MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA PARAÍBA
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE POMBAL
EXMO(A). SR(A). JUIZ(ÍZA) DE DIREITO DA VARA DA COMARCA DE POMBAL - PB
- Competência por livre distribuição -
Referência: Procedimento Administrativo nº 22/10
Origem: Promotoria de Justiça de Pombal/PB
Assunto: Irregularidades – Cadeia Pública – Pombal - PB
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA PARAÍBA, por seu representantesignatário, no uso de suas atribuições legais, com espeque nas peças informativas inclusas e com fundamento no art. 129, incisos II e III, da Constituição Federal, art. 25, incisos, Lei n.º 8.625/93, e Lei nº 7.347/85, vem, perante V. Exa., propor a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA
com PEDIDO(S) LIMINAR(ES)
em face do ESTADO DA PARAÍBA, pessoa jurídica de direito público interno, representado pelo Procurador-Geral do Estado, que pode ser encontrado na Avenida Epitácio Pessoa, nº 1457, 4º andar, Bairro dos Estados, João Pessoa - PB, pelos fatos e fundamentos a seguir aduzidos.
1. DAS QUESTÕES PRÉVIAS
1.1. DA LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO E DO CABIMENTO/ADEQUAÇÃO DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA
A Constituição Federal de 1988 dispõe sobre a incumbência do Ministério Público na "defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis" (art. 127, "caput", CRFB) e elenca como uma das funções ministeriais "promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos." (art. 129, III, CRFB).
De outro lado, a Lei nº 8.625, de 12 de fevereiro de 1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público), no seu art. 25, inciso IV, diz ser incumbência do Ministério Público promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei, "para a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, e a outros interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis e homogêneos" e "para a anulação ou declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio público ou à moralidade administrativa do Estado ou de Município, de suas administrações indiretas ou fundacionais ou de entidades privadas de que participem".
A Lei de Execução Penal (Lei Federal nº 7.210/84) imputa ao Ministério Público a responsabilidade pela fiscalização da execução da pena (art. 67 [01]).
Em diversos pontos desse País, o "Parquet" tem ajuizado ações civis públicas em prol da regularização dos estabelecimentos prisionais, sendo largamente acolhida a sua legitimidade processual.
Contemple-se a seguinte ementa:
"CONSTITUCIONAL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DIREITOS FUNDAMENTAIS DO ENCARCERADO - RELATÓRIOS DA VIGILÂNCIA SANITÁRIA SOBRE AUSÊNCIA DE CONDIÇÕES MÍNIMAS DE HIGIENE E SAÚDE AO PRESO NOS ESTABELECIMENTOS PRISIONAIS DO MUNICÍPIO - POSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO DO ESTADO EM OBRIGAÇÃO DE FAZER QUE NÃO AFRONTA O PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES, LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL E LEI DE LICITAÇÕES - ATO ADMINISTRATIVO VINCULADO FRENTE AS DETERMINAÇÕES DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL - NORMAS DE CONDUTA COGENTE E NÃO MERAMENTE PROGRAMÁTICAS - RESPONSABILIDADE DO ESTADO - APELAÇÃO IMPROVIDA. 1. A concretização dos direitos dos condenados elencados na Convenção de Viena em 1993, na Carta das Nações Unidas, na Declaração Universal dos Direitos Humanos e no art. 5º, LXIV da Carta Magna Brasileira foi estabelecido no corpo e espírito da Lei de Execução Penal, a Lei 7.210/84. Mencionado corpo normativo visa impedir o excesso ou a omissão da execução destes direitos. 2. A determinação judicial de uma obrigação de fazer não encerra suposta invasão do Judiciário na esfera da administração, isto porque as medidas impostas são atividades vinculadas a lei infraconstitucional. A Constituição Federal consagrou o direito a integridade física e moral dos presos no art. 5º, inciso LXIV, regulamentada pela Lei de Execução Penal, o que permite ao Poder Judiciário imposição de obrigação de fazer com o fim de tornar realidade os preceitos constitucionais, mesmo que a decisão atinja a esfera orçamentária pública." (TJMA - APELAÇÃO CÍVEL: AC 214462004 MA Relator(a): MILITÃO VASCONCELOS GOMES Julgamento: 16/06/2005 Órgão Julgador: SAO LUIS)
Sem sombra de dúvida, portanto, é o Ministério Público legitimado para a propositura da presente ação civil pública, que constitui o mecanismo processual adequado.
