Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/63736
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

Gestão judiciária e voluntariado: a experiência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) na criação do Núcleo do Voluntariado

Gestão judiciária e voluntariado: a experiência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) na criação do Núcleo do Voluntariado

Publicado em . Elaborado em .

A construção do modelo de gestão pelo voluntariado deve ser realizada em conjunto pelos voluntários e pelos destinatários dos serviços, através da ação social catalisada pela organização do Tribunal de Justiça de Minas Gerais em colaboração com os demais parceiros da rede de voluntariados.

Resumo: O trabalho tem por objetivo discutir as diretrizes de um modelo de gestão judiciária que tenha entre os seus fundamentos o voluntariado, tendo como foco a experiência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais na construção da rede de voluntariados, justificado na missão do Poder Judiciário: realizar Justiça, bem como na sua visão: ser reconhecido pela sociedade como instrumento efetivo da realização da justiça. A construção do modelo de gestão pelo voluntariado deve ser realizada em conjunto pelos voluntários e pelos destinatários dos serviços, através da ação social catalisada pela organização do Tribunal de Justiça de Minas Gerais em colaboração com os demais parceiros da rede de voluntariados.

Palavras-chave: Voluntariado; Gestão judiciária; Justiça; Poder Judiciário.


1 Introdução

Pode-se entender o processo de negócio como um conjunto de atividades relacionado com o objetivo essencial da organização. Pois bem, a organização Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), como parte do Poder Judiciário, tem a sua missão vinculada a uma virtude: a Justiça. Assim, entre os propósitos do TJMG estão a prestação jurisdicional e as ações de modificação social.

Para tanto, foi firmado pelo TJMG Memorando de Entendimento (MoU), assinado em 9 de maio de 2016, com o Programa de Voluntários das Nações Unidas (VNU), administrado pelo Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (PNUD), órgão subsidiário das Nações Unidas, e criado o Núcleo de Voluntariado do TJMG (NV/TJMG), através da Portaria Conjunta nº 543/PR/2016.

O objetivo do programa está consubstanciado no desencadeamento de um processo de posicionamento do sistema de voluntariado na vanguarda da gestão orientada para a responsabilidade social. Para tanto, é buscada a construção de um modelo de gestão que leve em conta entre os seus fundamentos a prática do Voluntariado, como forma de estimular a criatividade e o sentimento de pertencimento dos componentes da organização, além de possibilitar que o modelo gerencial do TJMG se adeque à ampla missão do Poder Judiciário.

Aguarda-se, de forma ambiciosa, que a maior parte dos componentes do TJMG, e não apenas aqueles engajados em ações sociais, tenham contato com a cultura do voluntariado a ser implementada durante o processo de educação da organização, permitindo o maior envolvimento dos servidores de todos os níveis e estimulando a apresentação de soluções criativas para os obstáculos que periodicamente surgirão. Em relação à sociedade, da mesma forma, há que se perceber que os resultados sociais e a  consolidação de conquistas civilizatórias em muito ultrapassam o conceito binário de produtividade – input/output – assim como superam o mero registro de resultados – income – tendo os efeitos do processo benefícios vários para a sociedade, em seus diversos segmentos, auxiliando na construção de políticas públicas, na universalização do acesso ao Poder Judiciário como instrumento de garantia de direitos sociais e na melhoria na eficiência do processo de gestão judiciária.

O trabalho que se apresenta segue o caminho da justificativa da construção de um modelo de gestão no âmbito do TJMG estruturado no voluntariado, com atuação complementar, solidária e inovadora em relação à política de gestão por resultados já adotada pelo TJMG. Primeiro será discutido o Voluntariado, como prática social transformadora e atividade vinculada à missão do poder Judiciário. Em um segundo momento, o diálogo que se propõem alcança as adaptações nos princípios, normas e funções gerenciais para o Voluntariado, o cenário encontrado na organização, bem como os questionamentos jurídicos que se apresentam em um sistema de rede com participação de órgãos públicos. Por fim, será apresentada a experiência que está a se iniciar no TJMG.


2 O voluntariado como caminho ético necessário para refundar a missão do Poder Judiciário

O objetivo do Poder Judiciário, por meio das organizações que o compõem, está vinculado à sua missão: realizar justiça. Na linha aristotélica, a justiça é destacada como virtude ética, pois é a única que se relaciona com o outro.

Por consequência, o propósito da organização Tribunal de Justiça de Minas Gerais, como parte do Poder Judiciário, está atrelado à sua missão e, portanto, conclui-se que as suas ações sociais transcendem a prestação jurisdicional para alcançarem as ações de modificação social.

Em um discurso de supremacia judicial, com ascendência da Constituição como norma fundamental e o Poder Judiciário como seu guardião primeiro, princípios como da dignidade da pessoa (inciso III do art. 1º da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988) e do objetivo de erradicação da pobreza e da marginalização imposto à República Brasileira (inciso III do art. 3º da Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988), dos quais decorrem a noção de mínimo existencial, assumem particular relevo na estruturação do propósito das organizações que constituem o Poder Judiciário.

O próprio Supremo Tribunal Federal adotou uma posição protagonista ao decidir o caso ADPF – RG 347 (2015) e justificar a intervenção do Poder Judiciário para viabilizar o acesso a direitos injustamente recusados pelo Estado, com uma ação assertiva e catalisadora, quando tal implicar em ameaça ao mínimo existencial e, portanto, violação de direitos fundamentais.

Não se deve olvidar, ademais, que o Brasil é signatário da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro pelo Decreto Federal nº 678, de 6 de novembro de 1992, que reconhece o propósito de consolidar, dentro do quadro das instituições democráticas, um regime de liberdade pessoal e de justiça social, fundado no respeito dos direitos essenciais do homem.

