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Fontes formais do processo administrativo e judicial

Fontes formais do processo administrativo e judicial

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O estudo do instituto das fontes do direito possui o viés de proporcionar aos jurisdicionados maior segurança jurídica, uma vez que poderão conferir a validade das normas de processo dentro do ordenamento jurídico e assim, estarem certos de estarem jungidos ao devido processo legal.

1. INTRODUÇÃO

Na clássica definição de processo, este pode ser entendido como o instrumento posto à disposição dos cidadãos pelo Estado, de forma a solucionar os conflitos de interesses que emergem na sociedade.

Nos primórdios da civilização, quando já havia a noção de Estado, este ainda não tinha poder suficiente para ditar normas jurídicas e fazer observá-las, aquele que tinha um interesse e queria vê-lo realizado, fazia, através da força, com que aquele que ao seu interesse resistisse acabasse observando-o. Na verdade, realizava o seu interesse aquele que tivesse força ou poder para tanto, prevalecendo a denominada “justiça do mais forte sobre o mais fraco.

No direito romano, sabe-se que a denominada “justiça pública” consolidou-se no período denominado de cognitio extra ordinem. Foi nessa fase que o Estado, por ter poder suficiente, passou a ditar a solução para os conflitos de interesses, não importando a vontade dos particulares, que na verdade já estavam submetidos ao poder do Estado, e deste seu poder de decidir os conflitos não podiam esquivar-se.

Impondo-se a proibição da autotutela, ou da realização das pretensões segundo o próprio poder do particular interessada, surge o poder de o Estado dizer aquele que tem razão nos conflitos de interesses concretos, ou o poder de dizer o direito, conhecido como iuris dictio.

Lembram Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart1, que “O Estado, ao proibir a autotutela, assumiu o monopólio da jurisdição. Como conseqüência, ou seja, diante da proibição da autotutela, ofertou-se àquele que não podia mais realizar o seu interesse através da própria força o direito de recorrer à justiça, ou o direito de ação.”

Tem por fim o processo, solucionar as lides formadas no seio social. As lides, conforme dito acima, são os conflitos de interesses caracterizados por uma pretensão resistida.

As lides se formam naturalmente no tecido social e sua principal fonte alimentadora está na constatação de que as necessidades humanas são infinitas mas, porém, os bens necessários à satisfação dessas necessidades são finitos.

E assim, se faz necessária a existência de regras jurídicas para que seja garantida a harmonia social.

Considerando que é natural que surjam dúvidas a respeito da interpretação dessas normas ou mesmo a disposição dos atores sociais em desrespeitá-las, podem eclodir no seio social os conflitos de interesses.

Caberá então ao Estado, que detém o monopólio da jurisdição, e cumprindo sua finalidade de garantir a Ordem Social, dizer o Direito e promover a paz social.

Oportuno lembrar aqui a finalidade do Estado destacada por Jacques Maritain2, “O Estado não é a suprema encarnação da idéia, como acreditava HEGEL – o Estado é apenas uma instituição autorizada a usar o poder da coação, é constituído por técnicos e especialistas em questões de ordem e bem-estar público; em suma, um instrumento a serviço do Homem. Colocar o homem a serviço desse instrumento é uma perversão política. A pessoa humana como indivíduo existe para o corpo político, mas o corpo político existe para a pessoa humana como pessoa. Mas o homem, de maneira alguma, existe para o Estado. O Estado é que existe para o homem”.

Portanto, a finalidade do Estado é a realização do bem comum.

Dalmo de Abreu Dallari ensina que “o Estado, como sociedade política, tem um fim geral, constituindo-se em meio para que os indivíduos e as demais sociedades possam atingir seus respectivos fins particulares. Assim, pois, pode-se concluir que o fim do Estado é o bem comum, entendido este com o conceituou o Papa João XXIII, ou seja, o conjunto de todas as condições de vida social, que consintam e favoreçam o desenvolvimento integral da personalidade humana.”.

E o processo é um dos instrumentos para a consecução desta finalidade. Constitui-se do ferramental jurídico necessário para a pacificação social.

Partindo-se desta premissa, é intuitivo o questionamento sobre como se formam as normas jurídicas que dão forma ao processo.

Ou seja, o questionamento sobre quais são as fontes do direito processual é inevitável.

Seriam elas apenas a lei, resultante da suprema vontade estatal? ? E o papel dos usos e costumes? Qual a influência das decisões judiciais na formação do direito? Os princípios fundamentais do direito e os valores de justiça não são formadores do Direito?

A finalidade do presente trabalho é responder a todas essas perguntas, por meio, primeiramente do estudo das fontes do direito e sua inserção na classificação de fontes formais do processo administrativo e judicial.


2. O PROBLEMA DAS FONTES DO DIREITO

O problema das fontes do direito é um dos pontos fundamentais da doutrina juspositivista, pelo fato de que a lei vem conquistando primazia sobre a formação de outras fontes do direito. O estudo das fontes é o ponto central da Filosofia do Direito e para ele converge toda a complexidade de seus temas.

Quando estudamos as espécies de normas jurídicas, necessariamente nos deparamos com o problema das fontes do direito.

Afirma André Franco Montoro3, citando Du Pasquier, que “Procurar a fonte de uma regra jurídica, significa investigar o ponto em que ela saiu das profundezas da vida social para aparecer na superfície do direito”.

Reconhecendo a importância e a complexidade do assunto, o Instituto Internacional de Filosofia do Direito e de Sociologia Jurídica dedicou os trabalhos de seu Primeiro Congresso, em 1934, ao “Problema das fontes do direito positivo”, publicando suas conclusões na revista Arquivos de Filosofia de Direito.

Foi o único tema que foi debatido mais de uma vez pelo Instituto, o que demonstra sua importância para a Filosofia do Direito.

É fácil evitar, o problema das fontes da ordem jurídica afirmando, dogmaticamente, que o Estado é a fonte única do Direito.

No entanto muitos questionamentos surgem a partir desta afirmação emergindo a inquietação a respeito de que fontes realmente provém o direito positivo de uma nação.

Então, são intuitivas as perguntas sobre a origem do direito. O direito surge apenas das leis promulgadas solenemente pelo Estado? E o papel dos usos e costumes? Qual a influência das decisões judiciais na formação do direito? Os princípios fundamentais do direito e os valores de justiça não são formadores do Direito?

O problema das fontes do direito diz respeito à validade das normas jurídicas. Uma fonte é válida (isto é, existe juridicamente) se for produzida por uma fonte autorizada, ou, em outros termos, pode remontar a um dos fatos ou atos competentes ou capazes, segundo o ordenamento, de produzir normas jurídicas.

Os ordenamentos jurídicos modernos não contém apenas normas que regulam o comportamento dos membros da sociedade, mas também normas que regulam a produção jurídica, isto é, normas que regulam o modo pelo qual deve ser normado o comportamento dos súditos.

Ou seja, nos ordenamentos jurídicos modernos existem normas que criam normas.

Surge daí a distinção doutrinária em regras de comportamento e regras de estrutura ou de organização.


3. CONCEITO DE FONTE DO DIREITO

Segundo o magistério de Norberto Bobbio4, “São fontes do direito aqueles fatos ou atos dos quais o determinado ordenamento jurídico faz depender a produção de normas jurídicas”..

O tema relativo a fontes do Direito, nas palavras de Maurício Godinho Delgado, é um dos mais nobres e fundamentais de todo o conhecimento jurídico, sendo essencial a qualquer ramo jurídico específico, “à medida que discute as induções que levaram à formação das normas jurídicas em cada um dos ramos enfocados e os mecanismos de exteriorização dessas normas”5.

Vale transcrever a citação feita por Délio Maranhão:

“Na expressão – ‘fontes do direito’ – usa a terminologia jurídica um estilo metafórico. E é apropriada a metáfora. ‘As regras de direito saem do húmus social, de onde se originam, como as águas saem do solo: espontaneamente, naturalmente’. A vegetação jurídica - a frase é de Georges Scelle – nasce do próprio fato social e, neste sentido, todo direito é natural. Por outro lado, como acentua Du Pasquier, ‘remontar à fonte de um rio é procurar o local onde suas águas brotam da terra. Do mesmo modo, investigar qual a fonte de uma regra jurídica é buscar o ponto em que ela surgiu das profundezas da vida social para aparecer à superfície do direito’. Em sua acepção mais ampla, por conseguinte, ‘fonte do direito’ significa a origem, o manancial de onde provém o direito”.6

Analisando o conceito de Bobbio, fala-se de fatos ou de atos segundo os quais os eventos a que o direito se refere. São acontecimentos em relação aos quais se prescinde da consideração do elemento subjetivo (conhecimento e vontade) próprio do agir humano, ou são comportamentos humanos que abrangem tal elemento subjetivo.

Com relação aos fatos fala-se de competência; com referência aos atos falamos de capacidade.

