Em interpretação sistemática das normas de regência sobre o tema sigilo financeiro e em especial à Lei Complementar n.º 105/2001 e à Lei n.º4.595/65, documentos bancários protegidos por sigilo são os produzidos por instituições financeiras em razão de atividades econômicas, financeiras, ou particulares, realizadas por pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, junto àquelas, as quais assim são consideradas os bancos de qualquer espécie, as distribuidoras de valores mobiliários, as corretoras de câmbio e de valores mobiliários, as sociedades de crédito, financiamento e investimentos, as sociedades de crédito imobiliário, as administradoras de cartões de créditos, as sociedades de arrendamento mercantil, as administradoras de mercado de balcão organizado, as cooperativas de crédito, as associações de poupança ou empréstimo, as bolsas de valores e de mercadorias e futuros, as entidades de liquidação e compensação e outras sociedades, a exemplo das empresas de fomento comercial ou de factoring, que, em razão da natureza de suas operações, assim venham a ser consideradas pelo Conselho Monetário Nacional.
Esses documentos institucionais possuem natureza sigilosa, em razão da tutela da intimidade das pessoas, contida no artigo 5.º, Inciso X, da Constituição Federal, que prescreve que "são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação".
Todavia esse direito à intimidade, a exemplo de outros direitos fundamentais, não é absoluto, passível de mitigação em certos casos previstos em lei e sempre de acordo com o devido processo legal para o afastamento do sigilo.
O interesse social plasmado no ordenamento jurídico como um todo é quem vai delimitar a forma e a intensidade do afastamento do sigilo bancário, de acordo com as funções desempenhadas e as necessidades dos entes ou órgãos envolvidos. Esses são as comissões parlamentares de inquérito, o Tribunal de Constas da União ou dos Estados, o Ministério Público, a Administração Tributária, a Administração Pública (e aqui envolvendo a Controladoria-Geral da União e suas prerrogativas sensivelmente distintas da Administração como um todo) e a polícia judiciária, uns com vista à tutela dos macro-interesses sociais (CPIs e Tribunais de Conta), outros com vista à proteção de bens jurídicos específicos, a exemplo do Ministério Público, como dominus litis da ação penal, ou da polícia judiciária no interesse da investigação criminal, ou ainda da Administração Pública, com base no seu poder disciplinar e para garantir a eficiência da persecução e da sanção estatutária, ou mesmo da Administração Tributária, no interesse da arrecadação de receitas derivadas.
Dentro desse contexto, duas possibilidades de método de afastamento do sigilo bancário se apresentam, ora em sede criminal, ora em sede cível.
Uma, por autoridade derivada e com observância ao princípio da reserva de jurisdição, quando o interessado busca a intervenção judicial, onde o juiz competente, legitimamente provocado, determina às instituições financeiras a remessa ao solicitante de dados bancários em seu poder e referentes a pessoas físicas ou jurídicas identificadas.
Outra, por autoridade própria, por força de lei, independentemente da intervenção do poder judiciário para qualquer autorização ou determinação. Dentro dessa linha, ainda existe a possibilidade de empréstimo (prova emprestada) desses elementos de prova, quando produzidos em outros procedimentos e trasladados, exempli gratia, para os procedimentos disciplinares do serviço público, com o fim de exercício do dever-poder disciplinar, ou para os procedimentos ou processos do fisco, com vista à identificação do patrimônio, rendimentos e atividades do contribuinte e no interesse da arrecadação tributária.
Diretamente, o sigilo bancário pode ser afastado, em instâncias distintas da criminal, sem a necessidade de provocação judicial, por comissões parlamentares de inquéritos (art. 58, § 3.º, CF).
