normas, compreendendo que a noção mesma de princípios é historicamente recente, razão da dificuldade em lidarmos com ela.

Compreender o que é um princípio tem consequências práticas de extrema relevância. Ao Direito do Trabalho, por exemplo, é cara a ideia de princípio da proteção, tão bem desenvolvida por Plá Rodriguez, cuja obra até hoje é referência para os estudiosos das relações jurídicas trabalhistas. Esse autor, de forma simples e direta, define princípios como “ideias fundamentais e informadoras da organização jurídica”[1]. A definição, embora diga tanto, parece insuficiente diante da função transformadora assumida pelo Direito a partir da segunda metade do século passado.

A construção da teoria dos direitos fundamentais determinou uma mudança radical na função do Direito e do Estado, que passou a deter a missão não apenas de diagnosticar, determinar e coibir condutas, mas especialmente de operar mudanças que implicassem melhoria nas condições sociais. Da preocupação com a estrutura do direito e de sua definição como “ciência jurídica”, passamos à consideração de sua função enquanto instrumento de transformação social.

Este estudo não se dedicará à definição ou mesmo à reconstrução da origem e do desenvolvimento da noção de direitos fundamentais. É preciso, porém, tangenciá-la para compreender de forma adequada a mudança no papel dos princípios a partir de então. E é por aí que iniciaremos.


1. Os Princípios no âmbito dos Direitos Fundamentais: novo conteúdo.

Quando falamos de direitos fundamentais, logo remetemos nosso pensar à ideia de dignidade da pessoa humana, exatamente porque no cerne da doutrina que reconhece e sistematiza alguns valores como “fundamentos do Estado”, está a noção de que o homem deve ser respeitado. E são justamente esses valores que irão inspirar e justificar  a categoria de direitos fundamentais. O conceito de dignidade humana em Kant é o de dignidade como “autonomia ética do ser humano”. Ou seja, “o ser humano (indivíduo) não pode ser tratado – nem por ele próprio nem pelos outros – como objeto”[2]. Parece tranquilo afirmar que essa noção de dignidade está presente na organização social desde muito tempo[3]. Ela é, porém, retirada do âmbito exclusivo da moral e trazida para dentro do sistema jurídico, justamente em um período histórico no qual foi necessária sua (re)afirmação.

É de registrar a crítica que podemos tecer ao conceito de dignidade em Kant, voltado que é à afirmação do indivíduo como sujeito de direitos, dando pouca ou nenhuma atenção ao caráter social da noção de dignidade: à necessidade de compreender a dignidade a partir do Outro.

Para além dessa crítica, que não compromete a importância da dignidade como  parâmetro  para a criação e aplicação das normas, notadamente daquelas trabalhistas, o importante é perceber que todos os doutrinadores se reportam à época em que importantes revoluções determinaram uma mudança radical na forma de organização social.

A Declaração dos Direitos do povo da Virgínia, de 1776, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, e a Constituição Americana de 1787, são textos em que já se verifica preocupação com a inserção de direitos inalienáveis e fundamentais[4]. Todos, editados após a ruptura com um modelo de organização da sociedade. Todos, em certa medida, comprometidos com valores como liberdade e igualdade.

É preciso novamente sublinhar o corte necessário pela dimensão desse estudo: não nos deteremos nas características das revoluções dessa época, das quais a Revolução Francesa destaca-se por sua expressiva importância para a construção do (novo) direito. Também não teremos espaço para dissecar a falácia contida nos ideais de liberdade e igualdade desses movimentos de libertação. Poucos fruíram verdadeiramente a liberdade ou puderam lançar mão da igualdade idealizada no movimento revolucionário francês. Já sabemos disso.

É importante, porém, refletir acerca da radical modificação de estrutura social que se opera nesse momento histórico. Ao estabelecer uma flagrante “abertura” em termos de acesso (a bens e à influência política), essas revoluções introduziram no imaginário jurídico a noção de que o homem, como destinatário da norma, deve ser protegido inclusive de si mesmo, porque esse é o único caminho capaz de garantir uma convivência minimamente saudável. Na gênese dos direitos fundamentais, portanto, está a noção do homem entre seus pares.

Olhando para trás, no momento de “dar nome” a essa categoria de direitos que deve figurar no “fundamento de um Estado”, a doutrina reconhece como direitos fundamentais de primeira dimensão ou geração, aqueles típicos do ideário liberal-burguês do século XVIII, de cunho individualista[5]. Embora a aparente contradição possa surpreender, mantemos a convicção de que os direitos fundamentais são direitos reconhecidos para além da condição humana individual. Constituem-se uma categoria de direitos tornada especial em face da constatação de que apenas assim seria possível um convívio saudável entre os homens.

Estão, pois, umbilicalmente ligados ao chamado “princípio da comunidade”[6]. Assim, ainda que sua sistematização, ocorrida a posteriori, identifique os direitos tipicamente liberais como fundamentais, um exame crítico da matéria nos revela que essa fase inicial, de extrema importância por valorizar a liberdade como fundamento do Estado, era apenas um primeiro e tímido passo para a construção do que realmente identifica a ideia mesma de direitos fundamentais.

O que a doutrina denomina direitos fundamentais de segunda dimensão[7], ou seja, os direitos sociais, são, em nosso sentir, o cerne do conceito de direitos fundamentais, porque é com eles que começamos a pensar o Estado como uma organização social e jurídica que tem que se preocupar com e garantir o bem estar de todos.

O desenvolvimento da noção de direitos fundamentais tem relação mais íntima do que a principio pode parecer, com o Direito do Trabalho e com o princípio/dever de proteção. A sociedade se industrializa e o capitalismo se instala como forma de organização social, sob o manto do ideal liberal e é em nome de uma proposta de participação de parte mais expressiva da sociedade na economia (lato sensu), que o conceito de liberdade se modifica. À noção de propriedade agrega-se a noção de acúmulo de riqueza. E essa capacidade de acumular (vendida como qualidade individual em tempos de liberalismo clássico e reforçada com esse mesmo viés pelo chamado neoliberalismo) passa a constituir o principal elemento de divisão (ou reconhecimento) das classes sociais.

Em pouco tempo, a sociedade passa a ser identificada como uma composição formada por homens que vivem-do-trabalho (expressão utilizada por Ricardo Antunes e para a qual Marx utilizava a denominação proletariado) e homens que vivem da exploração do trabalho alheio (capitalistas). O trabalho humano subordinado à vontade e aos fatores de produção de outrem é a mola propulsora dessa nova forma de organização social.

