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Assédio moral nas relações de trabalho ensejando a rescisão indireta do contrato de trabalho

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Agenda 17/08/2012 às 14:44

2 ASSÉDIO MORAL ENSEJANDO A RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO

Após a análise do assédio moral, estudar-se-á a rescisão indireta e a possibilidade de pleiteá-la em virtude do assédio moral exercido sob o trabalhador.

Primeiramente, para fins explicativos, convém estudar a rescisão indireta, com seus conceitos, requisitos e deveres e direitos das partes, para posteriormente, avançar para a elucidação da rescisão contratual motivada pelo assédio moral.

2.1 Rescisão Indireta do Contrato de Trabalho

A rescisão do contrato de trabalho é sempre precedida de uma relação, de direitos e deveres entre os pactuantes. A rescisão é quando findam os requisitos da relação empregatícia, quais sejam: subordinação, onerosidade, continuidade e pessoalidade. (BRASIL, 1943) [12]

2.1.1 Conceito

A rescisão indireta ou dispensa indireta, como é conhecida também, é uma das formas de término do contrato de trabalho por decisão do trabalhador em virtude da justa causa praticada pelo empregador, com fulcro no art. 483 da CLT. (MARTINS, 2009, p. 373). Deste modo, o trabalhador rescinde o contrato de trabalho em virtude de uma falta grave cometida por seu empregador.

Destarte, esta é uma das hipóteses legais para o empregado rescindir o contrato de trabalho e pleitear judicialmente a rescisão indireta, em virtude de atos praticados pelo empregador, que a lei aponta como ilegais. Deste modo, nada mais é que o rompimento (rescisão) contratual, onde o empregado ou empregador (no nosso caso, o empregado) dá fim à relação de emprego, devendo quitar os direitos legais deste término.

A única forma de o empregado caracterizar a justa causa cometida pelo empregador é, após verificar as ilegalidades, ajuizar, na Justiça do Trabalho, ação de rescisão indireta do contrato de trabalho, devendo notificar o empregador dos motivos que está tomando esta decisão, caso contrário, possibilitará à empresa considerar a sua ação como abandono de emprego.

2.1.2 Hipóteses e Requisitos da Rescisão Indireta do Contrato de Trabalho

Como observado anteriormente, a rescisão indireta do contrato de trabalho caracteriza-se pelo termino do contrato laborativo em virtude de uma violação ou omissão do empregador ao contrato avençado para o desempenho das atividades. O art. 483 da CLT enumera diversas hipóteses capazes de ensejar a rescisão indireta:

“Art. 483, da CLT – O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando:

a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato;

b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo[13];

c) correr perigo manifesto de mal considerável;

d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato;

e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama;

f) o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;

g) o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários.

§ 1º – O empregado poderá suspender a prestação dos serviços ou rescindir o contrato, quando tiver de desempenhar obrigações legais, incompatíveis com a continuação do serviço.

§ 2º – No caso de morte do empregador constituído em empresa individual, é facultado ao empregado rescindir o contrato de trabalho.

§ 3º – Nas hipóteses das letras d e g, poderá o empregado pleitear a rescisão de seu contrato de trabalho e o pagamento das respectivas indenizações, permanecendo ou não no serviço até final decisão do processo. “(BRASIL, 1943)

Além do art. 483 da CLT, os artigos 474 e 407, parágrafo único, da CLT, também tratam de rescisão indireta do contrato de trabalho, se não vejamos:

“Art. 474 da CLT: A suspensão do empregado por mais de 30 (trinta) dias consecutivos importa na rescisão injusta do contrato de trabalho.

Art. 407 - Verificado pela autoridade competente que o trabalho executado pelo menor é prejudicial à sua saúde, ao seu desenvolvimento físico ou a sua moralidade, poderá ela obrigá-lo a abandonar o serviço, devendo a respectiva empresa, quando for o caso, proporcionar ao menor todas as facilidades para mudar de funções.

Parágrafo único - Quando a empresa não tomar as medidas possíveis e recomendadas pela autoridade competente para que o menor mude de função, configurar-se-á a rescisão do contrato de trabalho, na forma do art. 483.” (BRASIL, 1943)

Diante das hipóteses elencadas no art. 483 da CLT, o empregado poderá rescindir seu contrato de trabalho ao ajuizar reclamatória trabalhista, visando o reconhecimento judicial por motivo de justa causa do empregador.

