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Agências reguladoras: perspectivas históricas e doutrinárias

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Agenda 06/09/2013 às 09:09

3-As Agências reguladoras no Direito Brasileiro

A Constituição Federal no art.21,inciso XI e art.177, §2º prevê a criação de “órgãos reguladores”, tal denominação avaliza a criação das agências reguladoras por meio de lei ordinária.

As leis de nºs. 9.427, de 26 de dezembro de 1996, 9472, de 16 de julho de 1997 e 9.478, de 6 de agosto de 1997 instituíram, respectivamente, a Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, a Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL e a Agência Nacional de Petróleo – ANP. Elas estão sendo criadas sob o epíteto: “autarquias de regime especial”, termo que às submete ao mesmo tratamento empregado às autarquias típicas que já encontram previsão Constitucional. Por este viés assevera o eminente doutrinador Celso Antônio Bandeira de Mello:

Em rigor, autarquias com funções reguladoras não se constituem em novidade alguma. O termo com que ora foram batizadas é que é novo no Brasil. Apareceu ao ensejo de tal ‘Reforma Administrativa’, provavelmente para dar sabor de novidade ao que é muito antigo, atribuindo-lhe, ademais, o suposto prestígio de ostentar uma terminologia norte americana (‘agência’).

A autarquia Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica – DNAEE, por exemplo, cumpria exatamente a finalidade ora irrogada à ANEEL, tanto que o art.31 da lei transfere à nova pessoa todo o acervo técnico, patrimonial, obrigações, direitos e receitas do DNAEE. (BANDEIRA DE MELLO, celso antonio, p.176)

Em sentido oposto, Di Pietro considera que:

As agências reguladoras constituem novidade no Direito Brasileiro, introduzida para assumir o papel que, na concessão, era antes desempenhado pela própria Administração Pública direta, na qualidade de poder concedente; o mesmo papel é assumido na permissão e na autorização.” (DI PIETRO, Maria Sylivia Zanella, p.130)

Ao passo que não é pacífico na doutrina o caráter inovador das agências reguladoras no Brasil, cabe-nos analisar as características que marcam as diferenças do instituto que foi implantado no Brasil com o instituto praticado nos EUA. Para isso é necessário salientar as funções deste instituto.

Como foi exposto no começo deste estudo, as funções das agências no Direito Norte Americano são as três funções que regem o próprio Estado no ideário da tripartição de poderes preconizado por Montesquieu. Contudo, as agências constituem uma espécie de “microcosmos”, pois elas legislam, julgam e administram somente aquilo que foi preconizado em sua lei instituidora. Geralmente se resumem ao âmbito técnico intrínseco ao setor regulado. Assim, a análise de Direito comparado deve levar em conta o grau de possibilidade desta “independência” das agências de editar normas, dirimir conflitos e praticar atos Administrativos de acordo com o ordenamento jurídico brasileiro. Para esta tarefa recorremos novamente às lições de Di Pietro, para quem a maior margem de independência de que gozam as agências é a administrativa, resguardados os ditames previstos na Constituição Federal. Desta forma, as agências deverão submeter-se ao ministério a que se vinculam e estarão sujeitas ao controle pelo Congresso Nacional, como prevê o art.49, inciso X, da Constituição, não podendo escapar também ao controle da “direção superior da administração Federal”, composta pelo Presidente da República e Ministros de Estado, assim preconizado no art.84, inciso II da Constituição Federal.

Independência em relação ao poder Legislativo não existe, já que os atos normativos das agências não podem conflitar com normas constitucionais ou legais, por força do princípio da legalidade strictu sensu (legalidade administrativa) e como já foi exposto, estarão submetidas ao controle do poder Legislativo.

Em relação ao Judiciário também não é possível independência, em face do art. 5º, inciso XXXV da Constituição, que dispõe: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário, lesão ou ameaça a Direito”, inciso que edifica o princípio da inafastabilidade da Jurisdição

Para uma análise mais detida em relação à autonomia administrativa das agências reguladoras, cabe-nos a seguinte pontuação: a) autonomia política dos gestores, que cumpririam mandatos fixos, possuindo assim estabilidade no emprego. Neste ponto deve-se ter assentado que só é possível a perda do mandato por parte do dirigente se este cometer algum ato de improbidade administrativa ou se descumprir injustificadamente o contrato de gestão da agência. Essas falhas devem ser apuradas em processo judicial ou administrativo, sempre a resguardar-se ampla defesa e contraditório. Os dirigentes são nomeados pelo Presidente da República, com prévia aprovação dos nomes pelo Senado Federal, de acordo com os ditames do art.52, inciso III, alínea “f” da Constituição Federal; b) Autonomia técnico-decisória, que justifica o objetivo intrínseco da agência e a coloca a salvo de ingerências políticas nas matérias que lhes são afetas; c) autonomia normativa, sempre de acordo com o que já foi analisado neste estudo no que concerne à independência em relação ao Poder Legislativo. Por último, autonomia gerencial, orçamentária e financeira, assegurada pela negociabilidade de um contrato de gestão, instrumento de regência e avaliação de desempenho da autarquia.