O Direito do Trabalho inevitavelmente encontra, então, solo fértil para nascer. Uma sociedade em que a industrialização, e a mão de obra necessária para que essa industrialização aconteça (colocando mais e mais produtos no mercado, estimulando mais e mais o acúmulo de riqueza) é potencializada, será necessariamente uma sociedade sujeita a conflitos entre aqueles que trabalham (e dependem do trabalho para sobreviver) e aqueles que lucram com o trabalho[8].

É interessante perceber que até hoje povoa o senso comum a ideia de que o capitalismo é inerente à natureza humana, pensamento que nega qualquer possibilidade de sua superação enquanto sistema econômico e social. Trata-se de um equivoco de avaliação que, ao mesmo tempo, faz transparecer o que acabamos de afirmar: o modelo de exploração do trabalho e do acúmulo de riquezas foi “vendido” no período pós-revolução francesa como o perfeito encontro do homem social com sua natureza humana individual. É claro que uma reflexão breve sobre o assunto nos levaria a argumentar que o capitalismo não existiu por vários séculos. E nada mais é do que uma das tentativas do homem de organizar-se de forma satisfatória em comunidade. Desde o início deu sinais de sua falibilidade e precisou, ele mesmo, criar mecanismos de auto contenção, dos quais o Direito do Trabalho é um exemplo.

Precisamos perceber, porém, que esse senso comum, evidentemente, não é gratuito. O capitalismo talvez seja mesmo a forma de organização que melhor se amolda à natureza humana primitiva, o que não significa compreendê-lo como a única ou mesmo como a melhor forma de viver entre outros. Ao contrário, toda a história humana é determinada pela vontade coletiva, consciente ou não, de viver bem entre os pares, de dominar a natureza humana primitiva, em prol de um bom convívio social.

Retornando ao nosso tema central, interessa perceber que o Direito do Trabalho, tal como o concebemos hoje, é fruto do capitalismo, assim como os direitos fundamentais de certa forma o são. A necessidade de sistematizá-los, de reconhecer a sua importância jurídica, é sem duvida resposta aos paradoxos e aos efeitos nefastos desse sistema econômico[9].

Barbagelata refere que a questão social, ou seja, a necessidade de lidar com a realidade excludente e díspare potencializada pelo sistema capitalista está na origem não apenas do Direito do Trabalho, mas dos direitos sociais em geral[10]. Podemos acrescentar que está na origem, também, da noção que hoje temos (ou tentamos desenvolver) de princípios. As primeiras regras de direitos sociais foram trabalhistas, podendo ser utilizada como exemplo a lei que limitava o horário de trabalho dos aprendizes, datada de 1802, e citada por Barbagelata na mesma obra[11].

A sistematização do conceito de princípios encontra-se e emerge dentro dessa realidade em que percebemos, como sociedade, a necessidade de garantir direitos. Definir princípios, porém, não tem sido tarefa fácil, embora constitua fator indispensável à compreensão e especialmente à melhor aplicação do direito. Tentaremos demonstrar no próximo tópico o caminho trilhado pela doutrina, para buscar uma definição satisfatória de princípios.


2. No princípio: uma definição de princípios.

Humberto Ávila tem obra dedicada exclusivamente à definição e aplicação de princípios jurídicos, na qual inicia referindo definições de grandes autores, como Karl Larenz, para quem princípios são normas que estabelecem "fundamentos normativos para a interpretação e aplicação do direito, deles decorrendo, direta ou indiretamente, normas de comportamento" e Canaris, que os define como normas com conteúdo axiológico, que carecem de regras para a sua aplicação[12].

Refere, ainda, Dworkin, para quem a diferença entre princípios e regras não é de grau, mas de estrutura lógica: enquanto as regras atuam no campo do tudo ou nada, os princípios contêm apenas fundamentos, que podem ser conjugados com os fundamentos de outros princípios. Por fim, cita Alexy, para quem princípios são normas que encerram "deveres de otimização", e devem ser aplicados ou afastados mediante critério de ponderação (técnica da proporcionalidade)[13].

Após essa breve exposição da evolução doutrinária acerca do tema, Ávila propõe alguns critérios de dissociação entre princípios e regras. Refere que os princípios remetem a valores e devem ser examinados de modo a identificar as condutas necessárias à realização dos valores neles contidos, para um uso "racionalmente controlado"[14]. Propõe uma distinção "heurística" (portanto, comprometida com descobertas empíricas), em que um dispositivo pode conter dimensão de comportamentos, e portanto ser uma regra, mas pode também conter dimensão finalística (princípio) ou metódica (postulado)[15]. Pontua o caráter finalístico dos princípios, que segundo o autor “estabelecem um ideal de coisas a ser atingido”, sem prescrever um comportamento específico.

Menciona que as regras são “decisivas e abarcantes”, enquanto os princípios são “normas com pretensão de complementaridade e de parcialidade”[16] e culmina por conceituar princípios como “normas imediatamente finalísticas, primariamente prospectivas e com pretensão de complementaridade e de parcialidade”, cuja aplicação demanda “uma avaliação da correlação entre o estado de coisas a ser promovido e os efeitos daí decorrentes”[17].

Se formos direto à fonte, veremos que para Alexy tanto regras quanto princípios são normas, porque ambos dizem o que deve ser. Para ele, a distinção entre regras e princípios é “uma distinção entre duas espécies de normas”[18]. Na definição de Alexy, “princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível dentro das possibilidades jurídicas e fática existentes. Princípios são, por conseguinte, mandamentos de otimização”.[19]

Refere que a proporcionalidade constitui técnica a ser utilizada para a ponderação de princípios colidentes. Para ele, portanto, princípios entram em rota de colisão e precisam ser ponderados a partir de critérios que define como adequação, necessidade (mandamento do meio menos gravoso) e proporcionalidade em sentido estrito (mandamento do sopesamento propriamente dito). E acrescenta que essa ponderação “decorre logicamente da natureza dos princípios”[20]

Mesmo Alexy, porém, reconhece em sua obra que “sempre que um princípio for, em última análise, uma razão decisiva para um juízo concreto de dever-ser, então esse princípio é o fundamento de uma regra, que representa uma razão definitiva para esse juízo concreto”[21]. A diferença, de extrema relevância, é que embora ele reconheça o princípio como fundamento de uma regra, também o reconhece como “mandado de otimização” a ser aplicado diretamente pelo intérprete, passível de ser afastado quando “colidente” com outro princípio.

