5.A IMPRESCRITIBILIDADE DO DEVER DE REPARAR O DANO AMBIENTAL.
A obrigação de reparar o dano ambiental, ao contrário do que ocorre com as sanções pecuniárias, não é alcançada pela incidência da prescrição no procedimento administrativo ambiental. É a regra disposta no § 4º do artigo 21 do Decreto nº 6.514/2008:
Art. 21.
§ 4º A prescrição da pretensão punitiva da administração não elide a obrigação de reparar o dano ambiental.
A independência das obrigações nascidas de conduta contrária à legislação ambiental encontra fundamento no texto constitucional, que assim dispõe:
Art. 225.
§ 3º. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar danos ambientais.
O Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp1.120.117-AC, manifestou-se no sentido de reconhecer a imprescritibilidade do direito à reparação do dano ambiental, posto que se trata de direito inerente à vida, fundamental e essencial à afirmação dos povos:
ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL - DIREITO AMBIENTAL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL – IMPRESCRITIBILIDADE DA REPARAÇÃO DO DANO AMBIENTAL – PEDIDO GENÉRICO – ARBITRAMENTO DO QUANTUM DEBEATUR NA SENTENÇA: REVISÃO, POSSIBILIDADE - SÚMULAS 284/STF E 7/STJ.
1.É da competência da Justiça Federal o processo e julgamento de Ação Civil Pública visando indenizar a comunidade indígena Ashaninka-Kampa do rio Amônia.
2. Segundo a jurisprudência do STJ e STF trata-se de competência territorial e funcional, eis que o dano ambiental não integra apenas o foro estadual da Comarca local, sendo bem mais abrangente espraiando-se por todo o território do Estado, dentro da esfera de competência do Juiz Federal.
3. Reparação pelos danos materiais e morais, consubstanciados na extração ilegal de madeira da área indígena.
4. O dano ambiental além de atingir de imediato o bem jurídico que lhe está próximo, a comunidade indígena, também atinge a todos os integrantes do Estado, espraiando-se para toda a comunidade local, não indígena e para futuras gerações pela irreversibilidade do mal ocasionado.
5. Tratando-se de direito difuso, a reparação civil assume grande amplitude, com profundas implicações na espécie de responsabilidade do degradador que é objetiva, fundada no simples risco ou no simples fato da atividade danosa, independentemente da culpa do agente causador do dano.
6. O direito ao pedido de reparação de danos ambientais, dentro da logicidade hermenêutica, está protegido pelo manto da imprescritibilidade, por se tratar de direito inerente à vida, fundamental e essencial à afirmação dos povos, independentemente de não estar expresso em texto legal.
7. Em matéria de prescrição cumpre distinguir qual o bem jurídico tutelado: se eminentemente privado seguem-se os prazos normais das ações indenizatórias; se o bem jurídico é indisponível, fundamental, antecedendo a todos os demais direitos, pois sem ele não há vida, nem saúde, nem trabalho, nem lazer, considera-se imprescritível o direito à reparação.
8. O dano ambiental inclui-se dentre os direitos indisponíveis e como tal está dentre os poucos acobertados pelo manto da imprescritibilidade a ação que visa reparar o dano ambiental.
9. Quando o pedido é genérico, pode o magistrado determinar, desde já, o montante da reparação, havendo elementos suficientes nos autos. Precedentes do STJ.
10. Inviável, no presente recurso especial modificar o entendimento adotado pela instância ordinária, no que tange aos valores arbitrados a título de indenização, por incidência das Súmulas 284/STF e 7/STJ.
11. Recurso especial parcialmente conhecido e não provido[11]. (grifo nosso).
CONCLUSÕES.
O procedimento administrativo ambiental é composto por duas fases distintas: a primeira, que podemos denominar de fase constitutiva, na qual haverá a lavratura do auto de infração e a consequente abertura do procedimento administrativo ambiental, finalizando-se com o julgamento no sentido da homologação ou não do auto de infração e seu transito em julgado (coisa julgada administrativa). E uma segunda fase, que podemos denominar de fase executória.
Na primeira fase, teremos a possibilidade da incidência da prescrição da pretensão punitiva e da prescrição intercorrente. A prescrição da pretensão punitiva decorre do escoamento do prazo de cinco anos, este contado da data da prática do fato ou da cessação da conduta ilícita, o que acaba por retirar da Administração Pública o poder de impor sanções às condutas indesejadas.
A prescrição intercorrente, por sua vez, poderá se dar no curso do procedimento administrativo e decorre unicamente da inércia da Administração Pública em promover atos necessários ao deslinde da causa. A paralisação injustificada do processo por mais de três anos ensejará o reconhecimento de ofício da prescrição intercorrente e demandará a apuração da responsabilidade funcional.
A fase executória do procedimento administrativo diz respeito aos atos necessários à tomada de medidas administrativas tendentes à satisfação do débito imposto na decisão final administrativa, já transitada em julgado, e não satisfeita voluntariamente pelo interessado. A Administração Pública deverá no prazo de cinco anos, a contar da data da constituição definitiva do crédito não tributário, promover as medidas necessárias à satisfação do débito, estando inclusive autorizado a promover a inscrição do nome do infrator no CADINe na dívida ativa.
Por fim, o dever de reparar o dano ambiental não será prejudicado pelo reconhecimento da ocorrência da prescrição no âmbito administrativo, pois, segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça, o direito constitucionalmente assegurado a um meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225) é imanente ao direito à vida, e, portanto, indisponível e protegido sob o manto da imprescritibilidade.
REFERÊNCIAS.
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DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2010.
FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo: Ed. Saraiva, 2012.
MACHADO, Paulo Affonso Leme Machado.Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo: Ed. Malheiros, 2009.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Editora Malheiros, 2005.
MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente: A gestão ambiental em foco. Doutrina. Jurisprudência.Glossário.São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.
SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de Direito Ambiental. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.
TRENNEPOHL, Curt. Infrações contra o meio ambiente: multas, sanções e processo administrativo: comentários ao Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008. Belo Horizonte: Fórum, 2009.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: parte geral/Sílvio de Salvo Venosa. Coleção de direito civil; v.1. São Paulo: Atlas, 2003.
Notas
[1]MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. p.662.
[2]VENOSA, Direito Civil: parte geral.p. 642.
[3] CUNHA, Leonardo José Carneiro. A Fazenda Pública em juízo. p.71.
[4] MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente: A gestão ambiental em foco. Doutrina. Jurisprudência. Glossário. p. 1233.
[5]TRENNEPOHL, Curt. Infrações contra o meio ambiente: multas, sanções e processo administrativo: comentários ao Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008, p.139.
[6]CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p.977.
[7] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit.
[8]MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. p.664.
[9]REsp 623023/RJ, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/11/2005, DJ 14/11/2005, p. 251
[10]REsp 1115078/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/03/2010, DJe 06/04/2010
[11]REsp 1120117/AC, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/11/2009, DJe 19/11/2009.
Abstract:This work studies the incidence of prescribing in environmental administrative procedure.
Keywords:Prescription. Types. Environmental administrative procedure.