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Aspectos jurídicos e conceituais das manifestações em Brasília.

Agenda 18/01/2023 às 18:10

Analisam-se os fatos ocorridos em 8 de janeiro de 2023 à luz do crime de terrorismo e dos crimes contra o Estado Democrático de Direito.

Resumo: O presente texto tem por fim colimado o estudo preliminar sobre o crime de terrorismo e análise perfunctória dos crimes contra o Estado Democrático de Direito previstos no ordenamento jurídico brasileiro.

Palavras-chave: Direito; penal; crime; terrorismo; golpismo; estado; democrático; previsão; legal; lei nº 13.260/2016; lei nº 14.197, de 2021.


INTRODUÇÃO

De antemão, frisa-se o caráter dogmático do lente ao construir suas ideias, agregar valores, expor suas posições, se valendo do mandamento previsto no artigo 5º, IV, da Magna Carta. Deita-se âncoras ainda suas posições doutrinárias pelo livre exercício e imprescindibilidade de suas atividades, artigo 133 da CF/88 c/c artigo 2º da Lei 8.906, de 94 e artigo 13 do Pacto de São José da Costa Rica, além de outros dispositivos que asseguram os direitos de 1ª Dimensão, aliás liberdade de expressão assegurado desde a PRIMEIRA EMENDA AMERICANA, adotada no dia 15 de dezembro de 1791, in verbis:

O congresso não deverá fazer qualquer lei a respeito de um estabelecimento de religião, ou proibir o seu livre exercício; ou restringindo a liberdade de expressão, ou da imprensa; ou o direito das pessoas de se reunirem pacificamente, e de fazerem pedidos ao governo para que sejam feitas reparações de queixas

Diante dos últimos acontecimentos registrados no Brasil, notadamente, as manifestações do dia 8 de janeiro de 2023, em Brasília, os temas terrorismo e golpismo passaram a ser objeto de grandes e acirradas discussões sociais, em especial, nos noticiários da imprensa e no meio jurídico.

O Brasil sempre foi rotulado como sendo um país de essência pacífica, produtor da paz, somente se ouvia falar em terrorismo por meio de noticiários da imprensa, geralmente registrados em outros países, a exemplo dos ataques às Torres Gêmeas, World Trade Center (WTC), na ilha de Manhattan, em Nova York, em 11 de setembro de 2011. Isto porque o Brasil sempre ostentou o rótulo de um país de índole da paz; o que mais incomoda a sociedade brasileira são os crimes contra a pessoa, contra o patrimônio e contra a administração púbica, todos catalogados no Código penal e os crimes de tráfico ilícito de drogas, porte ilegal de armas de fogo e mais recentemente os crimes de violência doméstica e familiar, esses previstos em leis especiais.

O crime de terrorismo somente foi tipificado no Brasil com o advento da Lei nº 13.260, de 2016; antes disso não havia específica norma tratando claramente do crime de terrorismo. É sabido que quando da realização da Copa do Mundo de 2014 no Brasil, havia um movimento intitulado Brasil Livre, iniciado em 2013, com grandes concentrações de pessoas nas ruas e avenidas reivindicando inúmeras pautas por um país melhor, exigindo precipuamente o fortalecimento da democracia através do exercício da cidadania.

Na naquela época de efervescência social, o professor BOTELHO já pontuava:

“Nesse sentido, torna-se imperioso reconhecer a legal e legítima atuação da Polícia para fazer valer na sua plenitude a técnica da colisão excludente, atuando sempre a favor da supremacia do interesse público, num viés coletivo, portanto, de caráter dúplice, no sentido de assegurar com efetividade o direito da livre manifestação do pensamento desde que exercida com civilidade, de forma pacífica e ordeira além de reprimir com os recursos permitidos por lei das ações criminosas de vândalos e agressores da paz pública. Por fim, é preciso entender que a Polícia deve existir como instrumento de efetivação de direitos, respeitando e sendo respeitada, vital para o estado de direitos como oxigênio para a vida, mas sempre como via de mão de dupla, sendo necessária e imprescindível para estabelecer um humanismo secular, que segundo o pensador francês Luc Ferry, trata-se de uma filosofia baseada na razão, na ética e na justiça. É preciso ficar atento ao surgimento de novos direitos, do surgimento das ondas renovatórias do direito, como essas originárias do Movimento Passe Livre 2013, que mesmo antes de nascer já se acham protegidos pela doutrina da constituição aberta, que segundo ensina Konrad Hesse, deve a Constituição ficar imperfeita e incompleta, porque a vida que ela quer ordenar, é a vida histórica e, por causa disso, está sujeita a alterações históricas. Essa alterabilidade caracteriza, em medida especial as condições de vida reguladas pela Constituição. Por isso, o Direito Constitucional, só em medida limitada e só pelo preço de modificações constitucionais frequentes, deixa-se especificar, tornar evidente e calculável de antemão. Se a Constituição deve possibilitar o vencimento da multiplicidade de situações problemáticas que se transformam historicamente, então seu conteúdo deve ficar necessariamente "aberto para dentro do tempo".[1]