Por sua vez, Dworkin diz que a diferença entre regras e princípios é de natureza lógica, “distinguem-se quanto à natureza da orientação que oferecem”[22]. Enquanto as regras são aplicáveis a partir da lógica do tudo ou nada, os princípios apenas apresentam uma “razão que conduz o argumento em uma certa direção”[23], e que por isso mesmo, pode opor-se a outras razões que conduzem em sentido diverso (admite, pois, a colisão de princípios). Em seguida, acrescenta que “os princípios possuem uma dimensão que as regras não têm – a dimensão do peso ou importância”[24]. Aqui, acaba por admitir, ainda que não se utilize dos mesmos termos de Alexy, a necessidade de fazer preponderar um princípio sobre o outro, em determinado caso concreto[25].

Dworkin admite que em casos difíceis o Juiz, a partir de princípios, construa uma nova regra, o que antes de configurar elemento de superação do positivismo acrítico ou de segurança jurídica, consubstancia um perigoso retorno à discricionariedade, permitindo que o Judiciário se distancie (como tantas vezes ocorre) do sistema jurídico que deve fazer prevalecer.

Os conceitos são instrumentos de linguagem, servem para favorecer a comunicação, para identificar o que, para determinada comunidade, em certo tempo histórico, tal coisa significa. A dificuldade em definir princípios transparece claramente do uso de palavras cujo conteúdo não é imediatamente identificado ou é múltiplo. Embora a construção de uma teoria jurídica possa pretender privilegiar conceitos mais rebuscados, ela terá pouca validade prática se não trouxer respostas que sirvam à aplicação desse conteúdo aos casos concretos.

O que estamos afirmando é que a dificuldade de conceituar talvez não seja um mero acaso, e muito provavelmente denuncie a necessidade de compreender normas jurídicas (princípios + regras) a partir de sua função para a vida em sociedade.

Como afirma Warat, o direito especializou-se em ser um “núcleo muito forte de inacessibilidades, quase blindado, a qualquer aproximação interpretativa  ou reflexão filosófica”, criando um conjunto de crenças e sensos comuns que garantem “a fuga dos juristas para um paraíso conceitual”[26]. Compreender princípios é algo extremamente relevante à aplicação do direito contemporâneo. E aplicá-los de forma comprometida com o ideal de “viver bem entre os pares” é essencial para que o direito cumpra sua função. De outro modo, teríamos de concordar que o direito não passa de um conjunto de normas cujo conteúdo é inacessível a maioria da população e está à disposição dos intérpretes, para ser aplicado conforme conveniências de quem detém poder de comando (seja em que medida ou em que contexto for).

Os conceitos de princípio até agora examinados esbarram nos exemplos que autores como Canaris[27], Dworkin[28], Alexy[29], e mesmo Ávila, nos apresentam. Ao indicarem normas que consideram princípios ou formas de aplicá-las a casos concretos, os conceitos se perdem, e persistimos com a sensação de caminhar por um terreno de areias que mudam de lugar ao sabor do vento. Como, então, obter uma noção de princípio que se comprometa com uma aplicação prática capaz de concretizar nossa ideia de Estado Social e conferir efetividade ao conjunto de regras que consideramos fundamentais para esse escopo?

O que nos inquieta, portanto, é a possibilidade, a partir de definições como aquelas dos autores antes mencionados, de múltiplas aplicações do direito, nem sempre comprometidas com o sistema que, especialmente no Brasil, inauguramos a partir de 1988, e que tem objetivos bem delineados nos primeiros artigos de nossa Constituição.

Parece-nos deva ser essa a principal preocupação de quem teoriza sobre as normas jurídicas e suas categorias. Toda teoria tem função prática. De nada serve uma teoria de princípios que sirva tanto à concretização quanto ao afastamento da ideia de vida em sociedade mediante busca de justiça, fraternidade e solidariedade. Tratar-se-ia de negar a própria razão pela qual criamos e teorizamos acerca de uma categoria a que chamamos de princípios.

Para auxiliar nessa investigação, que melhor se traduz como uma inquietude, uma insatisfação diante do que estamos fazendo, como intérpretes/aplicadores do direito, recorremos à doutrina de Lenio Streck.

Lenio defende que princípios são normas, possuem força normativa, mas não são aplicáveis diretamente. Não cabe ao intérprete “pular” a regra e ir direto ao princípio. Isso porque, para o autor, e com ele concordamos, “todo princípio encontra sua realização em uma regra”. Disso decorre não apenas que poucos são os verdadeiros princípios, mas também que os princípios não existem sem a historicidade do direito”[30]. O que o autor salienta é que os princípios “não cabem dentro de uma concepção instantaneísta de tempo”, não podem ser criados pelo intérprete/aplicador, ao seu bel prazer.

E para isso, parte de uma concepção do direito, comprometida com a filosofia da linguagem, pela qual a existência mesma é compreendida como um meio, não como uma dualidade. Refere que compreender a existência como um caminho, ditado pela tradição, e nesse contexto compreender o direito, é justamente o que permite a formação legítima de uma decisão judicial, calcada na tradição e no projeto que institui através de sua Constituição[31].

Sob esse prisma, a Constituição deve ser compreendida como um evento que introduz, prospectivamente, um novo modelo de sociedade, edificado sob certos pressupostos derivados de nossa história institucional, que condicionam “toda tarefa concretizadora da norma”. É a partir da Constituição que “o direito que se produz concretamente” legitima-se, por estar de “acordo com uma tradição histórica que decidiu constituir uma sociedade democrática, livre, justa e solidária”[32].

Ao Estado-Juiz cabe concretizar o projeto constitucional, através da aplicação das regras e princípios que, ainda de acordo com o autor, valendo-se especialmente da doutrina de Dworkin (a quem tece críticas) e de Gadamer, não são espécies de norma jurídica, mas a condição de possibilidade da própria normatividade. Refere que norma é “produto da interpretação de um texto”. Portanto, “se sempre há um princípio atrás de uma regra, a norma será o produto dessa interpretação, que se dá na applicatio”[33]. Por conseguinte, a norma “só se realiza na concretude”[34] . Nesse contexto, “princípios e regras são como que condições de possibilidade da normatividade”, e não duas espécies do gênero norma jurídica[35].

Trata-se de uma concepção nova do conceito de norma que vem sendo reproduzido e que rompe com a lógica da dualidade. Parece-nos, pois, bem mais alinhada à função contemporânea do Direito.

Para Streck, ao Estado-Juiz compete fundamentar a legitimidade de sua decisão, e o faz demonstrando que a regra ali concretizada “é instituída por um princípio”. Por isso o autor afirma que “não há regra sem um princípio instituidor. Sem um princípio instituinte, a regra não pode ser aplicada, posto que não será portadora do caráter de legitimidade democrática”[36].

