Capa da publicação Delito de hermenêutica e o uso seletivo da ação de improbidade
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O delito de hermenêutica instituído e punido, no Brasil, por meio da Lei de Improbidade Administrativa

15/07/2017 às 13:13
Leia nesta página:

O texto representa uma crítica ao comportamento, no Brasil, relacionado ao delito de hermenêutica, que existe, dependendo de quem é o intérprete da lei.

A lei de abuso de autoridade está tramitando no Congresso Nacional e surgiu por lá um dispositivo que foi interpretado como o malfadado “delito de hermenêutica”. Houve um autêntico levante do Poder Judiciário e do Ministério Público, seus sindicatos, associações, entidades de bairro etc. e tal, contra o dispositivo, chegando ao ponto de o Juiz Sérgio Moro ir às mídias criticar  a norma. Segundo todos eles, interferia na independência do juiz e do promotor, era um grave atentado ao judiciário e ao MP, que o demônio estava se transferindo para o Brasil com seus piores diabos.

No julgamento da chapa Dilma-Temer, a sociedade inteira esperava a cassação dela, mas os brasileiros tiveram de suportar o “voto de Minerva” do Presidente do TSE, contrário a tudo e a todos. De quebra, um Ministro deu chilique lá porque também é fruto de delação premiada. Fez gestos de cortar a cabeça com as mãos e tudo mais. A interpretação da lei que eles fizeram não foi considerada “delito de hermenêutica” e ninguém foi submetido a ação de improbidade administrativa.

A presidente Dilma Roussef foi cassada, mas o presidente do Supremo Tribunal Federal fez uma interpretação que a comunidade jurídica considerou inconstitucional, porque ele não cassou os direitos políticos dela. Inédito! Perplexidade total! A interpretação da lei não foi considerada “delito de hermenêutica”, e ninguém foi submetido à ação de improbidade administrativa.

A Constituição da República diz que “ninguém será considerado culpado antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória”. Surgiu dissídio jurisprudencial de que, a partir da confirmação da condenação em segunda instância, era possível o cumprimento de mandado de prisão, mesmo sem o tal “trânsito em julgado”, mesmo contra o teor literal da Constituição. A celeuma foi submetida ao plenário do STF e, por maioria de votos, foi decidido que era possível o cumprimento do mandado de prisão. Pois bem! Apesar dessa interpretação ser contra o texto literal da Constituição, não foi considerada “delito de hermenêutica”, e ninguém foi submetido à ação de improbidade administrativa.

Chegou um recurso ou Habeas Corpus – não me lembro bem – e o decano do STF mandou soltar o preso, dizendo que não havia ocorrido o trânsito em julgado, e ele não era “considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória”. Ocorre que o decano participou da votação no plenário que decidiu que era possível o cumprimento do mandado após confirmação da condenação em segunda instância. Porém, o decano foi voto vencido. Então, mesmo tendo sua interpretação monocrática sido contra a majoritária do pleno do STF, isso não foi considerado “delito de hermenêutica”, e ele não foi submetido à ação de improbidade administrativa.

 O Ministério Público Federal entendeu que pode dar imunidade absoluta em caso de delação premiada, tese que não coaduna com qualquer comentário sério sobre este instituto, contra suas origens norte-americanas, de onde foi importado e ao arrepio do que os juristas brasileiros propalam sobre ela. Concedeu a impunidade descaradamente à JBS, diante dos brasileiros atônitos, que tinham esperanças que o STF fosse determinar limites e definir parâmetros afim de corrigir esse equívoco. O STF sufragou tudo que o MPF fez. A interpretação do MPF, tanto quanto a interpretação do STF foi considerado “delito de hermenêutica, ninguém foi submetido à ação de improbidade administrativa.

Lá no Mogi das Cruzes, Estado de São Paulo, existe um Delegado em fim de carreira.

Delegado é aquele personagem cuja existência está expressa na Constituição Federal. Sua atividade e atribuições têm assento constitucional; aliás, é o único servidor policial que, na Carta Magna, tem assento. Além da direção da Polícia Judiciária, a  atividade do Delegado é expressa nos artigos 4º a 23 e 301 a 309, do Código de Processo Penal, Decreto-Lei 3689/1941, entre outras disposições deste mesmo Estatuto. Sua atividade é supinamente jurídica, como se pode perceber, inclusive, pela resolução do CNJ, que diz o que é e o que não é atividade jurídica. A menção expressa de que a atividade do Delegado é Jurídica não consta apenas de diversas Constituições dos Estados Federados Brasileiros, sua autonomia está expressa pelo Estatuto da Investigação Criminal Brasileira, Lei 12.830/2013.

Então, lá no Mogi, realmente, o Delegado encontrou sua cruz.

Ele acreditou que a Constituição, o Código de Processo Penal, o Estatuto da Investigação Criminal Brasileira e tantas outras normas que disciplinam sua atividade, garantindo sua autonomia em prol da sociedade, estão em vigor. Ledo engano!

Chegou uma ocorrência envolvendo drogas que ele RESOLVEU e DECIDIU que era infração de menor potencial ofensivo, que não se tratava de tráfico de drogas. Fundamentou sua decisão e decidiu o fato que lhe foi apresentado.

Adivinhem o que aconteceu?

Vamos lá... ganha um doce quem conseguir....

Uma paçoquinha...

Vamos! Você consegue...

Sim, isso mesmo!

O Ministério Público decidiu que ele cometeu “delito de hermenêutica”, e interpôs ação de improbidade administrativa.

O Poder Judiciário, por sua vez, sentenciou que era... vamos lá... duas paçoquinhas, agora.... Delito de hermêutica!

O Delegado foi condenado, perdeu o cargo, foi proibido de contratar com o Poder Público e tem de pagar multa.

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Captaram?

Delito de hermenêutica não pode...

... dependendo do lugar em que você está!


http://www.conjur.com.br/2017-jul-10/delegados-repudiam-condenacao-colega-perdeu-cargo

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Sobre o autor
Luís Carlos de Almeida Hora

Delegado de Policia em Rondônia

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HORA, Luís Carlos Almeida. O delito de hermenêutica instituído e punido, no Brasil, por meio da Lei de Improbidade Administrativa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5127, 15 jul. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/noticias/59072. Acesso em: 8 nov. 2024.

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