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Eficácia subjetiva da coisa julgada nos processos coletivos ajuizados por associações

Eficácia subjetiva da coisa julgada nos processos coletivos ajuizados por associações

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A eficácia subjetiva da coisa julgada nas ações coletivas está relacionada à legitimidade das associações para atuarem como representante processual em favor dos seus associados.

RESUMO: O artigo tem por finalidade abordar a eficácia subjetiva da coisa julgada nos processos coletivos intentados pelas associações. A repercussão da coisa julgada vai depender da forma processualmente utilizada para instrumentalizar a pretensão coletiva. Se via mandado de segurança coletivo, atuará como substituto processual, cujas regras da coisa julgada serão as constantes do microssistema coletivo. Se pelo rito comum, atuará como representante processual, cabendo aplicação das coisa julgada aplicadas no processo individual, de modo que o título executivo somente será extensível aos associados residentes no âmbito da jurisdição do órgão julgador que autorizaram a ação judicial e integraram a lista de associados, que seguiu juntada com a exordial, não abrangendo os associados que não autorizaram e não integraram a lista, pois a eficácia subjetiva da coisa julgada não os atinge, por ausência de capacidade processual da associação de atuar em seu nomes.

Palavras Chaves: Associações. Tutela Coletiva. Representação Processual. Substituição Processual. Coisa julgada.

Sumário: Introdução. 1. Associação. Conceito e natureza jurídica. 2. Processo Coletivo. Ação Coletiva. Tutela Jurisdicional Coletiva. Classificação dos interesses ou direitos coletivos lato sensu. 3. Da situação peculiar da atuação das Associações nos processos coletivos. 4. Da coisa julgada nos processos coletivos. 5. Extensão subjetiva do título formado no processo de conhecimento ajuizado por Associações. Conclusão. Referências Bibliográficas.


INTRODUÇÃO.

O presente artigo abordará a eficácia subjetiva da coisa julgada nos processos coletivos intentados pelas associações, a depender do instrumento processual a ser utilizado para defesa dos interesses dos associados, ou seja, por meio de ações coletivas, na via ordinária ou por meio de mandado de segurança coletivo.

É um tema importante para o ordenamento jurídico nacional, pois atinente às ações de massa, que há muito tempo vem se desenvolvendo, tanto no âmbito legislativo, como no doutrinário e no jurisprudencial.

Recentemente, o Supremo Tribunal Federal, analisou o tema da legitimidade das associações no uso das ações ordinárias por meio da representação, formando dois importantíssimos precedentes, a saber: RE 573232/SC e RE 612043/PR. Tais julgamentos foram efetuados pela sistemática da repercussão geral, cujas teses jurídicas possuem força vinculante em relação aos demais órgãos do Judiciário.

Não se tem a pretensão de esgotar o assunto, pois se trata de um tema deveras amplo e com várias nuances. E, justamente por isso, buscou-se focalizar o artigo na eficácia subjetiva da coisa julgada nos processos coletivos intentados pelas associações, por meio de representação processual, nos termos do artigo 5º, inciso XXI, da Constituição Federal de 1988, sem deixar de tecer comentários sobre a atuação como substituto processual, nos mandados de segurança coletivo.

Utilizou-se como base para o desenvolvimento do presente artigo, a fonte de pesquisa bibliográfica, de modo a extrair conceitos necessários para compreensão do tema, mas o cerne deste foi concebido a partir da pesquisa jurisprudencial.

No primeiro capítulo, foi apresentado um breve circunstanciado acerca do conceito e da natureza jurídica da associação, além de apontar as similitudes e diferenças com os sindicatos, já que ambos são entes que possuem iguais propósitos, porém com peculiaridades substanciais.

O segundo capítulo, traçou perfunctórios comentários acerca do processo coletivo, pontuando informações básicas como conceito de ação coletiva, tutela jurisdicional coletiva, bem como pontou acerca da classificação dos interesses ou direitos coletivos latu sensu.

O terceiro capítulo, abordou as formas de atuação das associações para defesa dos interesses de seus associados, para tanto, foi necessário distinguir os conceitos dois institutos processuais, representação processual e substituição processual, considerando que as atuações das associações podem ocorrer de duas formas, a teor do que dispõe o artigo 5º, incisos XXI e LXX, alínea “b” da Constituição Federal de 1988.

O quarto capítulo, abordou o conceito de coisa julgada e seus delineamentos nos processos individuais e coletivos, para fins de compreensão da extensão da coisa julgada nos processos coletivos ajuizados pelas associações.

O quinto e último capítulo, contém o cerne do presente artigo, sendo apresentada a eficácia da coisa julgada nos processos coletivos ajuizados pelas associações, seja atuando representante processual, nas ações coletivas ordinárias, seja atuando como substituto processual, nos mandados de segurança coletivo.

As conclusões do artigo decorrem de estudos relacionados ao tema extraídos da doutrina, mas preponderantemente da jurisprudência, que recentemente consolidou vários pontos que não estavam expressamente previstos na lei, os quais diariamente são enfrentados junto à atuação na Procuradoria Especializada de Pessoal, órgão da Procuradoria Geral do Estado de Mato Grosso do Sul.


1. ASSOCIAÇÃO. CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA. 

A associação pode ser compreendida como qualquer forma de associativismo, tais como sindicatos, entidades de classe, cooperativas e partidos políticos, cujo objetivo é a realização de atividades relacionadas à cultura, religião, recreação, defesa de direitos, ente outras várias finalidades, sem intuito lucrativo, nos termos do artigo 53 do Código Civil, in verbis: “Art. 53. Constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins não econômicos. Parágrafo único. Não há, entre os associados, direitos e obrigações recíprocos”.

Nestor Duarte et al. (DUARTE, 2018, p. 59-60), ao comentar a parte geral do Código Civil, especificamente sobre associação, a definiu nos seguintes termos:

As associações são pessoas jurídicas de finalidades não econômicas, que se constituem pela união de pessoas. Tanto quanto as sociedades, apresentam uma estrutura interna fundada em um conjunto de pessoas (iversitas personnrum), mas diferem entre si, porque as sociedades têm fins econômicos, enquanto as associações não; distinguem-se as associações das fundações, porque estas têm por substrato um patrimônio (universitas bonorum). (art. 5°, XVII e XVIII, da CF).

Paulo Nader (Nader, 2018, p. 283-284), ao lecionar sobre associações apresentou o seguinte conceito:

Modalidade que é de corporação, constitui-se por uma reunião de pessoas que se irmanam de igual propósito. O fim a ser realizado se diversifica em atividades: recreativas, filantrópicas, culturais, religiosas, entre outras. A lei não faz menção, por desnecessário, ao tipo de atividade a ser desenvolvida pela entidade, apenas exclui, pelo caput do art. 53 da Lei Civil, o fim de natureza econômica. Aliás, este é um dos traços peculiares às associações. A iniciativa de criação se dá mediante ato constitutivo, que é lei interna da corporação e onde o fim social deve ser definido. A sua criação independe de autorização, nos termos do que dispõe a Constituição Federal, art. 5º, inciso XVIII, e não se sujeitam à fiscalização ou a qualquer outro tipo de interferência. A personalidade jurídica, pela qual a corporação é reconhecida como ente portador de direitos e obrigações, se alcança com o registro do ato constitutivo

A natureza jurídica das associações é de pessoa jurídica de direito privado. A lei é expressa no sentido de que os associados possuem personalidade distinta da associação, sendo cada qual em sua individualidade quanto aos bens, direitos, obrigações e responsabilidades.

