3. Da obediência aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade na decisão que aplica a penalidade de perdimento do bem apreendido
Viu-se que a apreensão de bem envolvido na prática de infração administrativa ambiental constitui uma imposição ao fiscal autuante que, no momento da lavratura do auto de infração, não possui qualquer discricionariedade para optar pela não apreensão. Quanto a isso, a legislação aplicável é evidente e não dá margem a dúvida.
E não poderia ser de outra forma, mesmo porque, quando do exercício do ato fiscalizatório, o fiscal não detém qualquer informação válida ou elemento seguro para entender que, no caso concreto, o instrumento, veículo ou produto da infração não deverá ser objeto de perdimento. Ou seja, sem a instrução processual que seguirá à autuação, o fiscal não terá segurança jurídica para deixar de apreender o bem, pois não caberá a ele decidir sobre a aplicação futura da penalidade de perdimento. E, deixando-se de fazer a apreensão, o perdimento posterior restará totalmente prejudicado.
Após a necessária apreensão, deve tramitar o processo administrativo, respeitando-se o devido processo legal, apreciando-se as razões apresentadas pelo autuado e/ou por eventuais terceiros prejudicados. No curso de tal instrução, e restando-se confirmada a infração ambiental, à autoridade julgadora caberá aplicar a regra geral de perdimento dos bens apreendidos, como sanção resultante da apreensão anterior.
Como analisado alhures, tanto a Lei nº 9.605/98, como o Decreto nº 6.514/08, evidenciam a necessidade de aplicação da penalidade, nos casos em que a infração ambiental for confirmada pela autoridade julgadora.
O objeto de dúvida é a possibilidade ou não de, no caso concreto, e como exceção à regra geral, a autoridade julgadora, motivadamente, decidir pela não aplicação da penalidade de perdimento, manifestando-se pela devolução do bem ao seu proprietário.
Além da necessidade de se respeitar a propriedade do terceiro de boa-fé, deve-se considerar a real possibilidade, autorizada pelos princípios administrativos vigentes, de se decidir pelo não perdimento do bem apreendido, desde que, analisadas várias circunstâncias do ato infracional, foram elas totalmente favoráveis ao infrator, indicando que o perdimento do bem é medida irrazoável ou desproporcional.
Trata-se da aplicação dos Princípios administrativos da Razoabilidade e da Proporcionalidade que, apesar de não previstos expressamente na Lei que define as infrações e crimes ambientais, encontram-se transcritos na Lei geral que regula os processos administrativos federais. Com efeito, a Lei nº 9.784/1999, dispõe que:
Art. 2º A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.
Além do dispositivo legal, há artigo expresso na Instrução Normativa Ibama nº 10, de 07 de dezembro de 2012, o qual prevê a necessidade de dosimetria das penalidades a serem aplicadas, utilizando-se como parâmetro os princípios administrativos citados:
Art. 88. Estando o processo em termos para julgamento, a autoridade julgadora proferirá decisão que será expressa quanto aos seguintes aspectos, sem prejuízo de outros que venham a ser suscitados no processo e observado o disposto no § 2º:
I – constituição de autoria e materialidade;
II – enquadramento legal;
III – dosimetria das penas aplicadas, tendo em vista os princípios da razoabilidade e proporcionalidade;
IV – manutenção ou cancelamento das medidas administrativas aplicadas nos termos do art. 101 do Decreto nº 6.514, de 2008 confirmando-as ou não em sanções não pecuniárias;
V – agravamento da multa, considerando o disposto no art. 11 do Decreto nº 6.514, de 2008;
VI – majoração ou minoração do valor da multa considerando a existência de circunstâncias agravantes ou atenuantes e demais causas;
VII – período de vigência de sanção restritiva de direito, caso aplicada;
VIII – valor da multa dia e período de aplicação, em caso de multa diária.
