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A aposentadoria por idade ao trabalhador rural prevista no artigo 48, §3º, da Lei 8.213/91

A aposentadoria por idade ao trabalhador rural prevista no artigo 48, §3º, da Lei 8.213/91

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A Lei 11.718/08, ao introduzir o § 3º no artigo 48 da Lei 8.213/91, permitiu ao trabalhador rural o cômputo de contribuições vertidas para o regime urbano, para fins de aposentadoria rural, porém não permitiu que o trabalhador urbano se utilize de período rural para o preenchimento da carência para a aposentadoria por idade urbana.

INTRODUÇÃO

No meio rural, é muito comum que o trabalhador alterne períodos de atividade rural e urbana, fato que prejudicava o cumprimento dos requisitos para que ele se aposentasse por idade como trabalhador rural ou como trabalhador urbano.

O artigo 48, “caput”, da Lei 8.213/91 prevê a concessão do benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador urbano, enquanto que os parágrafos 1º e 2º preveem a concessão do benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural.

Como muitas vezes o trabalhador rural deixa as lides rurícolas para tentar nova profissão na área urbana, porém, após alguns anos de trabalho urbano não consegue se firmar e acaba voltando ao meio rural, este trabalhador estava sendo prejudicado por não poder comprovar o trabalho rural durante todo o tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido.

Visando sanar tal lacuna, a Lei 11.718/2008 acrescentou os parágrafos 3º e 4º ao artigo 48 da Lei 8.213/91, autorizando ao trabalhador rural o cômputo de períodos que não sejam de atividade rural, para fins de aposentadoria por idade.


DA PREVISÃO LEGISLATIVA

Veja-se a integralidade do artigo 48 da Lei 8.213/91 com as alterações para melhor compreensão:

 Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

§ 1o Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. (Redação dada pela Lei nº 9.876, de 1999)

§ 2o  Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período  a que se referem os incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11,718, de 2008)

§ 3o Os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo que não atendam ao disposto no § 2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher.

  § 4o  Para efeito do § 3o deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto  no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social.

O segurado que mesclar períodos de atividade urbana e rural não poderá se beneficiar da redução de 5 anos que tem direito o segurado que trabalhou somente como rurícola, razão pela qual deverá ser comprovada a idade de 65 anos para homem e 60 anos para mulher.

Observe-se que o § 3º se refere expressamente aos trabalhadores rurais. Depreende-se ainda da leitura atenta do mesmo § 3º, do art. 48, da Lei 8.213/91, que o legislador ao empregar o vocábulo "que satisfaçam essa condição" quis fazer menção ao segurado que migrou do meio urbano para o meio rural, isto é, “que ainda seja um trabalhador rural”, satisfazendo, assim, a referida condição.


DA DISCUSSÃO JURISPRUDENCIAL

Muito embora o §3º indique expressamente o trabalhador rural, houve muita discussão no Judiciário se esta norma poderia ser aplicada aos trabalhadores urbanos, ou seja, se o segurado urbano, quando do complemento da idade ou do requerimento administrativo, poderia computar períodos rurais para completar os requisitos faltantes.

Porém, embora ainda exista certa discussão, a jurisprudência está se consolidando no sentido de que o segurado deve estar vinculado ao campo no momento do preenchimento do requisito etário ou do requerimento do beneficio, conforme se apura das recentes decisões abaixo, do TRF1 e inclusive da TNU, que não conheceu do incidente de uniformização:

PREVIDENCIÁRIO E CONSTITUCIONAL. PEDIDO DE APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. AUSÊNCIA DE PROVA TESTEMUNHAL. SENTENÇA ANULADA. 1. No caso concreto Requisito etário: 14.02.2008 (Carência: 13,05 anos) Documentos apresentados: CNIS do pai da autora "aposentadoria por velhice" rural (fl. 09); Certidão de óbito do pai da autora em 1997(fl. 27); Mandado de Registro de Usucapião em favor do pai da autora e ITR da respectiva propriedade rural (fl. 10/26); Certidão de Registro do Imóvel rural com 16ha, adquirido por herança pela autora (Formal de Partilha datado de 27.08.2009), onde consta que a mesma é casada com Robinton Xavier de Miranda, qualificado no referido documento como lavrador (fls. 28/29), CCIR Fazenda Santa Barbara em nome da autora à fl. 30 (emissão 2006/2007/2008/2009); Recibos de entrega da declaração do ITR/2009 onde consta endereço urbano d autora. CNIS da autora (fl. 66): vínculos urbanos entre 1974/1976 ("EMPAL Empreitada Auxiliar de Obras Ltda"), de 1982/1983 (Prefeitura Municipal de Luziânia/GO) e de 2005/2007 (Prefeitura Municipal de São Miguel do Passa Quatro/GO). 2. Tendo sido a petição inicial instruída com documentos que, em princípio, podem ser considerados como início de prova material do labor rural que se visa comprovar, mostra-se equivocada a sentença que julga antecipadamente a lide antes da exaurida a instrução probatória com a produção da prova testemunhal que seria necessária ao deferimento da prestação requerida. 3. Ainda que o CNIS da autora demonstre a existência de alguns vínculos urbanos, não se pode olvidar a possibilidade de concessão do beneficio de aposentaria por idade rala de que trata o art. 48, §3º, da Lei 8213/91, com redação conferida pela Lei 11.718/2008 (aposentadoria híbrida ou mista), aplicável aos trabalhadores rurais que, no momento do preenchimento do requisito etário ou do requerimento do beneficio, comprove estarem vinculados ao campo. 4. Sentença anulada, com a determinação de retorno dos autos à origem, em face da inaplicabilidade do procedimento previsto no art. 515, § 3º, do CPC. 5. Apelação provida.

(AC , DESEMBARGADOR FEDERAL CANDIDO MORAES, TRF1 - SEGUNDA TURMA, e-DJF1 DATA:22/05/2014 PAGINA:322.) 

PROCESSO CIVIL. INCIDENTES DE UNIFORMIZAÇÃO REGIONAL E NACIONAL. MESMOS FUNDAMENTOS. INTERPOSIÇÃO SIMULTÂNEA. NECESSIDADE. PRECLUSÃO. PRECEDENTES. PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO NÃO CONHECIDO. 1. O autor, ora recorrente, pretende a modificação do acórdão proferido pela Turma Regional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais da 4ª Região, que negou provimento ao seu incidente de uniformização. 2. O acórdão proferido pela turma recursal de origem, que confirmou a sentença pelos seus próprios fundamentos, rejeitou o pedido de aposentadoria por idade, sob o fundamento de que o autor não cumpriu a carência, já que o tempo de serviço prestado por ele em atividade rural, que, no caso, corresponde ao período de 1951 a 1985, não pode ser computado para tal fim. Intimado da decisão, o autor interpôs somente o incidente regional de uniformização, ao qual foi negado provimento, em sessão de 19-10-2012, com o fundamento de que o benefício de que trata o art. 48, § 3º, da Lei 8.213/91 é devido aos trabalhadores rurais que implementam o requisito etário enquanto vinculados ao campo e que a Lei 11.718/2008 não revogou o disposto no art. 55, § 2º, da Lei 8.213/91. Em 7-1-2013, o autor interpôs incidente de uniformização nacional, alegando divergência da decisão da Turma Regional com a jurisprudência da 5ª Turma Recursal de São Paulo, que entende ser possível a junção dos períodos rural e urbano para efeito de carência com a finalidade de concessão da chamada aposentadoria mista, prevista no parágrafo 3º do art. 48 da Lei 8.213/91, incluído pela Lei 11.718/2008. 3. Decidida a causa em segundo grau de jurisdição, por força do art. 14 da Lei 10.259/01, deve ser interposto pedido de uniformização regional, se demonstrada a divergência entre turmas recursais da mesma região da justiça federal, ou nacional, se verificada a disparidade de entendimento entre turmas recursais de diferentes regiões ou com a jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça. Se existe divergência dentro e fora da região, a parte deve utilizar o incidente nacional, que será julgado pela última instância do juizado. Preferindo utilizar o incidente regional, ele deve ser interposto simultaneamente com o incidente nacional, se o fundamento for o mesmo, sob pena de preclusão, a não ser que a Turma Regional modifique o acórdão da Turma Recursal. 4. Precedentes da TNU: Pedilef. 2005.34.00.91.7983-4, relator o Sr. Juiz José Eduardo do Nascimento, e Pedilef 2007.71.58.001100-7, relator o Sr. Juiz Vladimir Vitovsky. 5. No caso, a Turma Regional não alterou o entendimento da Turma Recursal. 6. Julgamento de acordo com o art. 46 da Lei 9.099/95. 7. Pedido de uniformização não conhecido.

