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Juízes devem julgar “politicamente”?

Agenda 09/06/2013 às 14:21

Pode o membro do Poder Judiciário julgar com base em fundamentos políticos?

Tem ganhado muita força nos últimos dias a discussão acerca da atuação política dos juízes. Muito se tem falado, discutido e argumentado a favor e contra membro do Poder Judiciário julgar com base em fundamentos políticos. Trata-se de uma questão que deve nortear ainda por muito tempo o debate jurídico-político no Brasil. A pergunta, basicamente, é a seguinte: deve o Juiz julgar com base na Lei? Ou deve ir além de julgar com base em fundamentos também político?

Para alguns, a atuação do Judiciário dentro da segunda situação equipara o Juiz ao Parlamentar. Se julga com base em argumento de natureza política, faz política, e como tal edita uma norma sobre um determinado caso concreto. Se for o STF atuando em sede de controle de constitucionalidade, a norma concreta, ou individual, chamada também de “norma de decisão” (Hans Kelsen/Eros Grau), a situação ganha maior relevância tendo em vista que tal decisão teria efeito erga omnes, ou seja, eficácia geral, alcançando a todos no País. Se a decisão judicial não tem amparo em uma norma previamente discutida e aprovada pelo Poder Legislativo, e terá eficácia geral e abstrata, editou-se, em verdade, uma norma jurídica nova.

Tal situação é extremamente delicada, por envolver aspectos relacionados ao Estado Democrático de Direito e a legitimidade nesse Estado para elaborar leis. Quem possui legitimidade para tanto? Ao meu ver, a situação pode se desdobrar em duas hipóteses: Caso haja uma norma já editada pelo Poder Legislativo, não pode o Judiciário extrapolar aquilo que Hans Kelsen chama de “moldura da norma”. Pode até interpretar a norma de forma flexível, mitigando o rigor da letra da lei em favor de uma interpretação contextualizada, vinculada à realidade social e política do País. Mas não ir além do que determinada a Lei.

De outra banda, uma outra situação é quando não há norma jurídica dentro do Ordenamento Jurídico do País. O Legislador não fez a norma, e surge um conflito envolvendo pessoas que em concreto buscam uma solução através do Judiciário. O que fazer nesse caso? O judiciário tem que julgar. O cidadão espera uma solução para suas questões e o Judiciário deve lhe proporcionar isso, ainda que não tenha uma Lei. Nesse caso, de forma excepcional, deve o Judiciário construir uma norma individual, que não valerá, contudo, para todos (erga omnes). A decisão concreta somente vinculará as partes daquele processo.

É claro que a segunda situação, diante das normas processuais em vigor atualmente, poderá, com o tempo, tornar-se uma norma geral, desde que se torne jurisprudências pacífica das Cortes do País ou mesmo súmula vinculante. Contudo, o procedimento para que se chegue a tal situação é não é fácil, e a Legislação do País exige alguns requisitos que condicionam a mutação de uma sentença judicial em uma norma geral, semelhante à Lei. Para a Súmula Vinculante, por exemplo, é necessário que a matéria a ser regulada tenha sido já pacificada no STF. Não seria possível uma Súmula Vinculante regulando situação concreta não discutida no STF, ou que possua julgamentos divergentes dentro da Corte.

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Uma distinção importante é a feita por Ronald Dworkin entre decisão com fundamento em um “princípio político” e decisão tomada com base em “procedimento político”. Os princípios políticos constam já das Leis do País, e podem ser fundamento de uma decisão judicial, como é o caso dos princípios da isonomia, da legalidade, da moralidade na administração pública, da pluralidade partidária, etc., Já a decisão tomada com base em um “procedimento político” tem outra natureza. Nesse caso, o Juiz atua com base em critérios políticos, valendo-se de uma concepção relacionada ao bem-estar geral e ao interesse público. O Juiz faz a norma com o objetivo de contemplar algum interesse, ou seja, a sentença passa a implementar uma política pública. Seria o caso, por exemplo, do Juiz que determina ao Prefeito que construa uma ponte, uma escola, um sistema de esgoto, etc., valendo-se do seu entendimento acerca da necessidade daquela política pública para a comunidade em que atua.

Enfim, assunto polêmico e que demandará ainda muita discussão por parte da Comunidade Jurídica e Política do País. A novidade é que a discussão ganha as ruas, com uma discussão acalorada acerca de PEC’s (Propostas de Emenda Constitucionais) que tratam de temas que se relacionam diretamente à essa questão. Pode ou não o Judiciário criar normas jurídicas? Ganha o País com a discussão. Quanto maior o debate, maior o amadurecimento da Sociedade Brasileira, que assim então poderá tomar o rumo que melhor se adeqüe aos seus anseios e objetivos.

Sobre o autor
Marcos Luiz da Silva

Advogado da União em Teresina (PI). Professor efetivo da Universidade Estadual do Piauí.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Marcos Luiz. Juízes devem julgar “politicamente”?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3630, 9 jun. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24610. Acesso em: 22 nov. 2024.

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