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A ingerência dos meios de comunicação na prisão preventiva

A ingerência dos meios de comunicação na prisão preventiva

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A mídia, sua influência na opinião pública e a consequência disso na atuação do Poder Judiciário

INTRODUÇÃO

A custódia cautelar, em suas diversas espécies (flagrante, preventiva e temporária – ressaltando-se que, neste trabalho, será dado enfoque à prisão preventiva), é assunto de grande relevância na atualidade. Isso porque a imposição da medida restritiva limita o direito de locomoção do constrito e causa reverberação direta nas garantias assecuratórias do princípio da dignidade da pessoa humana.

A delimitação dos parâmetros autorizadores da medida extrema de privação da liberdade é necessária, porquanto a Constituição Federal traz como um de seus objetivos a construção de uma sociedade livre e justa (art. 3º, inciso I).

Os requisitos que devem ser observados, antes de ser decretada a prisão, servem para limitar os poderes do Estado em face do cidadão e evitar arbitrariedades desmedidas ou a banalização do instituto.

Para conter as irregularidades que poderiam ser praticadas pelos agentes estatais contra os integrantes da sociedade, a Carta Maior impôs um rol de garantias individuais a serem observadas, dentre as quais é possível citar o princípio da presunção de inocência (art. 5º, inciso LVII), cuja meta é limitar o poder de punir do Estado, estabelecendo que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

Diante deste quadro, constata-se que a liberdade é a regra, sendo a restrição deste direito a exceção, que deve ser devidamente fundamentada nos pressupostos e nos requisitos previstos na lei.

O Código de Processo Penal é o responsável em ditar as circunstâncias legitimadoras da decretação da prisão cautelar.

No entanto, a amplitude e a generalidade dos elementos autorizadores da medida, bem como a ausência de regulamentação suficiente quanto ao prazo de sua duração, possibilitam ao intérprete extensa discricionariedade, fato que, infelizmente, acarreta a banalização da custódia, cujo emprego acaba sendo feito de maneira desarrazoada e não, conforme deveria ser, como a ultima ratio. 

Em que pese as alterações trazidas pela Lei n.º 12.403/11, que enumera diversas medidas cautelares alternativas à restrição de liberdade, o legislador silenciou a respeito de vários pontos relevantes sobre a custódia cautelar, os quais serão abordados neste trabalho.

Neste panorama, é necessário adentrar ao assunto de que a fragilidade do instituto em foco fica em evidência quando a mídia demonstra interesse por particular fato delituoso, passando a acompanhá-lo e a noticiá-lo.

Quando isto acontece, observa-se que a veiculação de informações relacionadas ao crime é distorcida, visando a manipulação das massas, para o atendimento de interesses midiáticos relativos à economia ou à política.

Esta difusão de notícias carregadas de sensacionalismo está longe de ser inofensiva e não só serve para que as empresas veiculadoras de informação garantam seus objetivos, mas traz também outros efeitos colaterais, como o pânico na população, consubstanciado na sensação generalizada de medo.

Não bastasse isso, as consequências das transmissões desvirtuadas atingem os membros do Poder Judiciário, da Polícia e do Ministério Público, na medida em que salta aos olhos a pressão exercida pela coletividade, atemorizada, para que seja efetivada imediatamente a constrição dos supostos agentes do delito.

O desenvolvimento do tema será efetuado em onze capítulos, nos quais serão expostos os aspectos relevantes e as críticas sobre o assunto, bem como serão analisados casos concretos e recentes, que causaram grande repercussão social e jurisprudencial.

Inicialmente, serão analisadas as características da prisão preventiva e os princípios relativos a ela, assim como a iniciativa para a decretação e os fundamentos autorizadores.

Após, serão avaliadas as possíveis soluções dadas pela jurisprudência e pela doutrina em face da ausência de leis regulamentadoras dos prazos máximos de duração da constrição cautelar.

Em seguida, será ressaltada a relevância da fundamentação, para que seja justificada a decretação da medida extrema de privação de liberdade.

Visto isto, será analisado o novo entendimento jurisprudencial que admite o recolhimento provisório do condenado após a decisão proferida em segunda instância, além do caso recente sobre a aplicação de prisão cautelar a Senador.

Por fim, nos capítulos restantes, será observada a influência da mídia sobre a opinião pública e a atuação dos aplicadores do Direito, contexto em que será abordado: o interesse dos meios de comunicação no instituto processual da colaboração premiada; as situações em que a publicidade distorce informações e é prejudicial à atuação do magistrado; e quando é aliada do Judiciário.

Esse trabalho tem por objetivo realizar uma análise crítica do instituto da prisão cautelar, o qual encontra-se desatualizado perante os ditames traçados pela Constituição Federal, bem como demonstrar os fatores responsáveis pela distorção das notícias publicadas pelos meios de comunicação, além de sua influência na formação da opinião pública e na decisão do juiz.


1 CARACTERÍSTICAS DA PRISÃO PREVENTIVA E PRINCÍPIOS AFETOS AO TEMA

1. 1 CARACTERÍSTICAS GERAIS DA PRISÃO CAUTELAR

A custódia preventiva, no ordenamento jurídico brasileiro, é exceção ao princípio da presunção de inocência, o qual se encontra estampado no art. 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, e cuja meta é limitar o poder de punir do Estado, estabelecendo, assim, a premissa de que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

Esta medida restritiva de liberdade convive muito bem com a norma citada, não havendo que se falar em sua inconstitucionalidade, diante do fato de que é constrição excepcional, apenas podendo ser aplicada quando estiverem preenchido os estritos requisitos previstos em lei: necessidade da decretação como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria (art. 312 do Código de Processo Penal).

Cite-se:

Deve-se ressalvar, todavia, a possibilidade de prisão preventiva processual, desde que fundamentada em algum dos pressupostos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal (garantia da ordem pública, garantia da ordem econômica, conveniência da instrução criminal e garantia da aplicação da lei penal). [...] Vale lembrar que as prisões cautelares (em flagrante, temporária e preventiva) continuam sendo admissíveis, desde que fundamentadas concretamente nos pressupostos previstos na legislação penal pertinente.[1]

O encarceramento provisório consiste em uma espécie de medida cautelar de caráter pessoal, que visa restringir a liberdade do acusado ou indiciado, à vista dos imprevistos que podem acontecer no decurso do processo, portanto, tem em vista assegurar o devido processo legal.

A prisão provisória não destoa da Constituição Federal, porquanto, conforme mencionado, traz como sua característica o fato de ser excepcionalíssima e tal propriedade é reforçada pelos princípios constitucionais da proporcionalidade e do citado devido processo legal, ambos pilares do Estado Democrático de Direito.

Ainda, a Magna Carta estabelece regras fundamentais, com o intuito de impedir a concretização de restrições ilegais ou arbitrárias ao direito à liberdade e qualquer restrição a este direito deve observar parâmetros de legalidade estrita.

Os direitos e garantias individuais não estão previstos apenas na Constituição da República, mas também nos Tratados Internacionais de Direitos Humanos dos quais o Brasil é signatário, além da legislação processual penal.

Neste contexto, é indispensável que o agente seja cientificado a respeito das causas de sua prisão, quando esta for determinada.

Segundo o disposto no inciso LXIII do art. 5º da Lei Maior, “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado”.

Na mesma linha, o art. 2º, § 6º, da Lei da prisão temporária, estabelece que, “efetuada a prisão, a autoridade policial informará o preso dos direitos previstos no art. 5º da Constituição Federal”.

Da mesma forma, o art. 289-A, § 4º, do Código de Processo Penal também prevê que “o preso será informado de seus direitos, nos termos do inciso LXIII do art. 5º da Constituição Federal” e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, será comunicado à Defensoria Pública.[2]

Conforme ensina a doutrina:

O direito à liberdade, de forma ampla e genérica, é afirmado no caput do art. 5º da CF de 1988. Trata-se da própria essência dos direitos fundamentais de primeira geração (por isso mesmo também denominados liberdades públicas). A ideia de liberdade de atuação do indivíduo perante o Estado traduz o cerne da ideologia liberal, de que resultaram as revoluções do final do século XVIII e início do XIX. A doutrina essencial do laissez faire exigia a redução da esfera de atuação do Estado e de sua ingerência nos negócios privados a um absolutamente necessário.[3]

Ademais, a custódia preventiva tem por escopo proteger bens e direitos que tenderiam ao aniquilamento, em razão da demora da prestação jurisdicional, garantindo, assim, a eficácia da sentença definitiva.

Neste sentido:

Está claro que entre a ação e a providência judicial, decorre um certo espaço de tempo, maior ou menor de acordo com o caso e a sua complexidade. Esse lapso temporal pode acarretar não só mudanças nas coisas e bens do processo, mas perecimento e deterioração (desvio, alienação), o que justifica as medidas cautelares. Há a necessidade de que a tutela pedida ao Estado seja idônea para tornar efetiva a sua realização. Daí a necessidade de um meio rápido e eficaz para assegurar a manutenção (de pessoas ou coisas) resguardadas desse fator temporal. Esta é a função do processo cautelar, latu sensu, e das medidas cautelares, in specie.[4]

Como visto, as providências de natureza cautelar, no processo penal, devem ser utilizadas com a máxima prudência pelo aplicador do Direito, principalmente quando dirigidas à restrição de liberdade, quando o uso do instituto somente se justifica em situações excepcionais, coibindo-se, assim, desnecessárias lesões à integridade física e psicológica do suposto infrator, bem como ao conceito que ele ostenta perante a sociedade.

1. 2 INICIATIVA PARA A DECRETAÇÃO

Conforme a redação do art. 311 do Código de Processo Penal, a medida excepcional pode ser decretada pelo juiz, de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público, ou do querelante, ou mediante representação da autoridade policial.

O juiz, segundo o Diploma Processual Penal, tem legitimidade para determinar a constrição de ofício apenas durante a ação penal, eis que, na fase investigatória, é imprescindível a provocação do representante do Ministério Público ou do titular da ação penal privada[5]

Nesta linha:

Assim, não deve o juiz cuidar de tutelar a investigação. Havendo necessidade de sua atuação, em face das cláusulas de reserva de jurisdição (exigência de ordem judicial para interceptação telefônica, para mandado de busca e apreensão domiciliar, mandado para a prisão, além de outras inviolabilidades pessoais previstas na Constituição da República), haverá ele que ser provocado pelos órgãos titulares da persecução, sendo-lhe vedada qualquer iniciativa nesse sentido.[6]

Neste ponto, é mister fazer observância à regulação da prisão preventiva, quando se tratar da aplicação da Lei Maria da Penha.

O referido Diploma Legal, em seu art. 20, dispõe que “em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, caberá a prisão preventiva do agressor, decretada pelo juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação da autoridade policial”.

Autoriza, ao arrepio do art. 311 mencionado no início do tópico, que, mesmo na fase investigatória da persecução penal, o magistrado decrete, de ofício, a segregação preventiva.

Como adequar ambos os dispositivos?

Há duas correntes doutrinárias.

Existem os que defendem que o art. 20 é plenamente válido, admitindo a custódia preventiva independentemente de provocação em qualquer das fases da persecução penal e, aplicando, para tanto, o princípio da especialidade.

De outra mão, há os que percebem que o dispositivo da Lei Maria da Penha é uma mera reprodução da antiga redação do art. 311 do Código de Processo Penal e, uma vez que a regra geral foi modificada, deve o art. 20 ser interpretado de acordo com o novo entendimento, inadmitindo a imposição da custódia cautelar pelo magistrado, de ofício, durante o inquérito policial.

Esclarecido isto, passe-se à análise dos elementos autorizadores da decretação da prisão preventiva.

1. 3 FUNDAMENTOS

Para legitimar a aplicação da prisão preventiva, necessária é a presença concomitante de dois pressupostos: fumus comissi delicti e periculum libertatis.

O primeiro é consubstanciado pela prova da materialidade e indícios suficientes de autoria ou de participação, o segundo trata da garantia da ordem pública, da ordem econômica, conveniência da instrução criminal ou garantia de aplicação da lei penal. Tudo isto pode ser extraído do art. 312 do Código de Processo Penal.

Cite-se: 

Será preciso restar demonstrado, de plano, a presença de indícios cabais quanto à efetiva existência do resultado danoso, ou seja, a materialidade, bem como a evidência de sua qualificação como delito, a exigir, portanto, um juízo prévio quanto à sua tipicidade. Havendo dúvidas quanto à existência de qualquer causa de justificação (excludentes da ilicitude), não se determinará a prisão (art. 314, CPP). Nesse caso, quando se tratar de prisão em flagrante, caberá a liberdade provisória (restituição da liberdade), com a exigência de comparecimento a todos os atos do processo (art. 310, parágrafo único, CPP). E não é só. Constatada a evidência do fato, de sua classificação como crime, restará ainda examinar-se a extensão do material informativo, no que toca à demonstração da autoria.[7]

Inicialmente, o requisito da garantia da ordem pública tem definição extremamente vaga e indeterminada. Assim, gera controvérsia na doutrina e na jurisprudência quanto ao seu significado.

Conforme ensina Renato Brasileiro de Lima, o conceito de “garantia da ordem pública” é enfrentado em três correntes doutrinárias.

Uma primeira afirma que a decretação da custódia com base neste argumento seria inconstitucional, em virtude de sua definição jurídica incerta; por outro lado, há os que entendem que o requisito é sinônimo de risco de reiteração delituosa; ao final, existem os que trazem como significado, além do risco de reiteração delituosa, as hipóteses de ocorrência de clamor social provocado pelo delito.[8]

Neste ponto e considerando o tema cerne do trabalho, imprescindível se faz deixar claro que o conceito de ordem pública, para a maioria da doutrina, não se identifica, em nenhuma hipótese, com o “clamor social” isoladamente considerado, conforme é possível extrair do trecho: 

Impossibilidade de decretação da preventiva com base no clamor social provocado pelo delito: também não será possível a decretação da prisão preventiva em virtude da repercussão da infração ou do clamor social provocado pelo crime, isoladamente considerados. Tais argumentos, de per si, não são justificativas para a tutela penal cautelar. Afirmações a respeito da gravidade do delito trazem aspectos já subsumidos ao próprio tipo penal, ou seja, aspectos como a gravidade em abstrato do delito, o clamor social provocado pelo delito, ou a necessidade de segregação cautelar do agente como forma de se acautelar o meio social devem permanecer alheios à avaliação dos pressupostos da prisão preventiva, mormente para garantia da ordem pública, pois desprovidos de propósito cautelar. Nessas hipóteses de clamor público e repercussão social do fato delituoso, não se vislumbra periculum libertatis, eis que a prisão preventiva não seria decretada em virtude da necessidade do processo, mas simplesmente em virtude da gravidade abstrata do delito, satisfazendo aos anseios da população e da mídia. Não custa lembrar: o poder judiciário está sujeito à lei e, sobretudo, ao direito, e não à opinião da maioria, facilmente manipulada pela mídia. A propósito, o Supremo Tribunal Federal já decidiu que não constituem fundamentos idôneos, por si sós, à prisão preventiva: a) o chamado clamor público provocado pelo fato atribuído ao réu, mormente quando confundido, como é frequente, com a sua repercussão nos veículos de comunicação de massa (...) Essa linha de pensamento, segundo a qual o clamor público, por si só, não autoriza a prisão preventiva, foi adotada pelo Supremo Tribunal Federal em caso de repercussão nacional, no qual o jornalista P.N. fora acusado de matar sua namorada, também jornalista (STF, 2ª Turma, HC 80.719/SP, Rel. Min. Celso de Melo, DJ 28/09/2001, p. 37). Nas palavras do Min. Celso de Mello, a prisão preventiva, que não deve ser confundida com a prisão penal, pois não objetiva infligir punição àquele que sofre a sua decretação, mas sim atuar em benefício da atividade estatal desenvolvida no processo penal, não pode ser decretada com base no estado de comoção social e de eventual indignação popular, isoladamente considerados. [9]               

Para reforçar esta explicação, destaca-se julgado do Superior Tribunal de Justiça:

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO (ART. 121, § 2º, I E IV, C/C O ART. 29, AMBOS DO CP). PROCESSUAL PENAL. PRISÃO PREVENTIVA.  EXCESSO DE PRAZO. NÃO OCORRÊNCIA. INSTRUÇÃO PROCESSUAL ENCERRADA.  APLICABILIDADE DA SÚMULA  52/STJ.  GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA.  AUSÊNCIA DE FUNDAMENTOS IDÔNEOS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. EXISTÊNCIA.