É nítida a preocupação com a fundamentação das decisões, que a partir dessa concepção de norma jurídica, assume um lugar especial dentro da teoria do Direito. Ao admitirmos que norma jurídica é a regra aplicada em conformidade com o princípio que a inspira, outorgamos ao Estado-Juiz o dever de bem fundamentar sua decisão, demonstrando em que medida a regra aplicada cumpre essa função integrativa, resultando efetivamente uma norma jurídica.

Além disso, a função do princípio passa a ser a inspiração e justificação de um conjunto especial de regras, que existem e são válidas na exata medida em que lhe conferem efetividade.

Nesse contexto, para que reconheçamos a existência de um princípio próprio do Direito do Trabalho, devemos identificar a razão por que as regras trabalhistas são criadas e pela qual devem ser aplicadas, sua função dentro de um Estado que se pretende democrático e solidário, embora mantenha seu ideal liberal. O princípio, assim, qualifica-se como o que está “no princípio mesmo” da criação de um determinado conjunto de regras. E é partir da coerência (dos princípios e das regras que eles inspiram e justificam) e da integridade (especialmente na interpretação/aplicação dessas normas), que o intérprete/aplicador, identificando o princípio contido na regra, poderá proferir uma decisão adequada[37].

É preciso reconhecer que dentre os princípios criticados pelo autor como sendo criações “ad hoc”, destituídas de verdadeiro conteúdo principiológico, está o princípio da proteção do Direito do Trabalho. Entretanto, o conceito e a função dos princípios, que o autor apresenta, nos permite discordar dessa conclusão. O Direito do Trabalho não reproduz o ideal de igualdade do Direito Civil. Parece-nos mesmo falaciosa a afirmação, recorrente na doutrina, de que o Direito do Trabalho, através da proteção, busca reestabelecer o equilíbrio material entre as partes.

Não que a igualdade não esteja também aqui presente. O valor igualdade, ao lado da liberdade, constituem as bases da existência do Direito e, nesse aspecto, estão em alguma medida presentes em todas as normas jurídicas. O princípio instituidor do Direito do Trabalho, porém, não é o da igualdade (formal ou material), mas o da proteção ao trabalhador em razão da possibilidade de “vender” tempo de vida.

Sob essa perspectiva, não se trata de considerar desigualmente os desiguais, mas de proteger o trabalhador enquanto tal. A igualdade, dita material, promove uma discriminação positiva para aproximar materialmente os sujeitos e suas posições na ordem jurídica. As normas trabalhistas não fazem nem objetivam isso. Reconhecem e estimulam a desigualdade material. Em uma linguagem usual, mantêm “cada um em seu lugar”, e com isso facilitam a manutenção do próprio sistema. A proteção opera como medida de reconhecimento do trabalhador como sujeito de direitos, embora sirva também para continuar a concebê-lo como um sujeito de direitos com lugar de fala e campo de atuação radicalmente diversos daqueles outorgados aos “patrões”.

Por isso mesmo, Supiot refere que o Direito do Trabalho encontra-se no ponto de encontro entre pessoas e coisas e que reconhecemos a relação de trabalho como uma espécie sui generis de contrato justamente para devolver ao trabalhador a sua condição de sujeito, já que do contrário teríamos necessariamente de reconhecê-lo como mero objeto à disposição do empregador[38]. Note-se: reconhecê-lo como sujeito não significa igualá-lo, nem mesmo reduzir suas diferenças objetivas em relação ao empregador. Justamente porque a diferença é objetiva (troca de tempo de vida por remuneração) não há como minimizá-la. O Direito do Trabalho não ignora que o trabalhador em certa medida torna-se coisa no âmbito de um contrato, mas também o reconhece como sujeito de direitos. Lida com essa dicotomia estatuindo um princípio de proteção à condição humana de quem se vende em um contrato. Surge, pois, para enfrentar esse paradoxo: lida com a realidade de um “contrato” em que o objeto não se separa do sujeito contratante.

Adotaremos, então, a noção de princípio contida na doutrina de Lenio Streck, com a ressalva de que a proteção amolda-se a essa definição, configurando-se como o princípio (para nós, em realidade, o único princípio) que orienta e justifica o Direito do Trabalho.


3. O Princípio da Proteção e o Papel da Linguagem no Direito

É possível afirmar que a proteção ao trabalho humano é o princípio, o verdadeiro princípio em razão do qual o Direito do Trabalho existe. Princípio que não se confunde com a busca da igualdade material, porque reconhece e sustenta posições desiguais. A proteção é a razão de existência de regras próprias e a função do Direito do Trabalho no contexto capitalista. Essas afirmações tentarão ser demonstradas no presente tópico.

A maioria absoluta da doutrina converge no sentido de que o principio da proteção é o que justifica a existência do Direito do Trabalho como ramo especial do direito. Então, é possível afirmar que a proteção que faz surgir o Direito do Trabalho é a proteção contra a exploração econômica, mas é também, desde o início, o reconhecimento social de que essa relação implica uma troca desigual: tempo de vida/força física em troca de remuneração/valor monetário.

Esse elemento se revela já na constituição da OIT, em 1919, em que se afirma "trabalho não é mercadoria". Aqui, claro está o reconhecimento de que a troca desigual permitida nesse tipo de contrato deve ser controlada/restringida pelo Estado, para que a força de trabalho não seja, como foi no inicio do período de industrialização, tratada como mercadoria. Reconhecer a diferença objetiva entre trabalho humano e qualquer outra mercadoria é algo que, em realidade, tornou-se uma necessidade capitalista, diante da falta de mão de obra em algumas áreas e do expressivo aumento de casos de doenças e acidentes de trabalho, a exigir atuação do Estado[39]. A história demonstra que muitas normas trabalhistas surgem como resposta a  crises do sistema econômico, bastando citar como exemplo o conjunto de regras trabalhistas impostas pelo denominado New Deal, por Rosewelt, após a quebra da bolsa de Nova York, em 1929, no país mais liberal e capitalista do mundo ocidental.

O fato, facilmente comprovável, de que o Direito do Trabalho sempre foi uma "pedra no sapato" do sistema capitalista, dentro do qual floresce e ao qual serve, a princípio pode causar certo espanto, e parecer mesmo paradoxal diante da afirmação de que o Direito do Trabalho serve ao sistema. O paradoxo, porém, é apenas aparente. O Direito do Trabalho constitui uma espécie de concessão do sistema, que certamente não o agrada em sua essência, um "mal necessário"[40].