1.2. DA COMPETÊNCIA JURISDICIONAL
Conforme a inteligência do art. 162, art. 163, art. 165, inciso I, e art. 177, incisos, todos da Lei Complementar nº 96/2010 (LOJE - PB) [02], compete o processamento e o julgamento da presente demanda a qualquer uma das Varas da Comarca de Pombal – PB, mediante livre distribuição, pois não se inclui a causa em nenhuma das hipóteses de competência privativa elencadas no Anexo V da LOJE - PB.
Bem lidos os incisos do art. 177, LOJE – PB, especificamente os incisos II e V, nota-se que constituem a reprodução do conteúdo dos incisos VII e VIII, art. 66, LEP, e, portanto, consubstanciam providências essencialmente administrativas, sem nenhum caráter jurisdicional propriamente dito, posto não haver qualquer menção a processos judiciais/litígios que resultem na adoção de tais condutas (p.ex.: interdição de estabelecimento prisional; distribuição dos presos entre estabelecimentos) pelo Juízo de Direito, que figura, em tal ensejo, afastado/desprovido da incumbência de decidir uma lide entre partes. Em tais hipóteses, o Juízo simplesmente determina providências, sem prévio processo judicial.
De fato, conforme entendimento explicitado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (abaixo colacionado), as atribuições previstas no art. 61, VIII, Lei nº 7.210/84 (Lei das Execuções Penais), são puramente administrativas, não se atrelando/vinculando ao exercício da jurisdição nos processos atinentes às ações civis públicas voltadas à regularização dos serviços prisionais.
Contemple-se:
"CONFLITO POSITIVO DE COMPETÊNCIA. VARA CRIMINAL E VARA CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DESTINADA À INTERDIÇÃO DE CADEIA PÚBLICA LOCAL. INTELIGÊNCIA DO ART. 59, DA LEI COMPLEMENTAR Nº 59/2001. 1. A competência do juiz da execução criminal, prevista no artigo 61, inciso VIII, (repetida no art. 66 da LEP), é para as atividades administrativas da execução penal, o que não se confunde com a competência para processar e julgar ação civil pública proposta pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais contra o Estado de Minas Gerais, fixada pelo art. 59, da Lei Complementar nº 59/2001. 2. Consoante orientação jurisprudencial deste egr. Tribunal de Justiça, 'a Vara Cível, em Comarca que não exista Vara da Fazenda Pública, é a competente para julgar ação civil pública movida contra o Estado de Minas Gerais, que vise à interdição judicial de estabelecimento prisional (...)'.3. Conflito positivo de competência conhecido e declarada a competência do Juízo da 1.ª Vara Cível." (TJMG: 100000745915610001 MG 1.0000.07.459156-1/000(1) Resumo: Conflito Positivo de Competência. Vara Criminal e Vara Cível. Ação Civil Pública Destinada à Interdição de Cadeia Pública Local. Inteligência do Art. null59, da Lei Complementar nº 59/2001. 1. Relator(a): CÉLIO CÉSAR PADUANI Julgamento: 29/11/2007 Publicação: 06/12/2007)
Assim, considerando que o art. 66, VII e VIII, LEP, e o art. 177, II e V, LOJE – PB, abarcam apenas atribuições administrativas, aflora evidenciado que, por força do art. 165, I, LOJE – PB, qualquer uma das Varas da Comarca de Pombal detém competência para processar e julgar o presente feito.
2. DOS FATOS E DA FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
Trata-se de ação civil pública (ACP) embasada no Procedimento Administrativo nº 22/2010/Promotoria de Justiça/Pombal/PB, cujo teor indica a prática pelodemandado de ampla e inaceitável ofensa ao ordenamento jurídico vigente, no âmbito da Cadeia Pública de Pombal – PB.
São várias irregularidades e diversos os dispositivos normativos malferidos, conforme se depreende da leitura dos autos ministeriais em anexo.
Por diversas vezes (ff. 17, 18, 29, 37, 38, 85, 87, 89, 99, 116, 117 e 119), o Ministério Público oficiou as autoridades estaduais competentes para ciência a respeito do caso e regularização do estabelecimento prisional, mas o quadro fático não foi alterado pelo promovido.
Grife-se: foram expedidos 12 (doze) ofícios pelo "Parquet", sem qualquer resolução da grave situação constatada junto à Cadeia Pública de Pombal – PB.
Também foi provocado o Estado da Paraíba para formalizar um termo de ajustamento de conduta (TAC), como instrumento jurídico amistoso apto à extirpação das irregularidades, mas o silêncio foi dado como resposta.
Diante de tal quadro e das ilicitudes abaixo mencionadas, não restou outra saída a não ser o ajuizamento da presente ação civil pública.