1. Encerrada a instrução criminal, fica superada a alegação de constrangimento por excesso de prazo (Súmula 52/STJ).

2.  A jurisprudência desta Corte já se firmou no sentido de que a gravidade abstrata do delito não autoriza a decretação ou a manutenção  da  prisão cautelar imposta e de que não constituem, por si  sós,  fundamentos  idôneos para autorizar a prisão preventiva, o clamor  ou  comoção  social,  se  inexistentes  nos  autos elementos concretos para justificar a decretação ou a manutenção da medida (HC n.   296.961/SP, Ministro   Felix   Fischer, Quinta Turma, DJe 1º/10/2014).

3.  O magistrado de primeiro grau, in casu, não indicou fatos concretos aptos a justificarem a manutenção da segregação cautelar da recorrente, estando  a decisão fundamentada apenas na gravidade abstrata do delito e na suposta comoção social.

4. Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.[10]

Assim, o texto e a ementa citados vão ao encontro do posicionamento adotado neste trabalho de que a prisão preventiva deve ser determinada pela autoridade judicial em casos excepcionais e devidamente fundamentada (em consonância com o disposto no art. 315 do Código de Processo Penal), com observância dos requisitos legais e não com base em pressão popular.

Assemelhando-se muito ao conceito de ordem pública, há também a definição de ordem econômica, que admite a constrição do suposto agente acaso haja risco de reiteração criminosa relativa a infrações penais que causem perturbação ao livre exercício de qualquer atividade econômica, com abuso do poder, no intuito de dominar os mercados e eliminar a concorrência, com o consequente aumento arbitrário da lucratividade.[11]

Quanto à necessidade da custódia justificada pela conveniência da instrução criminal, é preciso salientar que não se trata de juízo de mera “conveniência”, mas sim “imprescindibilidade”.

Isso porque toda prisão deve ser devidamente fundamentada, porquanto, conforme exaustivamente explicitado, trata-se de medida excepcionalíssima, cuja necessidade precisa ser demonstrada.[12]

Ainda, quando a lei autoriza a restrição de liberdade para assegurar a aplicação da lei penal, sua finalidade é impedir a fuga do investigado ou acusado, quando este risco estiver presente concreta e efetivamente.[13]

Não bastassem esses requisitos, o art. 313 do Código de Processo Penal ainda delimita outros itens, que devem ser observados antes da determinação da custódia preventiva pela autoridade.

É necessário que: a) o delito apurado na ação penal ou no inquérito seja doloso, punido com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos; b) seja o suposto agente reincidente em crime doloso em sentença transitada em julgado, salvo se menor de 21 anos na data do fato ou maior de 70 anos na data da sentença; c) se o delito for relativo a violência doméstica e familiar contra a mulher, criança adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência; ou d) em caso de dúvida sobre a identidade civil do suposto infrator ou quando este não indicar elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o constrito ser liberado imediatamente após sua identificação, exceto se outras hipóteses recomendarem a manutenção da situação de privação de liberdade.

Por fim, o magistrado também precisa se atentar para o fato de que não poderá decretar a custódia se verificar que o agente agiu impelido por alguma das causas excludentes de ilicitude.


2 A INEXISTÊNCIA DE PRAZOS LEGAIS CLAROS E OBJETIVOS PARA A IMPOSIÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA 

A restrição da liberdade, mesmo que de forma cautelar, causa repercussão em vários direitos do suposto agente delituoso e também à sua vida no meio da sociedade, não afetando apenas a sua liberdade.

Além de afligir sua qualidade de vida, sua dignidade humana e o conceito que ostenta perante o meio social em que se encontra inserido, também traz repercussões negativas à sua integridade física e intelectual, eis que não apenas é privado de seu direito de ir e vir, mas também é enclausurado no ambiente extremamente hostil, como é notório, representado pelas penitenciárias brasileiras.

Neste contexto, é preciso observar as garantias a que faz jus este cidadão até então inocente, porque ainda não condenado, tendo em vista que o ordenamento jurídico pátrio é embasado no princípio da presunção de inocência.

Dentre os pontos que devem ser observados para a garantia da dignidade da pessoa humana do, em tese, infrator, está a duração desta medida excepcional de privação de liberdade de locomoção.

É preciso, de um lado, considerar os fundamentos autorizadores da prisão cautelar e, de outro, levar em conta as garantias estabelecidas pela Constituição Federal, a qual impõe limites ao Estado, com o fim de evitar arbitrariedades e injustiças que podem ser perpetradas por quem detém o poder jurídico neste país.

A Carta Maior protege seus cidadãos, ainda considerados inocentes, pois ainda investigados, de sofrimento desproporcional, impedindo que fiquem esquecidos pelos entes estatais dentro dos estabelecimentos carcerários brasileiros até que sejam definitivamente julgados.

Para tanto, a custódia é admitida pela Lei Superior em face da ponderação entre os princípios garantidores dos direitos dos cidadãos ligados à sua liberdade e dignidade em face das necessidades sociais de controle e de apuração das infrações, para que seja estabelecida o máximo de ordem possível.

Como é amplamente sabido, no entanto, a “justiça é lenta”, o processo demora para se desenrolar e chegar ao seu termo final e o acusado permanece encarcerado tendo seus direitos violados.

Até que ponto isso não torna a prisão cautelar uma medida inconstitucional, por violar os direitos do suposto infrator?

Para evitar a inconstitucionalidade da custódia, portanto, surgem as diversas formas de controlar, também, a atuação estatal, com a finalidade de limitar o lapso temporal que o imputado poderia permanecer constrito durante a persecução penal, seja na fase de inquérito, seja na fase processual.

E é neste ponto que se admite a concessão da ordem de habeas corpus, com a finalidade de relaxar a prisão ilegal, em razão do excesso de prazo para a formação da culpa do suposto agente delituoso.

O problema é que o Código de Processo Penal não traz o prazo máximo que o constrito pode permanecer com seu direito à liberdade maculado.

Isso acarreta grave insegurança jurídica, eis que o suposto autor do injusto e sua defesa desconhecem previamente o tempo de duração do cárcere provisório.

Este lapso temporal, portanto, está diretamente atrelado a critérios subjetivos do julgador.

 Dispõe Delmanto Junior que a ausência de prazo “abre espaço para interpretações elásticas e discricionárias, não conciliáveis com o dever estatal de prestação jurisdicional certa e segura”.[14]

O mesmo autor continua sua exposição afirmando que “o ideal seria que a lei ordinária estipulasse prazos claros e peremptórios de duração da prisão cautelar, que abrangessem toda a instrução e o julgamento, com limitadas e objetivas hipóteses de dilação, restringindo-se a arbitrariedade judicial”[15].

É inadmissível, em um Estado Democrático de Direito, regido pelo princípio da reserva legal e da presunção da inocência, a aceitação de prazos decorrentes do arbítrio do magistrado, os quais tendem a variar de acordo com a sua conveniência caso a caso.

Vale analisar o ordenamento jurídico de alguns países europeus, nos quais, preocupada em proteger a sociedade contra a discricionariedade do juiz, a legislação prevê os prazos máximos da custódia preventiva, além de exigir revisões periódicas dos fatos que a determinaram, evitando possíveis excessos na sua utilização.

A Espanha considera a pena em abstrato para estabelecer o prazo máximo da medida cautelar, podendo durar até um ano, se a reprimenda atribuída ao crime não ultrapassar três anos, e até dois anos, se ultrapassar, prorrogada até seis meses, no primeiro caso, e dois anos, no segundo.

Na Alemanha, determina-se que a prisão provisória não exceda a seis meses, salvo se a complexidade do caso justificar prazo maior.

Em Portugal, da mesma forma, os fundamentos que ensejaram a restrição devem ser revisados a cada três meses, além de não ser admissível a permanência do imputado em cárcere se em até dois anos não houver ocorrido o trânsito em julgado, salvo, também, se a gravidade do crime autorizar a continuidade da medida excepcional.[16]  

  A omissão do legislador brasileiro sobre essa importante matéria ofende princípios constitucionais, porquanto desrespeita o acusado, propiciando encarceramentos provisórios infinitos.

Ademais, acarreta o esquecimento de muitos cidadãos em nossas penitenciárias, ocasionando excessivo sofrimento ao sujeito, que, segundo a Magna Carta, é considerado inocente até prova em contrário.

Segundo notícia divulgada pelo site da Folha de São Paulo em 26 de julho de 2009, o Conselho Nacional de Justiça teria descoberto o que considerava ser, à época, um dos casos mais graves da história do Judiciário no país: o lavrador V. R. A., com 42 anos, teria passado quase 11 (onze) anos preso no Espírito Santo sem nunca ter sido julgado. Acusado de ter praticado um homicídio em 1998, V. R. A. teria passado por quatro presídios e não teve direito de sair da prisão nem mesmo para o enterro da mãe, em 2007. O lamentável caso confirma um dos maiores problemas da prisão preventiva no ordenamento pátrio: sua indeterminação temporal. Impera, no processo penal comum brasileiro, absoluta indeterminação acerca do prazo de duração da prisão preventiva, que passa a assumir contornos de verdadeira pena antecipada. Isso porque, ao contrário da prisão temporária, que possui prazo prefixado, o Código de Processo Penal não prevê o prazo determinado para a duração da prisão preventiva. Assim, a prisão preventiva, cuja natureza cautelar deveria revelar a característica da provisoriedade, acaba por assumir caráter de verdadeira prisão definitiva.[17]

Como já ventilado neste trabalho, a prestação jurisdicional em nosso país é extremamente morosa, em razão da alta quantidade de processos aglomerados dia após dia nas prateleiras de nossos tribunais, juntamente com a falta de estrutura do Poder Judiciário para analisá-los de forma célere.

O aparelhamento estatal em estado deficitário, conforme se apresenta no Brasil, traz prejuízos, pois deixa a desejar quando se trata de investigação e julgamento das condutas delituosas.

Não podemos transferir ao réu o encargo de suportar tal carência, que é de responsabilidade do Estado.

Para mudar essa triste realidade, na qual o arbítrio da autoridade jurisdicional impera, deve o legislador determinar os prazos máximos para o encarceramento provisório, pois, apesar de todas as garantias constitucionais existentes, é o preceito legal que impõe, com eficiência, os limites aos poderes estatais de interferência nos direitos individuais dos cidadãos.

Conforme vem ocorrendo com frequência neste país (não apenas no referente ao prazo de duração da prisão preventiva), o legislador tem sido omisso em sua atividade típica em diversas áreas.

E, como ao juiz não é dado se desincumbir de sua função de julgar nem mesmo quando ausente norma para o caso concreto, coube aos magistrados o empenho na busca de uma resposta para esta lacuna legislativa.

Assim, na desesperada tentativa de uniformizar a jurisprudência, os tribunais têm criado parâmetros em seus julgados, para definir o lapso temporal máximo aceito para a duração da constrição provisória de liberdade.

Respondendo a isso, a doutrina também trouxe suas delimitações quanto ao prazo para a prisão cautelar:

Com o novo procedimento comum ordinário (Lei n.º 11.719/08), aplicável quando o crime tiver sanção máxima igual ou superior a 4 (quatro) anos de pena privativa de liberdade (CPP, art. 394, § 1º, inciso I), a contagem do prazo para o encerramento do processo criminal quando o acusado estiver preso foi sensivelmente alterada, podendo variar entre 95 (noventa e cinco) e 190 (cento e noventa) dias. É bom esclarecer que, de modo semelhante ao que se dava com a construção pretoriana da contagem do prazo de 81 (oitenta e um) dias, não levamos em consideração as prazos relativos à movimentação cartorária. [...] Quanto à 1ª fase do procedimento do Tribunal do Júri (judicium accusationis), o prazo pode variar entre 100 (cem) e 120 (cento e vinte) dias, na Justiça Estadual e Federal, respectivamente. [...]Quanto à 2ª fase do procedimento do júri (judicium causae), diante da ausência de prazo expresso em lei para o julgamento em plenário do acusado já pronunciado, pode-se estabelecer uma presunção relativa de excesso de prazo caso o julgamento não seja realizado no prazo de 6 (seis) meses contado do trânsito em julgado da decisão de pronúncia, aplicando-se aí o prazo previsto para o desaforamento (CPP, art. 428, caput, com redação determinada pela Lei n.º 11.689/08).[18]

Diante disso, na tentativa de atender aos princípios constitucionais, a doutrina e a jurisprudência se esforçam ao máximo no sentido de determinar os paradigmas a serem seguidos no referente aos lapsos temporais máximos a que está sujeita a custódia cautelar preventiva.

Contudo, a força representada pela jurisprudência e pela doutrina não é a mesma que a da lei.

Os instrumentos voltados a assegurar a uniformização jurisprudencial, neste país, ainda engatinham, motivo pelo qual os lapsos temporais máximos estabelecidos pela doutrina e pelos tribunais são frequentemente relativizados, sob o fundamento da complexidade do caso ou da quantidade de réus, o que, inevitavelmente, sujeita o encarcerado à discricionariedade do julgador e acaba por acarretar insegurança jurídica.

Neste sentido:

PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. FURTO QUALIFICADO. FALSA IDENTIDADE. CORRUPÇÃO ATIVA. ALEGAÇÃO DE EXCESSO DE PRAZO. IMPROCEDÊNCIA. FEITO COMPLEXO. PLURALIDADE DE RÉUS. DIVERSAS CARTAS PRECATÓRIAS EXPEDIDAS. DIVERSOS PLEITOS DE REVOGAÇÃO DA PRISÃO ANALISADOS. NECESSIDADE DE LAUDOS TÉCNICOS. VÁRIOS E COMPLEXOS APARELHOS ELETRÔNICOS. RECURSO DESPROVIDO.

I - A prisão cautelar deve ser considerada exceção, já que, por meio desta medida, priva-se o réu de seu jus libertatis antes da execução (provisória ou definitiva) da pena. É por isso que tal medida constritiva só se justifica caso demonstrada sua real indispensabilidade para assegurar a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal, ex vi do artigo 312 do Código de Processo Penal (precedentes).

II - O prazo para a conclusão da instrução criminal não tem as características de fatalidade e de improrrogabilidade, fazendo-se imprescindível raciocinar com o juízo de razoabilidade para definir o excesso de prazo, não se ponderando a mera soma aritmética dos prazos para os atos processuais (precedentes).

III - In casu, malgrado o atraso na instrução criminal, ele se justifica, tendo em vista a complexidade do feito, com a persecução penal de 4 réus, tendo sido expedidas diversas cartas precatórias e apreciados 3 pedidos de revogação da prisão, além da necessidade de se realizar perícia em diversos e complexos aparelhos eletrônicos apreendidos na posse do ora recorrente, provavelmente utilizados para o cometimento de ilícitos penais, razão pela qual não se vislumbra, por ora, configurado constrangimento ilegal suscetível de concessão de writ.

Recurso ordinário desprovido.[19]

Portanto, ante a inexistência em lei de prazos certos e peremptórios de duração da constrição preventiva, impera a subjetividade do julgador na análise do caso concreto, o que causa grande insegurança jurídica aos jurisdicionados.