É importante notar que ao estudo do ordenamento jurídico interessa, com maior amplitude, que a partir do momento em que se reconhece existirem fatos ou atos dos quais se faz depender a produção de normas jurídicas, ou seja, as fontes do direito, reconhece-se que o ordenamento jurídico, além de regular o comportamento das pessoas, regula também o modo pelo qual se devem produzir as regras.

É corrente a afirmação de que o ordenamento jurídico regula a própria produção normativa.

Ou seja, pode-se dividir as normas jurídicas em normas de comportamento e normas de estrutura.

As primeiras têm por escopo direto regular a conduta dos componentes do tecido social.

As últimas podem também ser consideradas como as normas para a produção jurídica: quer dizer, como as normas que regulam os procedimentos de regulamentação jurídica. Elas não regulam o comportamento, mas o modo de regular um comportamento, ou, mais exatamente, o comportamento que elas regulam é o de produzir regras. São, com efeito, normas destinadas a regular a produção de outras normas.

É importante e oportuno mencionar a classificação de Norberto Bobbio7, quando trata da questão das normas de estrutura, na qual distingue a imperatividade das normas em dois níveis:

“Se levarmos em consideração também as normas para a produção de outras normas, devemos colocar, ao lado das imperativas, entendidas como comandos de fazer ou de não fazer, e que poderemos chamar imperativas de primeira instância, as imperativas de segunda instância, entendidas como comandos de comandar, etc.

Somente a consideração do ordenamento no seu conjunto nos permite aceitar a presença dessas normas de segunda instância.

(...)

Podem-se distinguir nove tipos:

1) Normas que mandam ordenar (por exemplo: art. 34, §2º da Constituição, onde o constituinte ordena ao legislador ordinário formular leis que tornem obrigatória a instrução);

2) Normas que proíbem ordenar (art. 27, § 4º da Constituição, onde se proíbe ao legislador impor a pena de morte;

3) Normas que permitem ordenar (em todos os casos em que o constituinte entende não dever intervir a ditar normas sobre certas matérias, pode-se dizer que isso permite ao legislador ordenar. Por exemplo, o art. 32, § 2º da Constituição, permite ao legislador ordinário estabelecer normas relativas ao tratamento sanitário).

4) Normas que mandam proibir (art. 18, §2º, da Constituição: o constituinte impõe ao legislador ordinário emanar normas proibitivas contra as associações secretas).

5) Normas que proíbem proibir (art. 22 da Constituição: ninguém pode ser privado por motivos políticos da capacidade jurídica, da cidadania, do nome).

6) Normas que permitem proibir (a propósito do art. 40 da Constituição, que sanciona a liberdade de greve, pode-se observar que nem nele nem em outro se fala em liberdade de suspensão do trabalho; essa lacuna poderia ser interpretada como se o constituinte tivesse desejado deixar o legislador ordinário a faculdade de proibi-la).

7) Normas que mandam permitir (essa caso coincide com o do número cinco).

8) Normas que proíbem permitir (essa caso coincide com o do número quatro).

9) Normas que permitem permitir (como a permissão é a negação de uma proibição, este é o caso de uma lei constitucional que negue a proibição de uma lei constitucional anterior).


4. A CLASSIFICAÇÃO DE FONTES FORMAIS E FONTES MATERIAIS

Os autores costumam distinguir as fontes formais, isto é, os fatos que dão a uma regra o caráter de direito positivo e obrigatório, das fontes materiais, representadas pelos elementos que concorrem para a formação do conteúdo ou matéria da norma jurídica.

Paulo Dourado de Gusmão8, adverte que “Deve-se distinguir fonte de cognição da fonte de produção jurídica. Pode-se entender a primeira como os meios de conhecimento do direito. Nesse sentido, confunde-se com as fontes formais. Porém, por fonte de cognição pode-se compreender também as várias matérias de que o legislador se serve para dar conteúdo às normas por ele formuladas, em função das quais pode-se ter o conhecimento mais exato das mesmas. Nesse último sentido, identifica-se como fonte material. Já fonte de produção é a norma ou conjunto de normas que dão o modo (regras) de criação de normas jurídicas, p. ex., as regras constitucionais de elaboração e aprovação de emenda constitucional. Temos, nesse caso, fonte de produção fundamental ou primária, que prescreve a forma de elaboração de normas jurídicas, contida na Constituição, e fontes de produção subordinadas ou secundárias, produzidas com observância daquela (leis, regulamentos etc.). O Código de Processo é fonte desse último tipo em relação à sentença. As fontes de produção são fontes formais, porque são encontradas na Constituição ou em leis. Há quem faça distinção entre fonte de qualificação e de conhecimento: a primeira dá juridicidade e validade às demais normas, enquanto a segunda estabelece as formas pelas quais pode-se conhecer o direito (lei, costume, regulamento, tratado etc). Finalmente, temos também quem reduza as fontes à autoridade qualificada competente para prescrever normas jurídicas”.

E a respeito dessa classificação, é oportuno reproduzir a lição crítica de Miguel Reale9:

“Preliminarmente, é necessário advertir que a antiga distinção entre fonte formal e fonte material do direito tem sido fonte de grandes equívocos nos domínios da Ciência Jurídica, tornando-se indispensável empregarmos o termo fonte do direito para indicar apenas os processos de produção de normas jurídicas.

Tais processos pressupõem sempre uma estrutura de poder, desde o poder capaz de assegurar por si mesmo o adimplemento das normas por ele emanadas (como é o caso do poder estatal no processo legislativo) até outras formas subordinadas de poder que estabelecem, de maneira objetiva, relações que permitem seja pretendida a garantia de execução outorgada pelo Estado.

Vejamos o que se tem designado com a expressão fonte material, para demonstrarmos a inconveniência desse termo.

Verificando-se, por exemplo, como aparece uma lei, podemos indagar de suas razões últimas, dos motivos lógicos ou morais que guiaram o legislador em sua tarefa. Estamos, pois, diante de uma pesquisa de natureza filosófica, que diz respeito às condições lógicas e éticas do fenômeno jurídico.

Ao lado dessa questão, que se liga ao próprio problema da justiça, da liberdade, da segurança e da ordem, encontramos outros problemas que já possuem um aspecto sociológico. Indagamos das causas não remotas, mas imediatas da lei. Podemos perguntar, por exemplo, se uma lei é devida a fatores econômicos permanentes ou transitórios, ou se ela é decorrência de exigências demográficas, geográficas, raciais, higiênicas e assim por diante. O problema que gira em torno das causas imediatas ou próximas do fenômeno jurídico pertence ao âmbito da Sociologia e, a rigor, da Sociologia Jurídica.

Como se vê, o que se costuma indicar com a expressão "fonte material" não é outra coisa senão o estudo filosófico ou sociológico dos motivos éticos ou dos fatos econômicos que condicionam o aparecimento e as transformações das regras de direito. Fácil é perceber que se trata do problema do fundamento ético ou do fundamento social das normas jurídicas, situando-se, por conseguinte, fora do campo da Ciência do Direito. Melhor é, por conseguinte, que se dê ao termo fonte do direito uma única acepção, circunscrita ao campo do Direito.

Por "fonte do direito" designamos os processos ou meios em virtude dos quais as regras jurídicas se positivam com legítima força obrigatória, isto é, com vigência e eficácia no contexto de uma estrutura normativa. O direito resulta de um complexo de fatores que a Filosofia e a Sociologia estudam, mas se manifesta, como ordenação vigente e eficaz, através de certas formas, diría­mos mesmo de certas formas, ou estruturas normativas, que são o processo legislativo, os usos e costumes jurídicos, a atividade jurisdicional e o ato negocial.”.

Miguel Reale propõe em sua obra O Direito Como Experiência10, a substituição da teoria das fontes formais pela teoria dos modelos jurídicos, sob o argumento de que aquela é uma fonte exaurida, arraigada ao dogma de que o direito é sempre criação do Estado, com prevalência da lei ou da decisão judicial.

Entende o autor que a linha de pensamento de Hans Kelsen, por meio de sua conhecida distinção entre normas jurídicas gerais e individualizadas, compreendeu bem o fenômeno da multiplicação e discriminação dos focos normativos, mas redundou no empobrecimento dos esquemas normativos periféricos, bem como no de sua autônoma operabilidade, visto o predomínio englobante do monismo normativo, preservado à custa da realidade social concreta.

Para Reale, “a indagação do direito como experiência possibilita o superamento das apontadas antinomias, demonstrando que a irrecusável multipilicidade dos centros reguladores dos comportamentos individuais e coletivos, tão característica de nossa época, pelo menos nos países de constituição democrática (pois, em última análise, quem diz democracia, diz pluridade de soluções políticas e jurídicas) longe de excluir, antes exige a sua articulação em um sistema complementar, não segundo uma unidade formal, - determinada por meras referências de pura subsunção lógica, - mas sim pelo reconhecimento de diversos graus de positividade jurídica, correspondentes aos modelos jurídicos que a vida real vai elaborando, em função de um complexo variado de fatores, com distintos índices de obrigatoriedade, assim como com diversificadas áreas de incidência”.