E, como já constante no Memorando de Entendimento firmado pelo TJMG com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), se a Missão do Poder Judiciário é a realização da Justiça, a sua Visão se concretiza no reconhecimento pela sociedade das organizações do Poder Judiciário como instrumentos efetivos de justiça, equidade e paz social, expressando para tanto a responsabilidade social como atributo de valor para a sociedade, associadas às diretrizes do Planejamento Estratégico de cada Tribunal, alinhadas com metas nacionais editadas pelo Conselho Nacional de Justiça (“CNJ”), que ressaltam a postura e adoção de práticas, ações e iniciativas em benefício da sociedade e dos mais vulneráveis.

Em regra, o auxílio organizacional é iniciado através de uma linha assistencialista, passando pela filantropia, pelo voluntariado clássico até chegar ao voluntariado transformador. Um longo caminho que segue a ideia de ultrapassar a busca pela contenção das vulnerabilidades emergenciais dos assistidos para atingir uma ação transformadora, com o incremento das potencialidades dos partícipes do processo que o construirão em conjunto.

O assistencialismo puro pode potencialmente perpetuar uma situação de falta de vitalidade do necessitado, embora seja emergencialmente necessário. Já a filantropia pode tanto ter a roupagem de benemerência quanto assumir uma ação modificadora próxima do voluntariado clássico ou semelhante ao empreendedorismo social. O voluntariado clássico, por sua vez, busca desenvolver vínculos de solidariedade entre os indivíduos que o abraçam, assim como liames de confiança e reciprocidade entre os afetados, tendo o condão de transformar a vida dos vulneráveis e de combater as desigualdades sociais através das contribuições sociais e econômicas que produz, como não deixa de ser a linha do próprio Programa dos Voluntários das Nações Unidas (UNV).

Aliás,  expresso no Memorando de Entendimento firmado pelo TJMG com a ONU, estão entre os escopos da atividade do voluntariado a busca pelos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), refletido na aprovação no âmbito da ONU da Declaração Transformando Nosso Mundo, não perdendo de vista que a Agenda de Desenvolvimento 2030 para o Desenvolvimento Sustentável contempla a erradicação da pobreza e da fome; o bem-estar de todos; a igualdade de gênero, o acesso igualitário e de qualidade à educação; a melhoria dos assentamentos humanos; a promoção do desenvolvimento econômico sustentável e inclusivo; a preservação do meio ambiente em todas as suas dimensões e a redução da desigualdade entre os países e dentro deles.

Não se deve olvidar, todavia,  das pertinentes  críticas de BEZERRA (2009) ao voluntariado contemporâneo clássico, que enfatiza uma solidariedade indiferenciada, egótica e singularizada na ação do voluntário, esse que se entende como prático de ações de cidadania ao conceder pontualmente ao outro bens e serviços sociais emergenciais, que não se traduzem em direitos sociais e acabam por perpetuar o distanciamento de segmentos pauperizados do conflito democrático legítimo e indispensável à conquista da cidadania social.

No mesmo diapasão, TELLES (1999) acrescenta que direitos sociais não se resumem às respostas laterais às necessidades emergenciais, pois a cidadania é construída também no dissenso, porquanto o conflito democrático é essencial na construção da cidadania social, sendo necessário para tanto a participação de todos, não só dos que se voluntariam, na deliberação das políticas públicas que a todos afetarão.

É importante que se diga, na linha do pensamento de MINTZBERG, AHLSTRAND e LAMPEL (2010), que a formulação da estratégia na administração é fruto de um aprendizado constante, forjada na interação social, cooperação e no próprio conflito.

Assim o mote do voluntariado transformador deve ultrapassar as concepções clássicas, com a incorporação à sua natureza da necessidade de não só trabalhar PARA o Outro, mas, sim, construir COM os demais afetados pela ação organizada um processo de gestão que possibilite o acesso a direitos e a edificação de políticas públicas inclusivas.

Em verdade, em um mundo em constante e rápida transformação, em pleno Völkerwanderun[1] pós-moderno, onde milhões de pessoas precisam de assistência para sobreviver, o conceito de voluntariado deve ultrapassar o caráter individualista e assistencialista para atingir o patamar de ação participativa e modificadora da sociedade.

Todavia, o reflexo econômico e social do voluntariado clássico é marcante, como se nota pelo estudo realizado por SODRÉ (2012, p. 4), que indica que o voluntariado movimenta cerca de 140 milhões de pessoas em todo o mundo, sendo dezenas de milhões só no Brasil, com uma contribuição econômica que totaliza US$ 400 bilhões por ano, representando, em média, 2,7% do Produto Interno Bruto (PIB) dos países desenvolvidos e cerca de 2% do PIB de países como o Brasil.

Pelo volume de pessoas e recursos movimentados e diante da distorção como política pública na ênfase na autonomia individual do voluntário como preponderante das ações solidárias voltadas ao combate às desigualdades sociais, é necessário um passo à frente.

Os novos tempos exigem um voluntariado bem mais estruturado e comprometido com o objetivo de diminuição da miséria e da pobreza e da preservação do meio ambiente equilibrado, sem que haja a exclusão do Estado como suporte e catalisador das organizações da sociedade civil que promovem o voluntariado e motivador de maior participação social.

A busca é então pelo equilíbrio: a construção de uma rede de voluntariados, constituída por núcleos autônomos em cada organização, privada ou pública como o TJMG, que têm a incumbência de recrutar, organizar e catalisar os esforços voluntários dos seus componentes para iniciativas interna e ações externas conglobantes com os demais parceiros, com  participação efetiva dos destinatários finais, tendo sempre em vista o propósito de transformar positivamente a vida dos segmentos mais vulneráveis da sociedade e potencializar os laços dos voluntários, fortalecendo a missão do Poder Judiciário.

Passemos, aos desafios administrativos e jurídicos encontrados na formação do Núcleo de Voluntariado do TJMG para alcançar tal desiderato.