IX – representação ao CONAMA, nos termos do art. 8º, V, da Lei 6.938/81, pela aplicação das penalidades previstas nos incisos IV e V do art. 20 do Decreto 6.514, de 2008.
(...) Grifos nossos
Os referidos princípios, caso utilizados para orientar decisão administrativa de devolução dos bens apreendidos, devem ser devidamente fundamentados, para que reste motivada a decisão excepcional, que deixará de aplicar penalidade administrativa prevista em lei, diante de circunstâncias concretas. Não se pode admitir, portanto, que tais condições casuísticas deixem de estar expressas na decisão a ser emitida pela autoridade julgadora, uma vez que se impõe respeito aos demais princípios administrativos, principalmente os da legalidade, finalidade, motivação, segurança jurídica e respeito ao interesse público.
Deve-se considerar, portanto, que a não aplicação da sanção constitui algo não corriqueiro, a se configurar apenas nos casos em que a situação concreta e as circunstâncias ocorridas recomendarem a manutenção do instrumento ou veículo com o autuado. Nesse sentido, entende-se que tal decisão administrativa será excepcional, pois o só fato de utilização do bem para cometimento do ilícito já é um indicativo considerável de possível reincidência, caso o instrumento seja mantido com o infrator. Nesse sentido, e considerando que a defesa do meio ambiente não suporta reiteração do ilícito danoso, justifica-se, em geral, a aplicação do perdimento do bem indevidamente utilizado.
Assim, antes de se analisar situações e circunstâncias que poderiam orientar uma decisão excepcional sobre o assunto, cabe reiterar que a regra, a ser aplicada na imensa maioria dos casos, é a do art. 25 da Lei nº 9.605/98, combinado com o art. 134 do Decreto nº 6.514/08. Ou seja, o produto e instrumento da infração serão apreendidos, quando da constatação da infração, e, restando esta confirmada, não mais retornarão ao infrator.
Contudo, sabe-se que o Direito não é uma ciência exata e que variados princípios, nenhum absoluto, devem orientar os atos administrativos, o que justifica existir espaço para decisão da autoridade julgadora pelo não perdimento de bem apreendido em fiscalização ambiental.
Nesse sentido, cumpre destacar que a Instrução Normativa do Ibama nº 28, de 08 de agosto de 2009, estabelece que:
Art. 8º Quando do julgamento do auto de infração, deve a autoridade julgadora apreciar a aplicação da sanção relativa à apreensão de animais, produtos, subprodutos da fauna e da flora, instrumentos, equipamentos, petrechos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração ambiental, definida no art. 72, IV da Lei Nº 9.605 de 12 de fevereiro de 1998.
§ 1º Nos casos em que a autoridade julgadora decidir por deixar de aplicar a sanção de apreensão, deverá o bem ser restituído ao proprietário, observando-se o disposto no parágrafo único do art. 105 do Decreto Nº 6.514 de 22 de julho de 2008.
§ 2º Nos casos em que tenha ocorrido a destinação dos bens apreendidos antes da decisão que confirme o auto de infração, conforme disposto no art. 107 Decreto nº 6.514 de 22 de julho de 2008, a autoridade julgadora deverá apreciar o ato praticado, quando do julgamento do auto de infração, confirmando-o ou não.
§ 3º Nos casos do § 2º em que a autoridade julgadora decida por não confirmar o ato praticado, o proprietário deverá ser indenizado, conforme disposto no parágrafo único do art. 105 do Decreto No- 6.514 de 22 de julho de 2008.
§ 4º Para a aplicação da sanção de apreensão relativa a veículos, embarcações e equipamentos utilizados como instrumentos para a prática da infração ambiental, deve a autoridade julgadora motivar expressamente quanto à razoabilidade e proporcionalidade da sanção frente à infração ambiental praticada.