Esse “mal”, centrado no reconhecimento da necessidade de proteção a quem trabalha, tem como conteúdo resguardar o indivíduo, em sua condição de objeto-sujeito de uma relação jurídica desigual, a fim de, assim, proteger também a sociedade. Tudo o mais que a doutrina denomina princípios do Direito do Trabalho, são em realidade decorrências, parâmetros impostos pela linha condutora da proteção.

Em outras palavras, no princípio está a proteção e se a afastarmos, nós desconfiguraremos esse direito, não porque retiramos a sua essência, mas porque retiramos a razão pela qual ele foi criado e existe até hoje, sua função. Isso é linguagem. A linguagem social do Direito do Trabalho é a minimização dos efeitos nocivos que a troca desigual (dinheiro x vida), que o Estado permite e incentiva, provoca no homem-trabalhador e na sociedade em que ele está inserido[41]. Então, todas as regras trabalhistas devem ser orientadas, contaminadas, pelo princípio que as institui, a  "proteção ao trabalhador". Por coerência, temos de negar a possibilidade de “ponderação” de princípios, na linha do pensamento de Alexy. O que realmente está no princípio e legitima a construção de um conjunto de regras não pode ser ponderado, sob pena de perda da razão mesma de ser desse microssistema.

A proteção não está, portanto, à disposição do intérprete, para ser afastada no caso concreto, a partir da ponderação com outra norma jurídica. A proteção é o que legitima a regra trabalhista, está nela necessariamente “grudada”, sob pena de invalidade, em razão da quebra da função do ordenamento jurídico trabalhista. Essa afirmação, que sabemos contrária a maioria da doutrina constitucional, é vital para que o Direito do Trabalho (malgrado as investidas do discurso flexibilizante) continue a ser Direito do Trabalho: não perca a sua genética.

É por isso que não é possível sequer pensar em regra (juridicamente válida) que institua punição do empregador ao empregado. Apesar disso, sabemos que a maioria absoluta da doutrina admite o denominado poder disciplinador/ punitivo do empregador, presente em praticamente todos os manuais, apesar do silêncio eloquente das normas trabalhistas. Isso, ao contrário de desestimular a investigação que estamos fazendo, revela a urgente necessidade de reconhecermos a importância da linguagem para a aplicação do direito, sobretudo quando o tema versa sobre princípios.

A primazia da realidade, apontada por Plá Rodriguez como princípio que decorre da proteção, é justamente o modo como a linguagem jurídica se apresenta no âmbito do Direito do Trabalho, como algo que deve servir para desvelar a questão social e minimizar suas consequências no contexto de um Estado liberal capitalista. A linguagem trabalhista é crítica em sua essência, e, portanto, jamais será neutra, porque constitui o modo de expressão desse conjunto especial de regras: seja para sublinhar as desigualdades no tratamento jurídico das partes dessa relação, seja para elevar o trabalhador ao patamar de verdadeiro sujeito de direitos. É justamente a linguagem que usamos para disfarçar o conteúdo das coisas. Aqui o primeiro indício das razões que levam os intérpretes/ aplicadores do Direito do Trabalho a agirem muitas vezes de forma oposta à ideia de proteção. A linguagem é o habitat do Direito, por isso definir princípio e aplicá-lo de acordo com essa definição é tão importante. Com a linguagem vamos justificar nossas decisões, transformar a realidade social e interferir na cultura das relações sociais.

Para isso, porém, temos inicialmente de reconhecê-la, desvelá-la. O senso comum de que os Juízes do Trabalho são “pró-empregados” ou “pró-empregadores” é exemplo eloquente da capacidade que temos de usar a linguagem contra o Direito do Trabalho. Os Juízes não podem ser “pró” essa ou aquela parte, mas havendo optado por atuarem como Juízes do Trabalho, têm dever de reconhecer e aplicar as regras a partir do princípio da proteção, com o qual assumem compromisso, ao jurarem aplicar a Constituição, que tanto no primeiro dos seus artigos, quanto em todo o seu texto, teima em insistir na necessidade de proteção à relação de trabalho[42].

O reconhecimento de outros princípios, ao contrário do que se pode imaginar, não potencializa a força da proteção no âmbito das relações de trabalho. Antes, a fragiliza. Por isso, no início desse estudo, insistimos em construir uma noção de princípio que fosse comprometida com a efetividade da norma. E adotamos a posição de Streck, para quem princípio + regra é igual a norma jurídica. Não estamos, pois, diante de espécies, mas de partes de uma mesma norma.

Sob essa perspectiva, o princípio da proteção (todo verdadeiro princípio) não será afastado nem entrará em colisão com nenhum outro. Afastar o princípio implicaria quebrar a ordem jurídica. Além dessa decorrência prática do reconhecimento do princípio da proteção como O princípio que qualifica-se como razão de ser do Direito do Trabalho e o identifica como tal, está a ideia de que regras incompatíveis com a noção de proteção ao trabalho humano não se qualificam como normas trabalhistas. Falta-lhes o princípio que as justifique.

O prejuízo decorrente da “inflação” de princípios patrocinada pela bem-intencionada doutrina trabalhista é imenso e serve a um discurso de flagrante desmanche das conquistas históricas representadas pelo direito fundamental do trabalho. A criação de princípios “ad hoc” transforma princípio em regra, aplicando-o ou afastando-o de acordo com o caso concreto. A técnica da ponderação, portanto, viceja em um ambiente que desconhece a verdadeira função do princípio. É da regra a função de determinar o comportamento em âmbito social, e bem por isso uma regra poderá ser afastada ou deixar de ser aplicada em determinado caso concreto. Essa regra, porém, estará sempre contaminada por um princípio. O princípio é o que legitimou a construção da regra. Não há como separar o princípio da regra, nem como aplicá-lo diretamente.

Mais do que uma segurança para os cidadãos que devem atuar socialmente a partir de um determinado ordenamento jurídico, essa compreensão de norma como ‘princípio mais regra’ constitui garantia de consolidação do projeto constitucional, impedindo desvirtuamentos tais como aquele que permite ao TST a edição de orientação jurisprudencial tratando de jornada de doze horas, absolutamente contrária ao artigo 7º da Constituição.

A imbricação desses conceitos com a noção de Estado Constitucional de Direito é evidente. É para reafirmar a “força normativa” da Constituição, que os princípios mudaram de roupagem e se transformaram em condições de possibilidade da normatividade. No Direito do Trabalho, esse é um poder que apenas a proteção parece deter. Mas não é pouco. Reconhecida como tal, a proteção teria o verdadeiro condão de extirpar da ordem jurídica o expressivo número de legislações e entendimentos sumulados que, diuturnamente, desafiam a lógica constitucional.