3 Contribuições do sistema de voluntariado para o planejamento estratégico

Conforme BATISTA (2012), a gestão do conhecimento da administração pública deve buscar produzir resultados efetivos para o cidadão com estrita observância dos princípios básicos da administração pública, preconizados pelo artigo 37 da Constituição da República (1988), tendo em vista o desenvolvimento sustentável.

Na linha de PORTER (1996), a estratégia não deveria ser sobreposta pela eficiência operacional na busca de excelência e na realização de vantagens competitivas sustentáveis, pois as técnicas de gestão transmudam o ambiente de início produtivo, com melhoras nos índices qualitativos, de entrega de resultados, com menor custo, reposição de produtos e manutenção de serviços, em uma luta antropofágica sob as mesmas bases competitivas refletida na convergência competitiva.

Por outro lado, a pasteurização da diferenciação trazida pela imitação e acomodação decorrente do predomínio da eficiência operacional, quando se torna mais fácil copiar e estabilizar do que criar e evoluir, é mitigada quando é enfatizado o posicionamento estratégico, que significa exercer atividades diferentes ou exercer atividades semelhantes de um modo diferente de acordo com os novos desafios que são encontrados.

O planejamento estratégico apresenta o suporte para que as decisões administrativas tenham o risco diminuído perante o ambiente em constante e rápida mutação, podendo, para tanto, envolver os níveis estratégico, gerencial e operacional, lançando mão de um sistema de inteligência compartilhado, flexível, preciso e rápido, amparado por ferramentas de tecnologia da informação e estruturado em rede. Com isso, além de perscrutar com eficiência o ambiente externo, a participação e o estímulo ao sentimento de pertencimento das diversas pessoas que fazem a organização, a cultura, no nosso caso a do voluntariado, é disseminada e ajuda a construir o processo de aprendizado estratégico que definirá não só um novo modelo de liderança e de atuação, mais democrático, estimulante e legítimo, mas também o propósito da organização e a justificativa social de sua existência.

Pois bem, se a escolha é o grande problema da pós-modernidade, a adaptação aos novos ambientes exige a plasticidade do gestor, o reconhecimento das mudanças e da necessidade de trade offs, ou seja, de escolhas de prioridades e compromissos com o consequente sacrifício de outras. E, na esteira de PORTER (1996), é a estratégia, e não a eficiência operacional, o melhor campo para fazer escolhas.

No caso de uma organização como as pertencentes ao Poder Judiciário, que não deveriam estar situadas em um ambiente de competição, pois os serviços devem ser prestados em complementaridade aos demais órgãos governamentais e da sociedade civil, nem deveriam estar vinculados primordialmente à eficiência operacional importada do mercado, o trade off deve ser observado em nova perspectiva, levando em conta o caráter vinculativo e universal do serviço prestado e a percepção da estratégia como mote de inovação e relacionamento com o público estruturas que são potencializadas pelo desenvolvimento do voluntariado organizacional.

Com efeito, o posicionamento baseado em necessidades demonstra a prioridade de adaptação de acordo com a mudança do perfil do jurisdicionado e do reconhecimento da própria missão do Poder Judiciário, com a maior relevância das informações e acesso aos serviços judiciários pelos estratos mais vulneráveis da sociedade, que possuem um arcabouço de direitos, porém não tem como acessá-los.

Não se deve olvidar, igualmente, que a ação finalística para ser bem-sucedida em sua execução deve considerar as expectativas do público estratégico, os stakeholders, com o envolvimento de todos os intervenientes, primando pelo comportamento, ou seja, a lisura do objetivo perseguido é resultado do caminho trilhado.

Por consequência, todos os destinatários dos serviços judiciais e judiciários – inclusive os mais vulneráveis – devem ser considerados stakeholders, notório conceito firmado pelo filósofo Robert Edward Freeman, pois envolvidos em um processo duradouro dos Tribunais, consubstanciado na missão do Poder Judiciário, e, portanto, elementos essenciais ao planejamento estratégico de negócios.

Em verdade, o espectro daqueles que afetam as organizações judiciárias e por ela são influenciados, dos servidores às comunidades, passando pelos fornecedores, mídia, governos e jurisdicionados em geral, tanto pela natureza das operações que realizam quanto em razão do ambiente que partilham, traduzem a essencialidade da atividade judiciária para a estabilidade social, legitimando-a no momento que busca o socialmente desejável para a própria organização e para a sociedade.

O próprio critério de urgência (GU), também definidor dos stakeholders, que no caso dos serviços judiciários se transmuda no conceito de morosidade, ao ser associado ao grau de poder e de legitimidade, deve ser ponderado com a natureza constitucional da própria atividade-fim do Judiciário, que se traduz na realização de uma virtude: a Justiça, e pela busca diuturna da consolidação dos valores civilizatórios.

Assim, no caso da organização judiciária, a sociedade se confunde com o stakeholder definitivo, com ênfase no grau de poder (GP), representado pela influência direta em sua atuação das alterações sociais, seja através do desenvolvimento jurisprudencial, em conta das diferentes situações que chegam às cortes de justiça, seja pela discussão dos recursos que devem ou não ser alocados para a Administração da Justiça. Igualmente, o desejo da atuação dos atores sociais, refletida no grau de legitimidade (GL), está intrinsecamente ligada à própria natureza do Judiciário, pois cabe à sociedade sindicar todos os atos judiciais, com transparência (accountability), para que os mesmos tenham valor. Sem perder de vista que as questões sociais levadas ao Judiciário são, em regra, de alta sensibilidade e criticalidade (GU), tanto que o princípio da efetividade e do tempo de duração razoável do processo foram positivadas exatamente para sedimentar tal assertiva e permitir que os princípios constitucionais, entre eles o do mínimo existencial, não sejam solapados pelo tempo.