É possível afirmar que tanto os sindicatos, quanto às associações possuem iguais propósitos, no que se refere à promoção de atividades culturais, esportivas e assistenciais. Porém é certo também afirmar que há entre as duas formas associativas peculiaridades que as diferem de forma substancial.

Os sindicatos são regidos pelo artigo 8º da CF, in verbis:

Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte:

I - a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical;

II - é vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, que será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, não podendo ser inferior à área de um Município;

III - ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas;

IV - a assembléia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei;

V - ninguém será obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato;

VI - é obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho;

VII - o aposentado filiado tem direito a votar e ser votado nas organizações sindicais;

VIII - é vedada a dispensa do empregado sindicalizado a partir do registro da candidatura a cargo de direção ou representação sindical e, se eleito, ainda que suplente, até um ano após o final do mandato, salvo se cometer falta grave nos termos da lei.

Parágrafo único. As disposições deste artigo aplicam-se à organização de sindicatos rurais e de colônias de pescadores, atendidas as condições que a lei estabelecer.

Enquanto os sindicatos são regidos pelo artigo acima transcrito, o qual traz em seu bojo regras e princípios a serem aplicados na constituição, atribuições, funcionamento, organização e filiação, as associações são regidas pelo artigo 53 e seguintes do Código Civil, para fins de constituição, funcionamento, organização e dissolução.

Outra diferença, cuja importância se faz necessário ressaltar, diante dos desdobramentos no presente trabalho, é a limitação constitucional para defesa e representação dos interesses dos associados/filiados, pois enquanto a associação atua em nome de seus associados, o sindicato atua em nome de toda a categoria profissional ou econômica, sem a necessidade de filiação, ante o papel político que possui nos interesses da categoria.

Após breve conceito acerca das associações, analisa-se no capítulo seguinte, conceitos relacionados à tutela coletiva, considerando que o processo coletivo é o meio mais utilizado para as associações atuarem na defesa dos interesses dos seus associados.


2. PROCESSO COLETIVO. AÇÃO COLETIVA. TUTELA JURISDICIONAL COLETIVA. CLASSIFICAÇÃO DOS INTERESSES OU DIREITOS COLETIVOS LATU SENSU.

Como ressaltado linhas acima, as Associações têm entre seus objetivos defender interesses e direitos de seus filiados, logo é recorrente que esteja no judiciário, ou mesmo no âmbito administrativo, apresentando pretensões sobre situações jurídicas coletivas.

A atuação das associações para buscar a concretização ou a defesa desses direitos pode se dar de duas formas; a primeira, por meio da substituição processual, quando atua como legitimada extraordinária; a segunda, por meio da representação, quando atua como legitimada ordinário. Sob essas duas formas, é efetuada por meio do processo coletivo, motivo pelo qual se faz necessário trazer à tona alguns conceitos básicos acerca do processo coletivo, ação coletiva, tutela jurisdicional coletiva, bem como a classificação dos interesses ou direitos coletivos latu sensu.

O processo coletivo é descrito por Fredie Didier Junior (DIDIER, 2016, p. 29) como a “a relação litigiosa (a que e objeto do processo) coletiva. Uma relação é coletiva se em um de seus termos, como sujeito ativo ou passivo, encontra-se um grupo (comunidade, classe, etc.)”.

A função jurisdicional coletiva surgiu em razão da necessidade da sociedade moderna, de massa, que precisava ser operacionalizada por procedimentos coletivos, iniciados por meio do exercício do direito de ação, acionada para a tutela dos direitos coletivos lato sensu.

Logo, no processo coletivo, há ações coletivas que veiculam pretensões coletivas, ou seja, as ações distribuídas envolvem várias ou um conjunto de pessoas, até mesmo toda a coletividade. Nessas ações a finalidade é tutelar interesses que transcendem os interesses individuais, denominados metaindividuais.

Nessa perspectiva, Fredie Didier Junior (DIDIER 2016, p. 32) define ação coletiva como a “demanda que dá origem a um processo coletivo, pela qual se afirme a existência de uma situação jurídica coletiva ativa ou passiva exigida para a tutela de grupo de pessoas”.

Tais ações coletivas visam solucionar uma situação jurídica coletiva, que é a entrega da tutela jurisdicional coletiva, que é definida por Fredie Didier Junior (DIDIER 2016, p. 32) como a “a proteção que se confere a uma situação jurídica coletiva ativa (...) ou a efetivação de situações jurídicas (...) em face de uma coletividade (...), que seja titular de uma situação jurídica coletiva passiva (deveres ou estados de sujeição coletivos)”.

Essas ações contêm interesses ou direitos difusos, coletivos em sentido estrito ou individuais homogêneos. O artigo 81 do Código de Defesa do Consumidor, traz em seu bojo as definições relativas a tais interesses. Vejamos.

Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.

Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:

I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;

II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;

III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.

Fredie Didier Junior (DIDIER, 2016, p. 69-72) ao abordar sobre direitos difusos, coletivos stricto sensu e individuais homogêneos, traz os seguintes conceitos:

Direitos difusos (art. 81, par. ún., I do CDC) aqueles transindividuais (metaindividuais, supraindividuais) de natureza indivisível (que só podem ser considerados como um todo), titularizado por um grupo composto por pessoas indeterminadas (ou seja, indeterminabilidade dos sujeitos, não havendo individuação) ligadas por circunstâncias de fato.

Direitos coletivos stricto sensu (art. 81, par. ún. II, do CDC) foram classificados como direito transindividuais (com a mesma sinomínia descrita acima), de natureza indivisível, de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas indeterminadas. Mas determináveis (frise-se, enquanto grupo, categoria u classe determinável) ligadas entre si, ou com a parte contrária, por uma relação jurídica base.

Direitos individuais homogêneos (art. 81, par. ún. III, do CDC) aqueles decorrentes de origem comum, ou seja, nascidos em consequência da própria lesão, em que a relação jurídica entre as partes é post factum (fato lesivo).

Diante desses breves apontamentos em relações aos interesses a serem discutidos nos processos coletivos, é possível concluir que direitos difusos são aqueles transindividuais, indivisíveis, cujos titulares são indeterminados, ligado por uma situação de fato. Já coletivos, são transindividuais, indivisíveis, cujos titulares são grupo, categoria ou classe de pessoas, ligadas por uma relação jurídica base. E, por fim, individuais homogêneos aqueles divisíveis, decorrentes de origem comum, fato jurídico.


3. DA SITUAÇÃO PECULIAR DA ATUAÇÃO DAS ASSOCIAÇÕES NOS PROCESSOS COLETIVOS.

O artigo 18 do CPC/15 traz em seu bojo a legitimidade para atuação nos processos, trazendo a seguinte previsão: “Ninguém poderá pleitear direito alheio em nome próprio, salvo quando autorizado pelo ordenamento jurídico.”

O dispositivo contempla o instituto da legitimidade, que segundo Waldir Zagaglia (ZAGAGLIA, 2019, p.93) corresponde “a titularidade do direito de ação. E continua definindo a legitimidade fazendo a seguinte observação:

Não há necessariamente coincidência entre os titulares do processo e os titulares da relação jurídica de direito material controvertida. Para descobrir se as partes são legítimas, duas são as observações: a) a própria lei enumera – neste caso, não há qualquer problema; e b) a lei é omissa.

Desses ensinamentos, extrai-se que há como regra duas espécies de legitimação: a ordinária e a extraordinária.