Importante observar que o reconhecimento da proteção como único princípio do Direito do Trabalho (e do direito processual ou coletivo do trabalho, que dele não se desconectam) não fragiliza preceitos como o da intangibilidade salarial, da irrenunciabilidade ou da primazia da realidade. Apenas os coloca em seu lugar: o de decorrências da noção de proteção.

A imperatividade da norma trabalhista, por exemplo, decorre diretamente da proteção que se opera inclusive contra a vontade do trabalhador. Trata-se de significativa restrição à autonomia da vontade, centrada no caráter social do trabalho humano e que se justifica num ambiente de Estado interventor, responsável pelo bom convívio social.

 Do mesmo modo, o que a doutrina denomina princípio da indisponibilidade ou irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas, nada mais é do que mero corolário da noção de que é necessário proteger o trabalho humano, por sua qualidade de sujeito e objeto, nessa relação jurídica especial. A irrenunciabilidade caracteriza-se como “a impossibilidade jurídica de privar-se voluntariamente de uma ou mais vantagens concedidas pelo direito trabalhista em benefício próprio”[43], e pressupõe a proteção ao trabalho como algo que interessa à sociedade, e não apenas ao titular do direito. É expressão disso, a impossibilidade de alteração contratual lesiva. Trata-se de norma explícita no direito constitucional brasileiro, seja na Constituição[44], seja no Código Civil[45], seja na CLT[46].

A noção de primazia da realidade, também apresentada pela doutrina como princípio, é, igualmente, expressão direta da proteção. Determina que os elementos substanciais da relação trabalhista a identificarão, e não o manto jurídico ou formal que as partes pretenderem lhe emprestar. Traduz-se nas regras da CLT, que definem a relação de trabalho a partir dos sujeitos e referem a nulidade de qualquer ato tendente a dissimulá-la. Logo, o princípio que inspira e justifica essas regras, tornando-as norma jurídica, é exatamente o da proteção ao trabalhador.

O que a doutrina nomina princípio da continuidade, pelo qual a relação de trabalho é por sua vez, decorrência lógica dessa noção de primazia da realidade. Na medida em que adotamos o modelo capitalista de produção e concebemos a realidade de que a produção passa pela exploração da mão-de-obra alheia, na mesma proporção em que o desenvolvimento econômico passa pela capacidade de consumo dos cidadãos, concebemos uma relação basilar que naturalmente se protrai no tempo. É feita para durar. A duração da relação de trabalho serve ao sistema capitalista, porque permite à empresa uma melhor organização e o maior aproveitamento da mão-de-obra (que se qualifica com o decurso do tempo) e ao trabalhador (necessariamente inserido nesse sistema), porque lhe dá condições de organizar o futuro próximo e de consumir com certa segurança[47].

Além desses pseudo-princípios, que nada mais são do que explicitações da noção de proteção, precisamos ainda referir o que Plá Rodriguez denomina “vertentes” do princípio da proteção e que, examinados de forma um pouco mais acurada, revelam-se técnicas de aplicação do princípio. A expressão “in dubio pro operario” representa a necessidade de que o intérprete / aplicador do Direito do Trabalho, diante da possibilidade de mais de uma interpretação de texto legal, resolva a questão pela interpretação mais favorável ao empregado[48], enquanto a aplicação da norma mais favorável determina que, existindo norma de hierarquia diferente no campo formal tratando sobre idêntica matéria, preferir-se-á aquela que traga condições mais benéficas ao empregado. Trata-se do que a doutrina também denomina relativização das fontes formais (hierarquia dinâmica das fontes). Por fim, a condição mais benéfica é aquela, preexistente e que beneficia o empregado. Nesse caso, a norma que lhe sobrevier e for em seu prejuízo não deve ser aplicada, justamente por sua contrariedade ao princípio da proteção.

É fácil perceber que se tratam de três técnicas para a aplicação das normas de forma a efetivar o princípio da proteção. O doutrinador uruguaio, em realidade, reconhece a fragilidade da linguagem jurídica e concebe mecanismos que não se confundem com o que está no princípio do Direito do Trabalho, mas dão ao intérprete / aplicador as “armas” necessárias para aplicá-lo em toda situação concreta.


CONCLUSÃO

O princípio da proteção é caro demais ao Direito do Trabalho. Não podemos, pois, deixar que caia na vala comum do que Lenio denomina “pan-principiologismo” e, com isso, submetê-lo a ponderações ou permitir seu afastamento no caso concreto. Princípios não são afastados nem ponderados, porque estão no princípio. Justificam a criação das regras e a elas aderem, tornando-as conforme à ordem constitucional vigente. Assumimos, nesse artigo, nosso compromisso com um referencial teórico pelo qual poucos são os verdadeiros princípios. E defendemos a ideia de que ao intérprete/aplicador cabe, justamente, reconhecê-los, para que possa aplicar as regras em consonância com sua função, sua razão de ser.

A espinha dorsal do Direito do Trabalho é determinada pela noção de proteção ao trabalho humano. Aí encontramos a justificativa para a existência de regras que limitam a vontade, visando a proteção ao homem trabalhador. Se afastamos o princípio da proteção já não estamos mais falando de Direito do Trabalho. É isso que precisa ser urgentemente reconhecido. E não se trata de uma constatação teórica. As decorrências práticas são inúmeras. Implica ao intérprete/aplicador a adoção de uma postura comprometida com a proteção ao trabalho humano, de sorte a afastar ou aplicar as normas jurídicas de forma adequada.

Ao fantasma da resposta correta como um retorno ao positivismo acrítico, Lenio Streck responde com maestria, decifrando o enigma da esfinge de forma clara: a resposta correta não é a vontade do legislador ou o conteúdo do texto de determinada regra jurídica. A resposta correta (ou adequada, expressão que nos parece mais pertinente) é aquela que torna vivo o projeto constitucional. E o nosso constituir de um novo Estado, no âmbito das relações de trabalho, é justamente o constituir da proteção que minimiza os efeitos nocivos da troca desigual aí operada.

Se é verdadeira a premissa de que os princípios não permitem uma maior margem de interpretação, mas, ao contrário, indicam o modo adequado de decidir, então é essa a ‘resposta correta’, para utilizar a expressão de Dworkin, que o Direito do Trabalho deve perseguir. Decisões comprometidas com a proteção ao trabalhador, superando, de uma vez por todas, o temor que os interprétes/aplicadores do Direito do Trabalho tem em assumir tal compromisso.