Invoca o autor a teoria da gradação da positividade jurídica, enunciada em termos gerais por Giorgio Del Vecchio, uma vez que a positividade do direito é marcada pela correlação essencial entre vigência e eficácia, sendo certo que é forçoso reconhecer que há um máximo de positividade, a qual corresponde à ordem jurídica estatal.

No entanto, em função desse macromodelo, distribuem-se outros centros de projeção normativa, dotados de competência derivada, com variável poder para a garantida imposição de suas determinações, e não menos variáveis “campos de eficácia”.

Por isso que, ao invés de uma escala de validade normativa, o que há é efetiva gradação da positividade jurídica, como uma das notas características do processo de objetivação do direito no contexto da realidade histórico-cultural.

Assim a pirâmide normativa descrita por Kelsen, que retrata a escala de validade normativa, deverá contemplar o escalonamento lógico das regras de direito, no âmbito do ordenamento vigente, elevando-se desde as normas de caráter privado até às de eminência constitucional, de forma a refletir o processo de discriminação e de integração próprio da vida estrutural-funcional do direito.

Como se vê, completa o citado autor, “as chamadas “fontes formais” do direito não são senão formas típicas de objetivação da experiência jurídica, cada uma delas dotada de uma determinada estrutura, com um repertório ou programa de ações possíveis, a que se ligam também determinadas conseqüências. Daí dever-se falar, com mais rigor, em modelos jurídicos, cujo estudo, repito, afigura-se-me do mais alto alcance.

Não há nada de estranhável nesta colocação do problema, pois, se a objetivação normativa é essencial à experiência jurídica, não se podendo conceber direito, em lugar ou tempo algum, desprovido de objetivação, as formas que esta assume são, todavia, categorias históricas variáveis e contingentes. Quando se fala em Direito Objetivo, a qualificação de “objetivo”é, em última análise, redundante”.

Analisaremos, pois, dentre as fontes do direito, aceitas pelos estudiosos, ou seja, a lei, os costumes, a jurisprudência, o negócio jurídico, a doutrina e os princípios gerais do direito, quais são as fontes formais do processo administrativo e judicial.


5. FONTES ABSTRATAS E FONTES CONCRETAS DO PROCESSO

É importante que se faça a distinção conceitual entre fontes abstratas e fontes concretas do processo.

Conforme sejam apreciadas em seu aspecto genérico ou particular, as fontes das normas processuais no direito brasileiro podem ser encaradas em abstrato ou em concreto.

As fontes abstratas da norma processual são as mesmas do direito em geral, ou seja, os fatos que dão a uma regra o caráter de direito positivo e obrigatório.

Por seu lado, as fontes concretas da norma processual são aquelas através das quais as fontes legislativas já examinadas em abstrato efetivamente atuam. Ex. Código de Processo Administrativo, Lei de Processo Administrativo.

É por meio das fontes concretas que as fontes abstratas são aplicadas. Aquelas são o canal de concretização destas.


6. FONTES FORMAIS DO PROCESSO ADMINISTRATIVO E JUDICIAL

Preliminarmente ao estudo das fontes formais do processo administrativo, é preciso indagar a respeito da existência jurídica do processo administrativo.

O ordenamento jurídico brasileiro contemplou o instituto do processo administrativo.

Sem dúvida. A previsão da existência de um processo administrativo está na própria Constituição da República, que em seu art. 5º, LV, dispõe:

“aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.

É importante notar que a leitura atenta do citado dispositivo constitucional revela a existência de dois tipos de processo: o judicial e o administrativo. E em ambos são assegurados o contraditório e a ampla defesa.

Imperiosa é a reprodução dos ensinamentos de Wagner Balera11, para a correta compreensão do tema:

“A litigiosidade, está definida, pela Constituição de 1988, como marco fundamental no trato da matéria atinente ao processo administrativo.

(...)

Tanto que caracterizado o litígio, outra é a dimensão do processo administrativo. Antes, exercício de função administrativa, é modo de produção de despacho por ato de autoridade própria do Estado. Depois, configurado sob a garantia do contraditório, é o instrumental que instaura ambiente processual diferente dentro no qual a controvérsia encontrará decisão jurídica.

O constituinte prefigurou novo regime jurídico para a matéria relativa ao processo administrativo.

É certo que, na Lei Fundamental de 1988, não se chegou ao extremo da ousadia que caracterizou o trato da matéria pela Emenda Constitucional nº 7, de 1977.

Aquela Emenda predeterminava que se instituísse um contencioso administrativo, com atribuições jurídicas equivalentes ao primeiro grau de jurisdição.

Com aquela configuração, seria necessária a reestruturação global do sistema jurisdicional brasileiro.

Mas é indubitável que a Constituição de 1988 conferiu juridicidade especial a determinada parcela da função administrativa”.

Cabe especular, sob outra óptica, se o processo administrativo existe apenas em decorrência de previsão legal ou constitucional.

Em verdade, é instrumento ínsito um Estado Democrático de Direito.

O agigantamento do Estado com o conseqüente aumento da interferência na vida privada das pessoas, exige, naturalmente, um instrumento capaz de garantir os efetivos direitos fundamentais da pessoa humana.

Vale lembrar, a esse respeito, as lições de Celso Antonio Bandeira de Mello12:

“Diante deste fenômeno do agigantamento do Estado e, mais do que isto, do agigantamento da Administração, que passou a intervir avassaladoramente na vida de cada cidadão, a resposta adequada e natural para impedir-lhe o amesquinhamento e buscar preservar, o quanto possível, o equilíbrio entre ambos teria de ser o asseguramento da presença do administrado no circuito formativo das decisões administrativas que irão atingi-lo. Com isto também se enseja maior descortino para as atuações da Administração, pois esta agirá informada, também, pela perspectiva para avaliação mais completa do assunto que esteja em causa.

Uma vez que a “vontade” administrativa do Estado é formada na seqüência que se denomina “procedimento administrativo”, discipliná-lo é o meio idôneo para mantê-la sob controle. Assim, antes que desemboque em sua conclusão final – antes, pois, de se fazer eventualmente gravosa a alguém -, pode-se zelar por seu correto e prudente encaminhamento”.

Pode-se afirmar, então, que a existência do processo administrativo, antes mesmo de sua previsibilidade em lei, decorre do próprio direito humano de ser ouvido, uma vez que em uma verdadeira democracia não é juridicamente sustentável que o Estado interfira na vida das pessoas, impondo condicionamentos e sanções, sem antes garantir-lhes o direito de audiência e defesa. E assim, ainda que de forma rudimentar, estaremos presente de um processo administrativo.

Cumpre esclarecer que a classificação doutrinária a respeito das fontes formais do direito não é unânime. Muitos doutrinadores não aceitam a classificação da jurisprudência, os princípios gerais do direito e o negócio jurídico como fonte formal do direito.

No presente estudo demonstraremos que, em que pese a resistência de algumas correntes doutrinárias, são fontes formais do direito a lei, o costume, a jurisprudência, os princípios gerais do direito e o negócio jurídico.

E após, esse enfoque, procuraremos demonstrar se tais fontes formais podem ser consideradas fontes do direito processual.


7. A LEI

Conforme dizia Montesquieu, as leis são as relações necessárias que decorrem da natureza das coisas.

Afirma André Franco Montoro13 que “nas sociedades modernas, a lei é indiscutivelmente a mais importante das fontes formais da ordem jurídica. Ela é a forma ordinária e fundamental da expressão do direito.”.

É ela que fixa as linhas fundamentais no sistema jurídico e serve de base para a solução da maior parte dos problemas do direito.

É essencial que os direitos do homem sejam protegidos pelo império da lei, afirma o preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos do Homem.

Cabe ressalvar que a Lei apresenta um duplo sentido. O primeiro, compreende toda norma geral de conduta que define e disciplina as relações de fato incidentes no direito e cuja observância o poder do Estado impõe coercitivamente, como são as normas legislativas, as costumeiras e as demais, ditadas por outras fontes do direito, quando admitidas pelo legislador. O segundo, mais restritivo, que se refere à Lei em sentido próprio e formal.

A Lei, tomada em seu sentido estrito e próprio, é apenas a norma jurídica aprovada regularmente pelo Poder Legislativo.

Nesse segundo sentido, mais preciso, é a lei a norma geral de direito formulada e promulgada, por modo autêntico, pelo órgão constitucionalmente competente.

Tem aplicação aqui o princípio do devido processo legal, que adquire o aspecto do substantive due process of law, muito claramente definido por Eduardo Garcia de Enterría14:

“Quanto ao conteúdo das leis, a que o princípio da lelgalidade remete, fica também claro que não é tampouco válido qualquer conteúdo (dura lex, sed lex), não é qualquer comando ou preceito normativo que se legitima, mas somente aqueles que se produzem ‘dentro da Constituição’ e especialmente de acordo com sua ‘vontade de valores que, com toda explicitude, expressem e, principalmente, que não atentem, mas que pelo contrário sirvam aos direitos fundamentais”.