O modelo de gestão que se busca nessa sociedade de informação é distinto do racionalista e não se contenta com a ênfase que vem sendo dada na eficiência operacional, com o desenvolvimento de estudos e alocação massiva de recursos em ferramentas não paramétricas, como a Análise Envoltória de Dados (DEA), para a avaliação da eficiência técnica (produtividade) comparativas de Unidades Tomadoras de Decisão (DMU), de acordo com uma relação binária de entradas de recursos e saídas de produtos e serviços (input/output) e, por vezes, de resultados (income).

Em verdade, o imprevisível e o imponderável passaram a ser reconhecidos nas avaliações de certos comportamentos ambientais, assim como a existência de valores intangíveis cuja proteção e garantia passaram a ser resultados desejados. Por conseguinte, transparece a necessidade do estímulo da criatividade e da partilha do conhecimento – que não se confunde com a sua fragmentação – através do estímulo de ações proativas, descentralizadas, com a coordenação dinâmica de núcleos de conhecimento ligados em rede formados por pessoas que partilham propósitos organizacionais semelhantes e direcionados também para finalidades de transformação social.

A estruturação solidária em um desenho de rede, amparado em uma plataforma multifocal, com foco no aprendizado e disseminação da cultura do voluntariado por toda organização como mote estratégico, também serve de instrumento para a consecução dos resultados e traz transformações críticas no sistema de liderança, que deve ser voltada então ao planejamento estratégico e gestão de conhecimento e apta a entender demandas internas, perceber oportunidades, estimular a criatividade dos parceiros em sentido lato, mesmo que em detrimento das rotinas, com vistas a servir de catalisador para o desenvolvimento do capital intelectual, reduzindo as vulnerabilidades e potencializando as virtudes não só no mesossistema e no exosistema, mas também no macrossistema social.

Para tanto, a utilização da tecnologia da informação (TI) e dos sistemas de informação (SI) na gestão pública do voluntariado são essenciais para evitar o desperdício dos recursos alavancados, públicos ou não, não perdendo de vista que a efetividade significa eficiência associada à eficácia, ou seja, resultados com qualidade, evitando-se o retrabalho, o descumprimento de normas e o atraso injustificado, que podem significar em uma situação emergencial a diferença entre o auxílio efetivo  e a consumação de um dano ambiental, social ou familiar permanente.

Aliás, em uma mudança de perspectiva, a interação ultrapassa a função do benchmark como ferramenta para o gestor estratégico de informação obter vantagens comparativas, pois além de os modelos e experiências coletadas na sociedade servirem como inspiração e permitirem o descarte comportamentos desnecessários, propiciando a remodelação de procedimentos gerenciais com o escopo de melhorar a performance, como não se está em um ambiente competitivo, mas, sim, solidário, a ideia de compartilhar as próprias experiências e exportar a expertise adquirida fazem parte do próprio propósito da organização pública.

Diante então da velocidade e integração do fluxo de suprimentos em uma rede solidária, os instrumentos de accountability, possibilitando que a sociedade, o Estado e todos os parceiros possam sindicar toda a gestão, são essenciais. A transparência será tanto mais efetiva quanto forem os stakeholders esclarecidos da necessidade de fiscalização e os instrumentos de comunicação forem de fácil acesso, confiáveis, em linguagem simples e com informações em tempo real.


4 Percepções sobre o cenário administrativo encontrado

A organização Tribunal de Justiça de Minas Gerais, como representativa de outros tribunais de grande porte, possui simbolizando sua estrutura administrativa um organograma simples, sendo também utilizado um design direto para a concepção do Mapa Estratégico, tendo como norte a melhoria na efetividade da prestação jurisdicional, de acordo com a Missão preconizada, e está de acordo com a apresentação de metas, consubstanciadas em macrodesafios.

Assim, mesmo com o salto qualitativo trazido pelo o advento da Resolução nº 823 (2016) sobre o Planejamento e a Gestão Estratégica no âmbito do TJMG, normalmente no âmbito do Poder Judiciário nacional as ações estratégicas enfatizam à diminuição quantitativa do acervo de processos, com ênfase no maior atendimento da demanda, preocupação com o nível de criticidade, resolução de conflitos através da conciliação, fatos que apresentam uma preocupação estatística  não necessariamente vinculada primordialmente à qualidade da prestação jurisdicional, embora não se perca de vista a busca constante do respeito à duração razoável do processo.

O planejamento estratégico e o plano de gestão seguem a busca na efetividade na prestação jurisdicional, através da identificação das tendências atuais e busca de um cenário desejado através da formulação de macrodesafios, porém por vezes peca em concentrar esforços na administração dos efeitos de uma anomalia, em vez de discutir suas causas. Assim, o Poder Judiciário passa de ultima à prima ratio na resolução de conflitos, situação, inclusive, estimulada pelo próprio Judiciário.

A partilha de funções em equipes pequenas e o compartilhamento de rotinas são objetivos comuns das organizações do Poder Judiciário, tendo sido investido uma quantidade importante de recursos para homogeneização das ações, todavia a estrutura é enorme e diversificada, o que dificulta a análise sistemática das informações comparativas, sem contar que o processo de liderança é historicamente concentrado, já que não é conquistado e, sim, concedido por uma autoridade formal.

Os Sistemas apoiam a Estrutura e a Estratégia, mas quando o fluxo e as próprias decisões são adotados de forma concentrada, de cima para baixo, resta maculado o sentimento de pertencimento dos componentes da organização em relação aos seus valores.

De qualquer forma, jurisdicionados e o restante da sociedade se confundem, levando em conta o caráter público das ações do Judiciário e das decisões judicantes, que tem por função, na linha do professor da Universidade Yale Owen FISS (2004), de desempenhar a função no quadro institucional de dar significado aos valores públicos e civilizatórios, inclusive levando em conta o bem-estar das gerações futuras, e não apenas resolver conflitos através da prestação jurisdicional básica.

