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Dedução no imposto de renda deve valer para deficientes no ensino regular

24/01/2014 às 11:05
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A Receita Federal permite a dedução de despesas com educação de dependente com deficiência como sendo despesas com saúde, portanto sem limite de valores. Porém, tal direito somente é permitido quando a criança está matriculada em escola especial. O presente recurso administrativo defende que, pela legislação mais recente, o direito deveria ser estendido ao ensino regular.

Ilustríssimo Senhor Delegado da Receita Federal do Brasil em (cidade):

(REQUERENTE), CPF nº (número), brasileiro, (estado civil), (profissão), vem mui respeitosamente perante Vossa Senhoria apresentar IMPUGNAÇÃO à Notificação de Lançamento nº (número), nos termos dos arts. 14 a 17 e 23 do Decreto nº 70.235/72, conforme fatos e direitos expostos a seguir:


DOS FATOS

O Requerente possui como dependente o seu filho menor (nome), nascido em (data), que tem deficiência consistente em (nome da deficiência e CID).

Nessa condição, tomou conhecimento da existência da Instrução Normativa SRF nº 15, de 6 de fevereiro de 2001, que assegura que as despesas de instrução de pessoa portadora de deficiência física ou mental sejam dedutíveis a título de despesas médicas.

Destarte, o Requerente, ao apresentar sua declaração de Imposto de Renda Pessoa Física do ano base (ano), ano calendário (ano), declarou dentre as despesas médicas aquela pertinente à instrução do aludido filho, prestada pela (nome da escola e CNPJ).

A declaração daquele ano terminou por ser retida em malha, sendo requerida a comprovação das despesas com saúde. O Requerente, antecipando-se à intimação, apresentou toda a documentação comprobatória das despesas médicas efetuadas. Dentre os documentos, encontrava-se o laudo médico que comprova a deficiência, nos termos exigidos pela aludida Instrução Normativa.

O digno Auditor Fiscal, embora considerando regular a comprovação das demais despesas médicas, entendeu por glosar o valor pertinente à instrução, considerando equivocada a sua dedução a título de despesas médicas, por não preencher os requisitos autorizadores.

Contudo, a dedução, tal como declarada pelo Requerente, se encontra adequadamente amparada pela legislação internacional, constitucional e infraconstitucional, como restará demonstrado a seguir.


DOS DIREITOS

A IN SRF nº 15/2001 dispõe, em seus arts. 39, § 4º, e 44, que as despesas de instrução de pessoa portadora de deficiência física ou mental são dedutíveis a título de despesas médicas.

O Requerente apresentou, oportunamente, documentos que comprovam a deficiência, inclusive laudos médicos, ora anexados.

No que tange à exigência, constante da citada Instrução Normativa, de que a despesa seja “efetuada em entidades destinadas a deficientes físicos ou mentais”, esta merece ser interpretada de acordo com a legislação vigente.

A ordem jurídica pátria, seguindo diretrizes internacionais, vem reiteradamente determinando que pessoas com deficiência sejam matriculadas no ensino regular das instituições de ensino do sistema de educação geral.

Bem antes da publicação da citada IN SRF nº 15/2001, a Constituição Federal de 1988 estabelecia a preferência pelo atendimento na rede regular de ensino:

Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:

III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;

Por sua vez, a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), assim definia a educação especial:

Art. 58. Entende-se por educação especial, para os efeitos desta Lei, a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais.

Em igual sentido, dispunha o Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999 (regulamento da Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência):

Art. 25.  Os serviços de educação especial serão ofertados nas instituições de ensino público ou privado do sistema de educação geral, de forma transitória ou permanente, mediante programas de apoio para o aluno que está integrado no sistema regular de ensino, ou em escolas especializadas exclusivamente quando a educação das escolas comuns não puder satisfazer as necessidades educativas ou sociais do aluno ou quando necessário ao bem-estar do educando.

Posteriormente, vieram novos atos normativos que, rompendo barreiras físicas e culturais, superaram o paradigma da inclusão educacional das pessoas com deficiência como simplesmente “preferencial”, passando a ser “necessária”.