(PEDILEF 50010207920124047110, JUIZ FEDERAL GLÁUCIO FERREIRA MACIEL GONÇALVES, TNU, DOU 07/06/2013 pág. 82/103.)

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE "HÍBRIDA" PREVISTA NOS §§ 3º e 4º DO ART. 48 DA LEI 8.213/91, COM REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.718/08. TRABALHADOR URBANO. PRETENSÃO DE CÔMPUTO, NO PERÍODO DE CARÊNCIA, DE ATIVIDADE RURAL EXERCIDA EM PERÍODO REMOTO. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONFORMIDADE COM O ENTENDIMENTO DA TNU. QUESTÃO DE ORDEM N° 13/TNU. INCIDENTE NÃO CONHECIDO.

1. Trata-se de pedido de uniformização interposto pela parte autora recorrente contra acórdão que reformou sentença de procedência de pedido de aposentadoria por idade. O acórdão recorrido entendeu que a aposentadoria por idade rural prevista no art. 48 e seus parágrafos é reservada aos trabalhadores de índole rural, o que não se coaduna com a hipótese dos autos, em que o autor se afastou das lides campesinas há mais de 20 (vinte) anos e passou a exercer atividade urbana.

2. A parte recorrente sustenta que o acórdão divergiu da jurisprudência da Turma Recursal do Espírito Santo (autos nº 2008.50.51.001295-0) no sentido de que é possível o cômputo de atividade rural e atividade urbana para efeito de carência para concessão de benefício de aposentadoria por idade, nos termos definidos pela nova redação do art. 48, §§ 3º e 4º da Lei 8.213/91, dada pela Lei nº 11.718/08, independentemente do fato de o segurado ser considerado trabalhador urbano ou rural ao tempo do requerimento administrativo.

3. O incidente não merece ser conhecido.

4. O julgado invocado como paradigma pelo recorrente foi objeto de reforma por esta Turma Nacional de Uniformização em 04/09/2013 (PEDILEF 2008.50.51.001295-0, Relator Juiz Federal Paulo Ernane Moreira Barros). Nessa ocasião fixou-se o entendimento de que a Lei n° 11.718/08 permitiu ao trabalhador rural (segurado especial) o cômputo de contribuições vertidas para o regime urbano, para fins de aposentadoria rural. Asseverou-se que, "todavia, o contrário continua não sendo permitido, ou seja, o trabalhador urbano não pode se utilizar de período rural para o preenchimento da carência para a aposentadoria por idade urbana." O acórdão recorrido está em conformidade com esse entendimento.

5. Incidência da Questão de Ordem nº 13 deste Colegiado (Não cabe Pedido de Uniformização, quando a jurisprudência da Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais se firmou no mesmo sentido do acórdão recorrido).

6. Pedido de uniformização não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Nacional de Uniformização não conhecer do incidente de uniformização, nos termos do voto e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

(Fortaleza, 14 de fevereiro de 2014. ANA BEATRIZ VIEIRA DA LUZ PALUMBO. Juíza Federal Relatora. PROCESSO: 5001411-58.2012.4.04.7102. ORIGEM: RS - SEÇÃO JUDICIÁRIA DO RIO GRANDE DO SUL. REQUERENTE: GETÚLIO BARROS SILVA

PROC./ADV.: DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. REQUERIDO(A): INSS. PROC./ADV.: PROCURADORIA-GERAL FEDERAL RELATOR(A): JUIZ(A) FEDERAL ANA BEATRIZ VIEI-RA DA LUZ PALUMBO).


CONCLUSÃO

Conclui-se, portanto, que a Lei n° 11.718/08, ao introduzir o §3º no artigo 48 da Lei 8.213/91, permitiu ao trabalhador rural o cômputo de contribuições vertidas para o regime urbano, para fins de aposentadoria rural, porém não permitiu que o trabalhador urbano se utilize de período rural para o preenchimento da carência para a aposentadoria por idade urbana.

Sendo assim, o segurado deve estar vinculado ao meio rural quando do preenchimento do requisito etário ou do requerimento do benefício.


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Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARBINATTO, Edelton. A aposentadoria por idade ao trabalhador rural prevista no artigo 48, §3º, da Lei 8.213/91 . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4106, 28 set. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/30443. Acesso em: 24 abr. 2024.