É certo quanto ao processo de democratização de ideias que o fluxo de decisões concentradas, sem o envolvimento de vários setores da organização na formulação das estratégias, leva ao desperdício de recursos e dificulta a implementação em razão da ausência de pertencimento, não perdendo de vista que a Visão do Poder Judiciário, como se vê na registrada pelo TJMG, deve ser o reconhecimento também interno de excelência de sua atuação.

Todavia, o vínculo ético do TJMG deve levar ao esclarecimento da sociedade sobre a função essencial do Judiciário não só como pilar da Democracia e da própria República, mas como conquista civilizatória, pois, conforme MINTZBERG, AHLSTRAND e LAMPEL (2010), a estratégia é integradora e, por consequência, existe a necessidade de observância dos valores éticos para a sua formulação.

De toda forma, ainda há muito espaço no Poder Judiciário para o posicionamento baseado em valores fundados na ética, acessibilidade, promoção da paz social e da justiça, valorização das pessoas e responsabilidade social, fato que demonstra a necessidade de adaptação de acordo com a mudança do perfil do jurisdicionado e da própria missão do Poder Judiciário, com a maior necessidade de informações e acesso a serviços jurisdicionais  para certos estratos da população, como as pessoas em situação de rua e demais segmentos vulneráveis, que possuem um arcabouço de direitos, porém não tem como acessá-los.

Deve-se buscar um desenvolvimento gerencial integrativo, com ênfase na função e no estudo do processo de mudança e transformação organizacional, dando força ao planejamento e a gestão estratégica, passando-se, então, de forma inversa ao que a realidade nos mostra, a compatibilizar as necessidades sociais às necessidades técnicas das organizações.


4 O Direito fundamentado na justiça: a realização da justiça como propósito da produção normativa e da interpretação judicial e administrativa

A disseminação da cultura do voluntariado na organização de natureza de direito público e a participação desta na Rede Estadual traz desafios jurídicos vários.

Em verdade, as ações internas veiculadas pelo Núcleo do Voluntariado (NV/TJMG) passam pela relação do servidor com a organização TJMG, com efeitos no plano de carreira que estão a exigir alterações normativas. Os obstáculos também devem ser enfrentados na relação do TJMG com os demais parceiros em um ambiente de rede, pois as ações dos órgãos do Poder Judiciário são reguladas e estruturadas legalmente.

No caso da participação do Poder Judiciário na Rede de Voluntariados, há que se perceber a presença de atividade colaborativa que envolve entidades de direito privado e direito público, com transferência de recursos públicos ou não, que se sujeitam ao controle do Estado em razão da natureza jurídica do instrumento seminal, ainda que observando a flexibilidade das ações individualizadas realizadas através de uma plataforma, sobrelevando sempre a orientação humanitária caracterizadora dos fins públicos, qualificados pela natureza da entidade destinatária e da atividade não lucrativa.

Cria-se um ambiente colaborativo que deverá ser estruturado como uma incubadora de projetos, um sítio catalisador de ideias e um facilitador de encontros entre entidades do Primeiro, Segundo e Terceiro Setor, mas sem se olvidar que a presença de organizações públicas altera o regime jurídico dos relacionamentos que serão construídos.

Com efeito, a toada que seguem as parcerias públicas leva à formalização dos interesses convergentes através de consórcios públicos e convênios, não perdendo de vista que em relação a estes não se admite a realização de despesas a título de administração, mas se faz necessária a realização de prévio processo licitatório, de acordo com os artigos 37, XXI, e 241 da Constituição da República (1988) e artigo 116 da Lei nº 8.666/1993.

Por outro lado, é bom que se diga que as organizações de natureza de direito privado que amparam as ações voluntárias são corriqueiramente pertencentes ao Terceiro Setor e, por conseguinte, estão, em regra, submetidas ao respectivo marco regulatório construído pelo advento da Lei nº 13.019/2014, máxime pelo fato de a regulamentação do trabalho voluntário no Brasil, definida pela Lei nº 9.608 (1998), estar voltada primordialmente para a pessoa física prestadora de serviço voluntário.

A crítica levantada por YAZBEK (2000) sobre o crescimento do Terceiro Setor, como sequência de um a política assistencialista dos demais setores, Estado e Mercado, que desloca a questão da pobreza de um espaço politicamente construído de diálogo – e mesmo de dissenso e ação social – para a assepsia da gestão tecnicista filantrópica, é forte, porém se confronta com uma realidade de estruturação de um sem-número de iniciativas socioeconômicas realizadas diuturnamente por organizações não governamentais, como se nota pelo trabalho de  FALCÃO, GUERRA e ALMEIDA (2013). A questão que se sobreleva, então, ainda na esteira de YAZBEK (2000) é como tratar o controle da gestão privada de financiamento público, em um sistema de rede, privilegiando-se a qualidade e não a estatística quantitativa como significativo de eficiência.

Di Pietro (2015) ensina que a regra em se tratando de entidades com personalidade jurídica de direito privado é que o direito público se aplica somente quando existe norma expressa que o determine.

Sem embargo, quando se tratar de manejo e destinação de recursos públicos é necessário se ter em mente os princípios constitucionais da Administração Pública, sendo indispensável a prestação de contas perante a unidade gestora, assegurada a publicidade e a transparência na destinação dos recursos, o que reflete o controle público e social de sua aplicação, como, aliás, já definiu o c. Supremo Tribunal Federal ao tratar do caso ADI 1.923, ao tratar das entidades do Terceiro Setor.

Por consequência, as Organizações Sociais (OS), entidades sem fins lucrativos colaborativas do terceiro setor e que prestam serviços por delegação do Poder Público, em regime jurídico de direito privado, por gerirem patrimônio público a elas transferido em substituição ao Poder Público naquela atividade específica, têm delimitada sua atuação através de um contrato de gestão com o Poder Público, sendo, inclusive, a necessária licitação quanto às contratações de terceiros, na forma da Lei nº 9.637/1998.

