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A importância dos laudos técnicos das Superintendências Regionais do Trabalho e Emprego nas ações regressivas acidentárias

Agenda 24/01/2013 às 14:53

Os laudos da SRTE são importante meio de prova nas ações regressivas acidentárias, as quais buscam o ressarcimento em favor do INSS, dos benefícios previdenciários pagos em virtude de acidentes de trabalho ocasionados por culpa dos empregadores.

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem o objetivo de delinear qual a real importância dos laudos técnicos emitidos pelas Superintendências Regionais do Trabalho e Emprego – SRTE’s enquanto elemento probatório apto a fundamentar o ajuizamento das ações regressivas acidentárias pelo INSS em face dos empregadores que descumprem as normas de saúde, higiene e segurança do trabalho.

Antes tudo, cumpre esclarecer que o verdadeiro escopo do presente estudo, longe de buscar interferir no conteúdo da atuação dos auditores do trabalho na fiscalização, procura na realidade retratar qual a importância dessa atividade para as outras instituições que também cuidam de combater e prevenir os acidentes de trabalho.

Nesse diapasão, os laudos da SRTE representam importantíssimo instrumento probatório nas ações regressivas acidentárias, as quais buscam o ressarcimento em favor do INSS, representado pelos órgãos de execução da Procuradoria-Geral Federal, dos benefícios previdenciários pagos em virtude de acidentes de trabalho ocasionados por culpa dos empregadores.

Isso porque, nesses laudos muitas vezes resta efetivamente demonstrada a culpa do empregador no acidente de trabalho, refletida através do descumprimento das normas de saúde, segurança e higiene do trabalho.


1. Ações Regressivas Acidentárias: Noções Gerais

O desenvolvimento do estudo, no entanto, pressupõe que sejam prestados alguns esclarecimentos acerca das ações regressivas acidentárias, relacionados à sua definição, sua natureza jurídica, seu objetivo, dentre outros que se fazem necessários.

Considerando que o Brasil é um dos campeões nas estatísticas de acidentes de trabalho, segundo os dados da Organização Internacional de Trabalho – OIT, e levando-se em conta que muitos desses acidentes são ocasionados pela negligência das empresas no cumprimento das normas de saúde e segurança do trabalho, a Procuradoria-Geral Federal passou a intensificar uma postura institucional de caráter proativo, pela qual objetiva contribuir para a redução das consequências econômico-sociais dos acidentes do trabalho[1].

Para tanto, passaram a ser ajuizadas sistematicamente ações regressivas acidentárias na busca pelo ressarcimento dos gastos públicos gerados pelo pagamento de diversas prestações acidentárias.

Nesse contexto, as ações regressivas acidentárias consistem no mecanismo jurídico através do qual o INSS busca a recomposição das despesas que sofreu com o pagamento de prestações sociais implementadas em virtude de acidentes de trabalho ocorridos por culpa dos empregadores, que descumpriram as normas de higiene, saúde e segurança do trabalho.

Para tal, fundamenta o INSS sua atuação no artigo 120 da Lei nº 8.213/91, conhecida como Lei de Benefícios Previdenciários, que preceitua:

Art. 120. Nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis.

Analisando o dispositivo legal acima indicado, vislumbra-se, desde logo, a necessária existência de alguns pressupostos fáticos para que haja procedência da ação regressiva acidentária, quais sejam:

1-  Acidente de trabalho sofrido por segurado (seja um acidente típico, seja uma doença ocupacional);

2- Concessão de uma prestação social acidentária em decorrência do acidente (abrange tanto os benefícios acidentários, como os serviços de habilitação e reabilitação profissional);

3-  Culpa do empregador pelo descumprimento ou mesmo ausência de fiscalização das normas de saúde e segurança do trabalho.

Somente com a existência concomitante dos três requisitos fáticos acima mencionados é que poderá ser reconhecido judicialmente o dever de indenizar por parte do empregador em favor do INSS quanto aos prejuízos decorrentes das prestações sociais concedidas em virtude do infortúnio.

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Ademais, mostra-se pertinente destacar que o objetivo na intensificação do ajuizamento das ações regressivas não se restringe ao mero escopo de ressarcimento dos prejuízos causados à Autarquia Previdenciária.

Para além desse intuito reparatório, o mencionado instrumento busca ainda punir aqueles que descumprem as normas trabalhistas, demonstrando que sua incúria repercutirá negativamente em seu patrimônio, pois será obrigado a ressarcir também à Previdência Social os prejuízos causados pelo acidente (e não apenas ao trabalhador ou sua família nas ações de indenização ajuizadas perante a Justiça do Trabalho).

Por óbvio que a efetiva responsabilização das empresas, através das condenações surgidas em ações regressivas acidentárias, será fator de incentivo a que os mesmos evitem os acidentes por meio da adoção de uma postura diligente e fiscalizadora, de modo a obedecer à legislação de segurança e saúde do trabalho.

