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Aviso prévio proporcional: direito tardio, aplicabilidade confusa

Agenda 05/12/2011 às 10:11

O Congresso resolveu aprovar a toque de caixa o que ficou engavetado 22 anos. Ao invés de solucionar o vazio existente no tocante à regulamentação do aviso prévio proporcional, a lei deixou dúvidas em aberto.

Após dormir 22 anos nas gavetas do Congresso Nacional, o projeto que trata do aviso prévio foi aprovado no Senado e enviado para sanção da Presidência da República. E isto somente ocorreu depois que o Supremo Tribunal Federal declarou, em junho de 2011, que o Legislativo Federal foi omisso ao tratar do assunto, ou seja, os deputados e senadores não cumpriram sua obrigação.

Assim, foi sancionada a Lei 12.506/11 que trata do “novo” aviso prévio proporcional ao tempo de trabalho, com aplicação a partir de 13 de outubro de 2011, data da publicação no Diário Oficial da União.

O direito ao aviso prévio mínimo de 30 dias é previsto no Artigo 7º, inciso XXI, da Constituição Federal desde 1988. Por sua vez, a nova lei define, em seu Artigo 1º, que o aviso prévio será concedido na proporção de 30 dias aos empregados com até um ano de serviço na mesma empresa, e, no parágrafo único, o acréscimo de três dias por ano de serviço prestado na mesma empresa, até o máximo de 60 dias. Assim, o prazo máximo para aviso prévio passa a ser de 90 dias no máximo, conforme o tempo trabalhado na mesma empresa.

Para exemplificar, o trabalhador que contar até 1(um) ano de casa continua tendo direito a 30 dias de aviso. A partir dos 12 meses, ele terá direito a mais 3(três) dias por ano trabalhado somados aos 30 dias da regra anterior.

Antes da sanção da Lei 12.506/11, o direito ao aviso prévio era tratado nos artigos 487 e seguintes da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Não havendo prazo estipulado, a parte (empregado ou empregador) que quisesse rescindir o contrato de trabalho deveria avisar a outra com antecedência mínima de 30 dias, sob pena de ter que indenizar a parte não avisada.

O curtíssimo texto da Lei, ao invés de ajudar a entender, acabou gerando polêmica quanto à sua aplicação. É que a nova sistemática pode trazer reflexos positivos e negativos, tanto para o trabalhador quanto para a empresa. Entre os pontos de discussão, podemos relacionar os seguintes:

  1. se os três dias de acréscimo por ano de serviço são devidos para o empregado que tem apenas um ano de serviço;
  2. se o empregado deve cumprir aviso prévio por mais de 30 dias;
  3. se o trabalhador deve sair duas horas mais cedo durante todo o período de aviso;
  4. se o trabalhador deverá pagar o aviso ao patrão quando for superior a 30 dias;
  5. como ficam as dispensas anteriores à edição da Lei;
  6. como contar o aviso em caso de empregado afastado do trabalho.

Esta simples contribuição não objetiva responder a todas as perguntas. Mas qualquer estudo que objetive fazê-lo deve começar por entender a natureza do instituto do aviso prévio.

O aviso prévio insere-se no rol dos direitos sociais definidos pela Constituição da República. Ele assegura o exercício do direito do empregado em rescindir o contrato de trabalho como garantia constitucional da liberdade de trabalho, enquanto que, por outro lado, limita o direito do empregador em rescindir imotivadamente o contrato de trabalho. O fundamento para tanto é princípio protetivo do direito do trabalhador, assegurando que o emprego é um bem social a ser protegido.

A história nos mostra que o aviso prévio tinha a finalidade de não deixar o empregador desamparado, chegando mesmo a ser preso o trabalhador que não respeitasse o prazo. Com a evolução do direito e o fortalecimento das lutas sociais, houve alteração na concepção e o aviso passou a ser entendido como um direito social.

A doutrina moderna dá ao aviso prévio o status de garantia do trabalhador à liberdade de trabalho. Ele compõe a extensão do contrato de trabalho, que geralmente termina pela vontade do empregador. Na prática, a obrigação de avisar previamente não garante o emprego, mas garante indenização ao empregado que não detém estabilidade, demonstrando que os desiguais devem ser tratados de forma desigual para se atingir a tão almejada justiça social.

Os países da Comunidade Européia têm maior tendência a colocar o aviso prévio como instituto protetor do emprego, afastando de forma definitiva a igualdade recíproca da resilição do contrato. Há países que fixam prazos diferentes de aviso prévio, maiores para o empregador e menores para o empregado, com clara diferenciação dos conceitos de dispensa e de demissão. Como sabido, a dispensa se dá por ato do empregador, enquanto a demissão consiste em ato de vontade do empregado que rompe o contrato e pede o acerto de contas.

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Assim posto, considerando que o aviso prévio proporcional é um direito do empregado, temos:

No tocante ao debate sobre a retroatividade da Lei 12.506/2011 para beneficiar os trabalhadores que foram dispensados antes de sua vigência, devemos atentar para a Constituição Federal, que é clara no sentido de se preservar a segurança jurídica nas relações privadas, assegurando o respeito ao ato jurídico perfeito.

Todavia, o assunto está em debate no Supremo Tribunal Federal, na relatoria do Ministro Gilmar Mendes. A propósito do tema, o Presidente do TST, Ministro João Orestes Dalazen, se diz contrário à aplicação retroativa da Lei, pelo menos em tese, por respeito à segurança jurídica, ao ato jurídico perfeito. Segundo ele, “... a lei não pode retroagir para afetar o ato jurídico perfeito”, e, sem seguida, emenda “Não pode prejudicar situações jurídicas consolidadas, como a cessação do contrato de trabalho[1].

No afã de evitar a completa desmoralização, o Congresso e o Governo Federal resolveram aprovar a toque de caixa o que ficou engavetado 22 anos. E o resultado é que, ao invés de solucionar o vazio existente no tocante à regulamentação do aviso prévio proporcional, a Lei deixou dúvidas em aberto gerando possibilidade de confusão e entendimentos diversos.

Desta forma, até que surjam respostas objetivas às situações geradas pela aplicação do aviso prévio proporcional, o trabalhador não poderá ser exposto a condição mais prejudicial. Deverá ser aplicada a situação mais vantajosa praticada anteriormente e, nos casos em que houver controvérsia, a interpretação da Lei deverá ser sistemática, conjugando os princípios de proteção aos direitos do trabalhador, a Constituição Federal, a CLT, as normas convencionais.


Notas

  1. http://www.gazetadopovo.com.br/economia/conteudo.phtml?id=1172388, edição 23/09/2011, acessado em 25/10/2011, 17:00h
Sobre o autor
José Raimundo Costa

Advogado trabalhista em Belo Horizonte (MG). Especializado em negociação coletiva, assessoria jurídica a entidades sindicais. Especialização em Direito Público pela Newton Paiva / Anamages, Graduação pela UFMG.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COSTA, José Raimundo. Aviso prévio proporcional: direito tardio, aplicabilidade confusa . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3078, 5 dez. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20565. Acesso em: 2 mai. 2024.

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