Assim, importante conferir o posicionamento do STF a respeito do tema. Quanto aos poderes para a decretação direita do afastamento do sigilo bancário por comissões parlamentares de inquérito, o Supremo Tribunal Federal assentou, no MS 24817/DF:
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO - PODERES DE INVESTIGAÇÃO (CF, ART. 58, § 3º) - LIMITAÇÕES CONSTITUCIONAIS - LEGITIMIDADE DO CONTROLE JURISDICIONAL - POSSIBILIDADE DE A CPI ORDENAR, POR AUTORIDADE PRÓPRIA, A QUEBRA DOS SIGILOS BANCÁRIO, FISCAL E TELEFÔNICO - NECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO DO ATO DELIBERATIVO - QUEBRA DE SIGILO ADEQUADAMENTE FUNDAMENTADA - VALIDADE - MANDADO DE SEGURANÇA INDEFERIDO. A QUEBRA DO SIGILO CONSTITUI PODER INERENTE À COMPETÊNCIA INVESTIGATÓRIA DAS COMISSÕES PARLAMENTARES DE INQUÉRITO. - A quebra do sigilo fiscal, bancário e telefônico de qualquer pessoa sujeita a investigação legislativa pode ser legitimamente decretada pela Comissão Parlamentar de Inquérito, desde que esse órgão estatal o faça mediante deliberação adequadamente fundamentada e na qual indique a necessidade objetiva da adoção dessa medida extraordinária. Precedentes. - O sigilo bancário, o sigilo fiscal e o sigilo telefônico (sigilo este que incide sobre os dados/registros telefônicos e que não se identifica com a inviolabilidade das comunicações telefônicas) - ainda que representem projeções específicas do direito à intimidade, fundado no art. 5º, X, da Carta Política - não se revelam oponíveis, em nosso sistema jurídico, às Comissões Parlamentares de Inquérito, eis que o ato que lhes decreta a quebra traduz natural derivação dos poderes de investigação que foram conferidos, pela própria Constituição da República, aos órgãos de investigação parlamentar. As Comissões Parlamentares de Inquérito, no entanto, para decretar, legitimamente, por autoridade própria, a quebra do sigilo bancário, do sigilo fiscal e/ou do sigilo telefônico, relativamente a pessoas por elas investigadas, devem demonstrar, a partir de meros indícios, a existência concreta de causa provável que legitime a medida excepcional (ruptura da esfera de intimidade de quem se acha sob investigação), justificando a necessidade de sua efetivação no procedimento de ampla investigação dos fatos determinados que deram causa à instauração do inquérito parlamentar, sem prejuízo de ulterior controle jurisdicional dos atos em referência (CF, art. 5º, XXXV). As deliberações de qualquer Comissão Parlamentar de Inquérito, à semelhança do que também ocorre com as decisões judiciais, quando destituídas de motivação, mostram-se írritas e despojadas de eficácia jurídica, pois nenhuma medida restritiva de direitos pode ser adotada pelo Poder Público, sem que o ato que a decreta seja adequadamente fundamentado pela autoridade estatal.
No que tange a seara criminal, quanto ao Ministério Público, em que pese parte da doutrina de processo penal entender possível a determinação da quebra de sigilo bancário pela instituição independentemente de ordem judicial e quando houver investigação de desvio de verbas públicas e com amparo legal do contido no art. 5.º, § 3º, IV da LC 105/2001 que prescreve que não constitui violação do dever de sigilo a comunicação às autoridades competentes sobre a prática de ilícitos penais e administrativos, abrangendo o fornecimento de informações sobre operações que envolvam recursos provenientes de qualquer prática criminosa (e nas atribuições do Conselho de Controle de Atividades Financeiras – COAF), o Supremo Tribunal Federal tem se inclinado por sua ilegalidade, não possuindo o MP autoridade própria para tal afastamento da tutela à intimidade das pessoas, consoante ementário abaixo, referente ao Inq. 2245:
EXISTÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL DE QUEBRA DE SIGILO PROFERIDA PELO PRESIDENTE DO STF E, POSTERIORMENTE, DE MODO MAIS AMPLO, PELO RELATOR DO INQUÉRITO. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. Igualmente rejeitada a alegação de que o banco BMG teria atendido diretamente a pedido do Ministério Público Federal. Na verdade, o ofício requisitório do MPF amparou-se em decisão anterior de quebra de sigilo bancário dos investigados, proferida pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal, durante o recesso forense (25-7-05). Posteriormente, o próprio Relator do inquérito afastou de modo amplo o sigilo bancário, abarcando todas as operações de empréstimos objeto do ofício requisitório do Procurador-Geral da República, bem como ordenou a realização de perícia com acesso amplo e irrestrito às operações bancárias efetivadas pelo referido banco. De resto, a comunicação dos mencionados dados bancários encontra respaldo suplementar na quebra de sigilo decretada pela CPMI dos Correios.
