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A responsabilidade tributária dos sócios da sociedade limitada e a inconstitucionalidade da aplicação do artigo 13 da Lei nº 8.620/93

A responsabilidade tributária dos sócios da sociedade limitada e a inconstitucionalidade da aplicação do artigo 13 da Lei nº 8.620/93

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Para que a responsabilidade tributária por débitos da empresa recaia sobre a pessoa do sócio, não basta o simples inadimplemento pela pessoa jurídica; também deve haver ligação entre o fato gerador e a conduta praticada pelo sócio.

1 INTRODUÇÃO

O objetivo do presente trabalho é discutir acerca da responsabilidade tributária dos sócios da sociedade limitada, tendo um enfoque voltado especialmente no âmbito da seguridade social, mais precisamente, na inconstitucionalidade da aplicação do artigo 13 da Lei nº 8.620/93.

Sendo assim, resta imprescindível num primeiro momento, o estudo dos fundamentos necessários para a responsabilização tributária dos sócios da sociedade limitada, sendo relevante destacar qual o entendimento da doutrina e jurisprudência acerca do assunto.

 Isso porque, diante da autonomia concedida as pessoas jurídicas, os sócios e administradores das empresas, em regra, não devem constar no pólo passivo de executivo fiscal e, consequentemente, responder com os seus bens particulares.

Contudo, diante dos casos de desvio de finalidade da personalidade da pessoa jurídica, o Código Tributário Nacional criou circunstâncias, através dos artigos 134 e 135 (terceiros), para responsabilizar sócios e administradores diante de algumas situações.

 Os referidos artigos citados, utilizados como freio para a má utilização da autonomia patrimonial das sociedades, são exceção a regra, devendo ser utilizados somente nos casos onde reste constatado que os créditos decorrem de obrigações tributárias oriundas de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos.

Posteriormente, será estudado a responsabilidade tributária dos sócios da sociedade limitada frente a seguridade social. Nesse ponto, será debatido alguns aspectos gerais da norma instituída no artigo 13 da lei nº 8.620/9, a existência de responsabilidade tributária do tipo objetiva disposta no caput do referido artigo, bem como a responsabilidade subjetiva vislumbrada no seu parágrafo único.

Por fim, será abordado os fundamentos que levam a interpretação da inconstitucionalidade do artigo 13 da lei nº 6.820/93 e, ainda, a posição dos Tribunais sobre o tema em discussão.


2 DA RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA

Antes de adentrarmos nas questões relevantes quanto a responsabilidade tributária, resta necessário alguns comentários sobre relações jurídicas tributárias, obrigações e sujeição passiva.

Quanto a relação jurídica, segundo Paulo de Barros Carvalho, consistiria no “vínculo abstrato, segundo o qual, por forçada imputação normativa, uma pessoa, chamada de sujeito ativo, tem o direito de exigir de outra, determinado sujeito passivo, o cumprimento de certa prestação”.[1]

Diante desse raciocínio, podemos concluir que a relação jurídica tributária decorre do vínculo entre o Estado, este como sujeito ativo, e o contribuinte ou responsável, na condição de sujeito passivo.

Assim, temos que a relação jurídica tributária possui natureza de obrigação (art. 113 do CTN), face a existência de uma relação entre sujeito ativo e sujeito passivo, a qual decorre, consequentemente, de um débito e um crédito.

Dessa forma, no que tange a obrigação tributária, calha trazer, novamente, as palavras do professor Paulo de Barros Carvalho:

Assim, recolhendo o vocábulo obrigação como sinônimo de relação jurídica economicamente apreciável, podemos defini-lo como o vínculo abstrato, que surge pela imputação normativa, e consoante o qual uma pessoa, chamada de sujeito ativo, credor ou pretensor tem o direito subjetivo de exigir de outra, denominada sujeito passivo ou devedor, o cumprimento da prestação de cunho patrimonial. Advertimos que o termo obrigação costuma ser empregado com outras significações, representando o dever jurídico cometido ao sujeito passivo, no seio das relações de cunho econômico (obrigacionais) e, até, o próprio dever jurídico, nos liames não-obrigacionais. Vê-se que a palavra é multisignificativa, problema semântico que persegue e atormenta constantemente o cientista do direito.[2]

Já Hugo de Brito Machado, em relação ao conceito de obrigação tributária, dispôs:

Diríamos que ela é relação jurídica em virtude da qual o particular (sujeito passivo) tem o dever de prestar dinheiro ao Estado (sujeito ativo), ou de fazer, não fazer ou tolerar algo no interesse da arrecadação ou fiscalização dos tributos, e o Estado tem o direito de constituir contra o particular um crédito.[3]

Ademais, quanto a obrigação tributária, temos que o seu surgimento não está ligado a vontade do sujeito passivo, eis que a mesma decorre de previsão legal, ou seja, possui natureza ex lege.

Nesse mesmo raciocínio, Luciano Amaro:

“O nascimento da obrigação tributária independe de uma manifestação de vontade do sujeito passivo dirigida à sua criação. Vale dizer, não se requer que o sujeito passivo queira obrigar-se; o vínculo obrigacional tributário abstrai a vontade e até o conhecimento do obrigado: ainda que o devedor ignore ter nascido a obrigação tributária, esta o vincula e o submete ao cumprimento da prestação que corresponda ao seu objeto”[4]

Logo, podemos fixar o entendimento de que o nascimento da obrigação tributária não ocorre através da iniciativa do sujeito passivo, visto que a mesma decorre de lei, a qual define fatos, atos ou negócios como fatos geradores de recolhimento de tributo.

Assim, delineados as questões referente a relação jurídica e obrigação tributária, resta necessário a analise da sujeição passiva da obrigação tributária.

Nesse ponto, temos como relevante, mais uma vez, a definição do professor Paulo de Barros Carvalho, o qual entende que o sujeito passivo da relação jurídica tributária  “é a pessoa – sujeita de direitos - física ou jurídica, privada ou pública, de que se exige o cumprimento da prestação: pecuniária, nos nexos obrigacionais; e insuscetível de avaliação patrimonial, nas relações que veiculam meros deveres instrumentais ou formais”.[5]

Já Geraldo Ataliba, entende o seguinte quanto a sujeição passiva tributária:

Sujeito passivo da obrigação tributária é o devedor, convencionalmente chamado de contribuinte. É a pessoa que fica na contingencia legal de ter o comportamento objeto da obrigação, em detrimento só próprio patrimônio  e em favor do sujeito ativo. É a pessoa que terá diminuição patrimonial, com a arrecadação do tributo”.[6]

No Código Tributário Nacional, o sujeito passivo da obrigação tributária encontra-se descrito no artigo 121, veja-se:

Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento do tributo ou penalidade pecuniária.

Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se:

I – contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador;

II – responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei.

Conforme visto no parágrafo único do art.121 do CTN citado acima, o sujeito passivo da obrigação principal será chamado de contribuinte ou de responsável, ou seja, a denominação irá depender da ligação existente com o fato gerador.

Quanto a sujeição passiva da obrigação tributária, Hugo de Brito Machado, faz apropriada distinção entre contribuinte e responsável, veja-se:

“É contribuinte a pessoa natural ou jurídica, que tem relação pessoal e direta com o fato gerador do tributo. O contribuinte é o devedor do tributo. E pode ser também responsável pelo seu pagamento, como de um modo geral acontece. Basta que a lei não atribua tal responsabilidade a outrem. Ou, se o fizer, reserve também ao contribuinte responsabilidade, solidária ou subsidiária”.

É responsável a pessoa, natural ou jurídica que, sem revestir a condição de contribuinte, vale dizer, sem ter relação pessoal e direta com o fato gerador do tributo, está obrigada a fazer o recolhimento respectivo por disposição expressa da lei. Não é o devedor do tributo, mas tem a responsabilidade por seu pagamento porque a lei assim estabeleceu.”[7]

E, ainda, quanto a sujeição passiva, esta pode ser classificada como direta ou indireta, conforme muito bem exposto por Regina Helena Costa:

Em síntese, podemos concluir, singelamente, o seguinte: na obrigação principal, o sujeito passivo direto ou contribuinte é o protagonista do fato ensejador do nascimento do vínculo; já o chamado sujeito passivo indireto ou responsável, terceiro em relação ao fato jurídico tributário, é o protagonista da relação jurídica distinta, uma vez que alcançado pela lei para satisfazer a prestação objeto da obrigação principal contraída por outrem em virtude da prática do ato ilícito (descumprimento de dever próprio), ou em função da disciplina assecuratória da satisfação do crédito tributário”.[8]

Complementando a sujeição passiva tributária, temos como imprescindível a classificação feita por Renato Lopes Becho em relação ao CTN:

A solidariedade foi destacada, pelo legislador, da sujeição passiva direta ou indireta, recebendo disciplina do art. 124. A transferência por sucessão e por responsabilidade foi unificada, pelo legislador, sob o rótulo de responsabilidade: responsabilidade por sucessão (arts. 129 a 133), responsabilidade de terceiros (arts.134 e 135) e responsabilidade por infrações (arts. 136 a 138).”[9]

Portanto, quanto a responsabilidade tributária, entendemos como coerente as palavras de Bernardo Ribeiro:

“Podemos definir responsabilidade tributária como a relação jurídica derivada, em virtude da qual uma pessoa (ou mais), denominada devedora, fica adstrita a satisfazer certa prestação em proveito de outra, denominada credora, em razão do inadimplemento da obrigação tributária originária. Responsável tributário é a pessoa jurídica derivada, com a obrigação de assumir as conseqüências do inadimplemento da obrigação tributária”.

Assim, tendo em vista que a espécie de responsabilidade tributária foco deste trabalho é a de terceiros, mais especificamente aquela prevista no inciso III do art. 135 do CTN, trataremos no ponto a seguir algumas peculiaridades do referido artigo.

2.1 DA RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA PREVISTA NO ARTIGO 135, INCISO III, DO CTN

Nesse ponto, o estudo está totalmente voltado a responsabilidade do administrador da sociedade limitada, tendo como enfoque a sua analise a partir do inciso III, do art. 135 do CTN, o qual dispõe:

Art.135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos:

(....)

III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.

Diante de uma leitura no referido dispositivo, temos que o mesmo descreve uma hipótese de responsabilidade direta e exclusiva de terceiro.

Nesse sentido, Sacha Calmon Navarro Coelho:

A responsabilidade passa a ser pessoal, plena e exclusiva desses terceiros. Isto ocorrerá quando eles procederem com manifesta malícia (mala fides) contra aqueles que representam, toda vez que for constatada a prática de ato ou fato eivado de excesso de poderes ou com infração de lei, contrato social ou estatuto. O regime agravado de responsabilidade tributária previsto no artigo estende-se, é óbvio, peremptoriamente, àquelas duas categorias de responsáveis previstas no rol dos incisos I e II (mandatários, prepostos, empregados e os diretores, gerentes e representantes de pessoas jurídicas de Direito Privado). O dispositivo tem razão em ser rigoroso, já que fitos responsáveis terão agido sempre de má-fé, merecendo, por isso mesmo, o peso inteiro da responsabilidade tributária decorrente de seus atos, desde que tirem proveito pessoal da infração, contra as pessoas jurídicas e em detrimento do Fisco”.[10]

Quanto aos atos praticados pelos sócios com poderes de administração, Hugo de Brito Machado, muito bem expôs as irregularidades que geram a responsabilidade destes, veja-se:

“É importante notar-se que a responsabilidade dos sócios-gerentes, diretores e administradores de sociedades, nos termos do art. 135, III, do CTN, é por obrigações resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos. Poder-se-ia, assim, sustentar que a obrigação, pela qual respondem, há de ser resultante de atos irregularmente praticados. O próprio nascimento da obrigação tributária já teria de ser em decorrência de atos irregulares.”[11]

Complementando o entendimento de Hugo de Brito Machado, no que se refere aos requisitos para aplicação do art. 135 do CTN, temos como necessário transcrever as palavras de Misabel Abreu Machado Derzi:

“A aplicação do art.135 supõe assim:

1. a prática de ato ilícito, dolosamente, pelas pessoas mencionadas no dispositivo;

2. ato ilícito, como infração de lei, contrato social ou estatuto, normas que regem as relações entre contribuinte e terceiro-responsável, externamente à norma tributária básica ou matriz, da qual se origina o tributo;

3. a autuação tanto da norma básica (que disciplina a obrigação tributária em sentido restrito) quanto da norma secundária (constante no art. 135 e que determina a responsabilidade do terceiro, pela prática do ilícito).