Assim, o Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009, que promulgou a Convenção Internacional de Nova York sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, com status de emenda constitucional por força do art. 5º, § 3º, da Constituição Federal, estabeleceu:

2. Para a realização desse direito, os Estados Partes assegurarão que:

a) As pessoas com deficiência não sejam excluídas do sistema educacional geral sob alegação de deficiência e que as crianças com deficiência não sejam excluídas do ensino primário gratuito e compulsório ou do ensino secundário, sob alegação de deficiência;

b) As pessoas com deficiência possam ter acesso ao ensino primário inclusivo, de qualidade e gratuito, e ao ensino secundário, em igualdade de condições com as demais pessoas na comunidade em que vivem;

d) As pessoas com deficiência recebam o apoio necessário, no âmbito do sistema educacional geral, com vistas a facilitar sua efetiva educação;

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Por sua vez, o Decreto nº 7.611, de 17 de novembro de 2011, que dispõe sobre a educação especial e o atendimento educacional especializado, foi ainda mais enfático:

Art. 1o  O dever do Estado com a educação das pessoas público-alvo da educação especial será efetivado de acordo com as seguintes diretrizes:

I - garantia de um sistema educacional inclusivo em todos os níveis, sem discriminação e com base na igualdade de oportunidades;

III - não exclusão do sistema educacional geral sob alegação de deficiência;

V - oferta de apoio necessário, no âmbito do sistema educacional geral, com vistas a facilitar sua efetiva educação;

VI - adoção de medidas de apoio individualizadas e efetivas, em ambientes que maximizem o desenvolvimento acadêmico e social, de acordo com a meta de inclusão plena;

O Ministério da Educação, por intermédio de sua Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI) e Diretoria de Políticas de Educação Especial (DPEE), emitiu a Nota Técnica nº 62/2011, com orientações aos Sistemas de Ensino sobre o Decreto nº 7.611/2011:

“Identifica-se nesse contexto, uma ruptura com o modelo de educação especial substitutiva ao ensino regular, que encaminha estudantes considerados não aptos às classes e escolas especiais, separando-os dos demais. (...)

Nesse sentido, a modalidade de Educação Especial é parte integrante do ensino regular e não se constitui em sistema paralelo de educação. (...)

Considerando que a Constituição Federal ocupa o topo da hierarquia no ordenamento jurídico brasileiro, a legislação infraconstitucional deve refletir os dispositivos legais nela preconizados. Sabendo que a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência – ONU/2006 foi ratificada pelo Brasil, com força de Emenda Constitucional, por meio do Decreto n° 6.949/2009, seus princípios e compromissos devem ser assumidos integralmente, assim como, devem ser alterados os instrumentos legais que os contrapõem. Desta maneira, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, promulgada em 1996, o Decreto n° 5.626/2005 e o Decreto n° 7.611/2011 devem ser interpretados à luz dos preceitos constitucionais atuais.”

Ao sancionar a Lei nº 12.764, de 27 de dezembro de 2012 (Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista), a Presidenta Dilma Rousseff vetou dois dispositivos que permitiam, ainda que excepcionalmente, o serviço educacional fora das classes comuns da rede regular de ensino, assim justificando em sua Mensagem de Veto:

“Ao reconhecer a possibilidade de exclusão de estudantes com transtorno do espectro autista da rede regular de ensino, os dispositivos contrariam a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, internalizada no direito brasileiro com status de emenda constitucional. Ademais, as propostas não se coadunam com as diretrizes que orientam as ações do poder público em busca de um sistema educacional inclusivo, com atendimento educacional especializado nas formas complementar e suplementar.” 

Portanto, a Instrução Normativa nº 15/2001 deve ser interpretada à luz dos preceitos constitucionais atuais, em especial aqueles incorporados pelo Decreto nº 6.949/2009, que possui status de emenda constitucional, de forma a admitir que o pagamento das despesas com instrução de pessoa com deficiência seja feito a instituições de sistema educacional geral, na forma do Decreto nº 7.611/2011.


DAS PROVAS

O Requerente apresenta, como provas, a certidão de nascimento de seu dependente (nome) e os laudos médicos atestando a natureza de sua deficiência, protestando pela juntada de eventuais provas que sejam exigidas pelo órgão julgador.


DOS PEDIDOS

Diante do exposto, o Requerente pede que seja anulada a Notificação de Lançamento nº (número), por conseguinte julgando válida a Declaração nº (número) (do Imposto de Renda Pessoa Física ano base (ano), ano calendário (ano)), tal como apresentada pelo declarante.

(cidade), (data).

PAULO GUSTAVO SAMPAIO ANDRADE

CPF (número)

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Sobre o autor
Paulo Gustavo Sampaio Andrade

Pós-graduado em Direito Constitucional pela Universidade Federal do Piauí (UFPI). Editor de conteúdo do Jus.com.br

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ANDRADE, Paulo Gustavo Sampaio. Dedução no imposto de renda deve valer para deficientes no ensino regular. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3859, 24 jan. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/26485. Acesso em: 21 nov. 2024.

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