Diante disso, existem duas hipóteses para o empregado continuar na empresa reclamada, caso seja de seu interesse, de acordo com o que estabelece o § 3º do artigo 483 da CLT.

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Primeiramente, diante da alínea "d", quando o empregador deixa de cumprir as obrigações do contrato de trabalho, ou, na hipótese de alínea "g", quando o empregador reduz unilateralmente o trabalho do empregado, afetando sua remuneração. Nas outras hipóteses do artigo 483 da CLT, o trabalhador terá que afastar-se da empresa, sob a penalidade de ser invalidada sua reclamação.

Diante de diversas possibilidades para rescindir o contrato de trabalho, existem, porém, alguns requisitos ou alguns critérios, para caracterizar o assédio moral, como ensina Godinho (2006, p.1211).

Primeiramente, o autor cita como essencial o preenchimento dos requisitos objetivos, o qual se deve considerar o enquadramento legal diante da atitude do empregador, e também o lapso temporal, entre o rompimento do contrato e o ato ilegal do empregador, compreendido com a gravidade da conduta do empregador, devendo ser extremamente grave a ponto de impedir a continuidade do contrato.

Já quanto aos requisitos subjetivos, devemos observar a autoria empresarial. O sujeito ativo do ato ensejador da rescisão, deve ser o empregador ou os seus prepostos.

Quanto aos requisitos circunstanciais, Godinho cita que a “ordem jurídica exige que haja efetiva vinculação entre a falta imputada ao empregador e a fundamentação da rescisão indireta pretendida pelo obreiro” (2006, p. 1214).

2.1.3 Direitos e deveres das partes contratuais na rescisão indireta

Como já observado, a CLT traz inúmeras possibilidades de rescisão contratual. Optando pela rescisão indireta, o trabalhador reclamante terá praticamente os mesmos direitos da demissão sem justa causa.

Deste modo, o trabalhador terá direito de receber pela rescisão o saldo de salário[14] até concluir o mês ou a data de pagamento prevista, multa de 40 % do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço[15], férias vencidas e proporcionais acrescidas de 1/3[16], desemprego" data-type="category">seguro desemprego[17], aviso prévio indenizado[18], décimo terceiro proporcional[19] e ainda um mês de remuneração por ano de efetivo serviço ou fração superior a seis meses.

2.2 Assédio moral como motivo de rescisão indireta do contrato de trabalho

Diante de nosso estudo, cabe destacar cinco[20] hipóteses, do art. 483 da CLT[21], que são as mais citadas em nossas jurisprudências (como veremos adiante), para configurar a rescisão indireta, advindo de um assédio moral.

A Primeira possibilidade é a exigência de serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato (art. 483, a). A “força”, citado acima, não deve ser analisada como força física especificamente, podendo ser entendida também como capacidade profissional para desempenhar o serviço. Ao citar os serviços alheios ao contrato, significa o exercício de atividades não pactuadas no contrato.

Outra possibilidade de pleitear a rescisão indireta é com fulcro na alínea “B” do art. 483 da CLT (BRASIL, 1943), quando o trabalhador é tratado com rigor excessivo, configurando o assédio moral. Significa que não pode haver repressões ou punições que possam configurar perseguições. Objetiva-se analisar a proporcionalidade entre o motivo da falta (se existe), e a sanção aplicada ao trabalhador.

O perigo de mal considerável, elencado na alínea “C” do art. 483, o qual ocorre quando o trabalhador é obrigado a exercer tarefas impróprias para a sua segurança, também pode ser determinante para a rescisão indireta advindo de um assédio moral.

O legislador elencou ainda, o não cumprimento das obrigações do contrato, descriminado na alínea “D” deste artigo. Neste caso, deve-se analisar os princípios contratuais, dispostos no Código Civil, que nos remete ao princípio da boa fé entre as partes, que neste caso, houve ruptura pelo empregador/assediador. Assim, ressalta-se que os contratos são sempre pactuados levando-se em conta o principio da boa fé e da continuidade, deste modo, o ato sofrido pelo empregado deve ser grave, a ponto de impossibilitar a continuação do trabalho.