Nessa bela época de saudosas reminiscências dos carapintadas nas ruas e avenidas não havia sido criada ainda no Brasil a indústria do ódio e nem o extremismo patológico, às vezes em fase terminal da enfermidade; tudo o que existia era um belo colorido verde e amarelo que procurava retratar e simbolizar o amor ao nacionalismo e o sentimento patriótico.

Mesmo com quase dez anos, naquela ocasião seguramente já se ouviam falar em grupos radicais, agressivos e violentos, que implantavam o terror no Brasil, a exemplo da figura do black bloc, um grupamento violento, com recorte e matriz anarquista, malfeitores sociais, que se apresentavam mascarados, taticamente trajados de preto, cuja finalidade era protestar em manifestações de rua, utilizando-se da força violenta nas ações próprias de guerrilhas a fim de desafiar frontalmente a sociedade e as forças ortodoxas, com grave subversão da ordem pública.

Nesse sentido, esses grupos violentos armados, usando roupas táticas, com luvas, calças de campanhas, gandolas, coturnos, escudos, depredavam instalações e prédios públicos, provocavam explosão, praticavam atentados gravíssimos e ações semelhantes a atos de terrorismo, por inconformismo político e clara demonstração de rebeldia.

Ainda nas proximidades da Copa do Mundo de 2014, esse grupamento aparecia em locais estratégicos, com ações extremamente violentas lançavam projéteis em empresas e instituições financeiras que patrocinavam a competição no Brasil.

Nessa época o crime de terrorismo não era claramente tipificado no Brasil. A recomendação das autoridades constituídas era que se aplicassem as normas atinentes aos crimes de dano qualificado, artigo 163, parágrafo único, incisos II, III e IV do Código Penal e os enquadramentos dos crimes de incêndio e explosão, crimes contra a incolumidade pública, artigos 250 e 251, respectivamente, do CP.

Ainda naquela ocasião, existia a vontade razoável e plausível de se aplicar o crime previsto no artigo 20 da Lei nº 7.170, de 14 de dezembro de 1983, uma espécie de terrorismo, considerando que o crime consistia em devastar, saquear, extorquir, roubar, sequestrar, manter em cárcere privado, incendiar, depredar, provocar explosão, praticar atentado pessoal ou atos de terrorismo, por inconformismo político ou para obtenção de fundos destinados à manutenção de organizações políticas clandestinas ou subversivas, com pena de reclusão, de 3 a 10 anos. Se do fato resulta lesão corporal grave, a pena aumenta-se até o dobro; se resulta morte, aumenta-se até o triplo.

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Não obstante, não houve o reconhecimento da incidência desse tipo penal, mesmo porque se aproximavam as olimpíadas de 2016 e o Brasil queria mostrar ao mundo que o país era pacífico e tranquilo.

Assim, em 2016, entrou em vigor no Brasil a Lei que definiu pela primeira vez o crime de terrorismo, no caso, a Lei nº 13.260, de 2016. Antes disso, a Carta Magna de 1988, em seu artigo 5º, inciso XLIII, se refere expressamente ao terrorismo, ao estatuir que a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem.

Destarte, a Lei nº 13.260, de 2016, regulamenta o disposto no inciso XLIII do art. 5º da Constituição Federal, disciplinando o terrorismo, tratando de disposições investigatórias e processuais e reformulando o conceito de organização terrorista; e altera as Leis nº 7.960, de 21 de dezembro de 1989, e 12.850, de 02 de agosto de 2013.