Para sintetizar a indicação das anormalidades averiguadas junto ao aludido estabelecimento criminal (v. Formulários/Relatórios de Inspeção a Estabelecimento Prisional às ff. 06-07v, 25-27v, 53-75, 78-81, 92-96, 101-115 e 121-127, elaborados pelo Ministério Público em conjunto com os integrantes da Cadeia Pública – Órgão do Estado da Paraíba), segue tabela apontando as irregularidades existentes e os dispositivos ofendidos:
Nº |
Irregularidade(s) |
Norma(s) Afetada(s) |
1 |
Inexistência de Classificação dos condenados, segundo os seus antecedentes e personalidade, para orientar a individualização da execução penal. |
Art. 5º, LEP [03] |
2 |
Inexistência de Comissão Técnica de Classificação (CTC) no estabelecimento. |
Art. 7º, art. 96, art. 97 e art. 98, LEP [04] |
3 |
A assistência material não está sendo prestada plenamente, pois não é fornecido vestuário e as instalações não são higiênicas (V. ff. 32-36). Segundo informações da Direção da Cadeia, o Estado da Paraíba não envia, com a regularidade devida, sequer sabonetes, aparelho de barbear, absorvente íntimo para mulheres, pasta dental, papel higiênico e escova dental (sendo esta, em 2010, enviada apenas duas vezes) (v. f. 103). |
Art. 12, art. 41, I e VII, LEP [05] |
4 |
Inexistência de local destinado à venda de produtos e objetos permitidos e não fornecidos pela Administração. |
Art. 13, art. 41, VII, LEP [06] |
5 |
A assistência à saúde não é plena, constatando-se que, em geral, no caráter preventivo e curativo, há precariedade no atendimento médico, farmacêutico e odontológico, inexistindo, em tal âmbito, qualquer atuação do Poder Público Estadual. Ressalve-se que, graças à atuação da rede municipal de saúde, o problema é pontualmente minorado porquanto: a) o atendimento médico curativo, desde o mês de junho/2010, está sendo prestado através da rede municipal de saúde – médico do PSF, não dispondo o médico, dentro da Cadeia Pública, de local apropriado para atender, utilizando-se, por empréstimo, do gabinete da Direção; b) o atendimento odontológico curativo estava ocorrendo através do deslocamento dos presos a postos do PSF (rede municipal de saúde), mediante escolta da Polícia Militar, mas, segundo informou a Direção da Cadeia Pública, o Poder Público Estadual, desde janeiro de 2011, deixou de promover a escolta dos detentos até o consultório dentário, suspendendo-se, portanto, os atendimentos odontológicos; c) os agentes comunitários fornecem preservativos regularmente aos detentos, objetivando a segurança das visitas íntimas; e d) a rede municipal de saúde tem fornecido grande parte dos medicamentos receitados pelo médico do PSF. No restante, inexiste qualquer aparato estatal. |
Art. 14, "caput" e parágrafos, art. 41, VII, LEP [07]; art. 196, CRFB [08] |
6 |
Precariedade da assistência jurídica aos presos/internados sem recursos financeiros para constituir advogado, através da Defensoria Pública. Conforme informam os autos, a Defensoria Pública presta serviços escassos junto à Cadeia Pública, sem visitá-la há vários meses, deixando os detentos completamente desassistidos, visto serem, em maioria absoluta, financeiramente hipossuficientes. Ademais, não há, dentro da Cadeia Pública, local apropriado destinado ao atendimento pelo Defensor Público. V. ff. 07v, 19 e 81. |
Arts. 15 e 16, parágrafos, art. 41, VII e IX, art. 81-A, art. 81-B e art. 83, §5º, LEP [09]; art. 5º, LXIII, CRFB [10] |
7 |
Inexistência de qualquer assistência educacional. A lei determina assistência educacional consistente em: instrução escolar e a formação profissional do preso e do internado; ensino de 1º grau; biblioteca, no estabelecimento, para uso de todas as categorias de reclusos, provida de livros instrutivos, recreativos e didáticos. |
Arts. 17 a 21, art. 41, VII, LEP [11] |
8 |
Inexistência de assistência social prestada pelo Estado. A lei determina a assistência social para: conhecimento dos resultados dos diagnósticos ou exames; relatos, por escrito, ao Diretor do estabelecimento, dos problemas e das dificuldades enfrentadas pelo assistido; acompanhamento do resultado das permissões de saídas e das saídas temporárias; promoção, no estabelecimento, pelos meios disponíveis, da recreação; promoção de orientação do assistido, na fase final do cumprimento da pena, e do liberando, de modo a facilitar o seu retorno à liberdade; obtenção de documentos, dos benefícios da Previdência Social e do seguro por acidente no trabalho; e colaboração com o egresso para a obtenção de trabalho. |
Arts. 22 e 23, art. 41, VII, LEP [12] |
9 |