Então, podemos definir a Lei como uma regra de direito geral, abstrata e permanente, proclamada obrigatória pela vontade da autoridade competente e expressa numa fórmula escrita.

Três elementos integram esse conceito.

1) Elemento material: que é o conteúdo da lei, expressando regra de direito geral, abstrata e permanente;

Isso significa que é uma regra estabelecida não visando uma situação individual, mas de todos os casos da mesma espécie. Ela pode ser mais ou menos geral, mas dentro de seu campo, ela se aplica igualmente a todos os casos ocorrentes.

Essa característica liga-se à finalidade da lei, que é o bem comum.

A lei disciplina uma situação jurídica abstrata, isto é, separada das circunstâncias variáveis em que ela se apresenta em cada caso concreto. Pode-se dizer que a lei é “impessoal”.

Esse caráter de impessoalidade desautoriza a produção de leis com efeitos concretos.

Mas deve se atentar para o fato de que mesmo que sejam determináveis os destinatários da lei não significa, necessariamente, que se opera individualização suficiente para tê-la por norma de efeitos concretos. Nesse sentido é o entendimento do Supremo Tribunal Federal:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI ESTADUAL 356/97, ARTIGOS 1º E 2º. TRATAMENTO FISCAL DIFERENCIADO AO TRANSPORTE ESCOLAR VINCULADO À COOPERATIVA DO MUNICÍPIO. AFRONTA AO PRINCÍPIO DA IGUALDADE E ISONOMIA. CONTROLE ABSTRATO DE CONSTITUCIONALIDADE. POSSIBILIDADE. CANCELAMENTO DE MULTA E ISENÇÃO DO PAGAMENTO DO IPVA. MATÉRIA AFETA À COMPETÊNCIA DOS ESTADOS E À DO DISTRITO FEDERAL. TRATAMENTO DESIGUAL A CONTRIBUINTES QUE SE ENCONTRAM NA MESMA ATIVIDADE ECONÔMICA. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. Norma de efeitos concretos. Impossibilidade de conhecimento da ação direta de inconstitucionalidade. Alegação improcedente. O fato de serem determináveis os destinatários da lei não significa, necessariamente, que se opera individualização suficiente para tê-la por norma de efeitos concretos. Preliminar rejeitada. 2. Lei Estadual 356/97. Cancelamento de multa e isenção do pagamento do IPVA. Matéria afeta à competência dos Estados e à do Distrito Federal. Benefício fiscal concedido exclusivamente àqueles filiados à Cooperativa de Transportes Escolares do Município de Macapá. Inconstitucionalidade. A Constituição Federal outorga aos Estados e ao Distrito Federal a competência para instituir o Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores e para conceder isenção, mas, ao mesmo tempo, proíbe o tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem na mesma situação econômica. Observância aos princípios da igualdade, da isonomia e da liberdade de associação. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente. (STF - Tribunal Pleno - ADI 1655 / AP - Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA – J. 03/03/2004 - DJ 02-04-2004 PP-00008, EMENT VOL-02146-01 PP-00156)

Mas o Supremo Tribunal Federal não aceita o controle concentrado de lei de efeitos concretos justamente por faltar a esta o elemento da abstração e generalidade, conforme se depreende dos julgamentos abaixo transcritos:

CONSTITUCIONAL. LEI DE DIRETRIZES ORÇAMENTÁRIAS. VINCULAÇÃO DE PERCENTUAIS A PROGRAMAS. PREVISÃO DA INCLUSÃO OBRIGATÓRIA DE INVESTIMENTOS NÃO EXECUTADOS DO ORÇAMENTO ANTERIOR NO NOVO. EFEITOS CONCRETOS. NÃO SE CONHECE DE AÇÃO QUANTO A LEI DESTA NATUREZA. SALVO QUANDO ESTABELECER NORMA GERAL E ABSTRATA. AÇÃO NÃO CONHECIDA. (STF - Tribunal Pleno - ADI 2100 / RS - Relator(a): Min. NÉRI DA SILVEIRA – j. 17/12/1999 - Publicação: DJ 01-06-2001 PP-00076 EMENT VOL-02033-02 PP-00238)

CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI COM EFEITO CONCRETO. LEI DE DIRETRIZES ORÇAMENTÁRIAS: Lei 10.266, de 2001. I. - Leis com efeitos concretos, assim atos administrativos em sentido material: não se admite o seu controle em abstrato, ou no controle concentrado de constitucionalidade. II. - Lei de diretrizes orçamentárias, que tem objeto determinado e destinatários certos, assim sem generalidade abstrata, é lei de efeitos concretos, que não está sujeita à fiscalização jurisdicional no controle concentrado. III. - Precedentes do Supremo Tribunal Federal. IV. - Ação direta de inconstitucionalidade não conhecida. (STF - Tribunal Pleno - ADI-MC 2484 / DF - Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO – j. 19/12/2001 - Publicação DJ 14-11-2003 PP-00011 EMENT VOL-02132-13 PP-02452)

O elemento de ser permanente significa que a Lei tem continuidade no tempo e se aplica indefinidamente aos casos ocorrentes, enquanto não for revogada ou não se esgotar o tempo de sua vigência.

2) Elemento formal: a vontade do legislador.

Qual é o órgão ou autoridade competente para exercer o poder de declarar o preceito contido da lei obrigatório? Quem é o legislador?

Isso depende do regime político. Nas democracias modernas, a Constituição confere em geral o poder de legislar a uma assembléia eleita pelo povo, com a participação do Chefe do Governo.

3) Elemento instrumental: a fórmula escrita.

Por ser escrita, distingue-se a lei do “costume jurídico”.

Quando falamos no processo de produção da Lei não podemos deixar de falar à temática de sucessão de leis no tempo e à necessidade de assegurar o valor da segurança jurídica.

Consiste a segurança jurídica, ensina Jorge Reinaldo Vanossi15, “no conjunto de condições que tornam possível às pessoas o conhecimento antecipado e reflexivo das conseqüências diretas de seus atos e de seus fatos à luz da liberdade reconhecida.”.

Se a lei revogada produziu efeitos em favor de um sujeito, diz-se que ela criou situação jurídica subjetiva, que poderá caracterizar-se como um direito subjetivo. Quando essa situação ocorrer, e não estivermos diante de um simples interesse, um direito condicionado ou latente, podemos dizer que o direito passou a integrar o patrimônio da pessoa.

A lei, quando trata do direito material e, portanto, disciplina os bens jurídicos apreensíveis pelo homem, possui a proteção constitucional do respeito ao direito adquirido, ao ato jurídico prefeito e à coisa julgada, inscritos no art. 5º, XXXVI, da Constituição da República.

Mas quando trata de direito processual a disciplina é outra. As regras de processo não se constituem em direitos subjetivos públicos, porque sua essência é a de regras de conduta. Assim, eventual lei revogadora de norma processual aplica-se aos processos em curso, atingidos todos os atos processuais futuros. Os já praticados, terão sua validade verificada em função da legislação revogada, uma vez tratarem-se de atos jurídicos, em tese, perfeitos.


8. O COSTUME

O costume é a mais antiga das fontes do direito.

Grande parte dos usos e costumes das sociedades primitivas está ligada à religião. Esse estudo pode ser feito em uma obra clássica sobre a matéria, que é A Cidade Antiga, de Fustel de Coulanges. Esse grande historiador francês mostrou como as mais importantes regras jurídicas relativas ao patrimônio, à propriedade e ao contrato estavam ligadas a elementos de ordem religiosa, como o culto dos mortos.

Costume é a norma jurídica que resulta de uma prática geral constante e prolongada, observada com a convicção de que é juridicamente obrigatória.

Ou ainda, como ensina Vicente Ráo16, é “a regra de conduta criada espontaneamente pela consciência comum do povo, que a observa por modo constante e uniforme e sob a convicção de corresponder a uma necessidade jurídica”.

Sua principal característica é ser criado espontaneamente pela consciência comum do povo e não editada pelo poder público.

Elementos:

a) Elemento externo, ou seja, o uso. Ele precisa ser praticado por longo tempo, de forma constante e geral, aplicando-se a todos os casos compreendidos naquela espécie.

b) Elemento interno ou psicológico: é necessária a convicção de que ele é obrigatório, de que constitui uma regra ou preceito correspondente a uma necessidade jurídica.

Espécies:

  • segundo a lei;

  • na falta da lei;

  • contra a lei.

No primeiro caso, o costume é segundo à lei quando esta a ele se reporta expressamente. Ex.: O código civil de 1916 dizia que o locatário era obrigado a pagar pontualmente o aluguel nos prazos ajustados e, em falta de ajuste, segundo o costume do lugar.