Nesse contexto, salta aos olhos o efeito pedagógico das ações regressivas, de forma a contribuir, por via reflexa, na efetivação da política pública de prevenção dos acidentes de trabalho, tão cara em nosso Estado Democrático de Direito.


2. Culpa do Empregador

Consoante observado, a culpa do empregador, caracterizada como pressuposto para a procedência das ações regressivas acidentárias, consiste no efetivo descumprimento do dever de observância das normas de saúde, higiene e segurança do trabalho e/ou na ausência de sua efetiva fiscalização, conforme preceituam a Constituição da República[2] e a Consolidação das Leis Trabalhistas - CLT[3].

Nesse sentido, a CLT delegou ao Ministério do Trabalho e Emprego - MTE a possibilidade de disciplinar mais especificamente a matéria relacionada à segurança e medicina do trabalho, o que é realizado através das Normas Regulamentares [4].

Logo, verifica-se não constituir caso de responsabilidade objetiva, de sorte que se torna indispensável, para que reste configurada a responsabilidade do empregador, que os prejuízos do acidente decorram do não cumprimento das normas de segurança do trabalho, seja através de conduta omissiva, seja por conduta comissiva. Assim posicionou-se o Superior Tribunal de Justiça no precedente abaixo colacionado:

RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. ACIDENTE DE TRABALHO. CULPA DO EMPREGADOR. AÇÃO REGRESSIVA. POSSIBILIDADE.

“Em caso de acidente decorrente de negligência quanto à adoção das normas de segurança do trabalho indicadas para a proteção individual coletiva, os responsáveis respondem em ação regressiva perante a Previdência Social.”  “O fato de a responsabilidade da Previdência por acidente de trabalho ser objetiva apenas significa que independe de prova da culpa do empregador a obtenção da indenização por parte do trabalhador acidentado, contudo não significa que a Previdência esteja impedida de reaver as despesas suportadas quando se provar culpa do empregador pelo acidente.”  “O risco que deve ser repartido entre a sociedade, no caso de acidente de trabalho, não se inclui o ato ilícito praticado por terceiro, empregadores, ou não.” Recurso não conhecido[5].(Grifos acrescidos)

Nessas hipóteses, que configuram inclusive infração penal[6], há a prática de um ato ilícito, de uma violação de dever legal de zelar pela incolumidade do trabalhador, de modo a gerar o dever indenizatório.


3. A função probatória do laudo de investigação da SRTE

Para fins de subsidiar o ajuizamento das ações regressivas acidentárias, mais especificamente na busca de comprovar a culpa do empregador pelo acidente, são utilizados diversos meios de prova disponíveis, tais como as provas documentais originárias da fase de instrução nas ações de indenização ajuizadas pelo empregado acidentado ou sua família perante a Justiça do Trabalho, os relatórios de conclusão de inquéritos instaurados nas Polícias Civis, dentre outras.

No entanto, o que se verifica na prática é que a maior parte das ações regressivas acidentárias é ajuizada com base nos relatórios conclusivos elaborados pelos auditores do Ministério do Trabalho e Emprego, o que demonstra a grande importância das atividades dos auditores do trabalho.

Isso porque, a extensão e relevância de seu trabalho, longe de impactar apenas na relação administrativa de fiscalização a que se submetem as empresas perante o Poder Público (MTE), ultrapassa o âmbito dessa instituição porquanto refletirá ainda no sucesso das ações regressivas acidentárias, na medida em que servirá para comprovar a culpa do empregador na ocorrência do acidente.

Deve-se ter em mente, portanto, que o trabalho dos auditores não se exaure no âmbito da sua instituição, que fiscaliza o cumprimento das normas de saúde e segurança do trabalho pelas empresas, punindo aquelas que se mostram negligentes. Mais do que isso, os laudos técnicos servirão ainda como instrumento probatório que fundamentará as ações regressivas, garantindo o sucesso de mais uma medida de combate e prevenção aos acidentes de trabalho.

O próprio Judiciário, ao julgar esse tipo de demanda indenizatória, tem proferido decisões de procedência tomando como fundamento os laudos elaborados pelas Superintendências Regionais, como pode ser extraído dos julgados abaixo transcritos:

PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO REGRESSIVA. LEI Nº 8.213/91. VALORES DESPENDIDOS COM PENSÃO POR MORTE EM RAZAO DE ACIDENTE DE TRABALHO. INOBSERVÂNCIA DE NORMAS DE SEGURANÇA. CULPA CONCORRENTE. [...] 3. Hipótese em que o Laudo Técnico elaborado pela Delegacia Regional do Trabalho/CE comprovou, quantum satis, as circunstâncias fáticas do acidente que vitimou o trabalhador, confirmando a negligência, seja do empregador, seja do segurado, no tocante às normas básicas de segurança, evidenciando a culpa concorrente, nos moldes preconizados no Código Civil. 4. Apelação parcialmente provida[7].