A assistência religiosa é prestada por entidades religiosas, mas o estabelecimento carece de local apropriado para os cultos religiosos (improvisadamente, utiliza-se a "quadra" da Cadeia, que, na realidade, é o vão/saguão de acesso às celas; v. foto à f. 67). |
Art. 24, §1º, art. 41, VII, LEP [13] |
10 |
Inexistência de Assistência ao Egresso. A lei determina a assistência ao egresso consistente em: orientação e apoio para reintegrá-lo à vida em liberdade; concessão, se necessário, de alojamento e alimentação, em estabelecimento adequado, pelo prazo de 2 (dois) meses. |
Art. 25 e 26, LEP [14] |
11 |
Inexistência de Atestado de pena a cumprir, emitido anualmente pela autoridade judiciária. |
Art. 41, XVI, art. 66, X, art. 81-B, II, todos da LEP [15] |
12 |
Inexistência de Patronato. A lei determina a existência do Patronato para: assistência aos albergados e aos egressos; orientação dos condenados à pena restritiva de direitos; fiscalização do cumprimento das penas de prestação de serviço à comunidade e de limitação de fim de semana; colaboração na fiscalização do cumprimento das condições da suspensão e do livramento condicional. |
Art. 61, VI, art, 70, IV, art. 78, art. 79, LEP [16] |
13 |
Inexistência de Conselho da Comunidade. A lei determina a existência do Conselho da Comunidade para:visita mensal do estabelecimento penal; entrevista dos presos; relatórios mensais ao Juiz da execução e ao Conselho Penitenciário; obtenção de recursos materiais e humanos para melhor assistência ao preso ou internado, em harmonia com a direção do estabelecimento. |
Art. 61, VII, art. 66, IX, art. 80, art. 81, todos da LEP [17] |
14 |
Inexistência de estabelecimento próprio e adequado à condição pessoal da mulher e do maior de sessenta anos, separadamente do estabelecimento comum. A Cadeia Pública de Pombal abriga, na mesma estrutura predial: a) em um mesmo ambiente e sem qualquer diferenciação, todos os homens (maiores e menores de sessenta anos conjuntamente, nas mesmas celas); e b) mulheres (estas em uma cela separada dos homens, mas em contato com os demais presos [inclusive, homens], em determinados momentos do dia (durante o banho de sol), principalmente com aqueles que prestam serviços dentro do estabelecimento prisional). Não há o indispensável isolamento entre os diferentes indivíduos (jovens, idosos, homens, mulheres, etc.). |
Art. 82, §§1º e 2º, LEP [18] |
15 |
Presença de agentes do sexo masculino na segurança quanto aos compartimentos ocupados por mulheres e por maiores de sessenta anos. |
Art. 77, §2º, art. 82, §1º, art. 83, §2º, LEP [19] |
16 |
Inexistência de áreas e serviços destinados a dar assistência, educação, trabalho, recreação e prática esportiva, em suas dependências. OBS: o estabelecimento carece de local apropriado para a prática esportiva, mas os detentos se utilizam improvisadamente do vão/saguão de acesso às celas como se fosse uma "quadra", que, na realidade, é somente o vão/saguão de acesso às celas (v. foto à f. 67). É o mesmo espaço utilizado para cultos religiosos. |
Art. 83, "caput", LEP [20] |
17 |
Inexistência de instalação destinada a estágio de estudantes universitários. |
Art. 83, §1º, LEP [21] |
18 |
Inexistência de salas de aulas destinadas a cursos do ensino básico e profissionalizante. |
Art. 83, §4º, LEP [22] |
19 |
Inexistência de berçário. No estabelecimento penal, há mulheres, mas não existe local onde as condenadas possam cuidar de seus filhos, inclusive amamentá-los, no mínimo, até 6 (seis) meses de idade. |
Art. 83, §2º, LEP [23] |
20 |
Considerando a presença de mulheres na Cadeia Pública de Pombal – PB, a inexistência (i) de seção para gestante e parturiente e (ii) de creche para abrigar crianças maiores de 6 (seis) meses e menores de 7 (sete) anos, com a finalidade de assistir a criança desamparada cuja responsável estiver presa, com atendimento por pessoal qualificado, de acordo com as diretrizes adotadas pela legislação educacional e em unidades autônomas, e horário de funcionamento que garanta a melhor assistência à criança e à sua responsável. |
Art. 89, "caput" e parágrafo único, LEP [24] |
21 |
Inexistência de Colônia Agrícola, Industrial ou Similar, na Comarca de Pombal - PB. |
Arts. 91 e 92, LEP [25] |
22 |
Casa do Albergado irregular (regime aberto e limitação de final de semana), pois, apesar de se situar na zona urbana, a casa do albergado: (i) situa-se dentro do prédio da Cadeia Pública (dentro dos mesmos muros), (ii) conta com obstáculos físicos contra a fuga (o portão é trancado com cadeados), (iii) são escassos os aposentos, (iv) não dispõe de local adequado para cursos e palestras e (v) carece de instalações para os serviços de fiscalização e orientação dos condenados. Para tanto, observem-se as fotografias de ff. 74 e 75. As mulheres que deveriam se destinar à casa do albergado (regime aberto e limitação de final de semana) recolhem-se na única cela destinada às mulheres (v. 3ª foto da f. 75), onde também ficam as presas provisórias e as submetidas ao regime fechado (v. f. 56, "in fine"; 2ª foto da f. 60; e 3ª foto da f. 75). |
