Eis um crime previsto no Código Penal desde 2021, introduzido pela Lei n. 14.197/21, mas que ficou famoso somente no dia 08/01/2023, aliás, um dia para não se esquecer jamais. Estamos falando da “Abolição violenta do Estado Democrático de Direito”, previsto no art. 359-L, do Código Penal. vejamos:
Art. 359-L. Tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais:
Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, além da pena correspondente à violência.
Este crime tem por objeto jurídico, isto é, bem ou interesse que a lei protege, o Estado Democrático de Direito. A nossa Constituição, em seu artigo inaugural informa que o Brasil se constitui em Estado Democrático de Direito. Em outras palavras, é um país regido pela legalidade e seu poder emana do povo.
Democracia é o poder do povo, que pode ser exercido direta ou indiretamente por meio de representantes eleitos. Nas palavras do professor Flávio Martins, “as decisões são tomadas por uma maioria, mas que jamais podem desproteger, excluir do processo decisório ou até mesmo discriminar as minorias”.1
É um delito que pode ser praticado por qualquer pessoa, portanto, é um crime comum. E possui como sujeito passivo a sociedade.
O crime de abolição violenta do Estado Democrático de Direito é um crime comissivo, ou seja, é um crime que exige um “fazer algo”: tentar abolir. De plano, é um crime que pune a mera tentativa. Afinal de contas, caso o agente obtenha sucesso, não será mais possível puni-lo, já que estaremos diante de um novo Estado.
Em regra, os crimes comissivos são punidos em razão da ação praticada. Mas é possível a punição pela omissão, desde que o omitente tenha o dever de agir e não agiu (crime comissivo por omissão).
Este crime é de ação livre que objetiva impedir ou restringir o exercício dos poderes constitucionais. Exige a violência ou grave ameaça que impeçam ou restrinjam o exercício dos poderes constitucionais.
Violência ou “vis absoluta” é o emprego de força física, admitindo qualquer meio de execução (forçar passagem, agressão física contra pessoa, animal ou objeto etc.).
Por sua vez, a grave ameaça ou “vis relativa” é o constrangimento moral pelo qual uma pessoa procura impor sua vontade a outra, com o objetivo de que esta faça o que lhe foi determinado sob pena de sofrer um mal injusto e grave. A grave ameaça também admite qualquer meio executório como palavra, gesto, escrito ou meio simbólico.
A violência e a grave ameaça são utilizadas para impedir (obstruir, proibir, parar, impossibilitar, vetar, tornar impraticável) ou restringir (reduzir, limitar, delimitar, estreitar) os poderes constitucionais (Executivo, Legislativo e Judiciário). É imprescindível que a tentativa consiga, ao menos, restringir o exercício de um dos Poderes do Estado.
O crime é punido a título de dolo, não se admitindo modalidade culposa porque não se tenta fazer algo que não se quer.
Por fim, como já dito, consuma-se com a mera tentativa. É crime formal, ou seja, o resultado abolir o Estado Democrático de Direito não precisa acontecer, basta tentar impedir ou, pelo menos, restringir o exercício de um dos Poderes do Estado.
Nota
MARTINS, Flávio. Curso de Direito Constitucional. 6ª edição. São Paulo: SaraivaJur, 2022.