Logo em seu artigo 1º, a lei em apreço conceitua terrorismo como sendo a prática por um ou mais indivíduos dos atos previstos neste artigo, por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, quando cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública.

Tão logo definiu o conceito de terrorismo, o § 1º do artigo 1º informa que são atos de terrorismo:

I - usar ou ameaçar usar, transportar, guardar, portar ou trazer consigo explosivos, gases tóxicos, venenos, conteúdos biológicos, químicos, nucleares ou outros meios capazes de causar danos ou promover destruição em massa;

IV - sabotar o funcionamento ou apoderar-se, com violência, grave ameaça a pessoa ou servindo-se de mecanismos cibernéticos, do controle total ou parcial, ainda que de modo temporário, de meio de comunicação ou de transporte, de portos, aeroportos, estações ferroviárias ou rodoviárias, hospitais, casas de saúde, escolas, estádios esportivos, instalações públicas ou locais onde funcionem serviços públicos essenciais, instalações de geração ou transmissão de energia, instalações militares, instalações de exploração, refino e processamento de petróleo e gás e instituições bancárias e sua rede de atendimento;

V - atentar contra a vida ou a integridade física de pessoa:

Torna-se imperioso frisar que dois incisos, II e III foram vetados pelo Presidente da República, respectivamente, II - incendiar, depredar, saquear, destruir ou explodir meios de transporte ou qualquer bem público ou privado; e III - interferir, sabotar ou danificar sistemas de informática ou bancos de dados.

Para justificar os vetos, houve a apresentação das seguintes razões:

“Os dispositivos apresentam definições excessivamente amplas e imprecisas, com diferentes potenciais ofensivos, cominando, contudo, em penas idênticas, em violação ao princípio da proporcionalidade e da taxatividade. Além disso, os demais incisos do parágrafo já garantem a previsão das condutas graves que devem ser consideradas ‘ato de terrorismo.”

A pena prevista para esse comportamento em epígrafe, é de reclusão, de doze a trinta anos, além das sanções correspondentes à ameaça ou à violência. Importante disposição é quando a lei esclarece que não se aplicam aos casos acima à conduta individual ou coletiva de pessoas em manifestações políticas, movimentos sociais, sindicais, religiosos, de classe ou de categoria profissional, direcionados por propósitos sociais ou reivindicatórios, visando a contestar, criticar, protestar ou apoiar, com o objetivo de defender direitos, garantias e liberdades constitucionais, sem prejuízo da tipificação penal contida em lei.

A LT 2 define o crime de organização terrorista no artigo 3º, consistente na conduta de promover, constituir, integrar ou prestar auxílio, pessoalmente ou por interposta pessoa, a organização terrorista, com pena de reclusão, de cinco a oito anos, e multa.

Por sua vez, o artigo 5º traz a controvertida figura da punição dos atos preparatórios de terrorismo, consistente em realizar atos preparatórios de terrorismo com o propósito inequívoco de consumar tal delito, cuja pena é a correspondente ao delito consumado, diminuída de um quarto até a metade, ainda incorrendo nas mesmas penas o agente que, com o propósito de praticar atos de terrorismo, recrutar, organizar, transportar ou municiar indivíduos que viajem para país distinto daquele de sua residência ou nacionalidade; ou fornecer ou receber treinamento em país distinto daquele de sua residência ou nacionalidade.

A última conduta criminosa prevista na LT, artigo 6º, consiste em receber, prover, oferecer, obter, guardar, manter em depósito, solicitar, investir, de qualquer modo, direta ou indiretamente, recursos, ativos, bens, direitos, valores ou serviços de qualquer natureza, para o planejamento, a preparação ou a execução dos crimes previstos na multicitada lei, com pena de reclusão, de quinze a trinta anos. Incorre nas mesmas penas do artigo em apreço, quem oferecer ou receber, obtiver, guardar, mantiver em depósito, solicitar, investir ou de qualquer modo contribuir para a obtenção de ativo, bem ou recurso financeiro, com a finalidade de financiar, total ou parcialmente, pessoa, grupo de pessoas, associação, entidade, organização criminosa que tenha como atividade principal ou secundária, mesmo em caráter eventual, a prática dos crimes previstos na lei em testilha.