No segundo caso, quando intervém na falta ou na omissão da lei. Tem caráter supletivo das lacunas deixadas pela lei.

O terceiro ocorre quando o costume contraria o que dispõe a lei.

A doutrina e a jurisprudência são pacíficas em aceitar o costume segundo a lei e na falta da lei, mas é extremamente controvertida a aceitação do costume contra a lei.

A questão é saber se o costume pode ser considerado fonte das normas de processo, tendo em vista que, quando tratamos dessa matéria, estamos diante de um típico direito público.

Para responder a esse questionamento, é preciso fazer uma análise prévia de dois princípios comuns ao processo administrativo e judicial.

O primeiro, é o princípio da legalidade. Tal princípio pode ser visto a partir de dois primas, quando analisado sob a óptica de seu elemento subjetivo.

Com relação aos administrados, nossa Constituição da República garante, por meio de seu artigo 5º, V, que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei.

Logo, prima facie, somente a lei é que poderá impor ou restringir comportamentos processuais aos litigantes em processo.

Ninguém poderá ser compelido a adotar determinado comportamento processual sem antes conhecer as regras previamente estabelecidas, sob pena de ofensa ao valor supremo da segurança jurídica.

Pela óptica da Administração Pública, esta por sua vez, só poderá agir se a lei assim o autorizar, conforme vaticina o art. 37 do Texto Maior.

Então, a atuação processual da Administração Pública estará necessariamente jungida aos comandos normativos estabelecidos pela Lei.

Ao tratar do processo administrativo, esclarece Wagner Balera17 que aquele “é o modo de acesso de que se vale o interessado para, recorrendo ao Poder Público, obter o seu quinhão de amparo previdenciário. Tanto que acionada, à Administração cabe mobilizar, de pronto (ex officio), o instrumental formal apto a dar resposta ao pleito do beneficiário. Tudo com base nas normas legais.”.

Celso Antonio Bandeira de Melo18, ao comentar o princípio da legalidade como um princípio capital para a configuração do regime jurídico administrativo, afirma que “o princípio da legalidade é o da completa submissão da Administração às leis. Esta deve tão-somente obedecê-las, cumpri-las, pô-las em prática. Daí que a atividade de todos os seus agentes, desde o que lhe ocupa a cúspide, isto é, o Presidente da República, até o mais modesto dos servidores, só pode ser a de dóceis, reverentes, obsequiosos cumpridores das disposições gerais fixadas pelo Poder Legislativo, pois esta é a posição que lhes compete no Direito brasileiro.

Michel Stassinopoulos, em fórmula sintética e feliz, esclarece que, além de não poder atuar contra legem ou praeter legem, a Administração só pode agir secundum legem. Aliás, no mesmo sentido é a observação de Alessi, ao averbar que a função administrativa se subordina à legislativa não apenas porque a lei pode estabelecer proibições e vedações à Administração, mas também porque esta só pode fazer aquilo que a lei antecipadamente autoriza. Afonso Rodrigues Queiró afirma que a Administração “é longa manus do legislador” e que “a atividade administrativa é atividade de subsunção dos fatos da vida real às categorias legais”.

O segundo princípio a que estão submetidos o processo judicial e administrativo é o princípio do devido processo legal.

Tecnicamente, poder-se-ia dizer que o princípio da legalidade deriva ou mesmo encontra-se inserido no princípio do devido processo legal, uma vez que a expressão “legal”, conjugada com a expressão “devido”, revela a condição jurídica de que toda norma processual deve ter sua previsão fundada na lei.

É por meio dele, que o indivíduo tem protegido, no âmbito do processo administrativo ou judicial, sua liberdade e seus bens.

Vale lembrar aqui, a lição de Alexandre de Morais19, que preleciona que “o devido processo legal configura dupla proteção ao indivíduo, atuando tanto no âmbito material de proteção ao direito de liberdade, quanto no âmbito formal, ao assegurar-lhe paridade total de condições com o Estado-persecutor e plenitude de defesa (direito a defesa técnica, à publicidade do processo, à citação, de produção ampla de provas, de ser processado e julgado pelo juiz competente, aos recursos, à decisão imutável, à revisão criminal).”.

Outro não é o entendimento do Supremo Tribunal Federal, conforme se depreende do aresto abaixo transcrito:

"Abrindo o debate, deixo expresso que a Constituição de 1988 consagra o devido processo legal nos seus dois aspectos, substantivo e processual, nos incisos LIV e LV, do art. 5º, respectivamente. (...) Due process of law, com conteúdo substantivo — substantive due process — constitui limite ao Legislativo, no sentido de que as leis devem ser elaboradas com justiça, devem ser dotadas de razoabilidade (reasonableness) e de racionalidade (rationality), devem guardar, segundo W. Holmes, um real e substancial nexo com o objetivo que se quer atingir. Paralelamente, due process of law, com caráter processual — procedural due process — garante às pessoas um procedimento judicial justo, com direito de defesa." (ADI 1.511-MC, voto do Min. Carlos Velloso, DJ 06/06/03)

Mesmo naqueles processos onde o princípio da informalidade e da instrumentalidade da formas está mais presente, não se pode deixar de ter em mente o princípio do devido processo legal.

A informalidade de um procedimento, não pode, com efeito, afastar as regras processuais vigentes. Esse é o entendimento do Supremo Tribunal Federal:

“Conforme decidido pela Segunda Turma desta Corte, no julgamento do AI 335.076-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, unânime, DJ de 07/02/2003, o fato de os juizados especiais cíveis e criminais atenderem aos princípios da celeridade e da economia processual não pode provocar o desrespeito aos postulados da ampla defesa e do devido processo legal. No presente processo, os recorrentes ficaram impedidos de produzir prova em audiência e de inquirir a testemunha arrolada, porque não foram intimados para esse ato processual de essencial para a apuração da verdade. O dano sofrido é inquestionável, pois o pedido deduzido pela recorrida foi julgado procedente.” (RE 260.776, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ 16/09/05)

Wagner Balera20, ensina que “por intermédio de esquema processual legalmente prefixado (e, por isso, devido) o Estado definirá o quantitativo de bem-estar a ser concedido (e nessa medida, devido) ao beneficiário da seguridade social”.

Posto isso, a princípio é possível afirmar que o costume não pode ser considerado fonte formal do processo administrativo ou judicial, seja porque naquele existe a obrigatoriedade da Administração Pública conduzir-se no estrito cumprimento da legalidade, seja porque neste, os administrados não podem se submeter à normas que não tenham emanado do Poder Legislativo.

No entanto, esse posicionamento não é unânime na doutrina e jurisprudência pátria.

Sem dúvida, não se pode esquecer da praxe forense ou da praxe administrativa. A doutrina não nega que o costume possa ser visto como fonte formal do direito administrativo.

A esse respeito, cabe invocar as lições de Hely Lopes Meirelles21 :

“O costume tem perdido muito de sua importância na construção do Direito, desde a Lei da Boa Razão (1769), que desautorizou seu acolhimento quando contrário à lei, até a promulgação de nosso Código Civil (1916), que declarou revogados os “usos e costumes concernentes às matérias de Direito Civil” por ele reguladas (art. 1.807). Persiste, entretanto, e com grande prestígio, no Direito Comercial, que o admite expressamente desde que secundum legem (CComercial, arts. 130 e 133).

No Direito Administrativo Brasileiro o costume exerce ainda influência, em razão da deficiência da legislação. A prática administrativa vem suprimento o texto escrito, e, sedimentada na consciência dos administradores e administrados, a praxe burocrática passa a suprir a lei, ou atua como elemento informativo da doutrina”

Vejamos um exemplo ilustrativo da jurisprudência aceitando o costume como fonte do direito administrativo:

FUNCIONÁRIO PÚBLICO MUNICIPAL – Procedimento administrativo – Portaria exoneratória – Invalidação – Necessidade – Médico – Exercício irregular de sua atividade profissional – Atendimento de pacientes particulares em dia e horário normal de trabalho na rede pública – Constatação da prática costumeira do “dia cirúrgico” por outros funcionários – Prática de um costume que pode ser errado, mas que se incorporou à rotina administrativa da prefeitura – Reconhecimento – Alegação da municipalidade de que uma irregularidade não se converte em regularidade se praticada por mais de um funcionário – Inadmissibilidade – Existência de um projeto de lei elaborado para regularizar a situação – Recurso provido. (Apelação Cível n. 339.563-5/4-00 – São Sebastião – 1ª Câmara de Direito Público – Relator: Renato Nalini – 28.3.2006 – V.U. – voto n. 10.877) MCGAS

O costume contra legem ocorre em duas situações: quando o costume simplesmente suprime a lei, que fica letra morta, ou no costume ab-rogatório, que cria uma nova regra.

Um dos problemas do reconhecimento do costume como fonte formal de formação das regras de processo, administrativo ou judicial, está justamente na falta de segurança jurídica.