As parcerias voluntárias firmadas entre o Poder Público e as Organizações da Sociedade Civil (OSC), gênero que exclui as OS’s, por sua vez, devem seguir a disciplina da Lei nº 13.019/2014. Nesse diapasão, também as entidades qualificadas como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), também constituídas por entidades privadas sem fins lucrativos, são submetidas ao controle público.

Há que se perceber que os recursos não perdem sua natureza pública com a transferência para as organizações privadas. Essas, por sua vez, quando recebem recursos qualificados, ainda que por meio do Procedimento de Manifestação de Interesse Social, com a recomendação de realização de um chamamento público objetivando a celebração de parcerias e a constituição do vínculo mediante instrumentos consubstanciados em termos de colaboração e de fomento, supervisionados pelo órgão do Poder Público e pelos Conselhos de Políticas Públicas, devem prestar contas de acordo com a estruturação do Direito Administrativo.

O importante, todavia, é adequar a agilidade, independência e autonomia das ações sociais com a transparência da utilização de recursos públicos em iniciativas de organizações privadas. O gerenciamento da rede de comunicação é medida essencial para atingir tal objetivo no âmbito do voluntariado.


6 A experiência do Núcleo de Voluntariado no TJMG

A estruturação de uma rede de trabalho voluntário, voltada para ações sociais com a participação do TJMG iniciou-se com o então projeto, hoje programa, Termo de Cooperação Técnica nº 16, de 20 de maio de 2015, denominado “Rua do Respeito”, firmado com o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e o Serviço Voluntário de Assistência Social de Minas Gerais (SERVAS), que tem por escopo o voluntariado organizacional voltado às políticas públicas destinadas às pessoas em situação de rua.

O dono em termos gerenciais do referido processo, como setor responsável pelo desenho e desempenho final do programa e pela prestação de contas sobre sua execução, foi, no âmbito do TJMG, a sua Presidência[2], bem como o subprocesso Recomendação Conjunta 001/2015, teve como gestor o Corregedor-Geral de Justiça.

O processo em questão, que segue a linha de voluntariado, tem como objetivos desenvolver a cultura do voluntariado no âmbito da organização TJMG, nos moldes da Lei nº 9.608/1998, Decreto Federal nº 7.053 (2009) e Lei Estadual nº 20.846/2013, a ponto ser inserido no planejamento estratégico da organização, bem como promover ações que viabilizem o acesso a direitos básicos às pessoas em situação e rua, combate ao preconceito, participação nas discussões sobre políticas públicas com as pessoas em situação de rua e seus representantes e transposição da condição de rua para uma maior inclusão social de referido grupo populacional.

Por se tratar de processo de voluntariado em rede, os fornecedores e insumos são diversificados com o cadastro mutável de demandas por trabalho voluntário, levantamento de oportunidades por trabalho voluntário, criação de uma plataforma e uma base de dados para interconexão. Ou seja, os insumos se baseiam em dados de pessoas jurídicas parceiras que oferecem serviços e recursos confrontados com as necessidades prementes de auxílio às políticas públicas específicas.

A análise dos custos do processo, como instrumento de gerenciamento, mesmo se utilizadas metodologias como da curva Activity Based Costing (ABC) – Atividade Baseada no Custo –, se mostrou limitada, levando em conta as peculiaridades da população assistida, então é importante para mensurar os gastos a serem partilhados pelos parceiros, ainda que as ações não sejam convertidas em orçamento financeiro, através de horas de trabalho doadas.

Como desdobramento da experiência da “Rua do Respeito” foram iniciados os contatos com a UNV/PNUD, acabando por redundar na assinatura do Memorando de Entendimentos (MoU), em maio de 2016, contando ainda como signatários o Estado de Minas Gerais, SERVAS e o Ministério Público de Minas Gerais.

O Estado de Minas Gerais, de forma paralela, programou a edição e decreto instituidor do Programa Estadual de Voluntariado Transformador, Decreto nº 47.074, de 01 de novembro de 2016, com o objetivo de criar um marco de cooperação e facilitar a colaboração entre a Administração Pública Estadual e as demais entidades signatárias do Memorando de Entendimento em epígrafe, de forma não exclusiva, e em áreas de interesse comum, para mobilização e fomento de serviços voluntários em Minas Gerais, contribuindo para a consolidação da Rede de Voluntariado.

De uma forma ainda mais avançada, o TJMG criou o Núcleo de Voluntariado do TJMG (NV/TJMG), através da Portaria Conjunta nº 543/PR/2016[3], com o objetivo de contribuir para a consolidação da Rede de Voluntariado do Estado de Minas Gerais, assim como para promover a disseminação da cultura do voluntariado na organização e coordenar as práticas de voluntariado no âmbito do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Nº 837/2016 [Alessandr1] 

O próximo passo foi o advento da Resolução nº 837/2016[4], que instituiu a Rede de Voluntariado do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais – RV/TJMG e dispôs sobre sua organização e funcionamento, estruturando-a em sub-redes.

A ideia básica do NV/TJMG é atuar em três frentes principais: a uma, de forma clássica, seguindo as recomendações da Resolução nº 403 do Supremo Tribunal Federal (2009), com vistas a suprir necessidade de incentivo à consciência da responsabilidade social do cidadão com os seus deveres cívicos e o incentivo à solidariedade social, disciplinando o serviço voluntário realizado por magistrado, servidor, estagiário ou estudante de instituição de ensino conveniada, em ações internas.

A duas, de forma integrativa, com a criação de banco de dados próprio para identificar as ações de voluntariado realizadas pelos componentes do TJMG e em nome deste, institucionalizadas ou não, criando uma rede colaborativa e de informações, utilizando, para tanto, um cadastro que promova um sistema seguro, transparente, acessível e constantemente atualizado com as informações dos projetos de voluntariado existentes na organização e dos componentes que desejam se apresentar como voluntários.