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De último, cumpre-se que sejam enumeradas aqui as agências reguladoras componentes do atual cenário administrativo brasileiro:

1)ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica (Lei n. 9.427, de 26.12.1996);

2) ANATEL – Agência Nacional de Telecomunicações (Lei n.9472, de 16.07.1997);

3) ANP – Agência Nacional de Petróleo (Lei n. 9.478, de 06.08.1997);

4) ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária ( Lei n. 9.782, de 26.01.1999);

5) ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar (Lei n. 9961, de 28.01.2000);

6) ANA – Agência Nacional de Água ( Lei n. 9.984, de 17.07.2000);

7) ANTT – Agência Nacional de Transportes Terrestres e ANTAQ – Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Lei n. 10.233, de 05.07.2001);

9) ADENE – Agência de Desenvolvimento do Nordeste (MP n. 2.156-5, de 25.08.2001);

10) ADA – Agência de Desenvolvimento da Amazônia (MP n. 2.157, de 24.08.2001);

11) ANCINE – Agência Nacional de Cinema (MP N. 2.228-1, de 06.09.2001);

12) ANAC – Agência Nacional de Aviação Civil (Lei n. 11.182, de 27.09.2005);


4-Conclusões

Podemos concluir com esse modesto estudo, que a criação das agências reguladoras foi uma atitude inevitável no contexto histórico em que elas surgiram nos EUA dos anos 1930. Elas faziam parte, naquele contexto, de um conjunto de ações que o Governo teria que promover para equilibrar o cenário econômico.

Após a crise, as agências serviam para manter esse equilíbrio. Serviam para evitar que os agentes regulados ultrapassarem limites que levassem aos males de uma economia desregulamentada, que são conhecidos de há muito. A especulação e a formação de conglomerados são quase inevitáveis quando o Estado não toma para si a responsabilidade de tentar evita-los. Isso é tão observável, que o próprio neoliberalismo que provocou a diminuição do espaço de atuação das agencies, levou os EUA a uma crise de proporções similares à grande depressão de 1930. A crise de 2008 teve entre seus fatores a falta de regulação do chamado “mercado de derivativos”, mas isso é assunto para um estudo mais cuidadoso.

Quanto à captura das agências, entendemos por inevitáveis. Já que no próprio cenário político administrativo estadunidense, onde prevalecem os lobbies em decisões legislativas, seria de uma inocência fatal esperar que as forças do mercado não absorvessem também as agências reguladoras, que estão em uma dimensão muito mais estrita do que os três Poderes constituídos. Essa premissa é também adaptável ao caso brasileiro. Por aqui, onde o próprio Estado sempre foi visto como patrimônio de alguns, não seria estranho que as agências reguladoras também fossem incorporadas aos interesses diversos. Piora pelo fato de que até mesmo a autonomia gerencial tem sido apropriada por interesses político partidários.


REFERÊNCIAS

Livros:

CUÉLLARLeila. As agências reguladoras e seu poder normativo. São Paulo: Dialética, 2001;

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo25º ed. São Paulo: Atlas, 2011;

PRADO JÚNIOR, Caio. Formação do Brasil Contemporâneo. São Paulo: Companhia das Letras, 2011;

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 29ª ed., rev. e atual., São Paulo: Malheiros, 2012;

ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Administrativo Descomplicado . – Marcelo Alexandrino, Vicente Paulo. – 20ª ed. rev. e atual;

HOBSBAWNEricEra dos Extremos: o breve século XX 1914-1991. Trad. Marcos Santarrita. 2ªed. São Paulo : Cia. Das Letras, 1996;

STRECK, Lênio Luiz. Hermenêutica Jurídica e(m) Crise: uma exploração hermenêutica da construção do direito. 9. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010;

STRECKLênio LuizMORAIS, José Luis Bolzan de. Ciência Política e Teoria do Estado. 7ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012;MARTINS, Aluisio de Souza. Agências Reguladoras e os ricos da captura pelos entes regulados: estudo comparado entre o Direito regulatório Norte-Americano e o Brasileiro. Dissertação de Mestrado. Orientação Dr. João Rezende Almeida Oliveira. Brasília: Universidade Católica de Brasília, 2010;

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública. 3 ed. São Paulo: Atlas, 1999oroduççguladorasdas agencncies

Revistas:

Revista Jurídica Consulex, Brasília-DF, ano XVII, n. 383, jan. 2013;

Internet:

ALVEAL, Carmen. Estado e Regulação Econômica: o Papel das Agências Reguladoras no Brasil e na Experiência Internacional. Conferência proferida no Seminário de Direito Internacional e Regulação Econômica. Escola Superior do Ministério Público da União. 20 Maio 2003. Disponível em http://www.ppge.ufrgs.br/ATS/disciplinas/11/alveal-2003.pdf;LIMA, Gustavo Augusto Freitas de. Agências reguladoras nos EUA e considerações sobre o direito comparado. Jus Navigandi, Teresina, ano 17n. 32904 jul. 2012 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/22159>.;

Sobre o autor
Tomás Jobin Coutinho Lopes

Mestrando em Filosofia pela Universidade Federal do Piauí - UFPI; Graduado em Direito pela Universidade Estadual do Piauí - UESPI.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LOPES, Tomás Jobin Coutinho. Agências reguladoras: perspectivas históricas e doutrinárias. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3719, 6 set. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25229. Acesso em: 22 dez. 2024.

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