Waldir Zagaglia (ZAGAGLIA, 2019, p.93) define legitimação ordinária “quando uma só pessoa enfeixar em si as duas titularidades, isto é, tanto a titularidade do direito material como a titularidade da relação jurídica processual (...) Quando a lei não indica o legitimado, a legitimação é sempre ordinária”.

Em relação a legitimação extraordinária, aponta que ocorre quando uma pessoa for titular da relação jurídica de direito processual e outra da relação jurídica de direito material (...) só ocorre nos casos expressamente previstos em lei, como disciplina o art. 18 do Código de Processo Civil”. (ZAGAGLIA, 2019, p.93).

É possível concluir que a legitimação ordinária, muito comum no processo individual, coincidem o legitimado e o interessado da pretensão a ser deduzida em juízo. Nesse caso, a sentença terá aplicação direta sobre a esfera jurídica do legitimado, nos termos do artigo 506 do CPC/15: “A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não prejudicando terceiros”.

Na legitimação extraordinária, também existente no processo individual, mas frequente no processo coletivo, a lei expressamente autoriza alguém a exigir o direito de outrem, ou seja, existe um terceiro legalmente investido para atuar na defesa de direito alheio, denominado substituto processual. Nesse caso, a sentença será além das partes que aturam no processo, a depender do interesse tutelado e dos moldes que foi apresentada a pretensão.

A legitimidade é diferente de capacidade. Isso porque a legitimidade é específica para uma causa específica, enquanto a capacidade é genérica para todo e qualquer processo. A ilegitimidade não pode ser sanada, já a capacidade pode ser sanada por meio da representação ou da assistência. Além disso, a legitimidade possui natureza jurídica de condição da ação, enquanto a capacidade possui natureza jurídica de pressuposto de validade do processo (ZAGAGLIA, 2019, p. 94).

E nessa perspectiva, necessário distinguir os institutos da substituição processual e da representação processual. O substituto processual age em nome próprio defendo direito alheio, enquanto o representante age em nome de terceiro, defendendo direito de terceiro.

Essa distinção é perfeitamente explicada por (GRECO, 2006, p. 353). Vejamos:

Substituto processual é parte, no sentido processual. Quer na posição de autor, quer na de réu, o substituto processual é sujeito da relação processual, da qual participa em nome próprio, não em nome do substituído. Nisso difere a substituição processual da figura da representação, em que o representante não é parte, mas apenas representante da parte, que é o representado. Enquanto na substituição processual o substituto age em nome próprio, na representação o representante age em nome do representado.

Nos processos coletivos, as ações coletivas quase sempre são baseadas na legitimação extraordinária, quando está presente o fenômeno da substituição processual. Porém, pode vir sob a forma de representação processual, como ocorre nos casos em que o agir dos entes coletivos ocorre em favor dos direitos de grupos sociais organizados e definidos, como as Associações e Sindicatos.

Os legitimados para propor a ação coletiva constam do artigo 82 do Código de Defesa do Consumidor, in verbis:

Art. 82. Para os fins do art. 81, parágrafo único, são legitimados concorrentemente:

I - o Ministério Público,

II - a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal;

III - as entidades e órgãos da Administração Pública, direta ou indireta, ainda que sem personalidade jurídica, especificamente destinados à defesa dos interesses e direitos protegidos por este código;

IV - as associações legalmente constituídas há pelo menos um ano e que incluam entre seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos protegidos por este código, dispensada a autorização assemblear.

§ 1° O requisito da pré-constituição pode ser dispensado pelo juiz, nas ações previstas nos arts. 91 e seguintes, quando haja manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido.

Dentre os legitimados previsto neste artigo, consta as associações, objeto do presente trabalho. A lei é clara e exige para a qualificação como legitimado extraordinário apenas que seja legalmente constituída há pelo menos um ano e que incluam entre suas finalidades a defesa de interesses e direitos dos seus associados.

No processo coletivo, a legitimidade processual é extraordinária, concorrente, disjuntiva e autônoma. É extraordinária porque o autor da ação não é o titular do direito material. Concorrente porque outros igualmente legitimados podem ingressar em juízo para defesa de interesses e direitos. Disjuntiva e autônoma porque a atuação de um colegitimado não vincula, nem subordina a atuação do outro. (DIDIER, 2016, p. 180-185)

As associações possuem legitimidade para atuar como legitimado extraordinário, a teor do artigo 82, inciso IV, do CDC e artigo 5º, LXX, alínea B da CF, bem como pode atuar como representante processual, a teor do artigo 5º, inciso XXI, da Constituição Federal de 1988.

Em linhas gerais, quando a associação atua com legitimação extraordinária, atua como substituto processual, ou seja, atua em nome próprio, defendendo direito alheio. Já quando atua como representante processual, atua em nome alheio, defendendo direito alheio. E, tanto atuando de uma forma como de outra, a Associação deve atender formas procedimentais previstas em lei.

A associação poderá litigar para garantir direitos dos associados, como já afirmado, por meio da substituição processual ou da representação processual. O que vai diferenciar a atuação é o meio escolhido, se via impetração de mandado de segurança coletivo ou se via ajuizamento de ação do pelo rito comum.

Quando as associações atuarem como substituto processual é decorrente da previsão constitucional constante do artigo 5º, inciso LXX, alínea “b” da Constituição Federal, que prevê o instituto do mandado de segurança coletivo, in verbis:

Artigo 5º

LXX - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por:

b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados;

Nessa impetração do mandamus, a Associação deve comprovar que atende os requisitos constitucionais, quais sejam, estar legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, além de estar atuando na defesa e nos interesses de seus associados, ou seja, deve ser comprovada a pertinência temática e a representatividade.

A representatividade é demonstrada pelo tempo de constituição da associação. Nesse aspecto, a lei expressamente exige que a associação esteja constituída há pelo menos um ano. Tal requisito pode até vir a ser dispensado, porém há necessidade de demonstração de manifesto interesse social, que será evidenciado pela dimensão ou característica do dano ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido.

No que toca à pertinência temática, a mesma é aferida por meio da análise dos seus fins institucionais, cujos interesses estão previstos nas cláusulas do estatuto da associação. A partir dessa previsão, é efetuada a verificação da relação entre os interesses e direitos protegidos coletivamente com as finalidades da pretensão da associação.

Segundo Hugo Nigro Mazzili (MAZZILLI, 1998, p. 627), pertinência temática é “requisito indispensável, que corresponde à finalidade institucional compatível com a defesa judicial do interesse”.

Porém, quando as Associações ajuizarem ação do rito comum atuarão como representante processual, nos termos do artigo 5º, XXI, in verbis: “as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente”.

Trata-se de atuação em nome alheio para defesa de direito alheio, desde que autorizada por seus filiados, a representa-los, judicial ou extrajudicialmente.