Para tanto, o desenvolvimento de uma plataforma de comunicação própria é fundamental, inclusive para se evitar desperdícios nos serviços voluntários e monitorar as ações para que elas não fujam do seu desiderato. Tecnologias como a de cloud computing, computação nas nuvens, são muito bem-vindas, pois o compartilhamento de dados pode ser realizado por diversos aplicativos, com acesso direto à rede mundial de computadores, tornando a partilha de informações muito mais fácil.

A três, em rede externa, com a integração da organização TJMG na Rede de Voluntariado Estadual, com participação no comitê gestor para a definição das ações sociais que serão realizadas de forma compartilhada entre as organizações parceiras, com a definição da alocação de recursos públicos e a liberdade para o acoplamento ou não em projetos gestados pela Rede, com a estruturação normativa, sendo importante a construção de instrumento de combinação (matching) supervisionado, que hoje denominamos “Plataforma”.

Pelo sistema de matching, consubstanciado em uma plataforma interativa, através de um modelo matemático representativo das combinações mais estáveis entre os perfis do voluntário e das organizações destinatárias da ajuda, são desenvolvidas estratégias para evitar o desperdício e dar maior efetividade ao auxílio que se propõem com ação interativa de voluntariado, dentro do ambiente da Rede.

A estruturação do modelo de gestão através do design thinking, igualmente, serve de apoio para a realização das ações organizacionais voluntárias.

Com efeito, experiências estudadas por Stickdorn e Schneider (2011), como a da NL Agency, pertencente ao Ministério da Economia da Holanda, que trabalha com a implementação em rede de políticas de sustentabilidade, inovação e cooperação internacional, estruturada na confiança e igualdade, assim como o trabalho denominado Mypolice, que traduz a interação de um sem número de instituições públicas, privadas e do terceiro setor, incluindo mais de cinquenta forças policiais por todo Reino Unido, com a constante produção de informações qualitativas, compartilhadas através de um website, sobre experiências dos usuários para a polícia, encorajando maior empatia da compreensão dos problemas, bem demonstram o sucesso das ações sociais em rede com a participação integrada de organizações públicas e privadas.

No diapasão dos estudos de Stickdorn e Schneider (2011), é importante que tanto o voluntário quanto o vulnerável destinatário dos serviços estejam no centro das atenções, no bulleyes, diante da importância vital de entender o comportamento de referidos stakeholders, com vistas a adaptar as ações sociais para que tenham elas maior efetividade, pois a co-criação verdadeira é baseada no desenvolvimento de soluções em conjunto com os voluntários e assistidos.


7 Considerações finais

Deseja-se como resultados esperados do projeto de modelo de gestão para o Voluntariado, que parte da premissa da humanização do serviço público judiciário, a disseminação na organização TJMG da cultura do voluntariado, pela abordagem dos fundamentos do Voluntariado como arcabouço filosófico do modelo de gestão e estruturação sistêmica do modelo.

O longo caminho a ser percorrido passa pelo detalhamento dos conceitos, elementos e ferramentas do modelo de gestão, que sugere o processo educacional que já foi iniciado através dos fóruns e oficinas de capacitação. Também reflete a necessidade de regulamento específico para aplicação do modelo de gestão para o voluntariado, bem como os métodos e procedimentos para aplicação das ferramentas de gestão definidas no modelo, que está a ser construído pelo Núcleo do Voluntariado do TJMG.

Na dimensão da Rede, o plano de implantação do modelo de gestão para o voluntariado, provoca a reestruturação das organizações parceiras para aplicação do sistema em rede, com a transferência e disseminação de conhecimento e habilidades técnicas de modo a empoderar a rede local, com o fito de fomentar continuamente a transparência, o engajamento, a responsabilidade compartilhada para a tomada de decisões.

De todo modo, há que se ter em mente que os destinatários internos do programa serão não só os voluntários, mas também todos os servidores do TJMG que terão contato com a cultura do voluntariado a ser implementada durante o processo de educação da organização, permitindo o maior envolvimento dos servidores de todos os níveis e estimulando a apresentação de soluções criativas para os obstáculos que periodicamente surgem.

Em relação aos destinatários externos – já que a palavra cliente é inadequada no caso – há que se perceber que os resultados sociais e consolidação de conquistas civilizatórias em muito ultrapassam o conceito binário de input/output, assim como superam o registro de income, tendo os resultados do processo benefícios vários para aqueles que estejam em situação de vulnerabilidade, auxiliando-os na transposição dessa condição ou os protegendo na defesa de seus direitos básicos.

De qualquer modo, perscrutar o propósito dos destinatários é fator essencial para a construção tanto do Núcleo do TJMG quanto da Rede Estadual de Voluntariado, pois a efetividade da ação social e a perenidade da ação voluntária escolhida será desenvolvida apenas se o trabalho for realizado com – e não apenas para ou pelo – os destinatários.

O mito pessoal do voluntário ao ser identificado e combinado com as ações sociais mediadas pela organização parceira estimulará o seu sentimento de pertencimento, bem como tem o condão de criar o liame com o destinatário, que muito ultrapassará o gesto de ajuda para transformá-lo no comprometimento com uma causa.

Da mesma forma, o destinatário do serviço voluntário, ao participar da formulação das ações, projetos e políticas públicas assume o compromisso de ser parte da transformação, e não mais objeto de ações assistencialistas.

Por fim, a própria organização do Poder Judiciário pode redescobrir a razão primordial de sua existência, que é servir à sociedade, através da consolidação dos valores civilizatórios, mediante a busca do bem-estar social, tanto pela prestação jurisdicional quanto pelas ações de modificação social, que refletem a virtude de sua missão fundamental: realizar a justiça.