Ainda em sede criminal, no que se refere à polícia judiciária no exercício de suas funções investigativas, esta não apresenta autoridade própria para determinar o afastamento da intimidade, no que tange aos dados acobertados pelo sigilo ora versado, devendo, para tanto, reportar-se à autoridade judicial, para o seu mister investigativo.
Em questões cíveis, financeiro-orçamentárias, tributárias e estatutárias da disciplina do serviço público, a par das possibilidades já apontadas pelas comissões parlamentares de inquérito, importante, antes de se analisar a questão em sede de persecução disciplinar, tecer algumas considerações sobre as prerrogativas dos Tribunais de Contas e da Administração Tributária, para, só então, verificar a legitimidade deste meio de prova junto à Administração Pública.
Quanto ao primeiro, pacífico o posicionamento do nosso Tribunal Constitucional de que a Corte de Contas não tem legitimidade para, independente de manifestação judicial, determinar a quebra do sigilo bancário, mesmo no exercício do controle externo constitucionalmente qualificado, em razão de ausência de previsão constitucional para tal, consoante excertos do ementário de jurisprudência do STF, referente ao MS 22801/DF:
Mandado de Segurança. Tribunal de Contas da União. Banco Central do Brasil. Operações financeiras. Sigilo. 1. A Lei Complementar nº 105, de 10/1/01, não conferiu ao Tribunal de Contas da União poderes para determinar a quebra do sigilo bancário de dados constantes do Banco Central do Brasil. (...) 2. Embora as atividades do TCU, por sua natureza, verificação de contas e até mesmo o julgamento das contas das pessoas enumeradas no artigo 71, II, da Constituição Federal, justifiquem a eventual quebra de sigilo, não houve essa determinação na lei específica que tratou do tema, não cabendo a interpretação extensiva, mormente porque há princípio constitucional que protege a intimidade e a vida privada, art. 5º, X, da Constituição Federal, no qual está inserida a garantia ao sigilo bancário. 3. Ordem concedida para afastar as determinações do acórdão nº 72/96 - TCU - 2ª Câmara (fl. 31), bem como as penalidades impostas ao impetrante no Acórdão nº 54/97 - TCU - Plenário.
No que concerne à Administração Tributária, a doutrina se divide, assim como a jurisprudência, em razão de preceitos não claros do texto constitucional, em especial o teor do art. 145, §1.º, que permite ao fisco, para cumprir mandamento de igualdade quanto à pessoalidade e à capacidade contributiva no pagamento de impostos, identificar, sempre que possível, nos limites dos direitos fundamentais, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas dos contribuintes.
Importante reparar (i) que a norma constitucional traz a prescrição de dever de respeito (observância), pelo fisco, aos direitos fundamentais do indivíduo, bem como (ii) o estatuído no art. 197, parágrafo único da Lei n.º 5.172/66, Código Tributário Nacional (que, assim como as leis n.º 105/2001 e n.º 4.595/65, também possui natureza jurídica de lei complementar), asseverando que as instituições financeiras não estão obrigadas à prestação de informações sobre fatos aos quais estejam legalmente obrigadas à manutenção de segredo em razão de cargo, ofício, função, ministério, atividade ou profissão.
Não obstante, os artigos 5.º e 6.º da Lei Complementar n.º 105/2001 permitem o afastamento do sigilo, sem qualquer ressalva de reserva jurisdicional, a par do dever de continuidade de manutenção do sigilo dos dados pelos próprios servidores da Administração Tributária (este resguardo do sigilo em harmonia com os ditames constitucionais plasmados no art. 145, §1.º).
À vista do explanado, conclui-se que a Lei Complementar n.º 105/2001, dispondo sobre o sigilo das operações de instituições financeiras, sigilo bancário, regula dentre outras providências o art. 145, §1.º da CF/88 e declina em seus artigos 5.º e 6.º que as autoridades tributárias (autoridades administrativas) poderão examinar documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive as contas de depósitos e as aplicações financeiras, quando houver procedimento administrativo fiscal instaurado e as informações e exames sejam considerados indispensáveis para o cumprimento das funções fiscais.
Desta feita, as normas referidas na lei complementar permitem, nos casos que regulam, quais sejam os procedimentos no exercício da função fiscalizatória tributária e no interesse da Fazenda Pública, o afastamento do sigilo bancário e fiscal, pela própria Administração Pública, Administração Tributária, e a sua utilização para a instrução de procedimento administrativo fiscal.