3 A NECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES QUE DETERMINAM A CUSTÓDIA PREVENTIVA, A SUA REVOGAÇÃO, BEM COMO A SUA REDECRETAÇÃO

Com o advento da Constituição da República de 1988, o princípio da motivação das decisões judiciais obteve status de dogma jurídico.

O art. 93, inciso IX, do citado Diploma, é claro ao dispor que “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade”.  

Seguindo os parâmetros constitucionais, o art. 315 do Código de Processo Penal prevê que “A decisão que decretar, substituir ou denegar a prisão preventiva será sempre motivada”. 

Em respeito a ambos os dispositivos mencionados, deve a autoridade responsável pela prisão do suposto autor do injusto fundamentar concretamente todas as decisões relativas à custódia, sejam elas de decretação ou mesmo de revogação.

A título de explicação, cite-se ementa de julgado prolatado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, que muito bem sintetiza o assunto:

AÇÃO DE HABEAS CORPUS - TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS - PRISÃO PREVENTIVA - AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA [...] CONSTRANGIMENTO ILEGAL CARACTERIZADO - ORDEM CONCEDIDA.A segregação cautelar, exceção no sistema penal brasileiro, deve ser fundamentada em dados concretos, que demonstrem a real necessidade da privação da liberdade. Ausente a devida motivação, resta evidente o constrangimento ilegal a ser reparado pela via do habeas corpus. [...] Ordem concedida, confirmando a liminar anteriormente deferida.[20]

Isso porque somente pela demonstração da existência dos elementos autorizadores da constrição é que será possível aferir a lisura da intenção do julgador, para saber se o mesmo está agindo com excesso de poder ou nos limites da norma.[21]

Ao se exigir a exposição, por parte do magistrado, dos motivos que o impeliram a tomar determinada decisão, é possível ter um certo controle sobre seus poderes, para que eventuais abusos possam ser coibidos, mesmo que, para isso, seja necessário o uso da ação de habeas corpus ou de algum dos recursos cabíveis no ordenamento. [22]  

Caracteriza constrangimento ilegal a decretação da custódia cautelar com base em meras conjecturas ou abstrações.

Especificamente, não pode a autoridade responsável pelo recolhimento ao cárcere mencionar genericamente a existência de um dos requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal (quais sejam: garantia da ordem pública ou econômica, conveniência da instrução criminal e aplicação da lei penal) sem explicar qual a situação concreta que faz o fato se subsumir a uma ou algumas das circunstâncias autorizadoras da medida excepcional.

Expõe Renato Brasileiro de Lima:

Logo, não há espaço para decisões que se limitem à mera explicitação textual dos requisitos previstos pelo art. 312 do CPP: “...Decreto a prisão preventiva com fundamento na garantia da ordem pública”. Afinal, a tarefa de interpretação constitucional para a análise da excepcional situação jurídica de constrição da liberdade dos cidadãos exige que a alusão a esses aspectos estejam lastreados em elementos concretos.[23]

Diante disso, vislumbra-se certa discricionariedade nos limites estabelecidos pela legislação, quando se trata da imposição da privação de liberdade preventiva, porém, a autoridade é obrigada a fazer uso dos fundamentos adequados a correlacionar as circunstâncias fáticas e a lei.

Ademais, cumpre salientar que, uma vez desaparecidos os motivos que levaram à determinação da medida, esta deve ser revogada:

A prisão preventiva, como medida cautelar, irá flutuar ao sabor da presença ou ausência dos elementos que autorizariam a decretação. É movida pela cláusula rebus sic stantibus, assim, se a situação das coisas se alterar, revelando que a medida não é mais necessária, a revogação é obrigatória. Deve o magistrado revogar a medida, de ofício, ou por provocação, sendo historicamente desnecessária a prévia oitiva do Ministério Público, que era apenas intimado da decisão judicial, para se desejasse, apresentar o recurso cabível à espécie. Agora, entretanto, o contraditório prévio deve ser respeitado, ressalvada a urgência, normalmente ínsita a situação prisional (art. 282, § 3º, CPP). Uma vez presentes novamente os permissivos legais, nada obsta a que o juiz a decrete novamente, quantas vezes se fizerem necessárias (art. 316, c/c o § 5º, do art. 282, CPP).[24]

Portanto, a prisão preventiva necessita ser fundamenta em dados concretos, sendo legítima apenas enquanto presentes os motivos que a ensejaram.

Por fim, imprescindível não se olvidar do fato de que, recentemente, os tribunais superiores vêm admitindo a fundamentação per relationem nas decisões judiciais e não poderia ser diferente com o decreto preventivo ou com o decisum revogatório da medida extrema.

Trata-se de motivação na qual a autoridade judiciária adota como suas as razões expostas na representação da autoridade policial, no requerimento do representante do Ministério Público, do querelante ou do assistente.

Em que pese as discussões doutrinárias a respeito da admissibilidade da aplicação desta técnica de fundamentação, os tribunais têm admitido:

Nesse contexto, entendeu a 1ª Turma do Supremo que, muito embora o sucinto decreto de prisão preventiva tivesse adotado como fundamentação o requerimento do Ministério Público, sem, entretanto, transcrevê-lo, a constrição cautelar teria sido baseada em fatos concretos, portanto, em conformidade com o disposto no art. 312 do CPP. (STF, 1ª Turma, HC 102.864/SP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 03/08/2010, DJe 173 16/09/2010).[25]

Apenas é preciso atenção ao detalhe de que, para o Superior Tribunal de Justiça, o acórdão que se limita a ratificar a sentença e a adotar o parecer ministerial é nulo, quando sequer os transcreve:

DIREITO PROCESSUAL PENAL. LIMITES À FUNDAMENTAÇÃO PER RELATIONEM. É nulo o acórdão que se limita a ratificar a sentença e a adotar o parecer ministerial, sem sequer transcrevê-los, deixando de afastar as teses defensivas ou de apresentar fundamento próprio. Isso porque, nessa hipótese, está caracterizada a nulidade absoluta do acórdão por falta de fundamentação. De fato, a jurisprudência tem admitido a chamada fundamentação per relationem, mas desde que o julgado faça referência concreta às peças que pretende encampar, transcrevendo delas partes que julgar interessantes para legitimar o raciocínio lógico que embasa a conclusão a que se quer chegar. Precedentes citados: HC 220.562-SP, Sexta Turma, DJe 25/2/2013; e HC 189.229-SP, Quinta Turma, DJe 17/12/2012.[26]

No entanto, não é esta mudança de entendimento jurisprudencial que tem causado mais repercussões entre a população e os estudiosos do Direito, mas sim a que será vista em tópico a seguir.


4 NOVO ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL SOBRE O RECOLHIMENTO À PRISÃO ANTES DO TRÂNSITO EM JULGADO

O Poder Legislativo tem deixado a desejar quando se trata de alguns aspectos relacionados à sua atividade típica, o que causa lacunas no sistema de aplicação das normas, além do fenômeno da “lei vaga”, que não estabelece de forma clara as suas finalidades, restando grande liberdade ao intérprete e permitindo, mesmo que de forma indireta (ante a “impotência legislativa” de alcançar especificamente alguns casos concretos), a ocorrência de condutas manifestamente ilícitas.

Na omissão do Legislativo, o Supremo Tribunal Federal se elastece na maior medida possível nos limites de sua competência, modificando entendimentos jurisprudenciais anteriormente consolidados, na tentativa desesperada de frear as práticas descaradamente ilegais que vêm estampando os jornais deste país: corrupção sistêmica e recursos manifestamente protelatórios.

Este é o assunto que será tratado ao longo deste e do próximo Capítulo.

Conforme já exaustivamente exposto neste trabalho, a Constituição Federal estabelece que ninguém será considerado culpado antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

O dispositivo é claro e de seu texto extrai-se que é imprescindível a ocorrência do trânsito em julgado da reprimenda imposta ao agente delituoso, para se concluir, assim, pela sua culpa.

Sabe-se que o acusado, para apelar, não precisa estar recolhido ao cárcere, no entanto, presentes os fundamentos demonstrativos da necessidade da custódia, deve a preventiva ser decretada ou mantida até a decisão final irrecorrível, quando, então, será absolvido ou condenado.

Contudo, em um julgado sobremaneira relevante e com o intuito de evitar a interposição dos recursos meramente protelatórios, o Supremo Tribunal Federal inovou em seu entendimento.

Estabeleceu que um réu já condenado em segunda instância deve ser recolhido à prisão antes de transitar em julgado a sentença penal condenatória.

O fundamento utilizado pela Suprema Corte foi no sentido de que o recurso especial (perante o Superior Tribunal de Justiça) e o recurso extraordinário (perante o Supremo Tribunal Federal) não possuem efeito suspensivo e a interposição deles, portanto, não tem o poder de assegurar ao réu o direito de permanecer em liberdade até que ocorra o trânsito em julgado da sentença.

Nesta decisão inovadora (STF. Plenário. HC 126292/SP, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 17/02/2016), que causou enorme repercussão, não só para os estudiosos e aplicadores do Direito, mas também na sociedade como um todo, o Ministro Teori Zavascki defendeu que, até a prolação do acórdão condenatório em 2º grau, deve-se presumir ser o réu inocente.

No entanto, depois deste momento processual, o postulado da não culpabilidade resta exaurido, eis que as medidas recursais aplicáveis à decisão de segunda instância (direcionados ao Superior Tribunal de Justiça ou ao Supremo Tribunal Federal) não se prestam à discussão dos fatos e das provas, mas somente da matéria de direito.

Para o mencionado Relator, no curso de todo o processo criminal, já foram observados os direitos e as garantias inerentes ao réu, além de respeitadas as regras probatórias para sua defesa.

Ao final, salientou, também, que, em nenhum país, além do Brasil, depois de observado o duplo grau de jurisdição, a execução de uma sanção é suspensa ao aguardo da confirmação da Suprema Corte.

Por outro lado, em Artigo denominado ‘A volta da "execução provisória" da pena’, o Procurador Federal Adel El Tasse demonstra descontentamento perante este novo entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal.[27]

Afirma, em síntese, que a Constituição da República, em seu texto, é clara ao exigir o trânsito em julgado da condenação, para o recolhimento à prisão, e não admite “ginásticas interpretativas”.

Acrescenta, ainda, que o sistema jurídico brasileiro não pode ser comparado ao de outros países levando em consideração apenas uma questão pontual (prisão condenatória antes do esgotamento dos recursos).

E isso, segundo o Procurador, não se dá em razão da inferioridade de nosso ordenamento em face dos outros, mas sim porque a análise deve ser feita com a observância do conjunto que forma o sistema de cada um.

Neste contexto, defende que o Brasil, ao contrário do que ocorre nos Estados Unidos e na Alemanha, não possui todos os elementos necessários em seu ordenamento jurídico para que possa suportar o início do cumprimento da reprimenda quando ainda forem cabíveis medidas recursais.

Como exemplo do perigo que este precedente jurisprudencial poderá acarretar, o autor cita diversos casos em que a Corte Suprema, em reforma a decisões condenatórias proferidas em segunda instância, absolveu condenados por furto de abóboras, melancias, chocolates etc., sob o fundamento do princípio da insignificância.

Por fim, uma solução apresentada pelo Procurador, para possíveis problemas que este novo entendimento acarretará, é a admissibilidade da impetração de habeas corpus, mesmo quando cabível recurso específico (writ substitutivo, o qual, segundo o autor, foi retirado do ordenamento pelos tribunais superiores) eis que, por meio do remédio constitucional, seria possível a concessão do pleito liminar de suspensão da pena, para salvaguardar direitos dos cidadãos assegurados pela Magna Carta.

Neste ponto, é preciso destacar aparente lapso em que incorreu o texto, ante a possibilidade de concessão de habeas corpus substitutivo, quando restar caracterizada flagrante ilegalidade.

Abaixo, a título de ilustração, segue o posicionamento que vem sendo adotado pelas Cortes Superiores:

[...] A Terceira Seção desta Corte, seguindo entendimento firmado pela Primeira Turma do col. Pretório Excelso, firmou orientação no sentido de não admitir a impetração de habeas corpus em substituição ao recurso adequado, situação que implica o não conhecimento da impetração, ressalvados casos excepcionais em que, configurada flagrante ilegalidade apta a gerar constrangimento ilegal, seja recomendável a concessão da ordem de ofício. [...][28]

Diante do julgado destacado, é possível concluir que, atualmente, o condenado em segunda instância, no Brasil, já pode ser recolhido ao cárcere, podendo, contudo, se beneficiar da concessão da ordem de habeas corpus, quando ficar evidente que sofre de flagrante ilegalidade.


5 CASO RECENTE SOBRE A APLICAÇÃO DE PRISÃO CAUTELAR A SENADOR

No dia 25 de novembro de 2015, o Supremo Tribunal Federal decretou a prisão do Senador Delcídio do Amaral.

Para contextualizar, imprescindível é a descrição da conduta imputada ao Parlamentar:

O Senador, em conjunto com os demais investigados, estariam tentando convencer o ex-diretor Internacional da Petrobras, Nestor Cerveró (um dos réus na Lava Jato), a não assinar acordo de colaboração premiada com o Ministério Público Federal. Isso porque Cerveró iria delatar crimes que teriam sido praticados por Delcídio e Esteves.

Em troca de seu silêncio, o Senador e o banqueiro teriam oferecido o pagamento de uma quantia mensal em dinheiro à família de Cerveró. Além disso, o Senador teria também prometido fazer lobby junto aos Ministros do STF para que estes concedessem liberdade a Cerveró e, em seguida, com o réu solto, o parlamentar iria facilitar a fuga do ex-diretor da Petrobras para a Espanha, país do qual também tem cidadania. Foram realizadas pelo menos quatro reuniões para tratar sobre a proposta e o plano de fuga. Nestas reuniões, participavam, além do Senador, o assessor parlamentar, o advogado de Nestor Cerveró e seu filho (Bernardo Cerveró). Ocorre que Nestor Cerveró já estava decidido a fazer o acordo de colaboração premiada e não confiava na proposta do Senador. Por isso, seu filho (Bernardo Cerveró) gravou as conversas e as propostas que foram feitas e as entregou ao Ministério Público. Bernardo entregou também vídeos, conversas trocadas por e-mail e por whatsapp.[29]

O art. 53, § 2º, da Constituição Federal prevê que “desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável”.

O mesmo dispositivo ainda acrescenta: “Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão”.

Pela literalidade do texto citado, um Senador somente poderá ser preso, antes da condenação definitiva em caso de flagrante de crime inafiançável.

Isso se dá em razão da imunidade formal que possui o parlamentar em relação à sua prisão.

Conforme bem explicam os doutrinadores Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino:

Por força dessa imunidade formal, desde a diplomação, o parlamentar não poderá mais ser vítima de qualquer tipo de prisão penal ou processual – prisão temporária, prisão em flagrante, por crime afiançável, prisão preventiva, prisão por pronúncia ou prisão por sentença condenatória recorrível –, tampouco de prisão civil por dívida nas hipóteses admitidas pelo art. 5º, inciso LXVII, da Constituição – inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e depositário infiel. [...] Alertamos que essa impossibilidade de prisão do parlamentar o protege não só em relação aos crimes praticados após a diplomação, mas, também, em relação aos crimes praticados em data anterior a esta. Assim, se, em data anterior à diplomação, o indivíduo havia cometido certo crime e estava respondendo por ele perante a justiça comum, com possibilidade de ser preso, com a expedição de sua diplomação a prisão não poderá mais ser determinada pelo Poder Judiciário, em respeito ao art. 53, § 2º, da Constituição.[30]

Conforme visto, por ocasião da imunidade formal, desde a ocorrência da diplomação, o Deputado ou Senador não poderá mais sofrer qualquer tipo de restrição à sua liberdade de locomoção, seja ela de natureza penal ou processual (segregação temporária, recolhimento em flagrante, por crime afiançável, prisão preventiva, custódia por pronúncia ou por sentença condenatória recorrível), nem mesmo prisão civil por dívida, nas situações em que o art. 5º, inciso LXVII, da Constituição Federal (inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia) autoriza.