Arts. 93, 94, 95 e 152, LEP [26] |
23 |
Inexistência de separação do preso provisório em relação ao condenado por sentença definitiva. |
Art. 84, "caput", LEP [27] |
24 |
Inexistência de seções distintas para cumprimento da pena dos reincidentes e dos primários. |
Art. 84, §1º, LEP [28] |
25 |
Inexistência de celas individuais. |
Art. 88, "caput", LEP [29] |
26 |
As celas são coletivas e não preenchem os requisitos legais, pois contêm (i) dormitórios insuficientes (muitos dos detentos dormem em redes fornecidas por seus familiares), (ii) aparelhos sanitários em péssimas condições e (iii) lavatórios em condições horríveis. Grife-se, também, a falta de requisitos básicos da unidade celular: a) insalubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de baixa aeração, nula insolação e condicionamento térmico inadequado à existência humana; e b) desrespeito à área mínima de 6,00m² (seis metros quadrados), pois, em média, há 16 (dezesseis) detentos por cada cela, que, por sua vez, mede aproximadamente 20m² (vinte metros quadrados). Em média, cada detento "usufrui" de aproximadamente 1,25m² (um metro e vinte e cinco centímetros quadrados), espaço equivalente a apenas 20,83% do mínimo garantido por lei. |
Art. 88, "caput" e parágrafo único, LEP [30] |
27 |
Carência do arquivo em relação às guias de recolhimento, extraídas pelo escrivão e assinadas pelo Juiz, pois, apesar de existir uma melhora modesta em tal seara, nos últimos meses, a situação ainda pende de solução definitiva porquanto, em tal serviço, (i) a Direção da Cadeia tem alocado presos em regime fechado para organizar o arquivo (situação que expõe a segurança das informações), (ii) inexiste servidor administrativo para tal finalidade e (iii) não há uma rotina administrativa própria em tal seara, devendo-se a atual situação somente ao improviso da Administração Carcerária, que sequer dispõe de um sistema informatizado para acompanhamento dos casos (f. 96). |
Art. 106, art. 107, "caput", §§1º e 2º, LEP [31] |
28 |
A cadeia pública é irregularmente utilizada para o recolhimento de condenados definitivos, em todos os regimes (fechado, semiaberto e aberto), inclusive para o cumprimento de pena restritiva de direitos consistente na limitação de final de semana, quando a lei prevê a sua utilização somente para o recolhimento de presos provisórios. |
Art. 87, "caput", art. 90, art. 102, art. 103 e art. 104, LEP [32] |
29 |
O trabalho do(s) preso(s) é, em tese, remunerado, mas, conforme informado pela Direção da Cadeia Pública, desde agosto de 2010, o pagamento dos detentos que trabalham não é efetuado pelo Estado da Paraíba. Ademais, segundo informado, a remuneração corresponde a menos de 3/4 (três quartos) do salário mínimo, sendo o(s) cozinheiro(s) remunerado(s) mensalmente com R$100,00 (cem reais) e os demais prestadores de serviços com R$80,00 (oitenta reais). |
Art. 28, art. 29, art. 41, II e IV, LEP [33] |
30 |
Superlotação carcerária. Segundo informações da Direção da Cadeia Pública, o prédio foi projetado para abrigar apenas 35 (trinta e cinco) presos provisórios, contando atualmente com mais de 100 (cem) pessoas. |
Art. 85, LEP [34] |
31 |
Indicativo da presença de pessoas detentas portadoras de doenças mentais. Conforme noticiado pela Direção da Cadeia Pública, há suspeita de que alguns detentos (v. ff. 07v, 22, 27, 57 e 81) portem problemas mentais, mas, até o presente momento, apesar da provocação ministerial (ff. 24 e 45), o Juízo da Execução Penal não se manifestou sobre o pedido de providências. |
Art. 108, LEP [35]; e arts. 154 e 682, CPP [36] |
32 |
Insegurança do prédio (maiores detalhes abaixo – fora da tabela). |
Art. 1º, LEP [37]; art. 5º, "caput" (direito fundamental à segurança), art. 37, "caput" (princípio da eficiência), e art. 144 , CRFB [38] |
Como se vê, o art. 1º, Lei nº 7.210/84, foi lançado às traças pelo promovido (Estado da Paraíba), pois, nem de longe, a Cadeia Pública de Pombal proporciona "condições para a harmônica integração social do condenado e do internado", sendo violados vários direitos do(s) condenado(s)/internado(s) não afetados pela sentença e pela lei (art. 3º, LEP), quando, a rigor, todas as autoridades devem "o respeito à integridade física e moral dos condenados e dos presos provisórios" (art. 40, LEP).