Nesse caso, não basta atender os requisitos da representatividade e a da pertinência temática, deve, também, preencher o requisito constante do parágrafo artigo 2º-A da Lei nº 9.494/97, que expressamente determina que a petição inicial deverá estar instruída com a ata da assembleia da entidade associativa que a autorizou, acompanhada da relação nominal dos seus associados e indicação dos respectivos endereços, in verbis:

Art. 2º-A – A sentença civil prolatada em ação de caráter coletivo proposta por entidade associativa, na defesa dos interesses e direitos dos seus associados, abrangerá apenas os substituídos que tenham, na data da propositura da ação, domicílio no âmbito da competência territorial do órgão prolator. (Incluído pela Medida provisória nº 2.180-35, de 2001)

Parágrafo único.  Nas ações coletivas propostas contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas autarquias e fundações, a petição inicial deverá obrigatoriamente estar instruída com a ata da assembléia da entidade associativa que a autorizou, acompanhada da relação nominal dos seus associados e indicação dos respectivos endereços. (Incluído pela Medida provisória nº 2.180-35, de 2001)

Nota-se que o referido dispositivo seria aplicado apenas para as ações propostas em face da União, Estados, Distrito Federal, Municípios e suas autarquias e fundações. Porém, em razão do que foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal, nos autos do RE 573.232, julgado pela sistemática da repercussão geral, quando as associações atuarem pelo rito comum, sua atuação dar-se-á representante processual e não como substituto processual, sendo necessário nessas situações que a petição inicial seja acompanhada da lista dos associados e da autorização dos associados para ajuizamento da demanda, não sendo admitida a previsão genérica do estatuto para demandar.

Vejamos a ementa do julgado:

REPRESENTAÇÃO – ASSOCIADOS – ARTIGO 5º, INCISO XXI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ALCANCE. O disposto no artigo 5º, inciso XXI, da Carta da República encerra representação específica, não alcançando previsão genérica do estatuto da associação a revelar a defesa dos interesses dos associados. TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL – ASSOCIAÇÃO – BENEFICIÁRIOS. As balizas subjetivas do título judicial, formalizado em ação proposta por associação, é definida pela representação no processo de conhecimento, presente a autorização expressa dos associados e a lista destes juntada à inicial. (RE 573232, Relator(a):  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Relator(a) p/ Acórdão:  Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 14/05/2014, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-182 DIVULG 18-09-2014 PUBLIC 19-09-2014 EMENT VOL-02743-01 PP-00001)

Como ficou demonstrado neste capítulo, as associações podem atuar nos processos coletivos, seja via legitimação extraordinária, quando impetrará mandado de segurança coletivo, seja via ordinária, quando ingressará com ações coletivas. Em ambas hipóteses sujeita a comprovação dos requisitos exigidos na lei e ratificados como legítimos pela jurisprudência vinculante, seja para demonstrar a legitimidade, seja para demonstrar a capacidade de representação.


4. DA COISA JULGADA NOS PROCESSOS COLETIVOS.

Após o exame da legitimação, passa-se à análise da coisa julgada, que será brevemente abordada apenas para fins de compreensão da extensão da coisa julgada nos processos coletivos, ajuizados pelas associações.

É consabido que a coisa julgada é uma garantia constitucional prevista no artigo 5º, inciso XXXVI da Constituição Federal, in verbis: “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.

Trata-se de garantia também decorrente do princípio fundamental da segurança jurídica, cuja finalidade é evitar que uma questão de mérito que já foi apreciada e decidida pelo Poder Judiciário seja novamente submetida a apreciação e julgamento, após seu trânsito em julgado.

Processualmente, trata-se de um pressuposto processual negativo, necessário para o desenvolvimento válido do processo, que deve estar presente na formação, e na constituição e no desenvolvimento do processo.

Para Luiz Guilherme Marinoni (MARINONI et al., 2017) “coisa julgada é a imutabilidade que qualifica a sentença de mérito não mais sujeita a recurso e que impede sua discussão posterior”.

No processo civil individual, a autoridade da coisa julgada material é adquirida nas decisões de mérito, de procedência ou de improcedência. O resultado do processo pouco importa. Os limites subjetivos da autoridade da coisa julgada material se dá apenas entre as partes, não prejudicando, nem beneficiando terceiros que não integraram a lide, nos termos do artigo 506 do CPC, in verbis: “A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não prejudicando terceiros”.

No processo coletivo, a coisa julgada material atinge outros patamares, considerando que, em tais processos, busca-se a aplicação de uma tese geral, com o fim de proporcionar o acesso à justiça de forma equânime, economia processual e proporcionar maior segurança jurídica. Nessa perspectiva, os artigos 103 e 104 do CDC traz a forma em que se opera a coisa julgada material a depender dos interesses tutelados, in verbis.

Art. 103. Nas ações coletivas de que trata este código, a sentença fará coisa julgada:

I - erga omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação, com idêntico fundamento valendo-se de nova prova, na hipótese do inciso I do parágrafo único do art. 81 (direitos difusos);

II - ultra partes, mas limitadamente ao grupo, categoria ou classe, salvo improcedência por insuficiência de provas, nos termos do inciso anterior, quando se tratar da hipótese prevista no inciso II do parágrafo único do art. 81 (direitos coletivos);

III - erga omnes, apenas no caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as vítimas e seus sucessores, na hipótese do inciso III do parágrafo único do art. 81 (direitos individuais homogêneos).

No processo coletivo, o resultado do processo, se procedente ou improcedente, vai influir na formação da coisa julgada material. Via de regra, a tese jurídica criada tem aplicação além das partes. No caso de procedência, a sentença ou acórdão vai beneficiar as vítimas e interessados in utilibus, ou seja, somente vai beneficiar o substituído se for conveniente, pois se a tese o prejudicar a mesma não será aproveitada, podendo haver o ingresso de ações individuais, a qual sempre estará aberta aos legitimados ordinários.

Nesse caso, se o interessado optar por ingressar com ações individuais, não poderá se valer da tese jurídica do processo coletivo, salvo se houver pedido de suspensão do processo individual, nos termos do artigo 104 do CDC, in verbis:

Art. 104. As ações coletivas, previstas nos incisos I e II e do parágrafo único do art. 81, não induzem litispendência para as ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes a que aludem os incisos II e III do artigo anterior não beneficiarão os autores das ações individuais, se não for requerida sua suspensão no prazo de trinta dias, a contar da ciência nos autos do ajuizamento da ação coletiva.

Nas decisões de improcedência, interessante fazer uma observação. A improcedência pode ocorrer sob duas formas, por ausência de provas e por ausência de direito. Essa distinção é deveras importante para fins da extensão da eficácia da coisa julgada. Logo, a solução para tais situações deve ser extraída da conjugação do artigo 103 do CDC c/c artigo 22 da Lei nº 12.016/2009, que assim dispõe: “No mandado de segurança coletivo, a sentença fará coisa julgada limitadamente aos membros do grupo ou categoria substituídos pelo impetrante”. Já o artigo 103 assim dispõe:

Art. 103. Nas ações coletivas de que trata este código, a sentença fará coisa julgada:

I - erga omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação, com idêntico fundamento valendo-se de nova prova, na hipótese do inciso I do parágrafo único do art. 81;

II - ultra partes, mas limitadamente ao grupo, categoria ou classe, salvo improcedência por insuficiência de provas, nos termos do inciso anterior, quando se tratar da hipótese prevista no inciso II do parágrafo único do art. 81;

III - erga omnes, apenas no caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as vítimas e seus sucessores, na hipótese do inciso III do parágrafo único do art. 81.

Extrai-se desse dispositivo que em se tratando de ações coletivas em sentido estrito, relacionadas aos interesses difusos e coletivos, a coisa julgada opera erga omnes para o primeiro e ultra partes em relação ao segundo, não o fazendo coisa julgada as decisões de improcedência por insuficiência de provas, em ambos os casos, por expressa previsão legal.