A peculiaridade do art. 135 está em atos ilícitos ali mencionados, que geram a responsabilidade do terceiro que os pratica, são causa (embora externa) do nascimento da obrigação tributária, contraída em nome do contribuinte; mas contrariamente a seus interesses. São, assim, do ponto de vista temporal, antes concomitantes ao acontecimento do fato gerador da norma básica, que dá origem à obrigação. Por isso, o dispositivo menciona ‘obrigações resultantes de atos praticados com excesso de poderes, infração de lei, contrato social ou estatuto’.”[12]

Logo, não há que se falar que o simples inadimplemento do tributo, ou seja, sem a ocorrência de algum ilícito praticado pelo sócio-gerente, para configurar a hipótese de responsabilidade tributária.

Aliás, Hugo de Brito Machado sobre tal assunto assim já se manifestou:

 Não se pode admitir que o não pagamento do tributo configure a infração de lei, capaz de ensejar tal responsabilidade, porque isto levará a suprimir-se a regra, fazendo prevalecer, em todos os casos, a exceção. O não cumprimento de uma obrigação tributária qualquer, e não apenas de uma obrigação tributária, provocaria a responsabilidade do diretor, gerente ou representante da pessoa jurídica de direito privado inadimplente. O que a lei estabelece como regra, isto é, a limitação da responsabilidade dos diretores ou administradores dessas pessoas jurídicas, não pode ser anulado por esse desmedido elastério dado à exceção.[13]

Dessa forma, podemos concluir que a responsabilidade disposta no art. 135 do CTN é subjetiva, eis que para sua ocorrência resta necessário a existência de provas da efetiva conduta dolosa.

Esse também é o entendimento jurisprudencial:

TRIBUTÁRIO – EXECUÇÃO FISCAL – REDIRECIONAMENTO – RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DO SÓCIO-GERENTE – ART. 135 DO CTN.

1. É pacífico nesta Corte o entendimento acerca da responsabilidade subjetiva do sócio-gerente em relação aos débitos da sociedade. De acordo com o artigo 135 do CTN, a responsabilidade fiscal dos sócios restringe-se à prática de atos que configurem abuso de poder ou infração de lei, contrato social ou estatutos da sociedade.

2. O sócio deve responder pelos débitos fiscais do período em que exerceu a administração da sociedade apenas se ficar provado que agiu com dolo ou fraude e exista prova de que a sociedade, em razão de dificuldade econômica decorrente desse ato, não pôde cumprir o débito fiscal. O mero inadimplemento tributário não enseja o redirecionamento da execução fiscal.

Embargos de divergência providos.

(EAg 494.887/RS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 23/04/2008, DJe 05/05/2008) (G.N.)

Ademais, deve ficar claro que não é todo sócio que deve responder pelo débito tributário, eis que a responsabilização prevista no art. 135 do CTN, aponta a necessidade de poderes de administração. Nessa linha, novamente, Hugo de Brito Machado:

Destaque-se desde logo que a simples condição de sócio não implica responsabilidade tributária. O que gera a responsabilidade, nos termos do art. 135, III, do CTN, é a condição de administrador de bens alheios. Por isto a lei fala em diretores, gerentes ou representantes. Não em sócios. Assim, se o sócio não é diretor, nem gerente, isto é, se não pratica os atos da administração da sociedade, responsabilidade não tem pelos tributos desta.”[14]

A jurisprudência segue o mesmo raciocínio:

EMENTA: “PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. REDIRECIONAMENTO. SÓCIO. ART. 135, III, DO CTN. HIPÓTESE NÃO CONFIGURADA.

1.A agravada não detém a qualidade de sócia-gerente da sociedade executada, para o fim de indicá-la como co-responsável tributário, nem mesmo há indícios de que a recorrida teria incidido em qualquer das hipóteses previstos no artigo 135, inc. III, do Código Tributário Nacional. Precedente do STJ: REsp 751858/SC, Rel. Ministro  TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04.08.2005, DJ 22.08.2005 p. 159.

2.Não se pode atribuir responsabilidade tributária à sócia da sociedade executada pelos créditos exigidos, com fundamento no artigo 135, III, do CTN, sem que haja efetiva comprovação de que a recorrida estivesse investida de funções administrativas, e que, nessa condição, tivesse praticado atos com excesso de poder ou infração à lei, contrato social ou estatuto, a ensejar o redirecionamento da execução fiscal.

3.A agravante não trouxe argumentos que alterassem o quadro descrito acima.

4.Agravo interno conhecido e desprovido

(Tribunal Regional Federal da 2ª Região. Agravo interno em Agravo de Instrumento nº 2004.02.01.006703-7 – Relator Juiz Federal Convocado Rogério Tobias de Carvalho. Data do julgamento: 30/01/2007). (G.N.).”

Fora isso, o débito cobrado deve ter ligação direta com o administrador da sociedade, tendo em vista a necessidade de o ato praticado ter decorrido de excesso de poderes ou infração a lei, contrato social ou estatuto.

Até porque, quem orienta e da o rumo da sociedade é o administrador, motivo que somente este poderá praticar atos ilícitos e, consequentemente, ser responsabilizado.

Reforçando tal entendimento, transcreve-se os ensinamentos de Leonardo Nunes Marques:

“Por fim, é importante que seja frisado que não é todo e qualquer membro da sociedade que pode ser responsabilizado pelo cumprimento da obrigação tributária. Apenas o sócio-gerente, e não qualquer sócio, mesmo que majoritário. A redação da lei é clara e não comporta ampliações. Até porque apenas estes são capazes de praticar atos que fazem surgir a responsabilidade pelo pagamento do tributo, conforme se verá. O sócio-gerente é aquele responsável por direcionar os negócios da sociedade, levando-a a praticar os atos necessários ao alcance de seu objetivo social. Dessa forma, é justamente o sócio-gerente quem pode conduzir a empresa à prática dos atos infringentes à lei, decorrentes de abuso de poderes ou violadores do contrato social.”[15]

E, ainda, face a permissão concedida no novo Código Civil ao possibilitar a administração de sociedade limitada por terceiros não sócios, temos o entendimento de que a responsabilidade disposta no art. 135, III, do CTN, pode ser aplicada a estes também.

Outro ponto relevante para aplicação da responsabilidade disposta no art. 135, III, do CTN é a questão do aspecto temporal. Ou seja, as condutas praticadas pelas pessoas descritas no referido artigo devem ter sempre ligação com o período do débito.