No entanto, ainda em sede de funções fiscalizatórias de tributos, doutrina de relevância tem sustentado a inconstitucionalidade dos artigos 5.º e 6.º da LC n.º 105/2001 e a ilegitimidade das autoridades tributárias para a realização da identificação das movimentações financeiras dos administrados e contribuintes, em razão de o próprio art. 145, § 1.º da CF/88, que é o fundamento de validade para a normatização complementar tributária, limitar os poderes do fisco ao respeito dos direitos individuais e estes são garantidos, no caso de sigilo bancário, pelo art. 5º, incisos X e XII, da CF/88, fazendo–se imprescindível, destarte, para a obtenção de informações bancárias pela Administração Tributária, a determinação judicial.
Alinhado, de certa forma, a essa corrente doutrinária, o Supremo Tribunal Federal em decisões recentes vem-se posicionando no sentido de que à Administração Tributária assiste legitimidade para efetivar a quebra do sigilo bancário, para fins fiscais, porém dependentemente de autorização judicial, fazendo valer de forma parcial os ditames da Lei Complementar n.º 105/2001.
Na mesma linha de mitigação dos poderes do fisco, a Suprema Corte decidiu recentemente que a quebra de sigilo bancário realizada, na origem, para a instrução criminal não pode ser compartilhada à Secretaria da Receita Federal (prova emprestada), a fim de que esta instrua procedimento fiscal, sob pena de ofensa ao devido processo legal, em razão de não observância dos preceitos da Lei Complementar de regência, com vista ao legal afastamento do sigilo, ferindo, por conseguinte a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, consoante se infere dos excertos do Informativo 612 – STF, de 16 de dezembro de 2010.
Com base nessa nova decisão, ou a Secretaria da Receita Federal se vale do art. 6.º da Lei Complementar n.º 105/2001 e, contando com a pré-instauração de processo administrativo ou procedimento fiscal, conquanto ainda a consideração de serem os exames dos documentos bancários imprescindíveis à conclusão do feito, ou fica impossibilitada de receber, por empréstimos de outros procedimentos os documentos bancários acobertados pelo sigilo. De outra feita, reconhece, nesse julgado, a legitimidade do procedimento prescrito na Lei Complementar n.º 105/2001, para a realização, desde que atendidos os requisitos legais, da quebra do sigilo bancário do contribuinte, na qualidade de prova emprestada.
Em posterior passagem, 24 de novembro de 2010, no bojo do Recurso Extraordinário 389808, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, agravando a linha de limitação dos poderes fiscalizatórios das autoridades tributárias, decidiu que o fisco não possui poderes para decretar, com independência e autonomia, a quebra do sigilo bancário do contribuinte, carecendo, destarte, de autorização judicial.
Com fundamento nessa recente decisão, o Supremo Tribunal Federal entende que nem mesmo a administração tributária, com o fim de instrução de procedimento fiscal e amparada nos preceitos do art. 145, §1.º da CF/88, está apta a realizar, de forma direta (sem a autorização judicial), a quebra do sigilo bancário, malgrado permissão legal estampada no art. 8º da Lei n° 8.021/1990, reproduzida no art. 6.º da Lei Complementar n.º 105/2001.
Assim, em resumo da classificação dos entes e órgãos que detêm autoridade própria para a determinação do afastamento do sigilo bancário, somente as Comissões Parlamentares de Inquérito a possui e desde que haja excepcional necessidade a qual deve ser devidamente fundamentada. O Ministério Público, a Administração Tributária e o Tribunal de Contas não detêm essa autoridade, devendo, na tutela de seus interesses, valer-se de solicitação ao judiciário que, sopesando o caso concreto, poderá determinar ou não o afastamento ou mitigação do direito fundamental.
Quanto à Administração Pública, havendo interesse de afastar o sigilo bancário, para a instrução de seus procedimentos interna corporis, esta se encontrará, ainda mais, submetida ao princípio da reserva de jurisdição.
A obtenção de elementos de prova oriundos de quebra de sigilo bancário em processos administrativos disciplinares parte-se, de plano, da sua impossibilidade de realização direta, por autoridade própria, plasmada nos mesmos fundamentos declinados para os casos de procedimentos fiscais – qual seja a necessidade de reserva de jurisdição, para garantira a tutela à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem das pessoas, como deferência e reconhecimento normativo ao princípio da dignidade da pessoa humana e mais, sem qualquer previsão legal para tal mister, do que não se pode falar para os procedimentos do fisco, que contam com os preceitos da LC 105/2001.