CIVIL E PREVIDENCÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL E REMESSA OFICIAL. ACIDENTE DE TRABALHO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. PRESCRIÇÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. INEXITÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA. INOBSERVÂNCIA DAS REGRAS DE PROTEÇÃO E SEGURANÇA DO TRABALHADOR. PAGAMENTO DE BENEFÍCIO DECORRENTE DO ACIDENTE. AÇÃO REGRESSIVA DO INSS. PROCEDÊNCIA. RECURSOS IMPROVIDOS. [...] 5. No caso dos autos, o laudo técnico realizado pela Delegacia Regional do Trabalho comprovou as circunstâncias e o modo como ocorreu o acidente que ocasionou a amputação traumática do antebraço direito do empregado, restando, portanto, incontestável a negligência da empresa quanto à observância e fiscalização das normas de segurança do trabalho para proteção de seus trabalhadores, além do nexo causal entre a sua omissão e o dano ocorrido. 6. Uma vez demonstrada a omissão da Empresa quanto à observância das normas de segurança de trabalho, deve a mesma ressarcir o INSS pelos pagamentos efetuados à filha do empregado falecido, a título de pensão por morte acidentária. 7. Apelação e remessa oficial a que se nega provimento[8].

Delineia-se, dessa forma, o caráter instrumental dos laudos de investigação, na medida em que servem como meio de prova a fim de demonstrar se o comportamento do empregador ensejou o descumprimento de normas de saúde, higiene e segurança do trabalho, para fins de ulterior ajuizamento da ação de regresso.


4. Conclusão

O que se objetivou no presente trabalho foi dimensionar a relevância da atuação dos auditores trabalhistas na fiscalização quanto ao cumprimento pelas empresas das normas de segurança e saúde do trabalho e de seu produto final, o relatório de investigação.

Isso porque, como visto a importância dessa atividade se estende para outras instituições, como é o caso do INSS, de forma a majorar sua potencialidade na efetivação da política pública de combate e prevenção dos acidentes de trabalho.

Como visto, sendo as ações regressivas acidentárias mecanismos importantíssimos também nesse desiderato, o sucesso das mesmas depende diretamente da existência de um laudo pericial apto a comprovar a existência de culpa do empregador no acidente laboral que gerou o dispêndio pelo INSS.

Em outras palavras, percebe-se que o sucesso de uma ação regressiva acidentária encontra-se, muitas vezes, intimamente relacionado com o conteúdo dos laudos de Investigação, porquanto tais documentos influenciam decisivamente no convencimento do órgão julgador quando da análise dessas demandas, implicando em maiores chances quanto à sua procedência.


Referências

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 03/01/2013.

BRASIL. Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>. Acesso em: 02/01/2013.

BRASIL. Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8213cons.htm>. Acesso em: 10/01/2013.

MACIEL, Fernando. Ações Regressivas Acidentárias. 1ª ed., São Paulo: LTr, 2010.


Notas

[1] MACIEL, Fernando. Ações Regressivas Acidentárias. 1ª ed., São Paulo: LTr, 2010, p. 13/14.

[2] Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

[...]

XXII - redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança;

[3] Art. 157 - Cabe às empresas:

I - cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho;

[4] Art. 155 - Incumbe ao órgão de âmbito nacional competente em matéria de segurança e medicina do trabalho:

I - estabelecer, nos limites de sua competência, normas sobre a aplicação dos preceitos deste Capítulo, especialmente os referidos no art. 200;

[5] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 506881/SC. Rel,. Min. José Arnaldo da Fonseca. Brasília/DF, 14/10/2003. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/pesquisar.jsp?newsession=yes&tipo_visualizacao=RESUMO&b=ACOR&livre=acidente negligência regressiva culpa independe. Acesso em: 15 Jan. 2013.

[6] Nos termos do art. 19, §2º da Lei nº 8.213/91: “constitui contravenção penal, punível com multa, deixar a empresa de cumprir as normas de segurança e higiene do trabalho”.

[7] BRASIL. Tribunal Regional Federal da 5ª Região. APELREEX 200981000127540. Des. Manoel Erhardt. Recife/PE, 10/05/2012. Disponível em: http://columbo2.cjf.jus.br/juris/unificada/Resposta. Acesso em: 13 Jan. 2013.

[8] BRASIL. Tribunal Regional Federal da 5ª Região. AC 200981000093669. Des. Luiz Alberto Gurgel de Faria. Recife/PE, 21/11/2012. Disponível em: http://columbo2.cjf.jus.br/juris/unificada/Resposta. Acesso em: 13 Jan. 2013.

Sobre o autor
Felipe Regis de Andrade Caminha

Procurador Federal Responsável pelo Núcleo de Cobrança e Recuperação de Créditos da PRF 1ª Região. Pós-Graduado em Direito Tributário pela UNIDERP (Rede LFG).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CAMINHA, Felipe Regis Andrade. A importância dos laudos técnicos das Superintendências Regionais do Trabalho e Emprego nas ações regressivas acidentárias. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3494, 24 jan. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23534. Acesso em: 25 nov. 2024.

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