Nessa linha, quanto a necessidade temporal para responsabilização, segue o entendimento jurisprudencial:

TRIBUTÁRIO - AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO - REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO FISCAL - NÃO PROVIMENTO.

- Decisão monocrática desta Corte, ora agravada, reformando o entendimento do Juízo da Execução Fiscal e excluindo do pólo passivo Ledir Dias de Araújo.

- A documentação acostada aos autos comprova que, durante o período do débito (ano-base 1980 - fl. 18), o sócio em questão não possuía poderes de gerência, conforme assim o  exige a norma do art. 135, III, do CTN (fls. 156/159 e 171/175).

- Agravo de instrumento tempestivo, já que os autos não se encontravam na Secretaria durante o transcurso do prazo recursal, o que foi comprovado nos autos.

-Recurso não provido. 

(Tribunal Regional Federal da 2ª Região. Agravo de Instrumento nº 200402010034860 – Relator Des. Luiz Antônio Soares. Data do julgamento: 06/12/2006). (G.N.)

Enfim, diante de tudo que foi exposto, podemos concluir objetivamente que para a configuração da responsabilidade prevista no art. 135, III, do CTN, resta necessário a existência de poderes de administração, ocorrência de uma conduta abusiva e, por fim, ligação temporal destas com o débito.

Sendo assim, feita as considerações necessárias quanto a responsabilidade tributária dos sócios-administradores da sociedade limitada (terceiros), surge a necessidade do estudo art. 13 da lei nº 8.620/93, o qual gerou uma nova modalidade de responsabilização diante do inadimplemento dos créditos perante a seguridade social, conforme adiante será debatido.


3 RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DECORRENTE DA INCONSTITUCIONALIDADE DA APLICAÇÃO DO ARTIGO 13 DA LEI Nº 8.620/93

O surgimento da Lei Ordinária nº 8.620/93, ao tratar da responsabilidade dos sócios perante a seguridade social, trouxe, consequentemente, uma enorme dor de cabeça aos sócios de empresas e operadores do direito.

Dessa forma, diante da sua repercussão no mundo tributário, torna-se relevante o seu estudo, motivo que a seguir trataremos alguns aspectos da refira norma, bem como os fundamentos que levam a interpretação de sua inconstitucionalidade.

3.1 DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA DISPOSTA NO CAPUT DO ART.13 DA LEI Nº 8.620/93

O caput do art. 13 da lei nº 8.620/93 trouxe, aos sócios da sociedade do tipo limitada e aos titulares de firma individual, uma nova modalidade de sujeição passiva tributária, veja-se:

Art. 13. O titular da firma individual e os sócios das empresas por cotas de responsabilidade limitada responde solidariamente, com seus bens pessoais, pelos débitos junto à Seguridade Social.

Conforme visto, diferentemente da responsabilidade tributária prevista no Código Tributário Nacional, o referido artigo tem como fundamento para a responsabilização dos sócios a simples falta de pagamento perante a Seguridade Social.

Assim, temos o surgimento de uma responsabilidade tributária objetiva, a qual dispensa a figura do dolo ou culpa, sendo que para a sua caracterização basta apenas o inadimplemento de débito perante a Seguridade Social.

Ademais, resta configurado uma solidariedade existente entre empresa individual ou limitada com os sócios e titulares, tendo em vista a previsão de que estes últimos poderão ter seus bens pessoais atingidos.

E, ainda, a norma em questão não faz qualquer distinção quanto ao tipo de sócio a ser responsabilizado, ou seja, se é um sócio comum ou com poderes de administração.

Portanto, a regra prevista no caput do art. 13 da lei nº 8.620/93, refere-se a uma sujeição passiva solidária e de caráter objetivo, eis que o simples inadimplemento da obrigação decorrente de débito devido a Seguridade Social, basta para responsabilizar os sócios da sociedade limitada.

Logo, resta constado a flagrante falta de respeito ao instituto da personalidade jurídica e de sua autonomia patrimonial, bem como as previsões legais insculpidas no Código Tributário Nacional e também na Constituição Federal.

3.2 DA RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DISPOSTA NO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART.13 DA LEI Nº 8.620/93

No que tange a sujeição passiva disposta no parágrafo único do art. 13 da Lei nº 8.620/93, temos que a responsabilização irá decorrer diante da caracterização do dolo ou culpa, veja-se:

Parágrafo único. Os acionistas controladores, os administradores, os gerentes e os diretores respondem solidariamente ou subsidiariamente, com seus bens pessoais quanto a inadimplemento das obrigações para com a Seguridade Social, por dolo ou culpa.

Diferentemente do disposto no caput, o referido parágrafo único inclui como responsáveis tributários os sócios com poderes de gerência e administração, decorrentes da sociedade por ações.

Outra diferença em relação ao caput, refere-se que neste caso teremos configurado a responsabilidade subjetiva, face a necessidade de existência de dolo ou culpa para sua caracterização.

De outra banda, resta como critica ao referido parágrafo a existência, ao mesmo tempo, de responsabilidade solidária e subsidiária, ficando praticamente impossível distinguir quem é quem, eis que inexiste qualquer menção, classificação ou alguma ordem.

E, ainda, conforme já visto anteriormente, a solidariedade deve atingir apenas aqueles sócios com poder de gerência e administração, mas jamais os sócios comuns.

Fora isso, resta também o fato de que a solidariedade não atinge a sociedade empresária limitada, face a existência do caráter subsidiário, ou seja, primeiro busca-se a satisfação do débito no patrimônio da pessoa jurídica para, posteriormente, quando não encontrado bens nesta, alcançar a riqueza dos sócios-administradores, desde que constatado a existência de culpa ou dolo.

Feito as classificações quanto aos tipos de responsabilidade do caput do art. 13 da Lei nº 8.620/93 (objetiva) e, ainda, quanto ao seu parágrafo único (subjetiva), a seguir será analisado as questões que levam ao entendimento da inconstitucionalidade da referida norma.

3.3 DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ART.13 DA LEI Nº 8.620/93

A responsabilização dos sócios perante os débitos da sociedade em que fazem parte ocorre como uma exceção no direito tributário, ou seja, a regra é a de que a autonomia patrimonial da pessoa jurídica sempre prevaleça.