A preclusão, por seu lado, pode ser um elemento impeditivo na aceitação do costume como fonte formal do processo, justamente porque a parte contrária sempre buscará seu reconhecimento como tática de atuação processual.

O costume, então, deve ser aceito como formador das regras de processo quando vier para prestigiar a boa-fé dos postulantes.

A jurisprudência, por seu lado, nos traz ricos ensinamentos a respeito da possibilidade de aplicação do costume, ou práxis judicial, como flexibilizadora e modificadora das regras de processo. Vejamos alguns exemplos:

PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. PREPARO. PRAXE FORENSE EM COMARCA DO INTERIOR. REMESSA DAS CUSTAS VIA CHEQUE. RECEBIMENTO PELO CARTÓRIO ANTES DE VENCIDO O PRAZO. RECOLHIMENTO BANCÁRIO TARDIO. DESERÇÃO AFASTADA.

I. Confirmada a existência de praxe em comarca do interior do Estado, que aceitava o recebimento de custas mediante envio de cheque pelo correio, documento que chegou ao cartório muito tempo antes do término do prazo legal para o preparo, a tardia conclusão da petição ao Juízo e o intempestivo pagamento, pelo serventuário, perante a agência bancária, elidem a aplicação da pena de deserção pelo Tribunal a quo.

II. Recurso especial conhecido e provido. (STJ – 4ª T. - REsp 57134 / RS – Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR - j. 10/10/2000 – Fonte: DJ 12.02.2001 p. 116, RSTJ vol. 157 p. 386).

PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. COMARCA DO INTERIOR. PAGAMENTO ADMITIDO COMO PRAXE PERANTE A CONTADORIA DO JUÍZO, NO MESMO DIA DA INTERPOSIÇÃO DO RECURSO. DESERÇÃO AFASTADA. CPC, ART. 511. LEI N. 8.950/94.

I. Nos termos do art. 511 do CPC, na redação que lhe deu a Lei n. 8.950/94, o preparo da apelação deve ser comprovado no ato da sua interposição.

II. Caso, todavia, em que respaldada por praxe adotada em Comarca do interior do Estado do Espírito Santo, que admitia a efetivação do pagamento, desde que no mesmo dia, junto à Contadoria do Juízo, é de se relevar, excepcionalmente, a deserção aplicada pelo Tribunal a quo.

III. Recurso especial conhecido e provido, para determinar a apreciação da apelação pela Corte de 2º grau. (STJ – 4ª T. REsp 138775 / - Relator(a) Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR – J. 24/08/1999 – Fonte DJ 28.02.2000 p. 86).

Outra hipótese que a jurisprudência considera a praxe forense como fonte do direito, é a hipótese relativa aos índices de atualização monetária:

AGRAVO DITO REGIMENTAL. INDENIZAÇÃO POR CONSTRUÇÕES, NO VALOR MÉDIO DOS LAUDOS APRESENTADOS, A SER ATUALIZADO "SEGUNDO OS CRITÉRIOS ADOTADOS PELA PRAXE FORENSE".

ARESTO QUE NÃO CONTRARIA OS ARTS., 516 E 547 DO CÓDIGO CIVIL, NEM O ART. 5. DA LICC, QUE APENAS ESTABELECE REGRA PROGRAMÁTICA PARA ADEQUADA EXEGESE DAS LEIS. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. (STJ - 4ª T - AgRg no Ag 17380 / RS - Relator Ministro ATHOS CARNEIRO j. 18/05/1992 – Fonte DJ 08.06.1992 p. 8622).

Em outra situação, o Superior Tribunal de Justiça considerou válido o costume de remeter os autos ao Ministério Público para ser intimado de sentenças ou notificações, sendo tal praxe de observância obrigatória, sob pena de reconhecimento de nulidade do processo:

Correição parcial.

1. Decisão de tribunal que não toma conhecimento de correição, sob fundamento de inexistência de norma legal que prescreve a remessa de autos ao Ministério Público quando de intimações de sentenças ou de notificações.

2. Ministério Público. Existência de normas legais expressas (art. 800, parágrafos 2º. e 4º., do CPP) impositivas da remessa dos autos ao Ministério Público, quando das intimações, aplicáveis aos prazos dos arts. 499 e 500 e extensivas a intimação das sentenças segundo antiga praxe forense. (STJ – 5ª T. - RMS 1226 / DF - Relator(a) Ministro ASSIS TOLEDO – j. 30/10/1991 – Fonte DJ 06.04.1992 p. 4503 - LEXSTJ vol. 36 p. 310 - RSTJ vol. 43 p. 162)

Vejamos outro exemplo de como a praxe forense é capaz de criar direitos processuais às partes:

HABEAS CORPUS - Processo - Impetração buscando a anulação do trânsito em julgado de sentença condenatória e a devolução do prazo para apelar - Intimação da paciente, solta, sem a apresentação, pelo oficial de justiça, do "termo de recurso" - Mandado de intimação que não traz no seu bojo advertência, clara, do direito a recurso e o seu respectivo prazo - Intimação deficiente, violadora do direito à ampla defesa - Termo de recurso - Expediente não previsto na legislação processual, mas que constitui praxe forense não restrita a réu preso. (TJSP - Habeas Corpus n. 294.633-3 - São Paulo - 4ª Câmara Criminal - Relator: Passos de Freitas - 05.10.99 - V.U.).

Mais interessante é o caso ilustrado pelo julgamento da primeira turma do Superior Tribunal de Justiça, na qual o relator, além de entender que a praxe forense pode ser considerada fonte formal do direito, acaba por influenciar as modificações legislativas no Código de Processo Civil. Diz o acórdão:

AGRAVO REGIMENTAL CONTRA DECISÃO QUE ADMITIU A AUTENTICAÇÃO DE PEÇAS POR DECLARAÇÃO DO ADVOGADO, CONFERINDO-LHE PRAZO NA FORMA DA NOVEL REDAÇÃO DO ART. 544 COM A DICÇÃO QUE LHE DEU A Lei 10.352/01. DEFEITO SANÁVEL. PRINCÍPIO DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS. A JURISPRUDÊNCIA E AS FONTES FORMAIS DO DIREITO. PREQUESTIONAMENTO DE DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. IMPOSSIBILIDADE.

I - O Direito Processual Civil adota o princípio da instrumentalidade das formas à luz da constatação de que o processo é meio para a realização do direito objetivo-material. Em conseqüência, a política de nulidades do CPC é voltada para a sanação dos atos não prejudiciais aos fins de justiça de processo, repudiando o fetichismo das formas.

II - Deveras, inspirado por esse princípio e influenciado pela práxis, o legislador empreendeu reforma no § 1º do Art. 544 do CPC, permitindo ao advogado declarar autenticas a peças acostadas ao agravo.

III - Em conseqüência, é lícito, antes do julgamento do recurso, já em vigor o novel diploma, instar-se o advogado a declarar a autenticidade das peças ao invés de não conhecer do recurso por formalidade hoje repudiada por norma legal expressa.

IV - Inaplicabilidade da regra tempus regit actum, tanto mais que a jurisprudência não é fonte formal do direito, tornando-se insubsistente ao exsurgimento de novel legislação que infirme o seu conteúdo.

V - Despacho que admitiu a declaração de autenticação das peças pelo advogado.

VI - Descabe ao STJ examinar questão de natureza constitucional, ainda que para fins de prequestionamento, porquanto enfrentá-la significaria usurpar competência que, por expressa determinação da Carta Maior, pertence ao colendo STF, a competência traçada para este Tribunal restringe-se unicamente à uniformização da legislação infraconstitucional.

VII - Agravo regimental desprovido. (STJ – 1ª T - AgRg no Ag 450459 / SP - Relator(a) Ministro LUIZ FUX - j. 11/03/2003 – Fonte DJ 31.03.2003 p. 158)


9. A JURISPRUDÊNCIA

Em sentido estrito, jurisprudência é o conjunto uniforme e constante das decisões judiciais sobre casos semelhantes.

Com efeito, é o conjunto de decisões proferidas por um tribunal, reiteradamente e de forma a construir uma diretriz de solução para os casos futuros e iguais.

Alguns autores criticam a classificação da jurisprudência como fonte formal do direito, sob o argumento de que por mais reiterada que seja, a jurisprudência não constitui norma imperativa como fonte formal do direito positivo.

A jurisprudência administrativa integra o rol das fontes do direito diante de seu caráter eminentemente normativo.

Mas para se falar em jurisprudência administrativa é preciso que se reconheça a existência da jurisdição administrativa.

A justiça administrativa pode ser definida como um sistema de mecanismos e de formas ou processos destinados à resolução das controvérsias nascidas de relações jurídicas administrativas.

De forma geral, é possível distinguir três modelos básicos de organização, tomando-se como critério os órgãos aos quais se atribui a competência para decidir:

  • Modelo Administrativista – a decisão final dos litígios administrativos compete aos órgãos superiores da Administração ativa. Nesse sentido, entende-se que a tarefa de julgar a administração é ainda administrar.