Impossível alegar, e se deixa claro, a falta de suporte orçamentário-financeiro do Estado da Paraíba para a realização de todas as medidas necessárias ao cumprimento integral das normas apontadas porquanto as injunções estatais estão vencidas há muito tempo, visto que a Lei das Execuções Penais brotou em 1984 (Lei nº 7.210/84), já se contando mais de 26 (vinte e seis) anos de vigência da mesma, sem que, na prática, o promovido realmente se empenhasse no cumprimento do Diploma Federal.
A Lei das Execuções Penais foi, está e, se não ocorrer a intervenção judicial, continuará a ser malferida pelo Estado da Paraíba, que, definitivamente, não manifesta nenhuma intenção em regularizar o mencionado estabelecimento prisional. Prova de tal comportamento é que, mesmo sendo provocado a tanto, o ente promovido jamais sinalizou positivamente em relação à formalização de um termo de ajustamento de conduta (TAC), dando o silêncio como resposta, nem mesmo procurou minimizar as diversas e profusas ilicitudes presentes no aludido estabelecimento prisional.
A LEP estabeleceu prazos em relação ao seu cumprimento (art. 203) [39], mas, como já destacado, o desrespeito à legislação federal se consolidou no tempo e o transcurso do prazo se constituiu objeto de mais um "esquecimento" por parte do Poder Público, que insiste em olvidar diversos cidadãos na indescritível Cadeia Pública de Pombal, que, na realidade, mais parece uma "masmorra".
O Resultado da inércia é cediço: a Cadeia Pública de Pombal é exemplo fiel de desrespeito aos direitos humanos, constituindo-se em um verdadeiro depósito de pessoas!
A Vigilância Sanitária Municipal inspecionou o local, averiguou diversas irregularidades ("Área externa: encontramos lixo e mato em todas as cercanias do muro, esgoto a céu aberto; Área interna – alojamento militar apresentando paredes mofadas, instalações elétrica inadequadas, ausência de colchões adequados nas camas, móveis e demais utensílios velhos e inadequados para uso. 2 – CELAS: Paredes mofadas e deterioradas, instalações elétricas inadequadas, ausência de colchões, banheiros sujos e com infiltrações.") e concluiu pela necessidade de "uma urgente reforma em toda sua infra-estrutura, com aquisição de equipamentos, móveis e demais materiais para um bom desempenho e acomodações dos que ali cumprem suas penas e prestam seus serviços." (ff. 32-36).
Ademais, as condições de segurança são indescritíveis (horríveis), colocando em risco a integridade do sistema carcerário (dada a iminência de fugas), da sociedade (pelo potencial risco de evasão dos detentos) e dos próprios aprisionados (pelas consequências próprias de eventuais fugas e pelo risco de represálias/vinganças através de eventuais invasões ao estabelecimento prisional). Para se ter uma perfeita noção, observem-se as fotografias constantes dos autos (ff. 63, 64, 65, 71, 73 e 75), demonstrando que: a) os muros da Cadeia são baixos (ff. 63 e 75), desprovidos de obstáculos relevantes (não há grampos, cercas elétricas, guaritas, etc.) e providos de vegetação que favorece a escalada-fuga (v. f. 64); b) as paredes das celas são frágeis e vulneráveis, havendo informação da própria Direção do estabelecimento de que as mesmas são de tijolo e "barro" (v. ff. 65, 71 [1ª foto – local do buraco utilizado em fuga] e 73 [2ª foto – local do buraco utilizado em fuga]).