OBRAS CONSULTADAS

ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Trad. Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros Editores, 2008.

AVILA, Humberto. Teoria dos Princípios. Da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 10 edição. São Paulo: Malheiros, 2009.

BARBAGELATA, Hector-Hugo. Curso sobre La Evolucion del Pensamiento Juslaboralista. Montevideo: fundacion de cultura universitária, 2011.

CANARIS, Claus-Wilhelm. Direitos fundamentais e Direito Privado. Coimbra: Almedina, 2ª reimpressão, 2009

DWORKIN, RONALD. Levando os Direitos a Sério. 3ª edição. 2ª tiragem. São Paulo: Martins Fontes, 2011.

MORAES, Evaristo de. Os Accidentes no Trabalho e sua reparação. Edição fac-similada. São Paulo: LTr, 2009.

RODRIGUES, Plá. Princípios do Direito do Trabalho. 3ª edição. São Paulo: LTr, 2000.

SANTOS, Boaventura de Souza. Pela mão de Alice: o social e o político na pós modernidade, 10 ed., São Paulo: Cortez, 2005.

SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 9ª edição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.

SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988. 3ª edição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004.

SEVERO, Valdete Souto. Crise de Paradigma no Direito do Trabalho Moderno: Jornada. Porto Alegre: Sergio Fabris, 2009.

STRECK, Lenio Luiz. Verdade e Consenso. Constituição, Hermenêutica e Teorias Discursivas. 4a edição. São Paulo: Saraiva, 2011.

SUPIOT, Alan. Critique du Droit du Travail. 2ª edicion. Paris: Quadrige, 2007.

WARAT, Luis Alberto. A Rua Grita Dionísio! Direitos Humanos da Alteridade, Surrealismo e Cartografia. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.


Notas

[1] RODRIGUEZ, Plá. Princípios do Direito do Trabalho. 3ª edição. São Paulo: LTr, 2000, p. 35.

[2] SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988. 3ª edição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 32.

[3] Por isso Sarlet, na mesma obra, refere que a dignidade da pessoa humana não pode ser “dada”, concedida pelo ordenamento jurídico. Trata-se de qualidade ínsita à condição humana. (Op. Cit., p. 69).

[4] SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 9ª edição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 51.

[5]  Op. Cit., p. 54.

[6] Essa é uma expressão utilizada por Boaventura de Souza Santos, e que ele identifica com o que denomina “segundo período do capitalismo”, caracterizado pela ideia de cidadania social, de desenvolvimento econômico socialmente comprometido. (SANTOS, Boaventura de Souza. Pela mão de Alice: o social e o político na pós modernidade, 10 ed., São Paulo: Cortez, 2005, p. 243-4).

[7] Estamos utilizando, propositadamente, a nomenclatura adotada por Ingo Sarlet, em lugar de “geração”, por entendê-la mais adequada.

[8] Como escrevemos em outra oportunidade: "Sobre essa égide fundamenta-se o Estado Moderno. O trabalho passa – de mera atividade opcional motivada pela liberdade – a constituir condição de sobrevivência do homem moderno. A Revolução Industrial solidifica a noção do homem como parte de uma organização destinada à produção de bens. As atividades se especializam e as fábricas passam a ver o homem-trabalhador como mais uma peça necessária à consecução de um resultado final gerador de lucro. Já na época, a exclusão social era fator indispensável ao desenvolvimento do sistema capitalista, pois não eram todos os homens que deveriam ser 'reificados', trocando sua mão-de-obra pelo mínimo indispensável à sua sobrevivência. O conceito de classe social é, pois, ínsito à organização capitalista de produção, que parte do pressuposto de que muitos trabalham para que alguns acumulem riqueza. (...) o capitalismo torna o acúmulo de riqueza um objetivo de tal modo arraigado à condição humana de existência, que faz com que se admita, mesmo em uma sociedade centrada em valores humanos como a nossa, que homens, mulheres e crianças sejam explorados por várias horas do dia, fazendo-os crer serem “colaboradores” ou candidatos a uma riqueza da qual jamais poderão desfrutar". SEVERO, Valdete Souto. Crise de Paradigma no Direito do Trabalho Moderno: Jornada. Porto Alegre: Sergio Fabris, 2009.

[9] A história do Direito do Trabalho revela, seja em nível nacional ou internacional, que a edição de normas protetivas aos trabalhadores surge antes de tudo como uma necessidade de reafirmação e desenvolvimento do sistema capitalista, notadamente no período que sucede as duas grandes guerras.

[10] BARBAGELATA, Hector-Hugo. Curso sobre La Evolucion del Pensamiento Juslaboralista. Montevideo: fundacion de cultura universitária, 2011, p. 76.

[11] Idem, p. 36.

[12] AVILA, Humberto. Teoria dos Princípios. Da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 10 edição. São Paulo: Malheiros,  p. 36.

[13] Idem, p. 37.

[14] Op. Cit., p. 65.

[15] Idem, p. 69.

[16] AVILA, Humberto. Teoria dos Princípios. Da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 10 edição. São Paulo: Malheiros,  p. 77.

[17] Idem, p. 78.

[18] ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Trad. Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros Editores, 2008, p. 87.

[19] Idem, p. 90. O autor segue referindo que “as regras são normas que são sempre ou satisfeitas ou não satisfeitas (...) Regras contém, portanto, determinações no âmbito daquilo que é fática e juridicamente possível. Isso significa que a distinção entre regras e princípios é uma distinção qualitativa, e não uma distinção de graus” (Op. Cit., p. 91). E conclui que  “conflitos entre regras ocorrem na dimensão da validade, enquanto as colisões entre princípios – visto que só princípios válidos podem colidir – ocorrem, para além dessa dimensão, na dimensão do peso” (p. 94).

[20] Op. Cit., p. 116.

[21] Idem, p. 94.

[22] DWORKIN, RONALD. Levando os Direitos a Sério. 3ª edição. 2ª tiragem. São Paulo: Martins Fontes, 2011, p. 39.

[23] Op. Cit., p. 40.

[24] Idem, p. 42.

[25] Dworkin também admite que o mesmo enunciado possa funcionar, do ponto de vista prático como uma regra e do ponto de vista substantivo como um princípio (Op. Cit., p. 45), fragilizando a possibilidade de compreensão de suas diferenças. Isso, porém, apenas evidencia o que tentaremos demonstrar em nosso breve estudo: regras e princípios estão irremediavelmente unidos para a formação do que devemos hoje conceber como norma jurídica. A impressão de que sob certo ponto de vista um enunciado é regra, e sob outro ele configura-se como princípio é evidência disso. Trata-se de detectar o princípio que “está por trás” ou se une à regra, justificando-a, para então com ela dar origem a uma norma juridicamente válida.