Na mesma esteira do crime de terrorismo, nos dias atuais o Brasil conhece os constantes ataques em caixas eletrônicos, onde cidades são sitiadas por organizações criminosas, que se utilizam de táticas de guerrilhas na perpetração dos crimes; assim, durante a execução do crime, integrantes dessas facções criminosas interrompem todo o sistema de comunicação da cidade, incendeiam instalações policiais, efetuam rajadas de tiros contra equipamentos policiais, queimam viaturas policiais, provocam grandes explosões dos caixas eletrônicos, colocam obstáculos ao longo da rota de fuga, chamados miguelitos, geralmente com a utilização também de escudos humanos no capô dos veículos, um verdadeiro filme de terror. A essa modalidade de crime, a doutrina tem denominado de terrorismo doméstico.

Linhas atrás, foi abordado o crime de atos de terrorismo previsto no artigo 20 da Lei de Segurança Nacional. Pois bem. Com o advento da Lei 14.197, de 2021, foi acrescido o Título XII, no Código Penal, criando os crimes contra o Estado Democrático de Direito, nascendo os crimes de atentado à soberania, atentado à integridade nacional, espionagem, Abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de estado, interrupção de processo eleitoral, violência política e sabotagem.

E assim, a Lei que instituiu os crimes contra o Estado Democrático de Direito no Título XII do Código penal revogou expressamente a Lei de Segurança Nacional.


REFLEXÕES FINAIS

Não quero ser imortal por aquilo que penso; apenas traduzido em palavras; atitude é melhor que palavras; não desejo perpetuar meu nome em razão das megas operações policiais que um dia debelou o crime organizado na cidade e restaurou a ordem pública; não quero ser lembrando apenas por ter contribuído na formação de milhares de acadêmicos na docência do ensino superior; um dia saio de cena, mas entra para a história o legado construído por um homem predestinado; paradigma indelével; uma luz artificial às vezes precisa de apoio para o seu impulso; desejo deixar eternamente para a literatura deste país as reflexões de um menino do Vale do Mucuri; Teófilo Otoni, berço da liberdade; perpetuar seu jeito próprio e particular de mostrar as mazelas deste submundo de trincheiras imundas; deixar o exemplo de caráter inabalável; inflexível; imutável; deixar nos anais históricos os alfarrábios de leitura compulsória; chamar a atenção deste mundo do desamor; revelar suas decepções na gestão pública; encontros e reencontros com servidores responsáveis; revelar sua descrença com o todo o sistema de justiça; contaminado e corrompido; tendencioso e parcial; ensinar aquilo que não se acredita; conhecer a preciosidade teórica e as mazelas práticas do Estado; deixar bem claro sua inexorável conduta de guardião do erário público; abandonar projetos prematuramente por conta de todo o sistema corrompido; gente hipócrita; vendedores de ilusões.

Diante de toda exposição teórica sobre o crime de terrorismo, pode-se afirmar que a partir de agora é possível fazer um juízo de valor acerca das expressões mais faladas nos dias hodiernos, como golpismos, terroristas, sem paixões ideológicas e sem grandes amores à bandeiras político-partidárias. O delito de terrorismo exige a presença dos elementos normativos previstos em seu conceito, devendo um ou mais indivíduos, praticar a conduta por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, quando cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública.

Noutra seara é possível enxergar nas condutas previstas no rol dos crimes contra o estado democrático de direito, a presença de tipos penais de atentando, o que geralmente não ocorre nos crimes de terrorismo, muito embora a lei nº 13.260, de 2016, puna os atos preparatórios de terrorismo em seu artigo 5º, desde que esses atos preparatórios tenham propósito inequívoco de consumação.

É preciso ficar atento no tocante ao elemento subjetivo do tipo dos dois delitos, terrorismo e golpe de estado, por exemplo, porque as imputações são gravíssimas, as penas austeras e as consequências processuais severas. Uma ótima coincidência é a previsão de condições de exclusão de crimes nas duas modalidades.

Assim, o § 2º, do artigo 1º da LT, textualmente prever que não se aplica à conduta individual ou coletiva de pessoas em manifestações políticas, movimentos sociais, sindicais, religiosos, de classe ou de categoria profissional, direcionados por propósitos sociais ou reivindicatórios, visando a contestar, criticar, protestar ou apoiar, com o objetivo de defender direitos, garantias e liberdades constitucionais, sem prejuízo da tipificação penal contida em lei.