O Código Tributário Nacional, conforme disposto no inciso III, do seu art. 135, tratou de criar situações onde as pessoas com poderes de gerência ou administração, quando inexistente bens da pessoa jurídica, pudessem ser responsabilizados pelos créditos decorrentes de obrigações tributárias praticadas com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos.

Assim, perante o direito tributário, criou-se um mecanismo de segurança para conter o mau uso da pessoa jurídica pelos seus sócios que a compõem.

Todavia, com o advento da Lei nº 8.620/93, precisamente quanto ao disposto no seu art. 13, criou-se uma nova modalidade de responsabilidade tributária, a qual veio a disciplinar que o simples inadimplemento diante de débitos oriundos da Seguridade Social, seria suficiente para responsabilizar os sócios da empresa por cotas de responsabilidade limitada.

A premissa que fundamenta a constitucionalidade da referida norma, utiliza como argumento o inciso II do art. 124 e o art. 128, todos do CTN, veja-se:

Art. 124. São solidariamente obrigadas:

(...)

II – as pessoas expressamente designadas por lei.

Art. 128. Sem prejuízo do disposto neste capitulo, a lei pode atribuir  de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-o a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação.

Ou seja, os dispositivos citados acima, seriam os fundamentos do Fisco para justificar a desnecessidade da existência de Lei Complementar para regular as hipóteses de responsabilidade tributária. Contudo, tal entendimento não deve prevalecer.

Quanto a fundamentação com base no inciso II do art. 124, do CTN, temos que a mesma é muito ampla e genérica, pois fala apenas que as pessoas descritas na lei, serão solidariamente obrigadas.

No que tange ao referido artigo, temos que não pode ocorrer a responsabilização de forma solidária de uma pessoa que não tenha qualquer ligação com o fato jurídico tributário que o originou, pois a constituição não permite. Nesse sentido, segue posição doutrinária:

“Quanto ao inciso II, do art. 124, a disposição que prescreve a solidariedade das ‘pessoas expressamente designadas por lei’ pressupõe que a lei poderá determinar a existência de solidariedade entre pessoas que possam não ter interesse comum na situação que constitua o fato gerador, pois é incabível previsão legal no sentido de estipular em qual ou quais situações há interesse comum.

Não há que se admitir que, na criação de um tributo, através da competência conferida pela Constituição Federal, seja estabelecida como devedor solidário pessoa que não tenha participado ou concorrido para realização do fato jurídico tributário, uma vez que o legislador ordinário, por força do texto constitucional, não poderá fazer incidir a carga tributária sobre pessoa estranha ao fato previsto na norma como gerador da obrigação”.[16]

Ora, a pessoa que deve suportar o pagamento é o contribuinte, pois este pode praticar o fato gerador ou, ainda, o terceiro que tiver ligação também como o fato gerador.

Isso porque, o art. 124 do CTN possibilita ao legislador escolher se a responsabilidade será solidária ou subsidiária da pessoa existente no pólo passivo, porém, jamais permitiu apontar quem será responsabilizado.

Nessa linha, Misabel Abreu Machado Derzi:

“A solidariedade não é forma de eleição de responsável tributário. A solidariedade não é espécie de sujeição passiva por responsabilidade indireta, como querem alguns. O Código Tributário Nacional, corretamente, disciplina a matéria em seção própria, estranha ao Capítulo V, referente a responsabilidade. É que a solidariedade é simples forma de garantia, a mais ampla das fidejussórias. Quando houver mais de um obrigado no pólo passivo da obrigação tributária (mais de um contribuinte, ou contribuinte e responsável, ou apenas pluralidade de responsáveis), o legislador terá de definir as relações entre os coobrigados. Se são eles solidariamente obrigados, ou subsidiariamente, com benefício de ordem ou não, etc. A solidariedade não é, assim, forma de inclusão de um terceiro no pólo passivo da obrigação tributária, apenas forma de graduar a responsabilidade daqueles sujeitos que já compõem o pólo passivo.”[17]

Assim, há que ser entendido que a referida lei ordinária mencionada no art.124 do CTN, quando for aplicada, deverá obedecer as normas já previstas no Código Tributário Nacional e jamais instituir novas regras que conflitem com o mesmo.

Já no que tange ao art. 128 do CTN, temos que a referida norma permite que a Lei Ordinária atribua responsabilidade a terceiro por crédito tributário devido, contudo, há que ser sempre observados as normas já previstas no CTN.

Outra questão relevante existente no referido artigo, refere-se a necessidade de vinculação do terceiro ao fato gerador, o qual tem como finalidade imputar a este a responsabilidade pelo pagamento do tributo no lugar do contribuinte.

No mesmo raciocínio, as ilustre palavras do professor Paulo de Barros Carvalho:

“Quanto à fixação da responsabilidade pelo crédito tributário há dois rumos bem definidos: um interno à situação tributada; outro externo. Diremos logo que o externo tem supedâneo na frase excepcionadora, que inicia o período – Sem prejuízo do disposto neste Capítulo – e se desenrola no conteúdo prescritivo daqueles artigos que mencionamos (129 até 138 CTN)”. [18]

Assim, diante dos dispositivos citados acima, podemos concluir que os mesmos jamais podem ser utilizados sem a observância das normas previstas no Código Tributário Nacional. Ou seja, não pode ser criada uma lei ordinária, instituindo responsabilidade de terceiros, sem qualquer vinculo com o fato gerador, quando já existente norma prevista no CTN prevendo de modo diverso.

Portanto, quando o art. 13 da Lei nº 8.620/93 institui responsabilidade aos administradores e aos titulares de firmas individuais, sem a observância dos artigos 134 e 135, ambos do CTN, temos como conclusão a sua invalidade e inconstitucionalidade, face ao desrespeito a norma hierarquicamente superior (CTN).

Fora as questões elencadas neste ponto, há que ser estudado os fundamentos que levam ao entendimento pela inconstitucionalidade da norma prevista no art. 13 da Lei nº 8.620/93, os quais serão analisados a seguir.

3.3.1 DA NECESSIDADE DE LEI COMPLEMETAR

Conforme dispõe o art. 146, III, “b”, da Constituição Federal, cabe a lei complementar estabelecer as normas gerais em matéria tributária:

“ Art. 146. cabe a lei complementar:

(...)

III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente:

(...)

b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência de tributos;

(...)

Assim, temos que o artigo constitucional citado, expõe claramente que em se tratando de matéria tributária, há que ser respeitado a necessidade de lei complementar para regularizar os assuntos que tratem de “obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência de tributos”.