Porém a forma mais genérica e comum de pleitear de requerer a rescisão indireta do contrato de trabalho em virtude do assédio moral é a alínea “E” do já citado art. 483 da CLT. Esta alínea é a mais invocada para pleitear a rescisão em virtude do assédio, pois trata do próprio ato lesivo da honra e/ou da boa fama do trabalhador, ou seja, é o próprio desrespeito do assediador para com o trabalhador, violando sua dignidade, e acarretando a infração da alínea “E” do CLT.

Assim, Rufino nos ensina:

“[...] a obrigação contratual do empregador de respeitar os direitos trabalhistas, além da personalidade moral de seu empregado e os direitos relativos à sua dignidade, e vice-versa, cuja violação implicaria na infração dos ditames contratuais e das leis trabalhistas, ensejando o direito do empregado à indenização correspondente, além da legitimação do direito obreiro de resistência, que se consuma com a recusa ao cumprimento de ordens ilícitas.” (RUFINO, 2006, p.35)

Deste modo, com a transgressão de sua honra e ou a boa fama do empregado, este tem direito a recusar as ordens de serviço, apesar da hierarquia (não se confunda com submissão a toda e qualquer ordem) existente, podendo rescindir o contrato e pleitear sua devida indenização.

Importante mencionar que o afastamento imediato realizado pelo empregado, culminado pela rescisão indireta, é a única forma de proteção dos seus direitos, já que não existe nenhuma lei federal capaz de determinar alguma penalidade ou sanção para esta prática, se não vejamos as palavras de Rufino:

“[...] a prática do assédio moral gera conseqüências jurídicas para o ofensor e, também, para a vítima, pois, muito inexista no âmbito trabalhista nacional uma lei específica sobre o fenômeno, o empregador deverá delimitar sua conduta em outras regras de proteção jurídica, que impõem o “dever-se” nesta relação, o qual, se violado, ensejará a respectiva sanção. 

De tal modo, apesar de inexistir uma norma específica dispondo e identificando o assédio moral, suas conseqüências e sanções, deverão ser aplicadas outras normas por analogia, impondo ao empregador o cumprimento fiel à proteção jurídica de direitos dos trabalhadores, limitando sua conduta, com ditames trabalhistas, como a implicância da rescisão indireta, previstas na CLT.” (RUFINO, 2006, p.91)

Destarte, diante da inexistência de leis acerca do tema, a rescisão indireta pleiteada judicialmente, com fulcro no art. 483, (alíneas “A”, “B”, “C”, “D”, ou ainda a “E”, por exemplo)[22], pode ser utilizada como forma de interromper o assédio moral exercido sobre o trabalhador, cabendo ainda, como já citado, a reparação pelos danos causados, como a perda do emprego (embora seja por rescisão indireta), despesas com médicos e psicólogos, entre outros.

Um dos pioneiros sobre o assunto, o Juiz Luiz Salvador, disserta brilhantemente sobre os direitos advindos da rescisão contratual em virtude do assédio moral:

“Assim, o lesado por assédio moral pode pleitear em juízo além das verbas decorrentes da resilição contratual indireta, também, ainda, a indenização por dano moral assegurada pelo inciso X do art. 5º da Lex Legun, eis que a relação de trabalho não é de suserania, é de igualdade, é de respeito, de intenso respeito, cabendo frisar que a igualdade prevista no art. 5º da CF não restringe a relação de trabalho à mera relação econômica subordinada: assegura ao trabalhador o necessário respeito à dignidade humana, à cidadania, à imagem, à honradez e à auto-estima.” (SALVADOR, 2003, p.13-17).

Deste modo, apesar da omissão legislativa acerca de uma lei nacional sobre o tema, a CLT fornece mecanismos para evitar a continuação do contrato de trabalho para o trabalhador vítima de assédio moral.