Isso leva à conclusão de que o parlamentar não poderia, apenas com base na lei, ser preso preventivamente.

Ainda de acordo com os mesmos autores:

A única situação em que se admite a prisão do parlamentar é a de flagrante de crime inafiançável. Mas, mesmo nesse caso, a manutenção da sua prisão dependerá de autorização da Casa Legislativa, e não da vontade do Poder Judiciário. Com efeito, determina a Constituição que, no caso de prisão em flagrante por crime inafiançável, os autos deverão ser remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão. A manutenção da prisão dependerá, então, de formação de culpa pela Casa Legislativa, pelo voto ostensivo e nominal da maioria de seus membros (maioria absoluta). Se a Casa Legislativa não autorizar a formação de culpa, o parlamentar será posto em liberdade, independentemente da gravidade de sua conduta criminosa.[31]

Do trecho citado, é possível considerar que a única situação em que se admite a restrição de liberdade de parlamentar é a de flagrante de crime inafiançável. E, mesmo neste caso, a manutenção de sua restrição de liberdade ficará condicionada à autorização da Casa Legislativa, e não à vontade do Poder Judiciário.

Por isso, segundo a Constituição, no caso de prisão em flagrante por crime inafiançável, os autos deverão ser remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão.

A manutenção da medida dependerá, então, de formação de culpa pela Casa Legislativa, pelo voto da maioria absoluta de seus membros. Se a Casa Legislativa não autorizar a formação de culpa, o parlamentar será posto em liberdade, independentemente da gravidade de sua conduta criminosa

Prerrogativas conferidas pela Carta Magna, as imunidades parlamentares servem para que os beneficiários Deputados e Senadores exerçam o mandato com liberdade e independência.

Na situação em análise, segundo o Ministério Público, o Senador Delcídio do Amaral e as demais pessoas investigadas teriam praticado, em tese, dois crimes: a) integrar organização criminosa (conduta descrita no art. 2º, caput, da Lei n.º 12.850/2013); e b) embaraçar investigação envolvendo organização criminosa (injusto tipificado no art. 2º, § 1º, da Lei n.º 12.850/2013).

O Supremo Tribunal Federal entendeu que estes delitos configuram crimes permanentes e, portanto, estava o Senador em situação de flagrância.

A doutrina confirma o estado de permanência, na medida em que até o momento da constrição estava o parlamentar integrando organização criminosa: “Infração permanente, a sua consumação se protrai enquanto não cessada a permanência. Isso significa que o agente pode ser preso em flagrante delito enquanto não desfeita (ou abandonar) a associação (art. 303 do CPP)”.[32]

Contudo, para o fim de determinar a prisão em flagrante, ainda era necessário serem estes injustos inafiançáveis, conforme limita a Constituição Federal no artigo mencionado no início deste item.

Por isso, a Corte Suprema declarou que, por estarem presentes elementos que autorizariam a constrição preventiva, não seria possível a concessão de fiança, caracterizando caso de conduta típica inafiançável, portanto.

Baseou-se o Tribunal no art. 324 do Código de Processo Penal, em seu inciso IV, o qual declara que “Não será igualmente concedida a fiança [...] IV – quando presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva (art. 312)”.

Portanto, este inciso estabelece que, mesmo o delito não estando previsto no rol de crimes absolutamente inafiançáveis (racismo, tortura, tráfico ilícito de drogas, terrorismo, crimes hediondos, crimes cometidos por ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático), não poderá receber fiança por circunstâncias concretas verificadas no curso do processo, as quais preenchem os requisitos autorizadores da decretação de prisão preventiva.

Mas, como é sabido, o art. 310 do Código de Processo Penal deixa claro que a prisão em flagrante não pode subsistir por muito tempo, devendo o juiz, observados os termos do dispositivo citado, determinar a liberdade provisória, a segregação preventiva, ou relaxamento da prisão em flagrante.  

Diante disso, em não sendo caso de soltura do suposto agente, deve a restrição ser convertida em preventiva, desde que, conforme já exposto, estejam presentes os requisitos autorizadores da medida excepcional.

Assim, o Procurador Geral da República representou, na hipótese, pela custódia preventiva, com fundamento no art. 312 do Diploma Processual Penal.

O argumento utilizado foi o de que o art. 53, § 2º, da Constituição da República não poderia ser tomado como absoluto.

A respeito da possibilidade de decretação da prisão preventiva de parlamentar surgiram duas correntes:

1ª) SIM. Para Rogério Sanches e Marcelo Novelino, o STF teria autorizado a prisão preventiva do Senador, relativizando o art. 53, § 2º, da CF/88. 2ª) NÃO. Não é possível a prisão preventiva de Deputado Estadual, Deputado Federal ou Senador porque a única prisão cautelar que o art. 53, § 2º da CF/88 admite é a prisão em flagrante de crime inafiançável. O Ministro Teori Zavascki não decretou a prisão preventiva do Senador Delcídio do Amaral. Digo isso não apenas com base na argumentação por ele utilizada, mas também pela forma como escreveu o comando da decisão. Vejamos: […]"Ante o exposto, presentes situação de flagrância e os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal, decreto a prisão cautelar do Senador Delcídio do Amaral, observadas as especificações apontadas e ad referendum  da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal."[33]

Portanto, embora a existência de discussões doutrinárias, o que não pode ser negado é que houve a decretação de uma “prisão cautelar” pelo Poder Judiciário, seja ela preventiva ou sui generis, na tentativa desesperada de suprir a ineficiência dos outros Poderes (representada pela insuficiência das leis elaboradas pelo Legislativo e onda de corrupção sistêmica no Executivo), com o fim de coibir as manobras realizadas pelos infratores que possuem o intuito de burlar a justiça.


6 DISTORÇÃO DA NOTÍCIA FEITA PELOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO

Este Capítulo é destinado à análise, em síntese, da relação existente entre a liberdade de divulgação jornalística e os direitos fundamentais, dos fatores responsáveis pela distorção da notícia, além da influência que o poder econômico exerce sobre os meios de comunicação populares.

6.1 A LIBERDADE DE DIVULGAÇÃO JORNALÍSTICA E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS  

A relevância dos meios de comunicação, nas sociedades contemporâneas, é evidente com o decurso do tempo e os avanços tecnológicos dele decorrentes.

As transformações ocorridas nos séculos XX e XXI determinaram a evolução na difusão de notícias, permitindo a realização de transmissões em tempo real.

Especificamente com o surgimento da internet e dos smartphones, juntamente com as redes sociais (whatsaap e facebook, por exemplo), a situação da divulgação de informação se tornou incontrolável, em razão da velocidade e amplitude com que se espalha por entre os cidadãos.

Os meios de comunicação em massa (televisão, livros, rádios, jornais, computadores e celulares) desenvolveram-se em progressão geométrica, passando a ser considerados por muitos estudiosos como os responsáveis pelo surgimento de um quarto poder, capaz de influenciar a sociedade.

Basta ver, nos últimos tempos, a quantidade de manifestações ocorridas contra o governo deste país, cujas organizações iniciais partiram das redes sociais e foram, em tempo real acompanhada pela televisão e internet.

Em questão de minutos, a propagação de uma informação é capaz de atingir uma enorme quantidade de sujeitos, ante a facilidade proporcionada pelos meios citados, os quais se encontram à disposição de um número elevado de destinatários.

Isto acarreta algumas consequências.

Os receptores da notícia são influenciados de diversas formas.

As pessoas, em sua individualidade, reagem de maneiras diversas ao mesmo estímulo, influenciadas por sua própria experiência de vida e preconceitos.

Neste ponto, há quem defenda que os receptores das informações transmitidas não passam de meros sujeitos passivos apáticos, de identidade empobrecida, fato que facilita o controle deles, tornando-os verdadeiras esponjas das notícias[34].    

Vale salientar que a mídia está atrelada às estruturas institucionais de organizações econômicas e também depende delas para se desenvolver.

Neste sentido:

A mercantilização de alguns impressos, como livros e panfletos, depende quase inteiramente da capacidade de produzir e vender as múltiplas cópias da obra. Outros impressos (jornais, por exemplo) combinam este tipo de valorização com outros, como a capacidade de vender o espaço de propaganda. No caso das transmissões de rádio e televisão, a venda do tempo de propaganda aos anunciantes tem sido de fundamental importância, em alguns contextos nacionais para a valorização econômica.[35]   

Neste contexto, portanto, a análise que será feita ao longo deste trabalho, sobre as características apresentadas pelos meios de comunicação de massa, possibilitará entender a sistemática de divulgação utilizada pela mídia e permitirá a identificação dos fatores que influenciam na seleção das matérias a serem publicadas e as possíveis distorções que poderão ser feitas.

O correto seria que os jornalistas permanecessem neutros quanto ao fato divulgado, para que a mensagem chegasse ao seu destinatário da forma mais condizente com a realidade possível.

O ideal seria que os noticiários realizassem seu trabalho com cautela, como meros relatores da informação.

No entanto, não é o que ocorre na realidade.

É notório que isto é muito difícil, eis que, de qualquer forma, são seres humanos transmitindo fatos e, nesta tarefa, é impossível que inexista ao menos um pouco de subjetividade, pois sempre estarão presentes as convicções pessoais de quem narra o fato que está sendo veiculado.

Não bastasse isso, existem também obstáculos acarretados por fatores externos, como a influência exercida pela política e economia.

Mesmo diante de todos estes percalços, o valor da mídia, na atualidade, é inestimável, porquanto é a através dela que a opinião pública é formada.

Inclusive, em Capítulo próprio, mais adiante neste trabalho, será analisada a utilidade da publicidade para o Direito.

Não bastasse isso, o Estado também necessita dos meios de comunicação, para a propagação de políticas de desenvolvimento. 

Sergio Capparelli e Venício Lima acentuam a importância da televisão no exercício da atividade do Estado:

No Brasil, a análise em separado das relações entre a televisão e o Estado, de um lado, e a televisão e capital, do outro, atende mais a objetivos didáticos, de tal forma que essas relações estiveram imbricadas desde o princípio da radiofusão. A televisão acolhe uma cultura de fluxo contínuo – os produtos difundidos tornam obsoletos os de ontem – mas é, ao mesmo tempo, um instrumento informativo e ideológico, fazendo com que o Estado tenha em relação a ela um interesse particular. Esse interesse existe também no plano econômico: assim, a fundação da BBC nos anos 20 revelou a vontade do Estado de sustentar a indústria eletrônica inglesa por razões econômicas e estratégicas – telecomunicações, por exemplo, vitais para o império inglês. Aconteceu, em quase todos os países europeus, uma intervenção clara do governo para favorecer os grupos econômicos nacionais.[36]   

Conforme é possível extrair do texto destacado, os meios de comunicação foram indispensáveis à evolução do Estado.

É que são eficientes em demonstrar as características da população e em comparar este Estado com os países desenvolvidos, para que sejam estudadas práticas que deram certo para outros ordenamentos jurídicos, a fim de que possamos implementar melhorias no nosso sistema atual.

Neste contexto, a mídia atua como facilitadora da adoção de novos métodos de produção e consumo, além de mobilizar a opinião pública, para que o ente estatal adote determinada postura diante do cenário mundial.

O constituinte, em apreço à divulgação de fatos formadores de opinião e ao consequente desenvolvimento populacional, resguardou, no art. 220, § 1º, da Lei Suprema, a liberdade de informações, vedando “toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística”.

Alexandre de Moraes explica que a liberdade de imprensa, em todos os seus aspectos, incluindo no que se refere à vedação à censura prévia, precisa observar as responsabilidades exigidas em um Estado Democrático de Direito, na medida em que o desvirtuamento da mesma, com o fim de cometimentos de ilícitos, sejam eles civis ou penais, possibilitará aos ofendidos integral indenização por danos materiais e morais, além do direito de resposta[37]

No entanto, esta liberdade não é absoluta, conforme pondera Pedro Lenza:

Conforme vimos, muito embora a “posição de preferência” que pode ser reconhecida na doutrina e jurisprudência em relação à liberdade de expressão, esse direito fundamental não é absoluto. Em caso concreto, discutia-se a prática ou não de crime de racismo cometido por escritor e editor de livros por suposta discriminação contra os judeus (art. 5.º, XLII) ao pregar ideias antissemitas, preconceituosas e discriminatórias. Absolvido em primeira instância, a 3.ª Câmara Criminal do TJRS, por unanimidade, reformou a sentença e o condenou. Impetrado HC no STJ, a ordem foi denegada. Houve nova impetração de habeas corpus no STF, ora em análise (HC 82.424). O STF, por 8 x 3, em julgamento finalizado em 17.09.2003, manteve a condenação imposta pelo TJRS por crime de racismo, flexibilizando a amplitude da liberdade de expressão. Em razão da importância do tema (o Min. Marco Aurélio, que ficou vencido e defendeu a tese da liberdade de expressão, definiu o julgamento como um dos mais importantes da Corte desde a sua chegada há 13 anos), pedimos vênia para transcrever a ementa: 1. Escrever, editar, divulgar e comerciar livros ‘fazendo apologia de ideias preconceituosas e discriminatórias’ contra a comunidade judaica (Lei n. 7.716/89, art. 20, na redação dada pela Lei n. 8.081/90) constitui crime de racismo sujeito às cláusulas de inafiançabilidade e imprescritibilidade (CF, art. 5.º, XLII). (...). 10. A edição e publicação de obras escritas veiculando ideias antissemitas, que buscam resgatar e dar credibilidade à concepção racial definida pelo regime nazista, negadoras e subversoras de fatos históricos incontroversos como o holocausto, consubstanciadas na pretensa inferioridade e desqualificação do povo judeu, equivalem à incitação ao discrimen com acentuado conteúdo racista, reforçadas pelas consequências históricas dos atos em que se baseiam. (...). 15. (...). Jamais podem se apagar da memória dos povos que se pretendam justos os atos repulsivos do passado que permitiram e incentivaram o ódio entre iguais por motivos raciais de torpeza inominável. 16. A ausência de prescrição nos crimes de racismo justifica-se como alerta grave para as gerações de hoje e de amanhã, para que se impeça a reinstauração de velhos e ultrapassados conceitos que a consciência jurídica e histórica não mais admitem” (HC 82.424, Rel. p/ o ac. Min. Presidente Maurício Corrêa, j. em 17.09.2003, Plenário, DJ de 19.03.2004). A maioria dos Ministros, apesar de pequenas distinções metodológicas, justificou os seus votos com base na ideia de ponderação (sopesamento) entre a liberdade de expressão e a liberdade de imprensa de um lado e a dignidade da pessoa humana e o direito à honra de outro.[38]

Na mesma linha, ensina Nathalia Masson que a liberdade de imprensa deve ser exercida em harmonia com os direitos individuais consagrados na Constituição, ou seja, a propagação de dados que não ostentem qualquer relação com o interesse público e social e violem a proteção à vida privada, dignidade e honra, não estão respaldadas na Carta Magna[39]

Este também é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, conforme o trecho da ementa:

[...] 1.  No  tocante  à  liberdade  de  imprensa,  em situações como a do presente caso, há de ser feita a devida ponderação entre os direitos constitucionais  em  tensão, levando-se em consideração as premissas do caso concreto firmadas pelas instâncias ordinárias. Tem-se, de um lado,  a  livre  expressão  da atividade intelectual, artística e de comunicação  e  informação,  com  ampla  liberdade  de  publicação e abordagem  de  temas,  assuntos,  notícias  e  imagens de interesse, inclusive recreativo, da coletividade (CF, art. 5º, IX), e, de outro lado,  o direito à intimidade, abrangendo a privacidade, a honra e a imagem da pessoa (CF, art. 5º, X). [...][40]

Assim, é preciso ponderar a liberdade de expressão com outras garantias e direitos fundamentais, como a dignidade da pessoa humana, o direito à honra, à intimidade, à vida privada e à imagem.