  • Modelo Judicialista – a decisão das questões jurídicas administrativas cabe a tribunais integrados ao Poder Judiciário, sejam comuns ou especializados em razão da matéria.

  • Modelo Judiciarista ou quase-judicialista - a resolução dos litígios relativos à Administração cabe a autoridades “judiciárias”, contudo integrando órgãos administrativos independentes, alheios à orgânica dos tribunais comuns, também chamados Tribunais Administrativos.

Conforme dito no início deste trabalho a existência do processo administrativo é expressamente reconhecida por nosso ordenamento jurídico.

A idéia de que o Poder Executivo, dentro de nosso ordenamento jurídico, tem o “poder-dever” de exercer a função atípica de julgar – aplicando as normas gerais e abstratas, positivando o Direito, introduzindo no sistema jurídico outras normas, individuais e concretas com o fito e na função de dirimir situações que encerram conflitos concretos de interesses – confirma-se no próprio plano do Direito Constitucional posto.

É por meio da função estatal Executiva que o Estado revela parcela significativa de sua força, por abrigar a maior parte da máquina burocrática, tutelando os mais diferentes interesses, sobretudo o público.

A Administração atua, no mundo fenomênico, por intermédio de atos administrativos, quase sempre no bojo de processos administrativos.

O processo administrativo, por sua vez, pode ser visto como um conjunto sistemático de atos dos órgãos públicos que regulam as relações jurídicas da Administração consigo mesma, com outras entidades estatais e com os administrados, pessoas físicas e jurídicas.

E assim, inegável que as decisões emanadas da jurisdição administrativa constituem-se de fontes do direito processual.

Mas quando abordamos o tema da jurisprudência como fonte do direito, sempre nos deparamos com o problema das relações entre a jurisprudência e a lei.

Para Vicente Ráo22, a jurisprudência, “por maior que seja a influência dos precedentes judiciais, jamais eles adquirem o valor de uma norma obrigatória e universal, podendo, quando muito, propiciar reformas ou inovações legislativas, como também pode fazer a ciência jurídica.

É certo que se discute se pode ou não o juiz, no desenvolvimento de sua função interpretativa, criar normas jurídicas e exercer, dessarte, certa atividade criadora do direito. A questão assume importância maior, quando o juiz se encontra em face da lei omissa ou lacuna e, apesar disto, precisa, deve, necessariamente, julgar o caso concreto. Mas, o que é certo é que ao juiz nenhuma outra função incumbe além da de aplicar as leis existentes, que ele não pode alterar nem substituir. E se a lei apresenta lacunas ou omissões, não lhe é lícito criar novas normas, bastando socorrer-se da analogia e dos princípios gerais de direito, o que significa, em última análise, que a norma assim extraída já se achava subentendida ou admitida nas normas expressas legislativas, não se podendo qualificar, por isso, como nova norma jurídica.”.

No entanto, Miguel Reale23 discorda desse posicionamento, prelecionando que “a jurisprudência, muitas vezes, inova em matéria jurídica, estabelecendo normas que não se contêm estritamente na lei, mas resultam de uma construção obtida graças à conexão de dispositivos, até então considerados separadamente, ou, ao contrário, mediante a separação de preceitos por largo tempo unidos entre si. Nessas oportunidades, o juiz compõe, para o caso concreto, uma norma que vem completar o sistema objetivo do Direito.

Mais acentuada é ainda a produção normativa da jurisprudência nos casos em que ao juiz cabe decidir por eqüidade, aplicando a norma que estabeleceria se fosse legislador, tal como se lia no tão decantado art. 114 do revogado Código de Processo Civil de 1939. A nosso ver, o juiz constitui norma para o caso concreto toda vez que houver lacuna na lei, assim como nos casos em que lhe couber julgar por eqüidade.

Criando ou não Direito novo, com base nas normas vigentes, o certo é que a jurisdição é uma das forças determinantes da experiência jurídica, tendo razão Tullio Ascarelli quando afirma que, se os precedentes jurisprudenciais não exercem, nos países de tradição romanística, o papel por eles desempenhado na experiência do common law, nem por isso é secundária a sua importância. Pode mesmo dizer-se que o seu alcance aumenta dia a dia, como decorrência da pletora legislativa e pela necessidade de ajustar as normas legais cada vez mais genéricas ou tipológicas, como modelos normativos abertos (standards) às peculiaridades das relações sociais.”.

Cabe lembrar aqui o fenômeno dos processos informais de mudança da legislação.

É certo que as leis possuem uma característica de estabilidade, uma vez que não são casuísticas.

Mas esse caráter de estabilidade não significa sua imutabilidade.

Esta pode ocorrer de suas maneiras. Pelo processo formal, que obedece ao devido processo legislativo e invoca as hipóteses e ritos de modificação da legislação.

Mas não podemos esquecer os processos informais de mudança da legislação, inclusive constitucional.

Lembra J.H. Meirelles Teixeira24 que “seria errôneo, entretanto, e mesmo ingênuo, pensar-se que as Constituições rígidas somente pudessem sofrer alterações através de técnicas jurídicas expressa e previamente estabelecidas, e que o impacto da evolução política e social somente pudesse atuar sobre elas através desses canais, e que a vida deveria necessariamente acomodar-se, em seu eterno fluxo de progresso, dobrando-se com docilidade ao sabor dessas fórmulas e apenas ao juízo de políticos e legisladores”.

As mutações constitucionais, diferentemente dos processos formais de reforma da constituição, ensina Anna Cândida da Cunha Ferraz25, consistem “na alteração, não da letra ou do texto expresso, mas do significado, do sentido e do alcance das disposições constitucionais, através ora da interpretação judicial, ora dos costumes, ora das leis, alterações essas que, em geral, se processam lentamente, e só se tornam claramente perceptíveis quando se compara o entendimento atribuído às cláusulas constitucionais em momentos diferentes, cronologicamente afastados um do outro, ou em épocas distintas e diante de circunstâncias diversas.”.

Face ao exposto, a nosso ver, a jurisprudência pode ser considerada fonte formal de produção das normas do processo administrativo e judicial.


10. OS PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO

Os princípios gerais do direito são os fundamentos que servem de base para a criação do direito de cujas normas os referidos princípios podem ser inferidos.

São os pressupostos lógicos do ordenamento jurídico, do qual, por abstração, devem ser induzidos.

Seu caráter é de uma norma supra-estatal.

Os princípios gerais zelam pela harmonia do ordenamento jurídico.

E quando falamos em harmonia sistêmica, não podemos deixar de reproduzir as lições de Del Vecchio26:

“A harmonia das diversas partes componentes do sistema deve ser experimentada e confirmada a cada instante, aproximando-se as regras particulares entre si e relacionando-as com os princípios gerais a que se prendem. Só assim poderá o jurista compreender o espírito do sistema e observá-lo em suas aplicações particulares, evitando os erros que se produziriam se ele se contentasse em considerar, por um modo geral, apenas esta ou aquela regra em si mesma. O jurista e, especialmente, o juiz, devem tanto quanto possível, dominar e, por assim dizer, reviver o inteiro sistema, compenetrando-se de sua unidade espiritual, desde os princípios remotos e subentendidos, até as mínimas disposições de detalhe, como se fossem autores do todo”.

Para Carnelutti os princípios gerais do direito não são algo que exista fora, senão dentro do próprio direito escrito, já que derivam das normas estabelecidas. Encontram-se dentro do direito escrito como o álcool no vinho: são o espírito ou a essência da lei.

Cabe advertir que alguns autores entendem que os princípios gerais do direito não se enquadram na categoria das fontes formais do direito, mas sim como fontes materiais.

Mas o que pode ser considerado princípio geral do direito?

A esse respeito existem diversas opiniões doutrinárias. Vicente Ráo27, enumera as principais classificações:

a) os princípios gerais do direito correspondem aos do direito natural (Brunetti, Del Vecchio e outros);

b) são princípios que se equiparam aos editados pela equidade (Borsari, Giorgi etc.);

c) são os que decorrem da natureza das coisas (Geny, Espínola etc.);

d) são os de caráter universal, ditados pela ciência e pela filosofia do direito (Bianchi, Pacchioni, Beviláqua etc).

e) são, para cada povo, os resultantes de seu sistema jurídico (ex.: art. 12 do Código Civil Italiano; Fadda e Bensa, nota ao § 23, v. I, das Pandectas de Windscheid etc.).

Entendemos que quando tratamos de princípios gerais do direito como fonte formal do processo administrativo e judicial, a posição mais acertada é aquela que considera seu caráter universal.

Nesse sentido, seguimos os ensinamentos de Clóvis Beviláqua, que ao comentar a lei civil brasileira, diz: “Não se trata, como pretendem alguns, dos princípios gerais de direito nacional, mas sim, dos elementos fundamentais da cultura jurídica humana em nossos dias; das idéias e princípios sobre os quais assenta a concepção jurídica dominante; as induções e generalizações da ciência do direito e dos preceitos da técnica”.