2.3 Nexo Causal e o Conjunto Comprobatório do assédio moral e sua validade na Justiça Brasileira

Antes de adentrar sobre a verificação do nexo causal, entre a conduta do agente e o resultado na vítima, cabe ingressar brevemente na área médica, mais precisamente na Medicina do Trabalho, especialidade da ciência médica, em virtude de sua conceituação no momento do ingresso da rescisão em virtude do assédio. Diante disso, o art. 2º da Resolução nº 1488/98, oriunda do Conselho Federal de Medicina trata sobre o tema:

“Artigo 2º: Para estabelecimento do nexo causal entre os transtornos de saúde e as atividades do trabalhador, além do exame clínico (físico e mental) e os exames complementares, quando necessários, deve o médico considerar:

I - A história clínica e ocupacional, virtualmente decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de nexo causal; II - o estudo do posto de trabalho; III - o estudo da organização do trabalho; IV - os dados epidemiológicos; V - a literatura atualizada; VI - a ocorrência de quadro clínico ou sub-clínico em trabalhador exposto a condições agressivas; VII - a identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, mecânicos, estressantes e outros; VIII - os depoimentos e a experiência dos trabalhadores; IX - os conhecimentos e as práticas de outras disciplinas e de seus profissionais sejam, ou não, da área da saúde.”

Apesar de toda a tecnologia, sabe-se que é extremamente difícil a caracterização pelo médico, do nexo causal entre as ações dos assediadores e as doenças advindas desta agressão às vítimas. Porém, em casos de dúvida deve o médico adotar o Princípio da Proteção, favorecendo o empregado, pois é a parte hipossuficiente da relação contratual.

Portanto, caso comprovado pelo médico o nexo causal, este poderá considerar um acidente de trabalho, com possibilidade de o trabalhador ingressar com auxílio doença, junto ao Instituto Nacional do Seguro Social, e se afastar da empresa enquanto perdurar o benefício.

Porém, voltando ao nosso tema, a prova é um aspecto delicado para caracterizar e provar o assédio moral.

De acordo com o artigo 818 da CLT[23], a prova das alegações incumbe à parte que as fizer. Deste modo, para ingressar com a rescisão indireta do contrato de trabalho em virtude do assédio moral, o trabalhador deverá estar repleto de provas desta violência.

Porém, o Código de Processo Civil[24], determina que o Reclamado/empregador poderá fazer prova dos fatos impeditivos, modificativos ou ainda, extintivos do direito do autor, ora trabalhador, portanto, poderá alterar ou se defender através de prova de suas ações neste ato.

Deste modo, não cabe apenas o trabalhador alegar fatos que ensejam o assédio moral, terá que comprovar, caso contrário, não haverá direito a rescisão indireta e tampouco a indenização.

As provas dos fatos são consideradas livre, admitindo-se todos os meios de provas legais, como email, mensagens telefônicas e virtuais, gravações telefônicas[25], testemunha(s), entre outras. As provas dos fatos mais utilizadas em nossos Tribunais Regionais são as testemunhas que presenciaram as ilegalidades ao longo das agressões, tendo elas o poder de mudar todo o pedido ou defesa das partes em decisões judiciais, tornando-se uma figura importante para o deslinde processual.

Não é tarde para lembrar que o assédio moral difere dos danos morais, já que aquele não tem a condição de publicidade perante terceiros, podendo ser pessoal, desde que comprovado.

Apesar de ser um requisito essencial, os danos psíquicos e/ou físicos são muito difíceis de comprovar. Assim, a vítima poderá comprovar tal ato, apresentando seu histórico médico, com a possibilidade (embora pequena para comprovar perante o Juiz tal fato) de apresentar ainda, o exame médico admissional, provando que os problemas de saúde começaram, ou se agravaram, após o assédio sofrido. Portanto as lesões sofridas psicologicamente pelos trabalhadores vítimas, poderão se fundar em atestados médicos, receitas ou notas fiscais de medicamentos, radiografias, entre outras.

Apesar destas provas, que poderão ser juntadas ao processo para demonstrar as lesões sofridas pela vítima, poderá o juiz, requerer uma perícia médica para provar as lesões sofridas pelo Reclamante.

Destarte, o Juiz é quem terá que analisar friamente a partir das provas trazidas aos autos, ficando à seu critério a caracterização da violência do assédio moral.

Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BENDER, Mateus. Assédio moral nas relações de trabalho ensejando a rescisão indireta do contrato de trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3334, 17 ago. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22435. Acesso em: 19 dez. 2024.

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