No entanto, em que pese tratar-se de pacífico entendimento da Suprema Corte no sentido de que os dados bancários acobertados pelo sigilo garantidor de uma inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem não são passíveis de obtenção direta pela comissão de disciplina, há de se constatar a possibilidade, declinada pela jurisprudência e doutrina, de sua realização indireta, com a autorização judicial, independentemente de ser ele oriundo de outro procedimento onde fora realizada a quebra (empréstimo de elementos de prova).
À vista do exposto, a existência de quebra de sigilo bancário em sede de investigação ou instrução criminal é prescindível para a realização do afastamento ora em estudo, uma vez que, por força do art. 3.º, §1.º, da Lei Complementar n.º 105/2001, basta (i) a instauração de regular procedimento disciplinar, com o fim de apurar a responsabilidade de servidor público por infração praticada no exercício de suas atribuições ou que com ela tenha relação e (ii) a autorização judicial, nos termos da norma regente, senão vejamos: "dependem de prévia autorização do Poder Judiciário a prestação de informações e o fornecimento de documentos sigilosos solicitados por comissão de inquérito administrativo destinada a apurar responsabilidade de servidor público por infração praticada no exercício de suas atribuições, ou que tenha relação com as atribuições do cargo em que se encontre investido".
Deste modo, o colegiado disciplinar poderá realizar de forma indireta a quebra de sigilo bancário, independentemente da necessidade de essa espécie de prova constar em inquérito policial ou investigação criminal, ou ainda em processo judicial ou da existência de um desses instrumentos em curso, bastando para tal simplesmente a instauração regular de processo em contraditório para a apuração de infração administrativa, a autorização judicial e a existência dessas provas já em poder do fisco, que deve proceder, então, ao compartilhamento.
O sigilo bancário pode ser afastado por solicitação direta da comissão de disciplina ao juiz competente, desde que haja procedimento disciplinar regularmente instaurado, destinado a apurar infrações administrativas disciplinares em face de agente público e esse meio de prova seja considerado imprescindível, conquanto extraordinário, para a conclusão do feito (art. 3.º, §1.º da LC 105/2001). Com efeito, não há a necessidade de representatividade postulatória pela advocacia da União. As razões para tanto são (i) o dever de tutela da Administração aos seus bens, serviços e interesses, envolvendo nessa concepção o interesse público primário e secundário; e (ii) a própria natureza investigativa, inerente aos procedimentos disciplinares a cargo do Estado-administração, mormente em questões interna corporis.
Anote-se que mesmo no caso de processo administrativo disciplinar realizado pela própria administração tributária, em face de servidores fiscais ou em exercício junto ao fisco, ela não poderá ferir a regra acima exposta e diretamente coligir os dados bancários de interesse do processo e em seu poder, sem a autorização judicial. Nesse sentido e seguindo jurisprudência da Suprema Corte, o Tribunal Regional Federal da 4.ª Região prescreve (2008.70.00.023414-0) que "não há que confundir a atividade fiscal da Receita Federal, enquanto órgão fazendário, com a atividade administrativa do ente público (a União), perante o qual o servidor exerce cargo público. Os dados cobertos pelo sigilo fiscal e bancário não podem ser utilizados em processo administrativo, inquérito ou ação judicial sem prévia autorização judicial, sob pena de ser considerada prova ilícita".
Quanto à manutenção do sigilo dessa modalidade de prova emprestada, sempre que se necessitar trasladá-la de um procedimento em que já fora autorizado o empréstimo, para outro, e.g., processo disciplinar, imprescindível se fará uma nova autorização judicial, sob pena de nulidade do novo compartilhamento.
Em conclusão, a Administração pública somente realizará validamente a quebra de sigilo bancário para a instrução de procedimentos disciplinares se se constatar a prévia instauração de procedimento apuratório, contraditório ou investigativo, em que haja ao menos um servidor identificado e investigado (sindicância) ou acusado de infração administrativa (processo administrativo), esse meio excepcional seja imprescindível à elucidação dos fatos e seja precedida de autorização judicial que determine às instituições financeiras ou ao fisco a remessa dos dados solicitados pelo colegiado administrativo processante.