Por sua vez, nas disposições finais da Lei nº 14.197, de 2021, o artigo 359-T, do CP, estatui que não constitui crime contra o estado democrático de direito, a manifestação crítica aos poderes constitucionais nem a atividade jornalística ou a reivindicação de direitos e garantias constitucionais por meio de passeatas, de reuniões, de greves, de aglomerações ou de qualquer outra forma de manifestação política com propósitos sociais.

Em sentido morfológico ou em seu valor semântico terrorismo é o modo de impor a vontade pelo uso sistemático do terror. Pode-se imaginar que terrorismo em sentido coloquial seria viver num país dominado por corrosões morais, asseclas do mal, concussionários do erário público, por gente de almas perdidas, por decisões boçais de coloração ideológica; decisões impostas por semideuses do arauto; terrorismo é viver num país onde não se pode viver livremente num território dominado pelo crime organizado; onde a liberdade de expressão, traço dos direitos humanos é cerceada pelo poder de mando de uma minoria autoritária e abjeta. Terrorismo é saber que na gestão pública existem servidores bitolados, aloprados, responsáveis por matarem o brilho de outros servidores diante da ausência de luz própria; terrorismo é quando se sepulta o tecnicismo em nome do nojento domínio político nas decisões administrativas em nome de projetos de poder; terrorismo físico ou psicológico é quando se deparam com amadores dominando todo o sistema de poder, numa espécie de empresários da vaidade, industriários do narcisismo, mercadores de interesses comerciais pessoais, vendedores de falsas ideias, de produtos fantasiosos, em última análise, disseminadores de fumaça por meio de bazófias enganosas e jactância ilusória. Essas são as modalidades de terrorismo invisível, camuflado, homiziado na imundície dos portais da Administração Pública, nos corredores da maldade, no recôndito dos gabinetes, como bem diz a conhecida parêmia popular um dia a máscara se despenca e a realidade volta à sua normalidade; o verdadeiro rei volta ao trono e o palhaço reassume seu posto no circo da vida.

Como bem retrata o cantor Beto Guedes, digno representante de Montes Claros, norte de Minas Gerais em sua música Canção do novo mundo:

“(...) Quem perdeu o trem da história por querer
Saiu do juízo sem saber
Foi mais um covarde a se esconder
Diante de um novo mundo

Quem souber dizer a exata explicação
Me diz como pode acontecer
Um simples canalha mata um rei
Em menos de um segundo (...)” 3

Voltando um olhar mais detidamente para os históricos acontecimentos registrados no dia 8 de janeiro de 2023, em Brasília, é possível enxergar uma manifestação com variados comportamentos humanos, multiplicidade de análises; a meu sentir, com análise apenas em imagens divulgadas em fontes abertas, é correto afirmar que juridicamente os manifestantes praticaram desde o crime de incitamento, tentativa de abolição do Estado democrático de direito, crime de dano qualificado, associação criminosa, prevaricação, condescendência criminosa, furto, lesão corporal, maus-tratos, até indiferente penal, lembrando e reafirmando sem medo de errar que inúmeros participantes das manifestações não praticaram nenhum crime, apenas exerceram o seu sagrado direito fundamental de liberdade de expressão, previsto no artigo 5º, inciso IV da CF/88, § 2º, do artigo 1º da LT, artigo 359-T da Lei nº 14.197/2012 c/c artigo 13 do Pacto de São José da Costa Rica, Decreto nº 678, de 1992.

Cabe à Polícia Federal, despida de qualquer coloração partidária, e sem a contaminação ideológica, lamentavelmente, presente em todo o sistema de justiça, investigar as condutas supostamente criminosas, providenciando a regular e legal individualização de cada conduta, na busca da justa causa, necessária para o indiciamento, sob pena de inviabilizar o indiciamento. Não se pode indiciar alguém sem a delimitação de seu comportamento, sob pena de se caracterizar grave violação dos direitos humanos.