Ademais, as leis complementares, consoante disposto nos artigos 59[19] e 69[20], ambos da Constituição Federal, decorrem do poder legislativo, bem como necessitam de aprovação da maioria absoluta do congresso.

E, ainda, quanto a necessidade de lei complementar, no caso de algumas matérias, como por exemplo, o direito tributário, Alexandre de Moraes reforça a ideia de sua importância:

“A razão de existência de lei complementar consubstancia-se no fato de o legislador contribuinte ter entendido que determinadas matérias, não obstante a evidente importância, não deveriam ser regulamentadas na própria Constituição Federal, sob pena de engessamento de futuras alterações; ao mesmo tempo, porém, não poderiam comportar constantes alterações por meio de um processo administrativo ordinário.”[21]

Na mesma linha de raciocínio, João Nogueira Matias:

“Na forma de recorrer o art. 146, III, b, da Constituição Federal, a legislação que estabelecer normas sobre responsabilidade tributária deverá se revestir obrigatoriamente de lei complementar.[22]

Ou seja, devido ao fato de que algumas matérias no direito passariam por diversas alterações constantes, restou definido pela Constituição Federal a necessidade da criação de lei complementar para completar certas lacunas constitucionais.

Nesse sentido, quanto a utilidade da lei complementar, Sacha Calmon Navarro Coelho:

“A – serve para complementar dispositivos constitucionais de eficácia limitada na terminologia de José Afonso da Silva;

B – serve ainda para conter dispositivos constitucionais de eficácia contida (ou contível);

C – serve para fazer determinações constitucionais consideradas importantes e de interesse de toda a Nação. Por isso mesmo as leis complementares requisitam quorum qualificado por causa da importância nacional das matérias postas a sua disposição.”[23]

Complementando o entendimento de Sacha Calmon, resta necessário destacar, no que tange a relação jurídica tributária, bem como a obrigação tributária, o entendimento de José Cretella Jr. acerca da necessidade de lei complementar para regularizar as referidas questões tributárias, veja-se:

“A lei dá origem à relação jurídica tributária, formada entre o poder público tributante, o Estado, e o contribuinte, pessoa física ou jurídica de direito privado. Enfim, a obrigação tributária deverá constar de lei complementar”.

 De outra banda, no que se refere ao presente trabalho, temos como foco a analise da reserva de lei complementar para dispor acerca das normas a serem editadas que tratam sobre obrigação tributária.

Logo, tendo a Constituição Federal determinando que as matérias referente a obrigação tributária fossem instituídas por lei complementar, temos que o Código Tributário Nacional assim o fez, eis que definiu as questões ligadas a responsabilidade tributária.

Portanto, podemos concluir que o Código Tributário Nacional, devidamente, tratou acerca da responsabilidade tributária, motivo que qualquer norma posterior a ser veiculada deverá respeitar, por questões de hierarquia, o CTN.

Todavia, não foi assim que aconteceu quando do advento da Lei nº 8.620/93, mais especificamente, no seu art. 13, o qual dispõe o seguinte:

Art. 13. O titular da firma individual e os sócios das empresas por cotas de responsabilidade limitada responde solidariamente, com seus bens pessoais, pelos débitos junto à Seguridade Social.

Parágrafo único. Os acionistas controladores, os administradores, os gerentes e os diretores respondem solidariamente ou subsidiariamente, com seus bens pessoais quanto a inadimplemento das obrigações para com a Seguridade Social, por dolo ou culpa.

Logo, consoante o exposto anteriormente, podemos concluir que o referido art. 13 da Lei Ordinária nº 8.620/93 vai de encontro a norma prevista no inciso III, do art. 135, do CTN, a qual é oriunda de Lei Complementar e está de acordo com o art. 146, III, “b”, da Constituição Federal.

Assim, levando em consideração que a norma disposta no Código Tributário Nacional é hierarquicamente superior a regra prevista na Lei Ordinária, temos que essa última não deve ser reconhecida e, consequentemente, deve ser declarada sua inconstitucionalidade.

Ora, a referida solidariedade disposta na norma criada por Lei Ordinária só teria validade e eficácia, caso estivesse em conformidade com a Constituição Federal e o Código Tributário Nacional, circunstância que não ocorre.

Nessa linha, Luiz Antônio Caldeira:

“A responsabilidade tributária não é matéria de livre criação e alteração pelo legislador infraconstitucional. A Constituição Federal de 1988 estabelece, implícita ou explicitamente, limitações às quais a produção normativa inferior relativa ao tema está adstrita.”[24]

Prosseguindo na exposição do entendimento doutrinário acerca do assunto, cita-se Heleno Taveira Tôrres:

“A relação hierárquica que eventualmente possa existir entre lei complementar e as leis ordinárias, ou mesmo outras leis complementares, dependerá, tão-só, da função que ela exerça no sistema. E assim, caso a função seja constitutiva de algum fundamento de validade, formal ou material, a lei complementar sempre terá prevalência sobre qualquer outra lei.”

“Como dito acima, às normas gerais aplica-se também ao primado da reserva da lei complementar, e pelas funções pertinentes à ‘Constituição Nacional’, impõem-se a necessária preeminência dessas leis complementares em relação às demais leis, mesmo que complementares, quando tenham por objeto o exercício de competência para instituição de tributos. Por conseguinte, prevalecerão sempre, sobre a legislação federal, estadual, distrital ou municipal, na medida em que estas legislações passam a ter que  admiti-las (as leis complementares que veiculam normas gerais) como fundamento de validade material.”[25]

Não podendo ser diferente, quanto a posição jurisprudencial, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por unanimidade, negou provimento ao Recurso Extraordinário (RE) 562276, e manteve decisão que considerou inconstitucional a responsabilização, perante a Seguridade Social, dos gerentes de empresas, ou o redirecionamento de execução fiscal, quando ausentes os elementos que caracterizem a atuação dolosa dos sócios. Veja-se a ementa da referida decisão:

DIREITO TRIBUTÁRIO. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA. NORMAS GERAIS DE DIREITO TRIBUTÁRIO. ART 146, III, DA CF. ART. 135, III, DO CTN. SÓCIOS DE SOCIEDADE LIMITADA. ART. 13 DA LEI 8.620/93. INCONSTITUCIONALIDADES FORMAL E MATERIAL. REPERCUSSÃO GERAL. APLICAÇÃO DA DECISÃO PELOS DEMAIS TRIBUNAIS. 1. Todas as espécies tributárias, entre as quais as contribuições de seguridade social, estão sujeitas às normas gerais de direito tributário. 2. O Código Tributário Nacional estabelece algumas regras matrizes de responsabilidade tributária, como a do art. 135, III, bem como diretrizes para que o legislador de cada ente político estabeleça outras regras específicas de responsabilidade tributária relativamente aos tributos da sua competência, conforme seu art. 128. 3. O preceito do art. 124, II, no sentido de que são solidariamente obrigadas “as pessoas expressamente designadas por lei”, não autoriza o legislador a criar novos casos de responsabilidade tributária sem a observância dos requisitos exigidos pelo art. 128 do CTN, tampouco a desconsiderar as regras matrizes de responsabilidade de terceiros estabelecidas em caráter geral pelos arts. 134 e 135 do mesmo diploma. A previsão legal de solidariedade entre devedores – de modo que o pagamento efetuado por um aproveite aos demais, que a interrupção da prescrição, em favor ou contra um dos obrigados, também lhes tenha efeitos comuns e que a isenção ou remissão de crédito exonere a todos os obrigados quando não seja pessoal (art. 125 do CTN) – pressupõe que a própria condição de devedor tenha sido estabelecida validamente. 4. A responsabilidade tributária pressupõe duas normas autônomas: a regra matriz de incidência tributária e a regra matriz de responsabilidade tributária, cada uma com seu pressuposto de fato e seus sujeitos próprios. A referência ao responsável enquanto terceiro (dritter Persone, terzo ou tercero) evidencia que não participa da relação contributiva, mas de uma relação específica de responsabilidade tributária, inconfundível com aquela. O “terceiro” só pode ser chamado responsabilizado na hipótese de descumprimento de deveres próprios de colaboração para com a Administração Tributária, estabelecidos, ainda que a contrario sensu, na regra matriz de responsabilidade tributária, e desde que tenha contribuído para a situação de inadimplemento pelo contribuinte. 5. O art. 135, III, do CTN responsabiliza apenas aqueles que estejam na direção, gerência ou representação da pessoa jurídica e tão-somente quando pratiquem atos com excesso de poder ou infração à lei, contrato social ou estatutos. Desse modo, apenas o sócio com poderes de gestão ou representação da sociedade é que pode ser responsabilizado, o que resguarda a pessoalidade entre o ilícito (mal gestão ou representação) e a conseqüência de ter de responder pelo tributo devido pela sociedade. 6. O art. 13 da Lei 8.620/93 não se limitou a repetir ou detalhar a regra de responsabilidade constante do art. 135 do CTN, tampouco cuidou de uma nova hipótese específica e distinta. Ao vincular à simples condição de sócio a obrigação de responder solidariamente pelos débitos da sociedade limitada perante a Seguridade Social, tratou a mesma situação genérica regulada pelo art. 135, III, do CTN, mas de modo diverso, incorrendo em inconstitucionalidade por violação ao art. 146, III, da CF. 7. O art. 13 da Lei 8.620/93 também se reveste de inconstitucionalidade material, porquanto não é dado ao legislador estabelecer confusão entre os patrimônios das pessoas física e jurídica, o que, além de impor desconsideração ex lege e objetiva da personalidade jurídica, descaracterizando as sociedades limitadas, implica irrazoabilidade e inibe a iniciativa privada, afrontando os arts. 5º, XIII, e 170, parágrafo único, da Constituição. 8. Reconhecida a inconstitucionalidade do art. 13 da Lei 8.620/93 na parte em que determinou que os sócios das empresas por cotas de responsabilidade limitada responderiam solidariamente, com seus bens pessoais, pelos débitos junto à Seguridade Social. 9. Recurso extraordinário da União desprovido. 10. Aos recursos sobrestados, que aguardavam a análise da matéria por este STF, aplica-se o art. 543-B, § 3º, do CPC.(RE 562276, Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, julgado em 03/11/2010, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-027 DIVULG 09-02-2011 PUBLIC 10-02-2011 EMENT VOL-02461-02 PP-00419 RDDT n. 187, 2011, p. 186-193 RT v. 100, n. 907, 2011, p. 428-442)

E a ministra Ellen Gracie, relatora do caso, no seu voto analisou a responsabilidade tributária em relação às normas gerais, salientando que, de acordo com o artigo 146, inciso III, alínea  “b” da Constituição Federal, o responsável pela contribuição tributária não pode ser qualquer pessoa - “exige-se que ele guarde relação com o fato gerador ou com o contribuinte”. 

Em relação à responsabilidade dos diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado pelos créditos correspondentes às obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos, a ministra observou que a jurisprudência tem-se firmado no sentido de que ilícitos praticados por esses gestores, ou sócios com poderes de gestão, não se confundem com o simples inadimplemento de tributos por força do risco do negócio, ou seja, com atraso no pagamento dos tributos.

Por fim, a ministra ressaltou que o caso possui repercussão geral (art. 543-B do Código de Processo Civil), conforme entendimento do Plenário expresso em novembro de 2007. Assim, a referida decisão do Plenário repercutirá nos demais processos, com tema idêntico, conforme ocorre nestes autos.

Diante do exposto, fica evidente que o artigo 13 da Lei nº 8.620/93, ao vincular a simples condição de sócio à obrigação de responder solidariamente, formou uma exceção não permitida pela norma geral de Direito Tributário, a qual está consubstanciada no artigo 135,  inciso III do CTN, evidenciando uma invasão da esfera reservada a lei complementar, disposta no artigo 146, inciso III, alínea “b” da Constituição.

Portanto, diante do estudo apresentado, podemos concluir que a definição da responsabilidade tributária é tema que deve ser tratado pelo Código Tributário Nacional, pois este recebeu poderes da Constituição Federal.

Assim, resta incabível a pretensão do legislador, mais especificamente quanto ao disposto no art. 13 da Lei nº 8.620/93, eis que o mesmo é ilegal e inconstitucional, tendo em vista que nega vigência ao Código Tributário Nacional (arts.134 e 135, ambos do CTN) e, ainda, a Constituição Federal (art. 146, III, “b”).