O direito de informação, conforme David Araujo, abrange “o direito de informar, de se informar e de ser informado”[41] e, com o intuito de explicar o significado de cada um, o autor cita as palavras de Canotilho e Vital:

O primeiro consiste, desde logo, na liberdade de transmitir ou comunicar informações a outrem, de as difundir sem impedimento, mas pode também revestir uma forma positiva, enquanto direito a meios para informar. O direito de se informar consiste designadamente na liberdade de escolha da informação, de procura de fontes de informações, isto é, no direito de não ser impedido de se informar; é a versão positiva do direito de se informar, consistindo num direito a ser mantido adequada e verdadeiramente informado.[42]

Neste sentido, é assegurado ao cidadão o direito de se manter informado, sem ter obstáculos criados pelo Estado.

Ressalte-se que a liberdade de informação se refere à jornalística, cuja abrangência se dá sobre fatos indispensáveis à formação da opinião pública e não puramente relacionados a aspectos íntimos de celebridades.

A propagação das informações deve ser feita de acordo com critérios objetivos, vinculados à verdade, tentando-se coibir, na maior medida possível, a difusão de notícias distorcidas e abusivas, as quais acarretam escândalos no meio social[43]

Acentua, José Afonso da Silva:

A liberdade de informação não é simplesmente a liberdade do dono da empresa jornalística ou do jornalista. A liberdade deste é reflexa, no sentido de que ela só existe e se justifica na medida do direito dos indivíduos a uma formação correta e imparcial. A liberdade dominante é a de ser informado, a de ter acesso às fontes de informação, a de obtê-la. O dono da empresa e o jornalista têm um direito fundamental de exercer sua atividade, sua missão, mas especialmente têm um dever. Reconhece-lhes o direito de informar ao público os acontecimentos e idéias, mas sobre ele incide o dever de informar à coletividade de tais acontecimentos e idéias, objetivamente, sem alterar-lhes a verdade ou esvaziar-lhes o sentido original, do contrário, se terá não informação, mas deformação.[44]   

Diante do exposto, a garantia constitucional resguarda apenas as notícias verídicas, as quais propiciam o conhecimento pela sociedade dos fatos de forma correta, com o fim de assegurar o efetivo e verdadeiro controle das atividades políticas e econômicas desenvolvidas pelo Estado.

Neste ponto, é indispensável fazer a abordagem do tema sob o aspecto da publicidade dos atos processuais.

Trata-se de prerrogativa inerente a todo processo (em razão do que dispõe o art. 93, inciso IX, da Constituição Federal) e pressuposto de validade dos atos judiciais.

Neste sentido:

Complementando essa garantia geral do dever de motivação e publicidade das decisões, o art. 5.º, LX, da CF/88 estabelece que a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem. Assim, totalmente aceitáveis as regras fixadas, por exemplo, nos arts. 155, 444, 815 e 841 do CPC/73 (tendo os dois primeiros correspondências nos arts. 189 e 368 do CPC/2015) e 20 do CPP.[45]

A exposição dos atos processuais representa grande importância para o réu, pois o resguarda de abusos inerentes a práticas excessivas ou arbitrárias e, consequentemente, ilícitas das autoridades.

Ao julgar às claras, o magistrado tende a ater-se exclusivamente a critérios jurídicos, despindo-se de qualquer influência espúria e mantendo a sua independência.

Além dessa função protetora, a publicidade possibilita o controle dos atos judiciais pela sociedade, proporcionando aos cidadãos, portanto, a fiscalização do exercício da atividade jurisdicional.   

No âmbito da esfera penal, é legítimo o estabelecimento de limites ao livre exercício da imprensa, quando esta liberdade vem de encontro com o processo penal justo, prejudicando garantias constitucionais do acusado[46].    

Pondera Ana Lúcia Menezes Vieira que:

Com a atual interferência da mídia na Justiça e, mais propriamente, no processo penal, os direitos da pessoa humana e das partes processuais estão sacrificados em nome da liberdade de imprensa que vem assumindo posição de preponderância sobre todo e qualquer outro direito humano, chegando, por vezes, a anulá-lo.[47]     

Conforme exposto, mesmo diante de todos os meios criados pela legislação e pela jurisprudência pátria a fim de coibir as práticas abusivas da mídia, a realidade em que vivemos e estamos inseridos é marcada pela supremacia dos meios de comunicação, quando confrontados com os direitos fundamentais que normalmente são afetados pela liberdade de expressão (por exemplo, o direito à intimidade) e isto é inconcebível para um Estado Democrático de Direito.

6.2 FATORES RESPÓNSAVEIS PELA DISTORÇÃO DAS NOTICÍAS

Conforme vem sendo amplamente abordado ao longo deste trabalho, a distorção dos fatos noticiados pela imprensa é uma prática comum na atualidade e causa repercussões na esfera jurídica.

Quais seriam as possíveis causas para a ocorrência deste fenômeno?

A imprensa, com sua ampla capacidade de difusão de informações não se encontra autônoma em relação à política e à economia.

Ela está, isto sim, diretamente vinculada a estas áreas, fato que acarreta aos jornalistas inúmeras restrições na elaboração e divulgação das notícias.

Comumente, o profissional responsável pela difusão de informações não ostenta discricionariedade o bastante na escolha dos fatos objetos de publicação.

Muitas vezes, os temas a serem abordados e suas condições de divulgação são impostos ao agente noticiante, por questões políticas, econômicas e também pelo Estado que fornece subvenções.

Trata-se de influência de natureza financeira, bem evidente nas grandes emissoras de televisão, na medida em que se verifica serem seus proprietários grandes conglomerados econômicos, cujo objetivo é o lucro, acima do dever de informar corretamente os seus telespectadores.

Tudo gira em torno da busca pelo lucro financeiro e aí cresce de relevo a importância da exposição de matérias capazes de interessar à coletividade, aumentando, assim, os índices de audiência.

Neste contexto, o trabalho do jornalista passa a ser a procura por notícias extraordinárias, que despertem o interesse do maior número de pessoas possível.

Aí, surge a busca por fatos relacionados com o cometimento de crimes, os quais ostentam grande potencial de chocar os indivíduos que deles tomam conhecimento, ativando, desta maneira, a curiosidade da maior parte da população.

Conforme expõe Marco Natalino:

O valor-notícia, que corresponde ao próprio cerne do hábito jornalístico, é aquele conjunto de características presentes em maior ou menor grau nos acontecimentos reconhecidos como notícia, como novidade, a extraordinariedade, a presença de personagens conhecidos, a negatividade, a presença de elementos fortes como vida, morte, desejo sexual, entre outros.[48]        

Por outro lado, é claro que, mesmo apresentando todos os defeitos expostos, não se pode olvidar da imprescindibilidade dos meios de comunicação para a vida do homem na atualidade, bem como para o desenvolvimento social.

Sobre o tema, destaca Ana Menezes Vieira:

Não é demais informar que os meios de comunicação exercem a indispensável função social de informar, esclarecer e propor debates. Impossível imaginar uma sociedade democrática que prescinda de informações, pois, somente pelas notícias, dados, idéias, o homem exerce sua condição humana de socialização. E, à medida que a pessoa se comunica, ela se desenvolve pessoalmente e participa do desenvolvimento coletivo. Por tal razão, a informação que possibilita a comunicação é um direito humano.[49]   

Contudo, na medida do possível, é necessário atentar para a propagação de notícias da forma mais objetiva possível, evitando, ao máximo, as distorções fáticas.

Isso porque o jornalista deve procurar comunicar os fatos à população com transparência e honestidade, conforme a realidade.

Informar é apresentar ao espectador a verdade.

O homem informado tem condições de compreender o mundo no qual se insere e se tornar mais participativo.[50]

Eugênio Bucci, ao conceber uma visão da ética da comunicação de massa, explica:

A ética da comunicação de massa não pode ser pensada a partir das mesmas balizas que nos guiam para discutir a ética na imprensa. O termo imprensa designa a instituição constituída pelos veículos jornalísticos, seus profissionais e seus laços com o público. Refere-se, portanto, ao relato das notícias e ao debate das idéias em jornais, revistas, emissoras de rádio e televisão, além de sites da internet. Sua ética deve primar pela busca da verdade factual, da objetividade, da transparência, da independência editorial e do equilíbrio. Já o conceito de “meios de comunicação de massa” traz em si, desde a origem, o embaralhamento sistêmico entre fato e ficção, entre jornalismo e entretenimento, entre interesse público, interesse privado e predileções da esfera íntima. Assim, a chamada “comunicação de massa”, além de modificar para sempre a própria natureza da imprensa, tende a misturar os domínios da arte e do jornalismo num mesmo balaio de imposturas éticas, prontas para o consumo e inimigas da virtude tanto artística (criar em conformidade com a imaginação), quanto jornalística (falar em conformidade com a imaginação).[51]

Assim, diante do surgimento dos meios de comunicação de massa, o relato de forma objetiva a respeito dos fatos noticiados passou a não ser mais o foco principal da mídia, cuja função primordial passou a ser mesclar realidade e ficção, aspirando à ampliação da quantidade de receptores da notícia.

Consequentemente, os índices de audiência tendem a crescer, possibilitando a essas corporações detentoras das empresas de comunicação a obtenção de lucro com a venda de intervalos para a divulgação de produtos pelos anunciantes[52].

Portanto, em primeiro lugar, o lucro é visado e, depois, é cumprida a função social, consistente no dever informar clara e objetivamente a população.

Destaca-se que:

A busca da verdade, virtude ancestral do jornalismo, é simplesmente incompatível com a lógica dos conglomerados comerciais da mídia dos nossos dias. A busca da verdade era um projeto da razão e os conglomerados há muito se divorciaram da razão. Não porque seus gestores sejam mentirosos, mas pela própria natureza dos conglomerados e da comunicação tiranizada pela imagem. Onde quer que a notícia esteja a serviço do espetáculo, a busca da verdade é apenas um cadáver. Pode até existir, mas, sempre, como um cadáver a serviço do “dom de iludir.[53]  

A velocidade demandada pela internet, na difusão de notícias, e a concorrência característica do nosso sistema capitalista são outros fatores que influenciam determinantemente na atividade jornalística, pois dificultam a efetivação de uma análise mais aprofundada do fato a ser divulgado, muitas vezes conhecido apenas por fontes precárias e sendo exposto, portanto, sem a confirmação de sua veracidade.

Sylvia Moretzsohn, tratando sobre a distorção ocasionada pela velocidade na propagação de notícias, explica:

A urgência imposta traz outras consequências: reduz, quando não anula, a possibilidade de reflexão no processo de produção de notícia, o que não apenas aumenta a probabilidade de erro como, principalmente e mais grave, limita a possibilidade de matérias com ângulos diferenciados de abordagem, capazes de provocar questionamentos no leitor; obriga o repórter a divulgar informações sobre as quais não tem certeza; submete as fontes à lógica da velocidade (apresentada como uma imposição da realidade e não como consequência do modo de produção), o que frequentemente compromete, na origem, a qualidade da informação a ser veiculada.[54]

A todos estes fatores, acrescem-se os desvios oriundos das interpretações dos redatores e editores dos textos e das imagens a serem veiculadas.

Isso porque é inevitável que prevaleçam as opiniões e ideologias dos profissionais responsáveis pela constituição do noticiário.[55] 

Não bastasse isto, no pertinente à esfera penal, a situação é ainda mais grave, porque os jornalistas, em sua grande maioria, quando tratam de assuntos alusivos a injustos penais, esquivam-se da sua função de informar, e se arvoram na condição de investigadores do caso, reconstruindo-o, de modo dramático, e exigindo dos órgãos estatais a punição imediata do suposto infrator, bem como o aumento da severidade das punições.

Consequentemente, influenciam a população, que clama por justiça.  

Sobre a carga de subjetividade presente na transmissão de informações, salienta-se:

Os meios de comunicação de massa medeiam a realidade e o conhecimento desta pelo público e, ao descreverem o acontecimento, podem ser inexatos. Isto ocorre porque a interpretação do profissional da notícia sobre as circunstâncias do acontecimento traz necessariamente, uma carga de subjetividade daquele que produz ou descreve o fato.[56]           

Diante de todo o exposto, é possível concluir que, apesar da grande importância que a mídia representa para a sociedade, na medida em que possibilita discussões, reflexões e informações, cujo papel para o desenvolvimento do Estado é essencial, existem diversos fatores negativos, os quais influenciam diretamente sobre a atuação dos agentes responsáveis pela aplicação do Direito Penal.

6.3 A INFLUÊNCIA DO PODER ECONÔMICO SOBRE OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO

O Brasil, como ocorre em geral nos países em desenvolvimento, apresenta grande disparidade entre as classes sociais.

Convivem inseridos na mesma sociedade pessoas em realidades econômicas completamente distintas.

Parcela reduzida da população detém a maior parte do poderio econômico, enquanto a maioria da população vive em condições de escassez de recursos.

Este fator exerce influência sobre o aumento da criminalidade, na medida em que o povo, não só não dispõe do mínimo de bens necessários a uma vida digna, como também carece de estudos, acarretando, assim, um número cada vez maior de potenciais criminosos.

Não que o fato de não possuir riquezas materiais ou de não estudar seja capaz, por si só, de construir uma personalidade voltada para o crime, ou que as pessoas detentoras de cultura e posses estejam isentas do cometimento de delitos, mas é inegável que este fator auxilia no aumento dos índices criminais.

O quadro instável provocado pela prática delituosa vai de encontro com os interesses da pequena elite detentora do poderio econômico, que necessita de um país estável, para realizar seus investimentos e auferir lucro. 

Neste contexto, os meios de comunicação de massa representam decisivo instrumento nas mãos da classe mais abastada no controle da população de baixa renda, pois informam os cidadãos a respeito dos fatos, mas sempre de acordo com os interesses da elite.

Os receptores da notícia, por sua vez, são bombardeados por reportagens selecionadas, as quais são repetidas exaustivamente até que sejam absorvidas, ou seja, a mídia oculta e omite do debate público questões que vão diretamente contra os interesses dos seus patrões (proprietários)[57].

Os órgãos responsáveis pela imprensa influem na reflexão do cidadão, escolhem os temas sobre os quais deve pensar e indicam a maneira de realizar esta meditação, conduzindo a opinião pública ao caminho desejado.

Explica Ana Menezes Vieira:

Utilizam-se os jornalistas da ideologia do proprietário da empresa. E é esta que irá formar a opinião pública. Sem dúvida, a notícia será tendenciosa, manipulada, pois não visa o interesse social e sim o particular. Vai impedir que o público analise e compreenda o que, de fato, é realidade; vai impedir a indagação e a dúvida e, por consequência, evitar o acesso às idéias.[58]  

 Oportuno citar a precisa lição do professor Fábio Martins:

Os órgãos da mídia não passam de meros veículos de que lançam mão a minoritária classe dominante para estabelecer, manter e perpetuar o status quo da realidade social na qual se inserem. Nesse contexto, a minoritária classe dominante manipularia a majoritária classe dominada. Para tanto, os dirigentes dos órgãos da mídia manipulam a informação, em prejuízo do público em geral.[59]    

Diante do exposto, por meio da constante manipulação das informações divulgadas, a opinião pública passa a ser formada em consonância com os interesses da classe economicamente dominante, acontecendo, assim, o controle dos órgãos de comunicação sobre as massas.


7 A INGERÊNCIA DA MÍDIA SOBRE A OPINIÃO PÚBLICA E A DECISÃO DO JUIZ

Em virtude do poder de “dizer o direito”, ao tribunal é atribuída grande responsabilidade, porque é dali que emana o “veredicto” (o dito verdadeiro, ou, ao menos, o que assim deveria ser).