Logo, a contrario sensu, as decisões de improcedência, por ausência de direito, produzem coisa julgada material, pois se tivesse o legislador a intenção de excepcionar tais decisões, teria feito a redação dos incisos I e II da mesma forma que fez em relação aos incisos III, no que toca aos interesses individuais homogêneos, que aponta coisa julgada apenas se a decisão for de procedência.

É nítida a intenção do legislador em relação aos interesses difusos e coletivos de contemplar a coisa julgada secundum eventum probationis, pois excepcionou da coisa julgada, apenas a improcedência por insuficiência de provas, para evitar o prejuízo dos interesses individuais, permitindo que os mesmos possuam repropor a demanda, mediante nova prova.

E mais, a Lei nº 12.016/2009, que dispõe sobre mandado de segurança coletivo, expressamente afirma que “no mandado de segurança coletivo, a sentença fará coisa julgada limitadamente aos membros do grupo ou categoria substituídos pelo impetrante”, ou seja, independente do resultado. E, assim o fez, porque há uma particularidade no mandado de segurança, não se admite a dilação probatória, ante a exigência de prova pré-constituída do direito líquido e certo.

Dessa forma, uma vez ultrapassada essa exigência do mandamus, a denegação da segurança, por ausência do direito, gera coisa julgada material, pois proferida com cognição plena e exauriente.  Em tais situações, resta prejudicado o direito de ingressar com nova ação para alcançar a pretensão almejada, seja de forma coletiva, seja individualmente, pois a eficácia subjetiva da decisão irá atingir toda a categoria, exatamente nos termos do artigo 22 da lei nº 12.016/2009.

Teori Albino Zavaski (ZAVASKI, 1995, p. 16-33), abordando o assunto, aponta que “mesmo ajuizado por substituto processual. O MS coletivo terá sentença com eficácia de coisa julgada material para todos os substituídos, desde que, evidentemente, nele haja pronunciamento específico sobre o direito afirmado pelo impetrante”.

Diante disso, a decisão que denega a segurança por ausência de direito líquido e certo não faz coisa julgada material, tampouco prejudica o direito de ingressar com ação do rito comum para alcançar a pretensão almejada. Porém, se a decisão que denegar a segurança for por ausência de direito, mesmo que traga a erronia quanto à forma de extinção, deve se analisar a essência, pois houve cognição plena e concluiu pela inexiste direito, faz coisa julgada material, sendo vedada a renovação da demanda.

Como se vê pela breve exposição constante desse capítulo, a coisa julgada no processo coletivo é diferenciada do processo individual, pois nessa a coisa julgada não depende do resultado do processo, enquanto naquele o resultado do processo é determinante.

No capítulo seguinte, abordar-se-á o tema principal do artigo, que é justamente a extensão subjetiva da tese jurídica formada no processo de conhecimento ajuizado pelas Associações, matéria de vultosa repercussão jurídica e econômica, cujos delineamentos, diante do vácuo normativo e da necessidade social, foram suprimidos e disciplinados pela jurisprudência, especialmente por precedentes vinculantes.


5. EXTENSÃO SUBJETIVA DO TÍTULO FORMADO NO PROCESSO DE CONHECIMENTO AJUIZADO POR ASSOCIAÇÕES.

Após uma abordagem prévia acerca do conceito e natureza jurídica das associações, bem como as formas de atuação processual para defesa dos direitos e interesses de seus associados, é possível ingressar nos questionamentos acerca da extensão subjetiva do título formado no processo de conhecimento intentado pelas associações.

Como alhures mencionado, as associações poderão atuar como legitimado extraordinário, a teor do artigo 82, inciso IV, do CDC e artigo 5º, LXX, alínea “b” da CF, bem como pode atuar como representante processual, a teor do artigo 5º, inciso XXI, da Constituição Federal de 1988.

Atuando com legitimação extraordinária, atua como substituto processual, ou seja, atua em nome próprio, defendendo direito alheio. Já quando atua como representante processual, atua em nome alheio, defendendo direito alheio. Numa forma ou de outra, a associação, ante o lauto de abrangência de uma decisão – tese jurídica criada, deve atender a forma legal.

Em que pese o artigo 82 do CDC contemplar a legitimação concorrente das associações para tutelar interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, o que poderia pressupor possibilidade de atuar como substituto processual também nas ações ordinárias,  o Supremo Tribunal Federal, nos autos do RE 573.232, julgado pela sistemática da repercussão geral, acabou restringindo a atuação como substituto processual no mandado de segurança coletivo, ao sedimentar o entendimento de que a atuação das associações, em ações do rito comum, se dá por meio de representação processual e não como substituto processual, ante a fixação da tese jurídica de que há necessidade de autorização expressa dos associados interessados para propor demanda.

Portanto, quando a Associação está atuando via mandado de segurança, está atuando como legitimado extraordinário, sendo dispensada de obter a autorização, considerando que a norma constitucional não condiciona a autorização dos filiados como requisito, nos termos do artigo 5º, inciso LXX, alínea “b”, in verbis:

Artigo 5º.

LXX - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por:

b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados;

Cabe aqui evidenciar que a associação, quando impetra mandado de segurança coletivo, atua como legitimado extraordinário, nos mesmos moldes do sindicato, aplicando-se os mesmos regramentos para utilização do instrumento processual, bem como em relação aos efeitos da coisa julgada. Na verdade, o que a decisão do STF fez foi diferenciar apenas a atuação das associações nos processos ajuizados pelo rito comum, onde atua como representação processual.

Quando a norma constitucional determinou a necessidade de autorização das associações para tutelar direitos dos associados, a teor do artigo 5º, inciso XXI, não o fez da mesma forma para os sindicatos, pois os dispensou da autorização para efetuar a defesa dos associados. Vejamos a distinção normativa, artigo 5º, inciso XXI, representação processual, enquanto artigo 8º, inciso III, substituição processual.

Art. 5º omissis

XXI - as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente.

Art. 8º omissis

III - ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas;

A legislação ordinária no mesmo sentido dispensa autorização, nos termos do artigo 21 da Lei nº 12.016/2009, que disciplina o mandado de segurança coletivo, in verbis:

Art. 21.  O mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por partido político com representação no Congresso Nacional, na defesa de seus interesses legítimos relativos a seus integrantes ou à finalidade partidária, ou por organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há, pelo menos, 1 (um) ano, em defesa de direitos líquidos e certos da totalidade, ou de parte, dos seus membros ou associados, na forma dos seus estatutos e desde que pertinentes às suas finalidades, dispensada, para tanto, autorização especial. 

Parágrafo único.  Os direitos protegidos pelo mandado de segurança coletivo podem ser: 

I - coletivos, assim entendidos, para efeito desta Lei, os transindividuais, de natureza indivisível, de que seja titular grupo ou categoria de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica básica; 

II - individuais homogêneos, assim entendidos, para efeito desta Lei, os decorrentes de origem comum e da atividade ou situação específica da totalidade ou de parte dos associados ou membros do impetrante. 

Nessa toada também é o conteúdo da Súmula n° 629 do STF “impetração do Mandado de Segurança Coletivo por entidade de classe em favor dos associados independe de autorização destes”.

O mandado de segurança coletivo pode atingir, ou não, toda a categoria, podendo a pretensão do mandamus interessar apenas a uma parte dela, como expressamente prevê o artigo 21 da Lei nº 12.016/2009. Nesse sentido, é o teor da Súmula n° 630 do STF ao dispor que expressamente apontou que a entidade de classe tem legitimação para mandado de segurança ainda quando a pretensão veiculada interessa apenas uma parte da respectiva categoria.