A insegurança está estampada, também, à f. 27 ("o prédio não apresenta condições necessárias de segurança: 1) há paredes constituídas de tijolo, barro e "reboco" (principalmente no pavilhão 3, onde ocorreu recente fuga); b) não há guarita; c) os muros são baixos e não contêm qualquer instrumento de contenção (grampos, cerca elétrica ou arama farpado); d) a polícia militar fica em plantão de 4 (quatro) dias seguidos, com os mesmos homens, em número de três."), f. 57 ("O prédio continua com os mesmos problemas de segurança: a) paredes fracas, havendo algumas de barro, sendo deterioráveis simplesmente pela fricção dos dedos (essa constatação foi feita pelo próprio Promotor de Justiça); b) não há guarita; c) os muros são baixos e não contêm qualquer instrumento de contenção (grampos, cerca elétrica ou arame farpado); d) a Polícia Militar fica de plantão seguido de 4 (quatro) dias, com os mesmos homens, agora em número de quatro.") e f. 77 (boletim de ocorrência da Polícia Militar).
Bem vista a realidade, nota-se que a Cadeia Pública de Pombal – PB, local supostamente destinado ao cumprimento da lei, representa fidedignamente a absoluta indiferença do Poder Público em relação ao ordenamento jurídico, causando a ojeriza do Texto Constitucional [40] porquanto:
a) não é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral (art. 5º, XLIX, CRFB);
b) a dignidade da pessoa humana é permanente violada (art. 1º, III, CRFB), com a exposição da vida e da saúde de todos os que habitam e trabalham naquele local;
c) os presos não são ressocializados e, com isso, afasta-se a possibilidade da concretização do objetivo de construção de uma sociedade livre, justa e solidária, até mesmo porque os aprisionados são submetidos a condições degradantes (art. 3º, I, CRFB);
d) as condições do mencionado estabelecimento prisional estimulam a marginalização (art. 3º, III, CRFB) e não promovem o bem dos detentos (art. 3º, IV, CRFB); e
e) coloca em xeque e fragiliza o "status" internacional da República Federativa do Brasil, que, grife-se, rege sua conduta, nas suas relações exteriores, pelo princípio da prevalência dos direitos humanos (art. 4º, II, CRFB). A situação encontrada, "in casu", traz à baila o velho ditado popular: "casa de ferreiro, espeto de pau!".
Em situações congêneres, a jurisprudência nacional tem reconhecido a procedência das ações civis públicas para condenar o Poder Público a ajustar o seu padrão de conduta às determinações legais. Observe-se:
"CONSTITUCIONAL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DIREITOS FUNDAMENTAIS DO ENCARCERADO - RELATÓRIOS DA VIGILÂNCIA SANITÁRIA SOBRE AUSÊNCIA DE CONDIÇÕES MÍNIMAS DE HIGIENE E SAÚDE AO PRESO NOS ESTABELECIMENTOS PRISIONAIS DO MUNICÍPIO - POSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO DO ESTADO EM OBRIGAÇÃO DE FAZER QUE NÃO AFRONTA O PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES, LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL E LEI DE LICITAÇÕES - ATO ADMINISTRATIVO VINCULADO FRENTE AS DETERMINAÇÕES DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL - NORMAS DE CONDUTA COGENTE E NÃO MERAMENTE PROGRAMÁTICAS - RESPONSABILIDADE DO ESTADO - APELAÇÃO IMPROVIDA. 1. A concretização dos direitos dos condenados elencados na Convenção de Viena em 1993, na Carta das Nações Unidas, na Declaração Universal dos Direitos Humanos e no art. 5º, LXIV da Carta Magna Brasileira foi estabelecido no corpo e espírito da Lei de Execução Penal, a Lei 7.210/84. Mencionado corpo normativo visa impedir o excesso ou a omissão da execução destes direitos. 2. A determinação judicial de uma obrigação de fazer não encerra suposta invasão do Judiciário na esfera da administração, isto porque as medidas impostas são atividades vinculadas a lei infraconstitucional.A Constituição Federal consagrou o direito a integridade física e moral dos presos no art. 5º, inciso LXIV, regulamentada pela Lei de Execução Penal, o que permite ao Poder Judiciário imposição de obrigação de fazer com o fim de tornar realidade os preceitos constitucionais, mesmo que a decisão atinja a esfera orçamentária pública." (TJMA - APELAÇÃO CÍVEL: AC 214462004 MA Relator(a): MILITÃO VASCONCELOS GOMES Julgamento: 16/06/2005 Órgão Julgador: SAO LUIS)