O problema é que o magistrado, tal qual todo ser humano, também está exposto a influências externas e é vulnerável às suas próprias preconcepções construídas ao longo de sua experiência de vida: “A hermenêutica filosófica mostra que só é possível compreender aquilo que, desde antes, possui alguma estrutura mínima de pré-compreensão, o que significa que a antecipação de sentido é condição essencial para a compreensão”[60].

O trecho citado explica e se aplica a muitas situações: é devido a esta premissa que cada indivíduo reage de uma maneira, sob o mesmo estímulo, dando ensejo a diversas interpretações não idênticas, mas todas verdadeiras, para um mesmo fato.

Isso significa que o sujeito que julga atribui sentido válido apenas às manifestações que confirmam seu entendimento prévio, desprezando provas e evidências em sentido contrário. Imaginemos uma situação típica: ante ao sumiço de uma joia que ficava guardada no criado-mudo do quarto em uma residência, culpa-se a empregada doméstica pelo furto. A reconstituição de fatos que pudessem levar a tal conclusão — que, em geral, é obtida sem provas — dá valor e relevância somente àquilo que confirma a hipótese primeira: Ah, a empregada estava limpando o criado-mudo onde estava a joia no dia anterior ao sumiço: prova cabal da culpa. Levem-na para a delegacia! Não importa se ela limpava aquele quarto a cada dois dias por anos... Como nos filmes de antigamente: houve um assassinato. Quem é o assassino? O mordomo. E, a partir daí, todas as atitudes desse acusado apenas confirmam as suspeitas. Não há chances de absolvição — o julgamento ocorreu antes do processo.[61]

No mesmo sentido:

A presunção de inocência como regra de tratamento e premissa do processo penal, é manipulada pelo viés de confirmação adotado pela ampla maioria dos magistrados, a saber, partindo-se da acusação como verdadeira o suporte de informações (provas) produzidas no decorrer do processo somente serve, mesmo que não sejam suficientes, para confirmar o que já se havia cristalizado. [...] De fato, não são poucos os autores que consideram que os poderes que permitem que o juiz interfira na gestão da prova devem ser complementares; no entanto, não conseguimos vislumbrar caso em que essa atividade não seja potencialmente danosa para o acusado, motivo pelo qual a consideramos em flagrante descompasso com a exigência de democraticidade, o que nos parece inaceitável; afinal, tal atividade desconsidera completamente o in dubio pro reo, uma vez que, na dúvida, o juiz parte em busca de provas, que obviamente só podem ter a finalidade de obter a condenação a qualquer custo. Em uma estrutura regrada de contenção do poder punitivo, a dúvida deve gerar absolvição, o que expressa o próprio sentido do princípio do in dubio pro reo. Mas, o processo penal do inimigo de Campos é fundado em torno de outra lógica, que configura um verdadeiro in dubio pro hell: diante da dúvida, a verdade deve ser perseguida até que se chegue ao resultado desejado, que não é outro que a condenação. Não há caso em que essa persistência não signifique a busca da condenação a qualquer custo, já que a dúvida deveria impor a absolvição.[62]  

Não bastasse a fragilidade do princípio do in dubio pro reo, demonstrada nos excertos destacados, o Poder Judiciário também sofre com as pressões da população influenciada pelos noticiários, fato que piora ainda mais a situação do investigado ou acusado.

Sobre o assunto:

De outra face, a força da mídia promove, com objetivos comerciais e outros nem tanto, a vivacidade do espetáculo ‘violência’, capaz de instalar a ‘cultura do pânico’, fomentador do discurso da ‘Defesa Social’ e combustível inflamável para aferrolhar o desalento constitutivo do sujeito clivado com a ‘promessa de segurança’, enfim, de realimentar os ‘estereótipos’ do crime e criminoso mote dos discursos da ‘Lei e Ordem’.[63]

Assim, sobre o indivíduo que, por vezes, nem mesmo foi processado ainda, já recaem todas as consequências externas da sanção, que não são ligadas diretamente ao cumprimento da pena, mas aquelas decorrentes da imagem que um condenado ostenta perante a sociedade, sendo segregado e hostilizado, ou seja, de maneira inevitável, pelo estereótipo de criminoso dado ao réu pela mídia, passa este a sofrer os efeitos extrapenais de uma sentença incriminatória, sem nem mesmo ter sido julgado. 

Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar explicam que as medidas cautelares aplicadas durante a persecução penal exigem grande cuidado das autoridades, porque a exposição da figura do indiciado ou acusado na imprensa, por meio da apresentação de sua imagem ou de informações obtidas na investigação é passível de causar um irreversível prejuízo à sua vida.[64]

Como salienta Fábio Andrade:

Verifica-se, hoje, tanto nos países centrais como nos periféricos, que a mídia não é apenas uma cronista da realidade; ela se torna, cada dia mais, a protagonista da realidade, modificando e construindo os fatos, interagindo com os atores da vida real, a ponto de construir outra realidade – diferente da vida real.[65]           

Além do mais, no pertinente às investigações, a publicidade pode ser determinante para o fracasso da persecução penal.

Isso porque, informados dos próximos passos que as autoridades tomarão para o descobrimento da autoria delitiva, os responsáveis pelo injusto podem tomar medidas preventivas, como destruir elementos probatórios ou até mesmo implementar uma evasão do país.

Guilherme de Souza Nucci pondera que o sigilo, quando plenamente justificado, não acarreta problemas ao investigado, porquanto “As investigações já são acompanhadas e fiscalizadas por órgãos estatais, dispensando-se, pois, a publicidade.”[66].

Assim, em alguns casos, o sigilo é imprescindível para o sucesso da atividade jurisdicional na busca pela verdade, eis que divulgações sobre as diligências a serem adotadas com o fim de apurar a autoria e materialidade do delito podem turbar a persecução penal, sem contar a já amplamente abordada distorção informativa feita comumente pelos noticiários, a qual induz ao desprestígio das instituições democráticas e cria descrença na efetividade do judiciário, quando um magistrado concede a liberdade ao suposto infrator, ao invés de decretar a prisão preventiva[67].    

Como pondera Artur Souza:

Não obstante não tenha sido gerada pelos meios de comunicação em massa essa falência da solidariedade social e ressocialização do condenado, é evidente que a forma de exposição dos fatos pela imprensa amplifica, dramatiza e, por vezes, distorce qualitativamente e quantitativamente as circunstâncias criminológicas e penais. Em razão disso, a legitimação social-democrática do Poder Judiciário é colocado em dúvida pela opinião pública, gerando insatisfação popular, pondo em risco a própria ordem democrática e a legitimação das instituições republicanas, fazendo com que o juiz, diante da delimitação do seu círculo hermenêutico, procure alternativas que mais se amoldem ou se adaptem aos postulados dos meios de comunicação em massa e da opinião pública.[68]   

A propagação de informações carregadas de vícios acaba por criar uma nova realidade, a qual, diversas vezes, é aderida pelo magistrado, que sofre com a pressão exercida pela opinião pública no momento em que está em suas mãos o poder da decretação da custódia cautelar.

Salienta Fabio Martins:

A pressão do chamado “Quarto Poder” sobre o Poder Judiciário - na mente do julgador e, portanto, em sua convicção – distorce a noção acerca da função jurisdicional que constitucionalmente lhe incumbe. Ele passa a desejar, consciente ou inconsciente, satisfazer a opinião pública (manipulada pelos órgãos da mídia) da qual se vê refém, ao passo que deveria se preocupar em distribuir a justiça através da prestação jurisdicional. A gravidade do problema é potencializada ainda mais quando se trata de juízes mais jovens e inexperientes.[69]  

Todo juiz criminal, ao se deparar com o cometimento de um injusto, busca analisá-lo sempre de modo a vinculá-lo à norma, mas, a sua interpretação também está diretamente relacionada a valores secundários, oriundos de sua concepção ideológica, social, cultural e psicológica, inerentes à sua personalidade e ditados pelo contexto social em que se insere. Esses fatores metajurídicos o influenciam na tomada de suas decisões[70].

É nesse ponto de discricionariedade da atuação judicial, que a mídia tende a influenciar o julgador, criando novos valores a serem seguidos.

Dessa forma, o magistrado, como integrante da sociedade que é, está diretamente atrelado aos dogmas difundidos pelos meios de comunicação de massa, os quais interferem no exercício de sua atividade.

Sobre o poder da mídia explica Geraldo Prado:

Reflete-se, de modo relevante, no processo penal, quando atua diretamente sobre a convicção do juiz, intentando formá-la não mais com base nas provas dos autos, obtidas com a segurança do contraditório e da ampla defesa, porém, a partir da conclusão amiúde precipitada a que chegam os órgãos informativos, de tal sorte que o secular princípio da imparcialidade resta afetado, às vezes até mesmo sem que o julgador se dê conta.[71]

O resultado da distorção efetuada pelos meios de comunicação e, consequentemente, a formação da opinião pública equivocada sobre o crime e a imagem do acusado pressionam o Poder Judiciário para a adoção de medidas enérgicas, influenciando a figura do juiz, o qual reiteradamente suprime as garantias constitucionais do acusado, banalizando o instituto da prisão preventiva.

Nas palavras de Guilherme de Souza Nucci:

Apura-se o abalo à ordem pública também, mas não somente, pela divulgação que o delito alcança nos meios de comunicação – escrito ou falado. Não se trata de dar crédito ao sensacionalismo de certos órgãos da imprensa, interessados em vender jornais, revistas ou chamar audiência para seus programas, mas não é menos correto afirmar que o juiz, como outra pessoa qualquer, toma conhecimento dos fatos do dia a dia acompanhando as notícias veiculadas pelos órgãos de comunicação. Por isso, é preciso apenas bom senso para distinguir quando há estardalhaço indevido sobre um determinado crime, inexistindo abalo real à ordem pública, da situação de mera divulgação real da intranquilidade da população, após o cometimento de grave infração penal [...] Nas palavras de Eugênio Pacelli de Oliveira, “a barbárie, como se sabe e se deve saber, não é privativa do Estado. Há violência por todos os lados, sobretudo em um mundo de grandes e intransponíveis desigualdades sociais. Daí não se poder afirmar seriamente que a violência ou o terror sejam criações da mídia, nelas interessada pelo baixo custo da produção de seus programas. A mensagem do pânico, por certo, pode ser e é ali frequentemente superdimensionada, em prejuízo até da apreciação judicial do caso (o que é mais grave), o que não significa que a coletividade (incluindo o Judiciário) não esteja preparada ou não saiba reduzi-la, pelo menos aos limites de seu conhecimento pessoal. Seria rematada ingenuidade, por exemplo, supor que organizações criminosas efetivamente organizadas e com liderança e atuação amplamente comprovadas (vide caso PCC) formaram-se apenas para a reivindicação de melhores condições carcerárias. Obviamente, qualquer pretensão nesse sentido é absolutamente legítima. Não obstante, não se esgota aí, à evidência, o respectivo campo de atuação. Com ou sem manipulação da mídia” (Regimes constitucionais da liberdade provisória, p. 67).[72]

Conforme dispõe o texto supra, é evidente que nem tudo é “invenção” ou “manipulação” dos noticiários e a sociedade vem sofrendo sim com inúmeros crimes violentos e com as mais diversas atrocidades.

É claro que o magistrado, assim como os demais membros da sociedade, está exposto a todo tipo de apelo proveniente dos noticiários, contudo, ele é um profissional do Direito, que estudou para exercer sua função e, a princípio, espera-se que ostente preparo o suficiente para exercer sua imparcialidade perante os casos concretos que irá analisar.

Surge, então, como tarefa à adequada apreciação da situação determinada a adoção, por parte do julgador de uma atitude contínua de desconfiança a respeito de suas verdades e antecipações, com o intuito de minimizar o máximo possível a contaminação de suas sentenças com as suas próprias concepções morais, assumidas, à primeira vista, como verdades.


8 A RELAÇÃO EXISTENTE ENTRE A PRISÃO PROVISÓRIA, A COLABORAÇÃO PREMIADA E A MÍDIA

A colaboração premiada, em síntese, é uma técnica especial de investigação por meio da qual o acusado ou investigado, em troca de determinado “prêmio legal”, não só confessa a participação no crime, como também presta informações relevantes para o esclarecimento do fato delituoso e de seus supostos praticantes.

Está prevista em diversas legislações especiais, com destaque para os artigos 4º a 7º da Lei de Organizações Criminosas.

Não cabe neste trabalho extensas digressões explicando em que consiste o instituto, restando apenas a análise deste relacionado com a mídia e com o contexto atual em que está inserida a nossa sociedade.

Neste ponto, há quem entenda que a colaboração premiada contribui para a banalização da prisão provisória, na medida em que constam entre os benefícios a que faz jus o colaborador, por exemplo, medidas despenalizadoras, como o não oferecimento de denúncia ou o perdão judicial, os quais acarretam a automática liberação do cooperador que esteja restrito sob os fundamentos autorizadores da prisão preventiva.

Ou seja, os defensores desta ideia afirmam que a custódia cautelar tem sido utilizada, portanto, como um meio de coerção ou até de tortura, para que o constrito colabore com as investigações, delatando seus comparsas e obtendo, como “prêmio”, a revogação da segregação cautelar.

Não bastasse isto, os jornais não escondem o apreço pela divulgação das declarações prestadas pelos infratores e, em razão da liberação de informações, a mídia contribui para a pressão pública, facilita a confissão e estimula a cooperação com as autoridades.

Tudo isso auxilia na deturpação do acordo de colaboração, bem como na vulgarização da prisão preventiva, segundo alguns estudiosos:

Esse é um debate interessante, e precisa ser colocado nas redes, até porque falta o contraditório. A grande mídia apoia entusiasticamente a delação premiada por casuísmo, porque no momento exerce o controle da narrativa dos escândalos. E lhe ajuda a vender notícias e prestígio, na medida em que há uma lamentável promiscuidade entre os aparelhos repressores e uma imprensa cada vez mais partidarizada.[73]

Outros autores ressaltam que nenhum acordo de delação pode ser considerado válido diante de alguém que se encontra preso.

Argumentam que a prisão como suposto estímulo para facilitar a confissão ou para cooperação com as autoridades que estão à frente da investigação do ilícito é inidônea e afronta a lei:

No Brasil, o Ministério Público e o príncipe de Curitiba criaram um nexo importante entre delação premiada e prisão preventiva, em sede da seriada operação lava-jato e é bom que se destaque, que, depois disso, referido nexo, começa a repercutir e receber acolhida em diversos juízos Brasil à fora. Sem saber (?) as referidas autoridades confundem nosso ordenamento com o ordenamento alemão. Uma confusão conveniente. Pois, ao mesmo tempo em que copiam (sem base jurídica para fazê-lo, eis que contra legem em território pátrio) requisitos da prisão preventiva na Alemanha, como se demonstrará mais adiante, “esquecem” que nas bandas germânicas, em regra, a prisão preventiva tem a duração máxima de até 6 (seis) meses. E quais seriam os requisitos utilizados na operação lava-jato, copiados da legislação alemã (utilizados implicitamente) e travestidos de legalidade com pedidos de prisão preventiva apresentados explicitamente sob as balizas do art. 312/CPP? Aqueles que a doutrina e jurisprudência alemã denominam de “fundamentos de prisão apócrifos” (apokryphe Haftgründe), no caso específico, a pressão da opinião pública; estímulo para facilitar a confissão e o estímulo para cooperação com as autoridades de investigação. [...] Diga-se mais. Nenhum acordo de delação pode ser considerado válido diante de alguém que se encontra preso (não é necessário dizer o que isso significa enquanto liberdade volitiva e vontade livre, em tais circunstâncias) com o propósito específico de estímulo para facilitar a confissão ou estímulo para cooperação com as autoridades de investigação, ambos fundamentos inidôneos e ilegais para a manutenção de prisões preventivas.[74]

Por outro lado, há os que entendem que uma coisa não tem nada a ver com a outra: prisão ocorre em razão da personalidade desajustada do infrator, em observância dos requisitos apontados pelo art. 312 do Código de Processo Penal, não servindo como meio coercitivo para a colaboração.