A coisa julgada no mandado de segurança coletivo será operacionalizada nos termos do artigo 103 do CDC c/c artigo 22 da Lei nº 12.016/2009.

No caso de procedência, a sentença ou acórdão vai beneficiar a todos os interessados. Quem não tiver interesse nesse resultado, paralelamente, poderá propor ações individuais. Nesses casos, não poderá se valer da tese jurídica do processo coletivo, salvo se optar pela suspensão do processo individual.

No caso de improcedência, necessária a distinção, se por ausência de direito ou por ausência de provas. Pela leitura do artigo 103 do CDC, no caso de direitos difusos e coletivos, a coisa julgada opera erga omnes para o primeiro e, ultra partes, em relação ao segundo, não o fazendo coisa julgada as decisões de improcedência por insuficiência de provas, em ambos os casos.

Logo, se a lei traz como única exceção a decisão de improcedência por ausência de provas, tem-se que as decisões de improcedência, por ausência de direito, fazem coisa julgada material, pois no mandado de segurança coletivo, a coisa julgada ocorre secundum eventum probationis. Isso porque, no mandado de segurança, não é possível dilação probatória, ante a exigência de prova pré-constituída do direito líquido e certo. Logo, uma vez ultrapassada essa exigência do mandamus, a denegação da segurança por ausência do direito gera coisa julgada material, pois proferida com cognição plena e exauriente. Nessa hipótese, resta prejudicado o direito de ingressar com nova ação para alcançar a pretensão almejada, seja de forma coletiva, seja individualmente.

Em casos tais, a eficácia subjetiva da decisão irá atingir toda a categoria, podendo haver cumprimento individual ou coletivo do conteúdo da decisão judicial – título executivo, a depender do interesse assegurado e que deverá ser implementado por meio do cumprimento.

Outrossim, corrobora esse posicionamento, o argumento de que se o legislador quisesse admitir coisa julgada só para as decisões de procedência teria adotada a mesma redação relativa aos direitos individuais homogêneos coletivo (103, III do CDC), cuja coisa julgada só opera nos casos de procedência, in utilibus.

Outro argumento importante para manter esse posicionamento é de natureza sócio jurídica, pois não se pode ignorar uma decisão judicial de improcedência, por ausência de direito, para admitir que o mesmo conflito, resolvido de forma molecular, seja atomizado, por meio de diversas demandas individuais. Seria um contrassenso com a princípio da eficiência e da duração razoável do processo, considerando que a situação dos sindicatos e associações em sede de mandado de segurança coletivo é sui generis, pois diferente dos demais legitimados, as associações sabem exatamente o que buscam, já que possuem conhecimento técnico para avaliar o direito e as necessidades de seus filiados/associados.

Esta sistemática muda completamente quando a Associação atua como legitimação ordinária, pois, nesse caso, estará atuando por representação processual, ou seja, atua em nome alheio, defendendo direito alheio, nos termos do artigo 5, inciso XXI da CF, in verbis: “as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente”.

A norma constitucional autorizou que as associações pudessem viabilizar a defesa, judicial ou extrajudicial, dos direitos e interesses individuais e coletivos de seus associados, porém, expressamente apontou a necessidade de autorização dos associados, como exigência de capacidade processual.

Nesse ponto, o Supremo Tribunal Federal, ao analisar os autos do RE 573.232, julgado pela sistemática da repercussão geral, ratificou o texto constitucional, apontando que não há letra morta no texto, sendo necessária a autorização dos associados para ajuizamento da demanda. E mais, apontou que não deve ser admitida a previsão genérica do estatuto para demandar. Vejamos o julgado:

REPRESENTAÇÃO – ASSOCIADOS – ARTIGO 5º, INCISO XXI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ALCANCE. O disposto no artigo 5º, inciso XXI, da Carta da República encerra representação específica, não alcançando previsão genérica do estatuto da associação a revelar a defesa dos interesses dos associados. TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL – ASSOCIAÇÃO – BENEFICIÁRIOS. As balizas subjetivas do título judicial, formalizado em ação proposta por associação, é definida pela representação no processo de conhecimento, presente a autorização expressa dos associados e a lista destes juntada à inicial. (RE 573232, Relator(a):  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Relator(a) p/ Acórdão:  Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 14/05/2014, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-182 DIVULG 18-09-2014 PUBLIC 19-09-2014 EMENT VOL-02743-01 PP-00001)

Para o STF, essa exigência de autorização não pode ser a genericamente prevista no estatuto, devendo haver autorização de forma expressa e específica, por meio da manifestação individual do associado ou por meio de aprovação em assembleia geral da entidade.

Segundo a ratio decidendi do acordão acima referido, essa exigência decorre da necessidade de contemplar o contraditório e a ampla defesa, pois é a partir dessa autorização que a parte contrária tem condições de efetuar a defesa.

Ademais, é em razão dessa singularidade que, nesses processos, em que pese haver discussão sob a forma coletiva, terá aplicação das regras do processo individual para fins de eficácia subjetiva da decisão, pois somente os associados que autorizaram a ação, cujo nome integrou o rol de associados, no momento do ajuizamento da ação, é que podem buscar a execução da decisão, pois quem não autorizou não possui legitimidade ad causam, já que os efeitos da sentença judicial transitada em julgado não os devem alcançar.

Essa regra foi sacramentada pelo STF, diante da tese jurídica fixada nos autos do RE 573232/SC, julgado pela sistemática da repercussão geral, no sentido de que: “as balizas subjetivas do título judicial, formalizado em ação proposta por associação, é definida pela representação no processo de conhecimento, presente a autorização expressa dos associados e a lista destes juntada à inicial”.

Essa decisão do STF possui fundamento legal, já que o parágrafo único do artigo 2º da Lei nº 9.494/97 era expresso nesse sentido em relação à União, aos Estados, ao Distrito Federal, aos Municípios e suas autarquias e fundações. Transcreve-se in verbis:

Art. 2º-A. (...)

Parágrafo único. Nas ações coletivas propostas contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas autarquias e fundações, a petição inicial deverá obrigatoriamente estar instruída com a ata da assembleia da entidade associativa que a autorizou, acompanhada da relação nominal dos seus associados e indicação dos respectivos endereços.

Trata-se de regra aplicada apenas quando havia no polo passivo a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações. Porém, após a decisão do STF, ficou expresso que essa mesma regra deve ser aplicada a todos os processos, independente do litigante constante do polo passivo, em razão do precedente vinculante, que por sinal atendendo o dever de coerência e integridade das decisões judiciais, nos termos do artigo 927, inciso III do CPC.

A constitucionalidade desse dispositivo foi questionada nos autos do RE 612043/PR, analisado pela sistemática de repercussão geral, em 2017, quando o Tribunal analisou a questão da eficácia territorial do pronunciamento judicial. O voto condutor declarou a constitucionalidade do dispositivo. Vejamos a conclusão do acordão:

(...) Em Direito, os fins não justificam os meios. Descabe potencializar a prática judiciária, tendo em vista a possível repetição de casos versando a mesma matéria, para buscar respaldar o alargamento da eficácia subjetiva da coisa julgada formada. Essa não é a solução adequada, considerado o efeito multiplicador, uma vez previstos, na legislação ordinária, mecanismos de resolução de casos repetitivos. O Estado Democrático de Direito é, antes de mais nada, liberdade, mas liberdade materializada mediante a estrita observância do devido processo legal.