8  Referências

BATISTA, Fábio Ferreira.  Modelo de gestão do conhecimento para a administração pública brasileira: como implementar a gestão do conhecimento para produzir resultados em benefício do cidadão. Brasília: Ipea, 2012. Disponível em: <http://ead.cpgis.unb.br/pluginfile.php/2306/mod_resource/content/1/Livro%20Modelo%20de%20Gest%C3%A3o%20do%20Conhecimento%20para%20a%20Administra%C3%A7%C3%A3o%20P%C3%BAblica%20Brasileira.pdf>. Acesso em: out. 2016.

BEZERRA. Leila Maria Passos de Souza. Re-significações híbridas de cidadania e solidariedade na experiência do voluntariado contemporâneo em Fortaleza-CE: entre a democratização e o neo-conservadorismo narcisista?. ANPUH – XXV SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA – Fortaleza, 2009.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.

------------ Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 22 jun. 1993.

----------- Lei n.º 9.608, de 18 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre o serviço voluntário e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 19 fev. 1998.

------------. Lei n.º 9637, de 15 de maio de 1998. Dispõe sobre a qualificação de entidades como organizações sociais, a criação do Programa Nacional de Publicização, a extinção dos órgãos e entidades que menciona e a absorção de suas atividades por organizações sociais, e dá outras providências Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 18 maio. 1998.

------------ Lei n.º 13019, de 31 de julho de 2014. Regulamenta Estabelece o regime jurídico das parcerias entre a administração pública e as organizações da sociedade civil, em regime de mútua cooperação, para a consecução de finalidades de interesse público e recíproco, mediante a execução de atividades ou de projetos previamente estabelecidos em planos de trabalho inseridos em termos de colaboração, em termos de fomento ou em acordos de cooperação; define diretrizes para a política de fomento, de colaboração e de cooperação com organizações da sociedade civil; e altera as Leis nos 8.429, de 2 de junho de 1992, e 9.790, de 23 de março de 1999. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 1 ago. 2014.

-------------- Decreto Nº7053 de 23 de dezembro de 2009. Institui a Política Nacional para a População em Situação de Rua e seu Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento, e dá outras providências Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 24.12.2009.

-------------. Supremo Tribunal Federal. Acórdão na Ação Direta de Inconstitucionalidade ADI 1923 / DF - Distrito Federal; Relator(a):  Min. Ayres Britto; Relator(a) p/ Acórdão:  Min. Luiz Fux; Julgamento: 16/04/2015. Disponível em:  <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28ADI%29%281923%2ENUME%2E+OU+1923%2EACMS%2E%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/hq5q5m63>. Acesso em outubro de 2016.

-------------. Supremo Tribunal Federal. Acórdão na Medida Cautelar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental ADPF 347 MC/ DF - Distrito Federal; Relator(a):  Min. Marco Aurélio; Julgamento:  09/09/2015. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28ADI%29%281923%2ENUME%2E+OU+1923%2EACMS%2E%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/hq5q5http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28ADPF%29%28347%2ENUME%2E+OU+347%2EACMS%2E%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/zf8dq8jm63>. Acesso em outubro de 2016.

-------------- Supremo Tribunal Federal. Resolução nª 403, de 4 de junho de 2009. Institui a prestação de serviço voluntário no Supremo Tribunal Federal. Publicado no Diário de Justiça Eletrônico em 9 jun. 2009.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanello. Direito Administrativo. 28. ed. São Paulo: Atlas, 2015.

FALCAO, Joaquim; GUERRA, Sérgio; ALMEIDA, Rafael (Orgs.). Administração Pública Gerencial. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2013.

FISS, Owen. Um Novo Processo Civil: Estudos norte-americanos sobre jurisdição, constituição e sociedade. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004.

MINAS GERAIS (Estado) Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Portaria Conjunta nº 543/PR/2016. Institui o Núcleo de Voluntariado do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais - NV/TJMG e dispõe sobre sua organização e funcionamento. Publicado no Diário de Justiça Eletrônico em ago. 2016.

MINTZBERG, H., AHLSTRAND, B., LAMPEL, J. Safári de Estratégia. Porto Alegre: Bookman, 2010.

PORTER, Michael. O que é Estratégia? Disponível em: <http://www3.pucrs.br/pucrs/files/adm/asplam/estrategia.pdf>. Acesso em set. 2016.

SODRÉ, Maria Cecilia de Azevedo. Perspectivas para um Sistema Nacional de Voluntariado. Disponível em: <file:///C:/Users/HOME/Downloads/Estudo%20UNESCO-%20infraestructura%20de%20Voluntariado%20(5).pdf>. Acesso em: set. 2016.

STICKDORN, Marc. SCHNEIDER, Jakob. This is Service Design Thinking. New Jersey:John Willey &Sons, 2011.

TELLES, V. Direitos Sociais. Afinal, do que se trata? Belo Horizonte: UFMG, 1999.

YASBEK, C. Terceiro Setor e despolitização. In: Revista Inscrita. Brasília: CFESS, jul. 2000.


Notas

[1]    Movimentação de povos, normalmente impulsionados pela miséria, guerras e totalitarismo.

[2]    A iniciar com o presidente Des. Pedro Bitencourt e corregedor Des. Antônio Sérvulo e ser desenvolvida na gestão do presidente Des. Herbert Carneiro e corregedor Des. André Leite Praça.

[3]    Tendo como presidente o Des. Manoel dos Reis Morais.

[4]    O juiz Marcus Vinicius Mendes do Valle foi o artífice da construção de referido ato normativo.


Autor


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERNANDES, Sérgio Henrique Cordeiro Caldas. Gestão judiciária e voluntariado: a experiência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) na criação do Núcleo do Voluntariado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6172, 25 maio 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/63736. Acesso em: 19 abr. 2024.