É o que se denota de Artigo publicado pelo Juiz Federal Sérgio Fernando Moro:

Nenhum dos três indivíduos foi preso ou processado para se obter confissão ou colaboração. Foram presos porque faziam do crime sua profissão. Tommaso Buscetta foi preso pois era um mafioso e traficante. Gravano, um mafioso e homicida. Chiesa, um agente político envolvido num esquema de corrupção sistêmica em que a prática do crime de corrupção ou de extorsão havia se transformado na regra do jogo. Presos na forma da lei, suas colaborações foram essenciais para o desenvolvimento de casos criminais que alteraram histórias de impunidade dos crimes de poderosos nos seus respectivos países. Pode-se imaginar como a história seria diferente se não tivessem colaborado ou se, mesmo querendo colaborar, tivessem sido impedidos por uma regra legal que proibisse que criminosos presos na forma da lei pudessem confessar seus crimes e colaborar com a Justiça. É certo que a sua colaboração interessava aos agentes da lei e à sociedade, vitimada por grupos criminosos organizados. Essa é, aliás, a essência da colaboração premiada. Por vezes, só podem servir como testemunhas de crimes os próprios criminosos, então uma técnica de investigação imemorial é utilizar um criminoso contra seus pares. Como já decidiu a Suprema Corte dos EUA, “a sociedade não pode dar-se ao luxo de jogar fora a prova produzida pelos decaídos, ciumentos e dissidentes daqueles que vivem da violação da lei” (On Lee v. US, 1952). Mas é igualmente certo que os três criminosos não resolveram colaborar com a Justiça por sincero arrependimento. O que os motivou foi uma estratégia de defesa. Compreenderam que a colaboração era o melhor meio de defesa e que, só por ela lograriam obter da Justiça um tratamento menos severo, poupando-os de longos anos de prisão. A colaboração premiada deve ser vista por essas duas perspectivas. De um lado, é um importante meio de investigação. Doutro, um meio de defesa para criminosos contra os quais a Justiça reuniu provas categóricas. Preocupa a proposição de projetos de lei que, sem reflexão, buscam proibir que criminosos presos, cautelar ou definitivamente, possam confessar seus crimes e colaborar com a Justiça. A experiência histórica não recomenda essa vedação [...][75]

Segundo o juiz, que está no comando da Operação Lava Jato, não é viável à sociedade e ao Poder Judiciário recusar as provas produzidas pelos supostos infratores.

Argumenta que os criminosos não se motivam a colaborar com as investigações por sincero arrependimento, mas sim em razão da estratégia construída por sua defesa.

Nesta linha, explica que a colaboração premiada deve ser observada por duas perspectivas: de um lado, é meio de investigação e, de outro, instrumento de defesa dos investigados ou acusados.

Do trecho destacado, ainda se pode inferir que, acaso sejam aprovadas leis para coibir a colaboração de quem está constrito provisoriamente, quem sairá perdendo será a sociedade, ante o desperdício de provas que poderiam ser produzidas com base nos relatos dos prováveis agentes delitivos.

Assim, em que pese o interesse dos meios de comunicação em divulgar o conteúdo dos acordos homologados e a discutível afetação que tudo isso causa à prisão provisória, é inegável que a colaboração premiada tem um papel de destaque na apuração dos delitos, contribuindo, e muito, para a justa e efetiva aplicação do Direito Penal.


9 QUANDO A PUBLICIDADE É ALIADA

No decorrer deste trabalho, foi repetido exaustivamente que a mídia, em seu processo de deturpação de informações, pode acarretar prejuízos à persecução penal.

Contudo, não se pode esquecer do fato de que a publicidade tem lá sua utilidade e pode sim ser aliada do processo criminal.

Um exemplo, que pode ser observado na fase investigatória, é o retrato falado:

Exemplo interessante de situação em que a publicidade – e não o sigilo – passa a ser essencial à eficácia das investigações policiais diz respeito à hipótese em que as autoridades policiais dispõem do retrato falado do criminoso, porém não sabem sua real qualificação. Nesse caso, é evidente que a publicidade dada ao retrato falado será extremamente importante, já que com a divulgação de tais imagens, talvez seja possível que a polícia venha a obter informações acerca da identificação do agente, assim como dados relativos acerca de sua possível localização.[76]

Conforme exposto acima, a divulgação de imagens de suposto infrator através do mecanismo do retrato falado é um ótimo instrumento ligado à publicidade, para que seja possível a obtenção de dados relativos à localização ou identificação deste.

Com enfoque no contexto atual da sociedade, tem-se outro exemplo de relevo, cuja menção se faz obrigatória neste tópico: a atuação do Juiz Federal Sergio Moro na Operação Lava Jato.

Para tanto, o Magistrado vem prestando um trabalho histórico na contenção da chamada corrupção sistêmica:

Também no evento, o juiz disse que é impossível dimensionar a corrupção no Brasil, mas, com base nos casos já julgados pela Operação Lava Jato, a situação atual indica uma possível prática de "corrupção sistêmica", ressaltando que casos de impunidade no Brasil geram um "ciclo vicioso". "Quando esses casos [de corrupção] são comprovados e a Justiça não dá uma resposta satisfatória, isso acaba sendo um incentivo de comportamento não só para aquela pessoa persistir na prática, mas igualmente às outras pessoas que vão sentir vontade de realizar também. (...) Passa a ver a corrupção como algo normal e, aí, ganha essa escala [de corrupção sistêmica]." Juiz Sergio Moro diz que Brasil tem 'corrupção sistêmica' e que não existe 'bala de prata' para resolvê-la.[77]

Analisando o sucesso da Operação Mãos Limpas (ou Mani Pulite) na Itália, o Juiz Sergio Moro escreveu um artigo no qual ressaltou que o recorrente fluxo de revelações sobre as investigações através da imprensa manteve o interesse do público elevado e os líderes partidários na defensiva.

Destacou:

A publicidade conferida às investigações teve o efeito salutar de alertar os investigados em potencial sobre o aumento da massa de informações nas mãos dos magistrados, favorecendo novas confissões e colaborações. Mais importante: garantiu o apoio da opinião pública às ações judiciais, impedindo que as figuras públicas investigadas obstruíssem o trabalho dos magistrados, o que, como visto, foi de fato tentado. Há sempre o risco de lesão indevida à honra do investigado ou acusado. Cabe aqui, porém, o cuidado na desvelação de fatos relativos à investigação, e não a proibição abstrata de divulgação, pois a publicidade tem objetivos legítimos e que não podem ser alcançados por outros meios. As prisões, confissões e a publicidade conferida às informações obtidas geraram um círculo virtuoso, consistindo na única explicação possível para a magnitude dos resultados obtidos pela operação mani pulite.[78]

Como visto no excerto citado, o apoio da sociedade, conseguido através da mídia, obsta que as figuras públicas, que detêm grande poder de influência, impeçam o trabalho dos magistrados.

Na mesma obra, ressaltou também que é através da opinião pública esclarecida que se é capaz de enfrentar as causas da corrupção:

É a opinião pública esclarecida que pode, pelos meios institucionais próprios, atacar as causas estruturais da corrupção. (...) a punição judicial de agentes públicos corruptos é sempre difícil, se não por outros motivos, então pela carga de prova exigida para alcançar a condenação em processo criminal. (...) a opinião pública pode constituir um salutar substitutivo, tendo condições melhores de impor alguma espécie de punição a agentes públicos corruptos, condenando-os ao ostracismo.[79]

A estratégia de Moro tem se mostrado extremamente eficaz, porque encontrou na mídia uma grande aliada para escancarar as atrocidades que têm sido praticadas na política, cercando, assim, os infratores, os quais, por possuírem grande poder de influência política e econômica acabavam por, até então, permanecer impunes.

Porém, com o enorme apoio social que conseguiu através da divulgação de informações pontuais ao povo, o magistrado conseguiu mobilizar multidões de manifestantes, descontentes com o governo, fato que, posteriormente desembocou na abertura de um processo de impeachment da então Presidente Dilma Rousseff.

Para contextualizar, segue texto retirado de livro que trata sobre os bastidores da Operação e demonstra uma suposta tentativa do Ex-Presidente Lula de obter o benefício do foro por prerrogativa de função, para, em tese, fugir da jurisdição de Moro:

O governo negou que tivesse essa intenção. A presidente Dilma deu uma entrevista naquela tarde, afirmando que o ex-presidente fora indicado para fortalecer o governo, e não em busca da prerrogativa de foro. “A troco de quê eu vou achar que a investigação do juiz Sergio Moro é melhor do que a investigação do STF?”, questionou. O anúncio da ida de Lula para o ministério parecia ser a notícia do dia, e as redações dos jornais trabalhavam em cima desse fato. No fim da tarde, alguns manifestantes se dirigiram ao Palácio do Planalto para protestar contra a nomeação. Foi quando estourou a bomba. O juiz Sergio Moro suspendera o sigilo dos diálogos gravados pela escuta legal decretada por ele nos telefones de Lula, de sua esposa, Marisa Letícia, de seu filho Fábio Luís, do Instituto Lula e da LILS Palestras. A Globonews foi a primeira a dar a notícia. Logo as transcrições e os áudios começaram a ser acessados pela imprensa no sistema que divulga todos os atos públicos do processo. Em uma conversa, que ocorrera naquele mesmo dia, aparecia a presidente Dilma Rousseff falando com o ex-presidente Lula. Ela também tinha sido gravada. O telefonema foi às 13h32:

– Alô – diz Dilma.

– Alô – responde Lula.

– Lula, deixa eu te falar uma coisa.

– Fala, querida. Ahn.

– Seguinte, eu tô mandando o ‘Bessias’ junto com o papel pra gente ter ele, e só usa em caso de necessidade, que é o termo de posse, tá?! – diz Dilma.

– Uhum. Tá bom, tá bom – responde Lula.

– Só isso, você espera aí que ele tá indo aí.

– Tá bom, eu tô aqui, fico aguardando.

– Tá?!

– Tá bom.

– Tchau.

– Tchau, querida – despede-se o ex-presidente.

A divulgação dessa conversa teve a força de mobilizar multidões. A questão que se impunha era: a presidente estava obstruindo a Justiça? Por que mandara o subchefe de assuntos jurídicos da Casa Civil, Jorge Messias (que na transcrição aparece como Bessias), levar o termo de posse para Lula no aeroporto? Nas ruas de Brasília, a manifestação rapidamente engrossou. Ao ouvir a conversa no rádio, na TV ou na internet, as pessoas saíam do trabalho e iam para o Palácio do Planalto. No começo da noite, eram mais de 5 mil que gritavam em coro na frente da sede do governo o imperativo do verbo renunciar: “Renuncia! Renuncia!” No Congresso, os oposicionistas repetiam a palavra de ordem das ruas. Além do Distrito Federal, os protestos se espalharam por 19 estados. A avenida Paulista, palco dos maiores atos contra a corrupção e a favor do impeachment, foi tomada por manifestantes. Mas aquele não era o único diálogo estarrecedor. Havia outros. Muitos outros. Com a divulgação dos áudios, as redações passaram a trabalhar em ritmo frenético. Apresentadores davam a notícia espantados. Em seu despacho, ao interromper a escuta legal, Sergio Moro disse estar agindo naquele caso exatamente como em todos os outros, suspendendo o sigilo e tornando os autos públicos para propiciar “não só o exercício da ampla defesa pelos investigados, mas também o saudável escrutínio público entre a atuação da Administração Pública e da própria Justiça Ciminal”. E concluiu: “A democracia em uma sociedade livre exige que os governados saibam o que fazem os governantes, mesmo quando estes buscam agir protegidos pelas sombras”.[80]

Assim, os meios de comunicação podem ser muito úteis, desde que utilizados com critérios pela justiça, podendo, inclusive, ajudar no trabalho do Poder Judiciário de prender infratores que possuem grande poder, especificamente os que ostentam grande influência política e que causam os maiores males à população, ante os desvios de quantias públicas extraordinariamente grandes, as quais poderiam ser implementadas nos serviços prestados à saúde e educação.


CONCLUSÃO

Durante a realização deste trabalho, foi possível concluir que o sistema adotado no Brasil, para regular a prisão preventiva é extremamente precário e encontra dissonâncias em relação aos parâmetros que se encontram estabelecidos no texto da Constituição da República de 1988.

É notório que a decretação da medida cautelar restritiva de liberdade, em qualquer fase da persecução penal, é de extrema gravidade para o suposto agente delituoso, em razão do inegável sofrimento a que fica exposto o indivíduo (investigado ou acusado) sujeito à custódia preventiva.

Isso somado à precariedade das penitenciárias deste país, cuja função de reinserção do criminoso no meio social foi extinta.

Não há como sair reabilitado de “escolas do crime”, como são conhecidos os cárceres brasileiros.                     

Não bastasse isto, a sociedade também não entende o caráter preventivo do recolhimento, o que acarreta ao réu certas “sanções extrapenais”, ante o estigma de culpado que passa a ser atribuído ao preso cautelar, o qual passa, consequentemente, a ser segregado pela população.

Por não ser uma medida inofensiva, portanto, é que a constrição de liberdade apenas deve ser utilizada em situações excepcionais, quando evidente que as demais cautelares são insuficientes.

No entanto, não é este cenário que vem sendo apresentado atualmente na realidade deste país.

O recolhimento à prisão provisória vem sendo constantemente banalizado pelos aplicadores do Direito.

Isto vem sendo acarretado por diversas razões: medo generalizado imposto pelas notícias sensacionalistas da mídia; pressão popular; ou razões de convicção do julgador, que, ao arrepio do princípio do in dubio pro reo, na dúvida, prefere condenar.

Esta atitude de tomar a preventiva como regra desfigurou o instituto e só ocorre em razão da generalidade dos pressupostos cautelares contemporâneos insculpidos no Código de Processo Penal.

Os dispositivos legais autorizadores da custódia processual amplificam em demasia as significações de seus vocábulos, possibilitando a heterogeneidade de interpretações e infringindo o princípio constitucional da legalidade.

Neste contexto, resta à doutrina e à jurisprudência a difícil tarefa de delimitar os prazos e definir os parâmetros de abrangência dos requisitos autorizadores da manutenção da segregação preventiva.  

Porém, doutrina e jurisprudência não possuem a mesma força de aplicação a casos gerais e abstratos como ostenta a lei.

Diante disso, faz-se necessária uma nova reforma legislativa sobre o assunto, com a inserção de fundamentos claros e exatos a justificar a prisão, capazes de deixar a mínima margem possível de discricionariedade ao julgador.

A situação da ausência de prazo máximo para a custódia preventiva é ainda mais dramática que a indefinição de seus requisitos.

O poder do Estado é limitado pela lei e pelas garantias constitucionais.

A isto dá-se o nome de garantismo, cuja função é assegurar ao povo proteção contra os arbítrios estatais.

No entanto, infelizmente, quando a legislação é vaga, quem acaba sofrendo são os cidadãos.

Não são raros os casos de presos provisórios que foram esquecidos por décadas pelo Poder Judiciário em suas celas, durante o trâmite eterno de seus processos, e, ao final, ainda foram absolvidos.

Isso é um absurdo, que não pode mais se perpetuar no ordenamento jurídico em que estamos inseridos.

Infelizmente, mesmo com a modificação realizada pela Lei n° 12.403, de maio de 2011, este quadro não mudou.