Todo cidadão deve ser amante incondicional da justiça, fazer jorrar em sua veia, o sangue da democracia, se colocando como porta-voz da liberdade e dos ideais republicanos, apanágios do povo aguerrido do Vale do Mucuri, nas Minas Gerais, repugnando a indústria do ódio, censurando a beligerância que tanto mal faz a sociedade. Nesse sentido, deve deixar bem claro que não se pretende jamais defender o crime, nem se coadunar com os festivais de equívocos, não se pretende filiar a uma exuberante ideologia extremista; mas acima de tudo é preciso que se respeite com absoluta fidelidade o devido processo legal, raiz do estado democrático de direito, seus desdobramentos, e corolários decorrentes, como princípio do juiz natural, contraditório e ampla defesa, e existência de dolo ou culpa na conduta de cada investigado ou acusado, individualização da conduta visando a parametrização da pena, além de outros. Colocar todo mundo no mesmo balaio é clara manifestação de revanchismo político-partidário, abjeto e esdrúxulo, e grave violação dos direitos humanos. Destarte, a sociedade deve ter ojeriza de atores desalmados que se ocupam diariamente dos holofotes midiáticos e se intitulam como legítimos representantes do povo. Nada de complexidade; tudo bem simples.


REFERÊNCIAS

GUEDES. Beto. Canção do Novo Mundo. Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=T13xccI2l1M. Acesso em 18 de janeiro de 2023, às 08:51 horas

BOTELHO. Jeferson. Movimento muda Brasil: As liberdades públicas e sua efetiva proteção. Disponível em https://jus.com.br/artigos/38059/movimento-muda-brasil-as-liberdades-publicas-e-sua-efetiva-protecao. Acesso em 17 de janeiro de 2023.

BRASIL. Constituição Federal de 1988. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em 17 de janeiro de 2023, às 22:21 horas.

BRASIL. Código Penal. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm. Acesso em 17 de janeiro de 2023, às 22:17 horas.

BRASIL. Lei nº 13.260, de 2016. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/l13260.htm. Acesso em 17 de janeiro de 2023, às 22:17 horas.

BRASIL. Lei 14.197, de 2021. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/l14197.htm. Acesso em 17 de janeiro de 2023, às 22:22 horas.


Notas

  1. BOTELHO. Jeferson. Movimento muda Brasil: As liberdades públicas e sua efetiva proteção. Disponível em https://jus.com.br/artigos/38059/movimento-muda-brasil-as-liberdades-publicas-e-sua-efetiva-protecao. Acesso em 17 de janeiro de 2023.

  2. Lei de Terrorismo – 13.260, de 2016.

  3. GUEDES. Beto. Canção do Novo Mundo. Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=T13xccI2l1M. Acesso em 18 de janeiro de 2023, às 08:51 horas.


Vivemos numa sociedade em constante transformação, com veloz mudança de hábitos e costumes. Uma evolução progressiva que começa com a consagração dos direitos civis e políticos, passando pelos direitos sociais, pela solidariedade, diversidade, direitos difusos, construção da paz e bioética. Ensina Ihering que o direito não é uma pura teoria, mas uma força viva. Todos os direitos da humanidade foram conseguidos na luta. O direito é um trabalho incessante, não somente dos poderes públicos, mas da nação inteira. Importante entender que os direitos são conquistados por meio da luta, atividade incessante e contínua, somados e aglutinados num processo de sedimentação e consolidação por meio daquilo que se chama de movimento do constitucionalismo. Assim, constitucionalismo é um movimento social, político e jurídico e até mesmo ideológico, a partir do qual se constroem as Cartas Magnas que regulam os direitos programáticos, analíticos ou sintéticos de uma sociedade. Constitui-se, assim, um ordenamento jurídico de um Estado localizado no topo da pirâmide normativa, ou seja, sua Constituição, geralmente com a garantia de direitos, a separação de poderes e a formação de princípios e regras limitadoras das atividades de governo.

(Prof. Jeferson Botelho)