[26]  WARAT, Luis Alberto. A Rua Grita Dionísio! Direitos Humanos da Alteridade, Surrealismo e Cartografia. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 55.

[27] CANARIS, Claus-Wilhelm. Direitos fundamentais e Direito Privado. Coimbra: Almedina, 2ª reimpressão, 2009.

[28] DWORKIN, RONALD. Levando os Direitos a Sério. 3ª edição. 2ª tiragem. São Paulo: Martins Fontes, 2011.

[29] ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Trad. Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros Editores, 2008.

[30] STRECK, Lenio Luiz. Verdade e Consenso. Constituição, Hermenêutica e Teorias Discursivas. 4a edição. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 581.

[31] “A faticidade de nossa existência mostra que sempre estamos situados no meio. Literalmente, poderíamos dizer que a existência é sempre travessia. Travessia é caminho e esse caminho se torna percorrível a partir das marcas que são nele impressas pela tradição. Os princípios são, portanto, estas marcas que balizam a formação da história institucional do direito. Esta história institucional possibilita a formação legítima de algo como uma decisão judicial. Eis, portanto, o sentido que se projeta como horizonte quando falamos em princípios.” (Op. Cit., p. 545)

[32] Idem, p. 546.

[33] Op. Cit., p. 549.

[34] Idem, p. 550.

[35] Idem, ibidem. O autor refere que“as regras constituem modalidades objetivas de solução de conflitos. Elas regram o caso, determinando o que deve ou não ser feito. Os princípios autorizam esta determinação; eles fazem com que o caso decidido seja dotado de autoridade que – hermeneuticamente – vem do reconhecimento da legitimidade. O problema da resposta adequada/ correta, neste caso, só é resolvido na medida em que seja descoberto o principio que institui (legitimamente) a regra do caso. (p. 562) 

[36] Idem, p. 546.

[37] STRECK, Lenio Luiz. Verdade e Consenso. Constituição, Hermenêutica e Teorias Discursivas. 4ª edição. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 551. O autor prefere o termo “adequada” ao de decisão correta e deixa claro que a adequação se dá especialmente em relação ao ordenamento, cuja “estrela guia” é a Constituição, comprometida com valores históricos (passado) e com um projeto de sociedade (futuro). A integridade é representada inclusive por esse “respeito” à construção histórica do Direito, evidenciado pelas decisões já proferidas em casos semelhantes. A coerência também remete à história do Direito, mas reclama, ainda, uma preocupação com o projeto constitucional, com o devir, e, pois, muitas vezes implica ruptura com decisões pretéritas. A principal diferença, é que essa ruptura precisa ser justificada a partir do princípio que institui a regra a ser aplicada ou que fundamenta seu afastamento, em determinado caso concreto. O ônus argumentativo se eleva significativamente.

[38] SUPIOT, Alain. Critique Du Droit Du Travail. 2a édition, Paris: Quadrige/PUF, 2007, p. 43.

[39] Nesse sentido, é imprescindível a leitura da obra reeditada, de Evaristo de Moraes: MORAES, Evaristo de. Os Accidentes no Trabalho e sua reparação. Edição fac-similada. São Paulo: LTr, 2009. No primeiro capítulo, o autor refere a necessidade de compreender trabalho como algo dissociado do conceito de mercadoria, embora reconheça que o sistema capitalista procura identificar ao máximo as duas coisas. Também nesse sentido, é exemplar a obra de Barbagelata BARBAGELATA, Hector-Hugo. Curso sobre La Evolucion del Pensamiento Juslaboralista. Montevideo: fundacion de cultura universitária, 2011.

[40] E como qualquer mal necessário, é tolerado, mas constantemente combatido pelo sistema. Talvez daí possamos extrair um dos principais motivos pelos quais a história de construção e desenvolvimento do Direito do Trabalho, a exemplo da historia em geral, caracterize-se como um pêndulo, que avança e se retrai em um constante e tenso movimento de vai-e-vem.

[41] Esse caráter social é facilmente percebido. A dispensa de um empregado não é fato individual, mas algo que, ao mesmo tempo afeta – podendo mesmo destruir – a vida de quem perdeu o emprego, de seus familiares, e da comunidade em que ele está inserido. Em um mundo globalizado, o fenômeno da flexibilização bem nos mostrou o quanto o desrespeito aos direitos trabalhistas de um chinês ou indiano, pode afetar diretamente a vida de trabalhadores brasileiros.

[42] O faz quando declara que os valores sociais do trabalho constituem fundamento da República (art. 1º), quando refere que o trabalho é um direito social fundamental (art. 6º), quando elenca direitos trabalhistas trazendo-os para o capítulo dos direitos fundamentais (artigos 7º a 11º) e, especialmente, quando determina que a ordem econômica se subordina à função social (art. 170).

[43] PLA RODRIGUEZ. Princípios do Direito do Trabalho. 3ª edição. São Paulo: LTr, 2000, p. 142.

[44] Art. 100, § 1º-A Os débitos de natureza alimentícia compreendem aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou invalidez, fundadas na responsabilidade civil, em virtude de sentença transitada em julgado

[45] A natureza irrenunciável do direito alimentar está prevista no art. 1.707 do Código Civil. Pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação ou penhora.

[46] Art. 9º da CLT- Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação.

Art. 444 da CLT - As relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes.

Art. 468 da CLT - Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia. Parágrafo único - Não se considera alteração unilateral a determinação do empregador para que o respectivo empregado reverta ao cargo efetivo, anteriormente ocupado, deixando o exercício de função de confiança.

[47] PLÁ RODRIGUEZ, Américo. Princípios de Direito do Trabalho. 3ª edição. São Paulo: LTr, 2000, p. 242.

[48] Idem, p. 132.


Autor

  • Valdete Souto Severo

    Valdete Souto Severo

    Juíza do Trabalho em Porto Alegre (RS). Especialista em Direito Processual Civil pela UNISINOS. Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela UNISC. Master in Diritto del Lavoro e della Sicurezza Sociale presso la Università Europea di Roma. Especialista em Direito do Trabalho pela UDELAR – Universidade do Uruguai. Mestre em Direitos Fundamentais pela PUC/RS. Doutoranda em Direito do Trabalho na USP/SP.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SEVERO, Valdete Souto. Princípio da proteção. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3633, 12 jun. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24690. Acesso em: 18 abr. 2024.