Não se pode esquecer, além do mais, da influência desempenhada na persecução penal pelos meios de comunicação de massa.   

A mídia adora veicular informações relacionadas à prática delituosa e, para isso, reveste os fatos de sensacionalismo e desvirtua a informação de sua realidade, para chamar mais a atenção da população e atingir objetivos políticos e econômicos.

Contudo, esta prática não é inofensiva e acarreta aos cidadãos um medo generalizado e uma sensação de impunidade.

Ato contínuo, a sociedade, em choque e já condenando o, até então, investigado, passa a exigir a imediata imposição da constrição de liberdade.

Essa pressão, inevitavelmente, repercute na decisão do juiz, mesmo que de forma inconsciente, podendo causar prejuízos ao exercício da jurisdição.

Surge, então, como tarefa à adequada apreciação do caso concreto a adoção, por parte do magistrado, de uma atitude ininterrupta de desconfiança a respeito de suas verdades e antecipações, bem como das divulgações midiáticas, com o intuito de minimizar o máximo possível a contaminação de suas sentenças com as suas próprias concepções morais ou com a opinião popular, assumidas, à primeira vista, como verdades.

Ainda, a função empresarial dos noticiários não deve se sobrepor, em hipótese alguma, à função social de informar.

Logo, deve o Estado fazer uso das prerrogativas a ele inerentes, para exigir dos meios de comunicação de massa a divulgação de notícias de cunho objetivo, em particular quando relacionadas com o Direito Penal.

Uma via para isto poderia ser a implementação de políticas de redução da carga tributária, a qual satisfaria, em parte, o interesse econômico das instituições jornalísticas, que, em troca, exerceriam suas atribuições nos limites estabelecidos pelo controle efetuado pelo ente estatal.

Ademais, seria útil também a exigência de conhecimento jurídico, mesmo que mínimo, por parte das empresas responsáveis pela divulgação de fatos criminais, com a finalidade de erradicar as aberrações jurídicas que são ditas e escritas com frequência nos meios de comunicação.

Por fim, teria enorme utilidade a criação de normas regulamentadoras da publicidade dos atos judiciais, cujas sanções pela distorção dos fatos propagados responsabilizariam civil e penalmente o infrator, já que a liberdade de informar, somente é assegurada pela Magna Carta quando associada à veracidade.

E, para garantir efetividade às regras instituídas, deveria o Estado criar um órgão para a fiscalização e o controle da atuação dos meios de comunicação de massa, na divulgação das notícias relacionadas com a atuação do Poder Judiciário, em especial quando o tema tratado for referente à apuração do cometimento de crimes ou à decretação ou manutenção da segregação preventiva.

Em suma, as medidas expostas permitirão um convívio mais equilibrado entre a mídia e o Poder Judiciário, bem como uma maior adequação da prisão preventiva com os preceitos contidos na Constituição Federal, trazendo mais segurança jurídica ao Direito Processual Penal e, reflexamente, aos cidadãos.


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Notas

[1] PAULO, Vicente e ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado. 15 ed. São Paulo: Editora Método, 2016, p. 182

[2] LIMA, Renato Brasileiro. Manual De Processo Penal - Volume Único. 4 ed. Bahia: Editora Juspodivm, 2016, p. 880-881

[3] PAULO, Vicente e ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado. 15 ed. São Paulo: Editora Método, 2016, p. 188

[4] SZNICK, Valdir. Liberdade, prisão cautelar e temporária. 2 ed. São Paulo: Editora LEUD, 1995, p. 288

[5] LIMA, Renato Brasileiro. Código de Processo Penal Comentado. 1 ed. Bahia: Editora Juspodivm, 2016, p. 934

[6] PACELLI, Eugênio e FISCHER, Douglas. Comentários ao Código de Processo Penal e sua jurisprudência. 6 ed. São Paulo: Editora Atlas, 2013, p. 641

[7] PACELLI, Eugênio e FISCHER, Douglas. Comentários ao Código de Processo Penal e sua jurisprudência. 6 ed. São Paulo: Editora Atlas, 2013, p. 645

[8] LIMA, Renato Brasileiro. Código de Processo Penal Comentado. 1 ed. Bahia: Editora Juspodivm, 2016, p. 860

[9] LIMA, Renato Brasileiro. Código de Processo Penal Comentado. 1 ed. Bahia: Editora Juspodivm, 2016, p. 863

[10] RHC 69.781/ES, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 30/06/2016, DJe 03/08/2016

[11] LIMA, Renato Brasileiro. Código de Processo Penal Comentado. 1 ed. Bahia: Editora Juspodivm, 2016, p. 866

[12] PACELLI, Eugênio e FISCHER, Douglas. Comentários ao Código de Processo Penal e sua jurisprudência. 6 ed. São Paulo: Editora Atlas, 2013, p. 847

[13] OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de processo penal. 12 ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2009, p. 648

[14] DELMANTO JUNIOR, Roberto. As modalidades de prisão provisória e seu prazo de duração. 2 ed. Rio de Janeiro: Editora: Renovar, 2001, p. 264

[15] DELMANTO JUNIOR, Roberto. As modalidades de prisão provisória e seu prazo de duração. 2 ed. Rio de Janeiro: Editora: Renovar, 2001, p. 264

[16] LOPES JUNIOR, Aury. Direito Processual Penal e sua Conformidade Constitucional. 5 ed. Rio de Janeiro: Editora: Lumen Juris, 2010, p.166

[17] LIMA, Renato Brasileiro. Manual De Processo Penal - Volume Único. 4 ed. Bahia: Editora Juspodivm, 2016, p. 954

[18] LIMA, Renato Brasileiro. Manual De Processo Penal - Volume Único. 4 ed. Bahia: Editora Juspodivm, 2016, p. 956-959

[19] RHC 72.569/RN, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 23/08/2016, DJe 09/09/2016

[20] TJPR - 5ª C.Criminal - HCC - 1546553-3 - Ponta Grossa -  Rel.: Jorge Wagih Massad - Unânime -  - J. 30.06.2016

[21] LOPES JUNIOR, Aury. Direito Processual Penal e sua Conformidade Constitucional. 5 ed. Rio de Janeiro: Editora: Lumen Juris, 2010, p. 210

[22] MACHADO, Alberto Antônio. Prisão Preventiva. São Paulo: Editora Acadêmica, 1993, p. 66

[23] LIMA, Renato Brasileiro. Código de Processo Penal Comentado. 1 ed. Bahia: Editora Juspodivm, 2016, p. 881

[24] TÁVORA, Nestor e ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 11 ed., Bahia: Editora Juspodivm, 2016, p. 1266

[25] LIMA, Renato Brasileiro. Código de Processo Penal Comentado. 1 ed. Bahia: Editora Juspodivm, 2016, p. 884

[26] STJ - HC 214.049-SP, Rel. originário Min. Nefi Cordeiro, Rel. para acórdão Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 5/2/2015, DJe 10/3/2015.

[27] Tasse, Adel El. A volta da "execução provisória" da pena. Disponível em <http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI234134,11049-A+volta+da+execucao+provisoria+da+pena> acesso em 06 de setembro de 2016.

[28] HC 359.996/RJ, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 16/08/2016, DJe 05/09/2016

[29] CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Principais Julgados do STJ e STF comentados 2015. 1 ed. Manaus: Editora Dizer o Direito, 2016, p. 1302-1303

[30] PAULO, Vicente e ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado. 15 ed. São Paulo: Editora Método, 2016, p. 456-457

[31] PAULO, Vicente e ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado. 15 ed. São Paulo: Editora Método, 2016, p. 456-457

[32]CUNHA, Rogério Sanches e PINTO, Ronaldo Batista.  Crime Organizado - Comentários à Nova Lei Sobre Crime Organizado (Lei n. 12.850/13). 1 ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2013, p. 18.

[33] CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Principais Julgados do STJ e STF comentados 2015. 1 ed. Manaus: Editora Dizer o Direito, 2016, p. 1307

[34] VIEIRA, Ana Lúcia Menezes. Processo Penal e Mídia. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 27

[35] THOMPSON, John B.. A mídia e a modernidade: uma teoria social da mídia. Petrópolis: Editora Vozes, 1998, p. 33

[36] CAPPARELLI, Sérgio; LIMA, Venício Artur de. Comunicação e televisão: desafios da pós-globalização. São Paulo: Editora Hacker, 2004, p. 83

[37] MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 32 ed. São Paulo: Editora Atlas, 2016, p. 121

[38]LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. (iBooks) 20 ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2016, p. 2876-2875

[39] MASSON, Nathalia. Manual de Direito Constitucional. 3 ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2015, p. 1272

[40] REsp 1243699/RJ, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 21/06/2016, DJe 22/08/2016

[41]ARAUJO, Luiz Alberto David. Curso de direito constitucional. 14. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2010 p. 166

[42]ARAUJO, Luiz Alberto David. Curso de direito constitucional. 14. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2010 p.168

[43]ARAUJO, Luiz Alberto David. Curso de direito constitucional. 14. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2010 p. 169-170

[44]SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 33.ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2010 p. 247

[45] LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. (iBooks) 20 ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2016, p. 3011

[46] VIEIRA, Ana Lúcia Menezes. Processo Penal e Mídia. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 130- 131

[47] VIEIRA, Ana Lúcia Menezes. Processo Penal e Mídia. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 131

[48] NATALINO, Marco Antonio Carvalho. O discurso do telejornalismo de referência: criminalidade violenta e controle punitivo. São Paulo: Editora IBCCRIM, 2007. p. 80

[49]VIEIRA, Ana Lúcia Menezes. Processo Penal e Mídia. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003 p. 34

[50] VEIGA, Zaclis. Telejornalismo e violência social: a construção de uma imagem. Curitiba: Editora Pós-Escrito, 2002, p. 44

[51]BUCCI, Eugênio; KEHL, Maria Rita. Videologias: ensaios sobre televisão. São Paulo: Editora Boitempo, 2004, p. 127

[52]BUCCI, Eugênio; KEHL, Maria Rita. Videologias: ensaios sobre televisão. São Paulo: Editora Boitempo, 2004, p.131

[53]BUCCI, Eugênio; KEHL, Maria Rita. Videologias: ensaios sobre televisão. São Paulo: Editora Boitempo, 2004, p.130

[54]  MORETZSOHN, Sylvia. A lógica do jornalismo impresso na era do “tempo real”. Discurso Sedicioso: Crime, Direito e Sociedade, Rio de Janeiro: Freitas Bastos: Instituto Carioca de Criminologia, ano 4, número 7, 1999 p. 263

[55] VEIGA, Zaclis. Telejornalismo e violência social: a construção de uma imagem. Curitiba: Pós-Escrito, 2002 p.51

[56] VIEIRA, Ana Lúcia Menezes. Processo Penal e Mídia. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 46

[57] ANDRADE, Fabio Martins de. Mídi@ e poder judiciário: a influência dos órgãos da mídia no processo penal brasileiro. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2007 p. 20

[58]VIEIRA, Ana Lúcia Menezes. Processo Penal e Mídia. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p.59

[59] ANDRADE, Fabio Martins de. Mídi@ e poder judiciário: a influência dos órgãos da mídia no processo penal brasileiro. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2007 p. 95

[60] MARRAFON, Marco Aurélio. Quadro mental paranoico não pode imperar na solução de casos jurídicos (publicado em 14/07/2014), disponível em <http://www.conjur.com.br/2014-jul-14/constituicao-poder-quadro-mental-paranoico-nao-imperar> acesso em: 02 de setembro de 2016

[61] MARRAFON, Marco Aurélio. Quadro mental paranoico não pode imperar na solução de casos jurídicos (publicado em 14/07/2014), disponível em <http://www.conjur.com.br/2014-jul-14/constituicao-poder-quadro-mental-paranoico-nao-imperar> acesso em: 02 de setembro de 2016

[62] ROSA, Alexandre Morais da; KHALED JR, Salah H.. In dubio pro hell: o princípio mal-dito do processo penal. Disponível em <http://justificando.com/2014/07/08/dubio-pro-hell-o-principio-mal-dito-processo-penal/> acesso em 02 de setembro de 2016.

[63] ROSA, Alexandre Morais da; KHALED JR, Salah H.. In dubio pro hell: o princípio mal-dito do processo penal. Disponível em <http://justificando.com/2014/07/08/dubio-pro-hell-o-principio-mal-dito-processo-penal/> acesso em 02 de setembro de 2016.

[64] TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 11 ed., Bahia: Editora Juspodivm, 2016, p. 45

[65] ANDRADE, Fabio Martins de. Mídi@ e poder judiciário: a influência dos órgãos da mídia no processo penal brasileiro. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2007, p. 124

[66] NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. (iBooks), 2015, p. 367.

[67] SOUZA, Artur César de. A decisão do juiz e a influência da mídia. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 153

[68] SOUZA, Artur César de. A decisão do juiz e a influência da mídia. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p.166

[69] ANDRADE, Fabio Martins de. Mídi@ e poder judiciário: a influência dos órgãos da mídia no processo penal brasileiro. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2007, p.306

[70] SOUZA, Artur César de. A decisão do juiz e a influência da mídia. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 215-220

[71] PRADO, Geraldo L. M. Opinião pública e processo penal. In: PRADO, Geraldo L.M; VIANNA, Guaraci de Campos; SANTOS, Willian Douglas Resinente dos (Org). Ensaios Críticos sobre Direito Penal e Direito Processual Penal. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, p. 106

[72] NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. Rio de janeiro: Editora Forense. 2016, p.452-453

[73] ROSÁRIO, Miguel do. Resposta a Vladimir Aras e à sua defesa da delação premiada. Publicado em 13/05/2015. Disponível em: <http://www.brasil247.com/pt/247/artigos/180798/Resposta-a-Vladimir-Aras-e-%C3%A0-sua-defesa-da-dela%C3%A7%C3%A3o-premiada.htm> acesso em 02 de setembro de 2016.

[74] LEMOS, Bruno Espiñeira. Delação premiada e prisão preventiva: (não estamos em Berlim). Publicado em 15/04/2016. Disponível em: http://canalcienciascriminais.com.br/delacao-premiada-e-prisao-preventiva-nao-estamos-em-berlim/ acesso em: 02 de setembro de 2016.

[75] MORO, Sérgio Fernando. A justiça e os decaídos. Publicado em 31 de maio de 2016. Disponível em: < http://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,a-justica-e-os-decaidos,10000054313> acesso em 02 de setembro de 2016.

[76] LIMA, Renato Brasileiro. Manual De Processo Penal - Volume Único. (Ebooks) 4 ed. Bahia: Editora Juspodivm, 2016, p. 787-788

[77] BELLONI, Luiza. Juiz Sergio Moro diz que Brasil tem 'corrupção sistêmica' e que não existe 'bala de prata' para resolvê-la. Publicado em 23 de maio de 2016. Disponível em: <http://www.brasilpost.com.br/2016/05/23/sergio-moro-corrupcao-no-brasil_n_10108022.html> Acesso em 02 de setembro de 2016

[78] MORO, Sergio Fernando. Considerações sobre a Operação Mani Pulite. 2004, p. 4. Disponível em: <http://jornalggn.com.br/sites/default/files/documentos/art20150102-03.pdf> Acesso em: 02 de setembro de 2016.

[79] MORO, Sergio Fernando. Considerações sobre a Operação Mani Pulite. 2004, p. 3. Disponível em: <http://jornalggn.com.br/sites/default/files/documentos/art20150102-03.pdf> Acesso em: 02 de setembro de 2016.

[80] NETTO, Vladimir. Lava Jato: o juiz Sergio Moro e os bastidores da operação que abalou o Brasil. Rio de Janeiro: Editora Primeira Pessoa, 2016, p. 356-360



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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CECHINEL, Liliana. A ingerência dos meios de comunicação na prisão preventiva. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5128, 16 jul. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/58882. Acesso em: 24 abr. 2024.