4 CONCLUSÃO

A autonomia patrimonial das pessoas jurídicas, decorrente das sociedades do tipo limitada, foi de extrema relevância para a economia, bem como para os empresários que estavam dispostos a fazer investimentos sem correr o risco de ver seu patrimônio pessoal em risco.

Contudo, devido a existência da personalidade jurídica da sociedade limitada distinta de seus sócios, alguns destes começou a utilizar a mesma para fins distintos ao seu objetivo para que foi criado.

Dessa forma, no que se refere ao direito tributário, criou-se normas com a finalidade de afastar a má utilização da autonomia patrimonial das pessoas jurídicas e, consequentemente, responsabilizar os sócios por suas condutas ilícitas (arts.134 e 135, ambos do CTN)

Ademais, as referidas normas dispostas no Código Tributário Nacional, decorrem do disposto no art. 146, III, “b”, da a Constituição Federal, o qual determinou que as questões referente a responsabilidade tributária fossem tratadas por lei complementar.

Assim, diante da permissão constitucional, o Código Tributário Nacional, apontou as hipóteses de responsabilidade tributária que poderiam ocasionar a responsabilização de seus sócios, desde que (i) fosse impossível a cobrança do débito perante a pessoa jurídica, bem como que (ii) o fato gerador decorrente da obrigação tributária exigida tenha surgido devido a prática pelos sócios de conduta com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos.

Logo, verificamos que (i) não basta o simples inadimplemento pela pessoa jurídica e, ainda, que (ii) deve haver ligação entre o fato gerador e a conduta praticada pelo sócio. Aliás, quanto a este último, somente será responsabilizado aqueles que tiverem poderes de gerência ou administração, ou seja, pessoas que podem agir diretamente no fato gerador.

Dessa forma, face as questões postas acima quanto a responsabilidade tributária, entendemos que o art. 13 da Lei nº 8.620/93 é inconstitucional.

Primeiro, criou nova modalidade de responsabilidade tributária, sendo que para sua configuração bastaria o inadimplemento de débito perante a Seguridade Social, desprovido de qualquer conduta dolosa ou culposa por parte dos sócios.

Por segundo, temos que a criação da lei acabou por desrespeitar a norma prevista no art. 146, III, “b”, da Constituição Federal, a qual disciplinou que somente a lei complementar poderá dispor acerca da responsabilidade tributária.

Enfim, por terceiro, verifica-se que além da norma referida na Lei nº 8.620/93 ter desrespeitado a constituição, também verificamos que a mesma acabou por deixar de observar a existência de norma hierarquicamente superior, ou seja, aquela criada pelo Código Tributário Nacional.

Logo, diante da ofensa a Constituição Federal, bem como a inobservância a existência de norma hierarquicamente superior, somado ao entendimento proferido pelo STF em sede de repercussão geral, chegou-se a conclusão pela inconstitucionalidade do art. 13 da Lei nº 8.620/93.


REFERÊNCIAS

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Notas

[1] CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 16ª ed. São Paulo : Saraiva, 2004, p.282/283.

[2] CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário, 20ª ed. ver. São Paulo : Saraiva, p.197.

[3] MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, 28ª ed., 2007, p.103.

[4] AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro, 17ª ed. São Paulo : Saraiva, 2011, p. 272.

[5] CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário, 19ª ed. ver. São Paulo : Saraiva, 2007, p. 333.

[6] ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária, 6ª ed. São Paulo, Malheiros, 2000, p.89.

[7] MACHADO, Hugo de Brito. A Solidariedade da Relação Tributária e a Liberdade do Legislador no Art. 124, II, do CTN. Revista Dialética de Direito Tributário nº 195, São Paulo : 2011, p.63.

[8] COSTA, Regina Helena. Curso de Direito Tributário. Constituição e Código Tributário Nacional. São Paulo : Saraiva, 2009, p.211.

[9] BECHO, Renato Lopes. Revista Dialética de Direito Tributário nº 192. 2011, p.129.

[10] CÔELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro, atualização e notas por Misabel Machado Derzi, 11ª ed. Rio de Janeiro : Forense, 2005, p.668/669.

[11] MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário, 22ª Ed. Malheiros, 2003, p.138

[12] Direito Tributário Brasileiro, de Aliomar Baleeiro. 11ª Ed., rev. e ampl. Por Misabel Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2000,p. 757.

[13] MACHADO, Hugo de Brito. Responsabilidade tributária e infração da lei. Repertório de Jurisprudência IOB, 15/94.

[14] MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário, 27ª ed. Ver., atual. e ampl. São Paulo : Malheiros, 2008, p.131.

[15] MARQUES, Leonardo Nunes. A responsabilidade dos membros da sociedade limitada pelas obrigações tributárias e o novo código civil. Revista Dialética de Direito Tributário, p. 69.

[16] CALDEIRA, Luiz Antônio. Comentário ao Código Tributário Nacional, Saraiva, ob. Coletiva, 2002, p.212.

[17] BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. Atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. 11. Ed. Rio de Janeiro.: Forense, 2003, p.729.

[18] CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência tributária. 5. Ed. São Paulo : Saraiva, 2007, p. 317.

[19] Art. 59 - O processo legislativo compreende a elaboração de:

I - emendas à Constituição;

II - leis complementares;

III - leis ordinárias;

IV - leis delegadas;

V - medidas provisórias;

VI - decretos legislativos;

VII - resoluções.

[20] Art. 69 - As leis complementares serão aprovadas por maioria absoluta.

[21] MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 15ª ed. São Paulo : Atlas S.A., 2004, p. 569.

[22] MATIAS, João Nogueira. Responsabilidade Tributária de Sócios no Mercosul. Belo Horizonte : Mandamentos, 2001, p.73.

[23] COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. 8. Ed. Rio de Janeiro : Forense, 2005, p.105.

[24] CALDEIRA, Luiz Antônio. Comentário ao Código Tributário Nacional, Saraiva, ob. Coletiva, 2002, p. 212.

[25] TÔRRES, Heleno Taveira. Teoria Geral da Obrigação Tributária: Estudos em Homenagem ao Professor José Souto Maior Borges. São Paulo : Malheiros Editores, 2005, p. 151/152.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALFAMA, Thiago Santos. A responsabilidade tributária dos sócios da sociedade limitada e a inconstitucionalidade da aplicação do artigo 13 da Lei nº 8.620/93. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3648, 27 jun. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24802. Acesso em: 23 abr. 2024.