A problemática da eficácia territorial do pronunciamento judicial é ação plúrima submetida ao rito ordinário. Esse mesmo enfoque seria observado se ajuizada a ação, diretamente, pelos próprios beneficiários do direito, não havendo tratamento diverso atuando a associação como representante.

Conheço e desprovejo o extraordinário, declarando a constitucionalidade do artigo 2º-A da Lei nº 9.494/1997.(...)

O recurso extraordinário que gerou esse precedente continha os seguintes elementos: a causa de pedir recursal consistia na contrariedade aos artigos 1º, 5º, inciso XXI e inconstitucionalidade do artigo 2º-A, parágrafo único, da Lei nº 9.494/1997, já o pedido recursal consistia na fixação dos limites da extensão da coisa julgada, especialmente no sentido de esclarecer qual o momento seria exigível a filiação, considerando que no caso concreto havia a discussão sobre a possibilidade de beneficiar da eficácia da coisa julgada os filiados que se filiaram após a formalização do processo de conhecimento.

A matéria foi amplamente discutida, seguindo a ideia interpretativa de Dworkin, romance em cadeia, partindo-se da ratio decidendi constate do RE 572.232/SC, tema 082.

Em relação ao momento processual adequado para se exigir a comprovação da filiação, o acordão não se limitou ao aspecto temporal para comprovação da filiação, mas também ao aspecto geográfico, criando a seguinte tese:

A eficácia subjetiva da coisa julgada formada a partir de ação coletiva, de rito ordinário, ajuizada por associação civil na defesa de interesses dos associados, somente alcança os filiados, residentes no âmbito da jurisdição do órgão julgador, que o fossem em momento anterior ou até a data da propositura da demanda, constantes da relação jurídica juntada à inicial do processo de conhecimento.

Logo, a eficácia subjetiva da coisa julgada formada a partir de ação coletiva, de rito ordinário, ajuizada por associação civil na defesa de interesses dos associados, por meio do instituto da representação, somente alcança os filiados, residentes no âmbito da jurisdição do órgão julgador, que no momento anterior ou até a data da propositura da demanda, tenha autorizado e o nome tenha constado da relação juntada à inicial do processo de conhecimento.

Trata-se de situação relevante apenas para as ações propostas no âmbito justiça estadual, cujas decisões ficariam limitadas a jurisdição do Tribunal estadual, pois se a ação tramitar junto a jurisdição Federal, não terá essa restrição, considerando que o mesmo possui jurisdição nacional, a teor do que dispõe o artigo 109, §2º da Constituição Federal: “As causas intentadas contra a União poderão ser aforadas na seção judiciária em que for domiciliado o autor, naquela onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda ou onde esteja situada a coisa, ou, ainda, no Distrito Federal”.

Nesse sentido, os seguintes precedentes:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. AÇÃO COLETIVA AJUIZADA NO DISTRITO FEDERAL. EFEITOS DA SENTENÇA. LIMITAÇÃO SUBJETIVA DO ARTIGO 2º-A DA LEI 9.494/1997. INAPLICABILIDADE. 1. A Justiça Federal do Distrito Federal possui jurisdição nacional, por força do art. 109, § 2º, da Constituição da República, e, desse modo, as decisões proferidas pela Seção Judiciária do Distrito Federal não têm sua abrangência limitada nos termos do art. 2º-A da Lei 9.494/1997. Precedentes: AgInt no REsp 1.382.473/DF, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe 30/3/2017; AgRg nos EDcl no AgRg no Ag 1.424.442/DF, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 28/3/2014. 2. No caso, optando o Sindicato dos Trabalhadores do Serviço Público Federal no Estado do Rio de Janeiro - SINTRASEF por ajuizar a ação coletiva na Seção Judiciária do Distrito Federal, os efeitos da sentença proferida por referido Juízo alcança, naturalmente, todos os seus filiados. 3. Agravo interno não provido. (STJ, AgInt no REsp 1448615/DF, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/06/2018, DJe 18/06/2018)

Quanto aos associados que ingressarem após o ajuizamento da ação, a tese jurídica nada menciona, porém, pela lógica da ratio decidendi, os associados que ingressarem após o ajuizamento da ação não devem ser atingidos, pois não integraram a lista dos associados, logicamente não autorizaram o ajuizamento da inicial.

Tem-se que essa sistemática poderá ser alterada, caso o interessado passe a integrar a lide como terceiro interessado, na qualidade de assistente litisconsorcial. Nesse caso, a intervenção é útil, pois não vai extrair a essência molecular da demanda coletiva, ao contrário vai evitar a atomização de várias ações individuais paralelas com mesmo pedido.

Dessa forma, pode-se afirmar que a eficácia subjetiva da coisa julgada, nas ações ordinárias intentadas pelas associações, são as mesmas do processo individual, ou seja, o título executivo somente será extensível aos associados que autorizaram a ação judicial, residentes no âmbito da jurisdição do órgão julgador, cujo nome constou na lista de associado juntada com a exordial, não abrangendo os associados que não autorizaram e não integraram a lista, pois a associação não tem legitimidade ativa para defender os interesses desses associados.

O Superior Tribunal de Justiça vem seguindo de forma uníssona o precedente do STF:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. JUÍZO DE RETRATAÇÃO. REPERCUSSÃO GERAL. ART. 543-B, § 3º, CPC. RE 573.232/SC. ASSOCIAÇÃO. REPRESENTAÇÃO. ASSOCIADO QUE NÃO CONSTA EXPRESSAMENTE NA LISTA. ILEGITIMIDADE PARA FUTURA EXECUÇÃO.

1. Com o julgamento do RE 573.232/SC pelo Supremo Tribunal Federal, os autos foram devolvidos pela Vice-Presidência do STJ a esta relatoria em atenção ao disposto no § 3º do art. 543-B do Código de Processo Civil, diante da necessidade de adequação do julgamento ao entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal.

2. A Segunda Turma desta Corte Superior havia decidido que tanto o sindicato como a associação possuem legitimidade para defender os interesses da categoria na fase de conhecimento ou execução, sendo desnecessária a juntada de relação nominal dos filiados, bem como de autorização expressa.

3. Ocorre que a questão foi posta ao exame do Plenário do Supremo Tribunal Federal que, reconhecendo a repercussão geral da matéria, apreciou e julgou o RE 573.232/SC, de relatoria da Min. RICARDO LEWANDOWSKI, relator para Acórdão Min. MARCO AURÉLIO, ocasião em que as "balizas subjetivas do título judicial, formalizado em ação proposta por associação, é definida pela representação no processo de conhecimento, presente a autorização expressa dos associados e a lista destes juntada à inicial".

4. Não têm aplicabilidade ao caso dos autos os precedentes do STF que reconhecem a ausência de repercussão geral do debate acerca da ilegitimidade ativa de servidores e trabalhadores para executar sentença condenatória, quando há previsão expressa no título executivo judicial de extensão dos efeitos da decisão a toda a categoria. Primeiro, porque o presente feito cuida de ação de ordinária (conhecimento) interposta por associação em nome de atuais e futuros associados e não de execução individual de sentença proferida em ação civil pública. Segundo, porque o debate travado nas instâncias ordinárias não abarca a questão federal sobre limites da coisa julgada formada em sentença condenatória genérica proferida em processo de conhecimento, matéria de natureza infraconstitucional. Terceiro, porquanto o fundamento da legitimidade ativa da associação, no presente caso, não dispensa exame sobre a necessidade de autorização das associações para a representação de seus associados, matéria reconhecidamente de repercussão geral no Recurso Extraordinário 573.232/SC, ou seja, de cunho constitucional.