11. O NEGÓCIO JURÍDICO PROCESSUAL

Alguns doutrinadores entendem que o negócio jurídico processual pode ser considerado como fonte formal do direito.

No entanto, conforme lembram Antonio Carlos de Araújo e Cintra e outros28 “há na doutrina forte tendência a negar a existência dos negócios jurídicos processuais; a alegação é a de que a vontade dos sujeitos processuais não determina os efeitos do ato que praticam (os autos processuais são voluntários, mas apenas no sentido de que sua celebração depende da vontade; o sujeito processual limita-se a escolher entre praticar ou não o ato, não lhe deixando a lei margem de discricionariedade na escolha dos efeitos do ato”.

No entanto, Miguel Reale29, atento à sua teoria dos modelos jurídicos alhures citada, entende ser possível a classificação do negócio jurídico como fonte formal do direito.

“Esclarecido que a doutrina não é propriamente uma fonte do Direito, cumpre salientar a importância do poder negocial como força geradora de normas jurídicas.

Os que ministram noções básicas de Direito nem sempre dão o devido relevo a essa fonte de Direito, mesmo após terem admitido que a experiência jurídica não é disciplinada somente por normas legais ou leis, de caráter genérico, mas também por normas particulares e individualizadas'.

Entre as normas particulares, assim chamadas por só ligarem os participantes da relação jurídica, estão as normas negociais e, dentre estas, por sua fundamental importância, as normas contratuais, comumente denominadas cláusulas contratuais.

Essa espécie de normas resulta do fato de que, qualquer que seja o ordenamento jurídico vigente, será sempre necessário reconhecer, pela natureza mesma das coisas, que o homem é um ser capaz de direitos e obrigações e, notadamente, com o poder de estipular negócios para a realização de fins lícitos, graças a acordo de vontades. Mesmo nos países socialistas, que restringem a livre disponibilidade pessoal dos bens econômicos, transferindo para o Estado iniciativas antes conferidas aos indivíduos, mesmo nas Nações, em suma, onde se operou "a socialização dos bens de produção", é reconhecida uma esfera de ação privada, na qual se respeita o poder de disposição de cada ser humano.

Reconhece-se, em última análise, como uma conquista impostergável da civilização o que, técnica e tradicionalmente, se denomina autonomia da vontade, isto é, o poder que tem cada homem de ser, de agir e de omitir-se nos limites das leis em vigor, tendo por fim alcançar algo de seu interesse e que, situado no âmbito da relação jurídica, se denomina bem jurídico. Pode este ser, quanto ao conteúdo, de natureza econômica, estética, religiosa, de comodidade social, de recreação etc., pois o Direito é sincrônico com todas as formas de vida social.

Pouco importa o fato de que o poder negocial, que é uma das explicações ou exteriorizações fundamentais da autonomia da vontade, seja um poder sujeito aos limites da lei, pois um raciocínio desse tipo obrigar-nos-ia a concluir pela tese extremada segundo a qual tão-somente a lei constitucional seria fonte de Direito...

O fato é que, por assim terem livremente convencionado, homens e grupos dão nascimento a formas ou modelos jurídicos de ação, que os vinculam à prática dos direitos e deveres avençados. Essas avenças geralmente se ajustam a modelos legais previstos nos Códigos ou em leis complementares, mas nada impede que as partes constituam estruturas negociais atípicas, isto é, não correspondentes aos tipos normativos elaborados pelo legislador. Muito freqüente é, outrossim, a combinação de dois ou mais modelos normativos, bem como modificações nos esquemas consagrados nas leis, a fim de melhor atender às múltiplas e imprevistas exigências da vida contemporânea, tanto no plano interno, como no internacional.”.

A existência do negócio jurídico processual como fonte do direito estaria baseada nas normas dispositivas do direito material e processual, como por exemplo, a eleição de foro, a convenção sobre a distribuição do ônus da prova, a suspensão convencional do processo.

Dessa forma, entendemos como correta a classificação do negócio jurídico processual como fonte formal do direito processual à luz da teoria dos modelos jurídicos.


CONCLUSÕES

Um dos problemas mais fascinantes da ciência jurídica é o estudo das fontes formais do processo, de modo a permitir a exata compreensão da origem e validade dos instrumentos postos à disposição do Estado para a pacificação social.

A teoria das fontes formais do direito vai cedendo espaço para a teoria dos modelos jurídicos proposta por Miguel Reale. Por meio desta teoria, melhor se compreende como a experiência jurídica, impulsionada pelas mutações realidade social, interfere na formação do direito.

O estudo do instituto das fontes do direito possui o viés de proporcionar aos jurisdicionados maior segurança jurídica, uma vez que poderão conferir a validade das normas de processo dentro do ordenamento jurídico e assim, estarem certos de estarem jungidos ao devido processo legal, que, como vimos, é um princípio que tem aplicação a todos os processos administrativos e judiciais.

Analisamos que a lei possui primazia sobre as demais fontes do direito processual, em especial por estarmos diante de um direito tipicamente público quando falamos em processo administrativo ou judicial.

Não obstante isso, o costume, em que pese estarmos diante de normas de caráter público, tem seu espaço na formação das normas de processo, porém restrita às hipóteses nas quais se prestigia a boa-fé dos litigantes.

A jurisprudência, igualmente, pode ser considerada fonte formal do processo. Quando falamos em jurisprudência administrativa, remetemos à idéia de que o Poder Executivo, dentro de nosso ordenamento jurídico, tem o “poder-dever” de exercer a função atípica de julgar – aplicando as normas gerais e abstratas, positivando o Direito, introduzindo no sistema jurídico outras normas, individuais e concretas com o fito e na função de dirimir situações que encerram conflitos concretos de interesses – confirma-se no próprio plano do Direito Constitucional posto.

Quando falamos da jurisprudência judicial, dissemos que a jurisdição é uma das forças determinantes da experiência jurídica e, como tal, cada vez mais se afirma na condição de fonte formal do processo, ainda que alguns autores assim não entendam.

Os princípios gerais ao zelarem pela harmonia do ordenamento jurídico, são fontes formais do direito processual, tendo em vista a força normativa que ostentam em razão da carga axiomática que carregam. É justamente por isso que se diz que violar um princípio é muito mais grave que violar um norma.

Tratamos, por fim do negócio jurídico processual, que atento à teoria dos modelos jurídico pode perfeitamente ser considerado uma das fontes formais do processo administrativo e judicial, naquelas hipóteses em que a lei processual preveja normas de caráter dispositivo.


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Notas

1 MARINONI, Luiz Guilherme e ARENHART, Sérgio Cruz. Manual do Processo de Conhecimento, p. 29.

2 MARITAIN, Jacques. O Homem e o Estado, p. 20.

3 MONTORO, André Franco. Introdução à Ciência do Direito, p. 379.

4 BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico, p. 45.

5 DELGADO, Maurício Godinho. Introdução ao Direito do Trabalho, p. 109.

6 DÉLIO Maranhão In Arnaldo Sussekind et al. Instituições de Direito do Trabalho vol 1, p. 157.

7 Op. cit. p. 47/48.

8 GUSMÃO, Paulo Dourado. Introdução ao Estudo do Direito, p. 102.

9 REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito, p. 139/140.

10 REALE, Miguel. O Direito Como Experiência, p. 167 e ss.

11 Op. cit., p. 39.

12 Op. cit. p. 455/456.

13 MONTORO. op. cit., p. 383.

14 ENTERRÍA, Eduardo Garcia de. Princípio da legalidade na constituição espanhola, p. 6.

15 VANOSSI, Jorge Reinaldo. El Estado de derecho em el constitucionalismo social, p. 30.

16 RÁO, Vicente. op. cit, p. 253.

17 BALERA, Wagner. Processo Administrativo Previdenciário – Benefícios, p. 116..

18 MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, p. 92.

19 MORAES, Alexandre. Direito Constitucional, p. 124.

20 Op. cit., p. 121.

21 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, p. 45.

22 RÁO, Vicente. O direito e a vida dos Direitos, p. 266.

23 REALE, Miguel. op. cit. p. 159.

24 TEIXEIRA, J.H. Meirelles. Apostilas de direito constitucional, p. 62.

25 FERRAZ, Anna Cândida da Cunha. Processos Informais de Mudança da Constituição, p. 9.

26 DEL VECCHIO, Giorgio. Lês príncipes généraux de Droit”, in Recueil d’Études Sur lês SOurces du Droit em l’Honneur de F. Geny, v. II, p. 69 e ss.

27 RÁO, Vicente. op. cit. p. 273.

28 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido R. Teoria Geral do Processo, p.337.

29 REALE, Miguel. Lições, p. 169.


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CRUZ, Marcelo Cavaletti de Souza. Fontes formais do processo administrativo e judicial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3963, 8 maio 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/28182. Acesso em: 25 abr. 2024.