"
AÇÃO CIVIL PÚBLICA - CADEIA PÚBLICA - INTERDIÇÃO - PRECARIEDADE DO PRÉDIO - INADEQUABILIDADE DAS INSTALAÇÕES E SUPERLOTAÇÃO - CONSTRUÇÃO ANTIGA E DANIFICADA - COMPROMETIMENTO - RISCOS DE FUGA E DE INTRODUÇÃO DE DROGAS E ARMAS - DEMONSTRAÇÃO SUFICIENTE - LIMINAR CONCEDIDA - MANUTENÇÃO. A pretensão cautelar de interdição de estabelecimento prisional se encontra justificada se há laudo pré-constituído pelo Ministério Público que demonstra a precariedade do prédio da cadeia pública, inadequabilidade das instalações e superlotação. Construção antiga e danificada, com forro de madeiramento e telhado comprometidos e prédio em condições que facilitam a introdução de drogas e armas, além de facilitar fugas, demonstra falta de segurança, que recomenda a medida. A desativação de Cadeia e do serviço público ali prestado é afeta à competência correcional do Juiz da execução penal, que também assim agiu fundamentadamente." (TJMG: 100340300820010011 MG 1.0034.03.008200-1/001(1) Relator(a): VANESSA VERDOLIM HUDSON ANDRADE Julgamento: 23/08/2005 Publicação: 16/09/2005)
Ademais, considerando a gama incontável de direitos lesionados pela entidade promovida (Estado da Paraíba), deve-se consignar que a conduta estatal em análise tem provocado inúmeras e indetermináveis vítimas (pessoas encarceradas, pessoas em liberdade e trabalhadores que prestam[ram] serviços dentro do aludido estabelecimento prisional), as quais sofreram e sofrem imensuráveis constrangimentos em direitos indisponíveis (p. ex.: a vida, a saúde, a dignidade humana, a segurança, etc.) simplesmente porque o Poder Público se nega, de maneira injustificável, a cumprir suas obrigações jurídicas, figurando como entidade completamente insensível ao sofrimento das pessoas que são obrigadas a permanecer na indescritível Cadeia Pública de Pombal (detentos e trabalhadores) e dos demais indivíduos em liberdade, cuja segurança e tranquilidade são aviltadas permanentemente pela total precariedade do aludido prédio prisional.
Os danos morais coletivos são evidentes!
No magistério de Carlos Alberto Bittar Filho, pode ser encontrada a precisa definição de dano moral coletivo:
"Consiste o dano moral coletivo na injusta lesão da esfera moral de uma dada comunidade, ou seja, na violação antijurídica de um determinado círculo de valores coletivos. Quando se fala em dano moral coletivo, está-se fazendo menção ao fato de que o patrimônio valorativo de uma certa comunidade (maior ou menor), idealmente considerado, foi agredido de maneira absolutamente injustificável do ponto de vista jurídico. Tal como se dá na seara do dano moral individual, aqui também não há que se cogitar de prova da culpa, devendo-se responsabilizar o agente pelo simples fato da violação (damnum in re ipsa)." (Revista Consultor Jurídico - http:conjur.estadao.com.br, 25/02/2004, in Coletividade também pode ser vítima de dano moral)
Os danos morais coletivos se consubstanciam na lesão ao patrimônio moral de uma comunidade, bem como aos direitos difusos, coletivos e/ou individuais indisponíveis. A prestação de serviços carcerários de qualidade constitui um direito difuso, dizendo respeito a toda comunidade, e, quando não observado, gera danos a todos. Enfim, nas palavras de Carlos Alberto Bittar Filho, "consiste o dano moral coletivo na injusta lesão da esfera moral de uma dada comunidade, ou seja, na violação antijurídica de um determinado círculo de valores coletivos".
A atuação do Estado da Paraíba produziu (e continua a produzir) os danos morais apontados, que detêm natureza extrapatrimonial e provocam o nascimento do liame obrigacional entre a coletividade e o processado, por ser este o causador do evento danoso injusto e ilícito. Logo, a indenização por danos morais coletivos se justifica para punir o infrator (Estado da Paraíba) e evitar a repetição dos danos, servindo, neste caso, como medida profilática no âmbito administrativo.
Assim, restam faustuosamente configuradas as irregularidades narradas, ensejando o ingresso da presente ação com o objetivo de extirpar todas as ilicitudes acima mencionadas e concretizar indenização pelos danos morais praticados contra a coletividade.