Sobre o autor
Jeferson Botelho Pereira

Jeferson Botelho Pereira. Ex-Secretário Adjunto de Justiça e Segurança Pública de MG, de 03/02/2021 a 23/11/2022. É Delegado Geral de Polícia Civil em Minas Gerais, aposentado. Ex-Superintendente de Investigações e Polícia Judiciária de Minas Gerais, no período de 19 de setembro de 2011 a 10 de fevereiro de 2015. Ex-Chefe do 2º Departamento de Polícia Civil de Minas Gerais, Ex-Delegado Regional de Governador Valadares, Ex-Delegado da Divisão de Tóxicos e Entorpecentes e Repressão a Homicídios em Teófilo Otoni/MG, Graduado em Direito pela Fundação Educacional Nordeste Mineiro - FENORD - Teófilo Otoni/MG, em 1991995. Professor de Direito Penal, Processo Penal, Teoria Geral do Processo, Instituições de Direito Público e Privado, Legislação Especial, Direito Penal Avançado, Professor da Academia de Polícia Civil de Minas Gerais, Professor do Curso de Pós-Graduação de Direito Penal e Processo Penal da Faculdade Estácio de Sá, Pós-Graduado em Direito Penal e Processo Penal pela FADIVALE em Governador Valadares/MG, Prof. do Curso de Pós-Graduação em Ciências Criminais e Segurança Pública, Faculdades Unificadas Doctum, Campus Teófilo Otoni, Professor do curso de Pós-Graduação da FADIVALE/MG, Professor da Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC-Teófilo Otoni. Especialização em Combate à corrupção, crime organizado e Antiterrorismo pela Vniversidad DSalamanca, Espanha, 40ª curso de Especialização em Direito. Mestrando em Ciências das Religiões pela Faculdade Unida de Vitória/ES. Participação no 1º Estado Social, neoliberalismo e desenvolvimento social e econômico, Vniversidad DSalamanca, 19/01/2017, Espanha, 2017. Participação no 2º Taller Desenvolvimento social numa sociedade de Risco e as novas Ameaças aos Direitos Fundamentais, 24/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Participação no 3º Taller A solução de conflitos no âmbito do Direito Privado, 26/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Jornada Internacional Comjib-VSAL EL espaço jurídico ibero-americano: Oportunidades e Desafios Compartidos. Participação no Seminário A relação entre União Europeia e América Latina, em 23 de janeiro de 2017. Apresentação em Taller Avanco Social numa Sociedade de Risco e a proteção dos direitos fundamentais, celebrado em 24 de janeiro de 2017. Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad Del Museo Social Argentino, Buenos Aires – Argentina, autor do Livro Tráfico e Uso Ilícitos de Drogas: Atividade sindical complexa e ameaça transnacional, Editora JHMIZUNO, Participação no Livro: Lei nº 12.403/2011 na Prática - Alterações da Novel legislação e os Delegados de Polícia, Participação no Livro Comentários ao Projeto do Novo Código Penal PLS nº 236/2012, Editora Impetus, Participação no Livro Atividade Policial, 6ª Edição, Autor Rogério Greco, Coautor do Livro Manual de Processo Penal, 2015, 1ª Edição Editora D´Plácido, Autor do Livro Elementos do Direito Penal, 1ª edição, Editora D´Plácido, Belo Horizonte, 2016. Coautor do Livro RELEITURA DE CASOS CÉLEBRES. Julgamento complexo no Brasil. Editora Conhecimento - Belo Horizonte. Ano 2020. Autor do Livro VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. 2022. Editora Mizuno, São Paulo. articulista em Revistas Jurídicas, Professor em Cursos preparatórios para Concurso Público, palestrante em Seminários e Congressos. É advogado criminalista em Minas Gerais. OAB/MG. Condecorações: Medalha da Inconfidência Mineira em Ouro Preto em 2013, Conferida pelo Governo do Estado, Medalha de Mérito Legislativo da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, 2013, Medalha Santos Drumont, Conferida pelo Governo do Estado de Minas Gerais, em 2013, Medalha Circuito das Águas, em 2014, Conferida Conselho da Medalha de São Lourenço/MG. Medalha Garimpeiro do ano de 2013, em Teófilo Otoni, Medalha Sesquicentenária em Teófilo Otoni. Medalha Imperador Dom Pedro II, do Corpo de Bombeiros, 29/08/2014, Medalha Gilberto Porto, Grau Ouro, pela Academia de Polícia Civil em Belo Horizonte - 2015, Medalha do Mérito Estudantil da UETO - União Estudantil de Teófilo Otoni, junho/2016, Título de Cidadão Honorário de Governador Valadares/MG, em 2012, Contagem/MG em 2013 e Belo Horizonte/MG, em 2013.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEREIRA, Jeferson Botelho. Aspectos jurídicos e conceituais das manifestações em Brasília.: Golpismo, terrorismo ou atipicidade?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 28, n. 7140, 18 jan. 2023. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/102063. Acesso em: 26 dez. 2024.

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