Recurso especial conhecido em parte e parcialmente provido para reconhecer a necessidade de autorização expressa dos associados e a lista destes juntada à inicial. (REsp 1468734/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/03/2016, DJe 15/03/2016)

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EFEITOS DA COISA JULGADA EM AÇÃO COLETIVA. LIMITAÇÃO TERRITORIAL E TEMPORAL. SÚMULA 83 DO STJ. 1. É assente na jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que, quando em discussão a eficácia objetiva e subjetiva da sentença proferida em ação coletiva proposta em substituição processual, a aplicação do art. 2º-A da Lei n. 9.494/1997 deve se harmonizar com os demais preceitos legais aplicáveis ao tema, de forma que o efeito da sentença coletiva nessas hipóteses não está adstrito aos filiados à entidade sindical à época do oferecimento da ação coletiva, ou limitada a sua abrangência apenas ao âmbito territorial da jurisdição do órgão prolator da decisão. Aplicação da Súmula 83 do STJ. 2. Agravo interno desprovido. (AgInt no REsp 1639899/RS, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 26/09/2017, DJe 24/11/2017)

PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA 284/STF. AÇÃO COLETIVA PROPOSTA POR SINDICATO NO INTERESSE DA CATEGORIA. SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL. RESTRIÇÃO DOS EFEITOS AOS FILIADOS AO TEMPO DO AJUIZAMENTO DA AÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. LIMITAÇÃO SUBJETIVA DO TÍTULO AOS NOMINADOS EM LISTAGEM. DESCABIMENTO. 1. Não se conhece do Recurso Especial em relação à ofensa ao art. 535 do CPC quando a parte não aponta, de forma clara, o vício em que teria incorrido o acórdão impugnado. Aplicação, por analogia, da Súmula 284/STF. 2. O acórdão recorrido está em consonância com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça de que o sindicato, na qualidade de substituto processual, detém legitimidade para atuar judicialmente na defesa dos interesses coletivos de toda a categoria que representa, sendo prescindível a relação nominal dos filiados e suas respectivas autorizações, razão pela qual a coisa julgada advinda da ação coletiva deverá alcançar todas as pessoas da categoria, legitimando-os para a propositura individual da execução de sentença. 3. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa medida, não provido. (REsp 1681890/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/12/2017, DJe 19/12/2017)


CONCLUSÃO

As associações possuem legitimidade para atuar por legitimação extraordinária, a teor do artigo 5º, LXX, alínea “b” da CF, bem como por meio de representante processual, a teor do artigo 5º, inciso XXI, da Constituição Federal de 1988.

Quando as associações atuarem como representante processual em ações coletivas em favor dos seus associados, deverá estar autorizada pelos associados para propor a ação na defesa de seus interesses. Essa autorização fornecida pelos associados deve ser expressa e específica para cada ação a ser proposta pela associação, não sendo suficiente a autorização genérica prevista no estatuto da associação. Pode ser viabilizada por meio de declaração individual do associado ou por aprovação na assembleia geral da entidade.

O momento processual adequado para se exigir a comprovação da filiação do associado para fins de execução de sentença proferida em ação coletiva ajuizada por associação, atuando como representante processual, restou delineado nos autos do RE nº 612043/PR, julgado pela sistemática de repercussão geral, que fixou a tese de que o associado deve estar filiado em momento anterior ou até a data da propositura da demanda, constantes da relação jurídica juntada à inicial do processo de conhecimento.

Além dessa limitação relacionada ao aspecto temporal, a decisão também restringiu os limites geográficos ao apontar que a eficácia subjetiva da coisa julgada somente deve alcançar os filiados residentes no âmbito da jurisdição do órgão julgador, ante a constitucionalidade do artigo 2º-A da Lei nº 9494/97, reconhecida expressamente pelo STF, nos autos do RE 612043/PR.

Tais regramentos não se aplicam nas hipóteses em que as associações atuam como substituto processual, com fulcro no artigo 5º, inciso LXX, alínea “b” da CF, mediante impetração de mandado de segurança coletivo, pois nessas hipóteses a associação não precisa de autorização específica dos filiados, nos termos da Súmula 629 do STF.

No mandado de segurança coletivo, os limites subjetivos do título judicial serão operacionalizados nos termos do artigo 103 do CDC c/c artigo 22 da Lei nº 12.016/2009, que assim dispõe: “No mandado de segurança coletivo, a sentença fará coisa julgada limitadamente aos membros do grupo ou categoria substituídos pelo impetrante”.

Logo, nos interesses difusos e coletivos, a coisa julgada opera erga omnes para o primeiro e ultra partes em relação ao segundo, não o fazendo coisa julgada as decisões de improcedência por insuficiência de provas, em ambos os casos, por expressa previsão legal. A contrario sensu, as decisões de improcedência, por ausência de direito, produzem coisa julgada material, pois se tivesse o legislador a intenção de excepcionar tais decisões, teria feito a redação dos incisos I e II da mesma forma que fez em relação aos incisos III, no que toca aos interesses individuais homogêneos, apontando que só produzirá coisa julgada de for de procedência.

Porém, o legislador assim não o fez, foi expresso que em relação aos interesses difusos e coletivos, a coisa julgada seria secundum eventum probationis, pois excepcionou apenas decisão de improcedência por insuficiência de provas, da mesma forma que permitiu a repropositura da ação mediante prova nova.

E mais, não se pode olvidar que a Lei nº 12.016/2009 foi elaborada após doze anos e, mesmo diante da evolução do processo coletivo, não dispõe de forma diferente. Ao contrário, expressamente previu que “no mandado de segurança coletivo, a sentença fará coisa julgada limitadamente aos membros do grupo ou categoria substituídos pelo impetrante”, ou seja, independente do resultado, fará coisa julgada material.

Ora, se o legislador quisesse impor outra sistemática, teria feito de forma expressa em outro sentido. Porém, assim não o fez, isso porque o mandado de segurança possui sua peculiaridade de não admitir a dilação probatória, ante a exigência de prova pré-constituída do direito líquido e certo. E, ultrapassada a exigência do mandamus, a denegação da segurança por ausência do direito gera coisa julgada material, pois proferida com cognição plena e exauriente, independente do termo utilizado, pois o que se deve analisar é a essência do julgamento.

Nessas situações, resta prejudicado o direito de ingressar com nova ação para alcançar a pretensão almejada, seja de forma coletiva, seja individualmente, pois a eficácia subjetiva da decisão irá atingir toda a categoria, exatamente nos termos do artigo 22 da lei nº 12.016/2009.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Autor

  • Keila Vânia Fernandes Jara

    Pós-graduanda em Direito Processual Civil pela EDAMP/UNIGRAN/MS. Advogada integrante da Carreira de Assistência Jurídica do Estado de Mato Grosso do Sul. Atualmente chefe da Unidade de Apoio Jurídico da Procuradoria de Pessoal, órgão integrante da estrutura da Procuradoria Geral do Estado de Mato Grosso do Sul

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Informações sobre o texto

Foi elaborado para fins de conclusão do Curso de Pós Graduação em Processo Civil - EDAMP/UNIGRAN/MS

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

JARA, Keila Vânia Fernandes. Eficácia subjetiva da coisa julgada nos processos coletivos ajuizados por associações. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5979, 14 nov. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/77780. Acesso em: 23 abr. 2024.