A própria legislação infra-legal, portanto, prevê a possibilidade de a autoridade julgadora deixar de aplicar a sanção de apreensão, mas cabe considerar que tal previsão, na realidade, refere-se à penalidade de perdimento, que é a sanção resultante da apreensão. É que a apreensão em si, como medida administrativa, é impositiva ao fiscal, o qual, como visto, não pode deixar de aplicá-la, quando da constatação de infração administrativa ambiental.
Por outro lado, a penalidade que se segue à apreensão, qual seja, o perdimento do bem, pode deixar de ser imposta pela autoridade julgadora, que, ao analisar as razões de defesa e verificar as circunstâncias em que cometida a infração, e lastreada nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, pode entender indevida a referida sanção administrativa.
Importa destacar, contudo, que a legislação não estabelece os casos em que a regra da destinação do bem apreendido deixará de ser aplicada. Não há elementos precisos, nem princípios absolutos, que determinem a não aplicação da pena e orientem a tomada de decisão, de forma objetiva, pela autoridade julgadora. Exatamente pela ausência de precisão normativa sobre a aplicação da penalidade em análise, que se torna imprescindível a motivação do entendimento a ser adotado pela autoridade competente.
O mais importante, destarte, é que a decisão administrativa que analise o auto de infração e a(s) penalidade(s) a ser(em) aplicada(s) esteja devidamente fundamentada e possa justificar a opção da autoridade julgadora pela devolução do bem apreendido ao seu proprietário, ainda que a infração reste confirmada.
Com vistas a auxiliar os agentes da Administração Pública na tomada de decisão consciente sobre a sanção aplicável e a uniformizar, o tanto quanto possível, decisões sobre o assunto, entende-se recomendável analisar situações objetivas em que haverá elementos suficientes para aplicar, com segurança, a penalidade de perdimento, deixando-se de devolver o bem ao infrator.
Tais circunstâncias, porém, devem ser analisadas sempre em conjunto com outros elementos existentes nos autos, com vistas a evitar injustiças e a garantir o cumprimento da finalidade da norma. Ademais, como visto, não se vislumbra nenhum critério como absoluto, a ponto de ser entender exata a ciência do Direito Ambiental. A discricionariedade administrativa a ser aplicada exige um certo grau de subjetivismo do agente, o qual, contudo, depende de uma vasta fundamentação, para não se tornar arbitrário.
4. Da penalidade de perdimento, como resultado necessário à apreensão de instrumentos e produtos da infração ambiental
Com o objetivo de orientar, minimamente, a autoridade julgadora na aplicação da penalidade de perdimento do bem apreendido, não se entende possível pré definir, sem que a lei o tenha feito, casos em que a penalidade poderá deixar de ser imposta. Tal análise deverá ser desenvolvida em cada caso concreto, a depender das circunstâncias envolvidas, que são diversas e variáveis.
Assim, parece mais apropriado analisar situações que, se configuradas, determinarão, quase que necessariamente, a aplicação da penalidade de perdimento pela autoridade julgadora, não se vislumbrando, nesses casos, possibilidade de devolução do bem ao infrator.
Antes de se adentrar em circunstâncias concretas, convêm distinguir os produtos da infração dos seus instrumentos, estes englobando veículos de qualquer espécie e/ou petrechos, utensílios ou objetos, em geral, determinantes para a prática e configuração da infração ambiental.
Os produtos e subprodutos da fauna ou flora resultantes da infração ambiental devem ser tidos como bens ilícitos, pois, em razão das condições ambientalmente adversas que determinaram a sua produção, não há que se admitir que sejam produtos com absoluto status de legalidade.
Os produtos e/ou subprodutos resultantes da prática da infração ambiental não podem entrar no mercado de consumo como se bens lícitos fossem, motivo pelo qual a sua utilização pelo próprio infrator há de ser vedada, sendo que solução contrária resultaria em uma premiação àquele que realizou atividade econômica em desacordo com as normas ambientais. Diante disso, em relação aos produtos da infração, inadmissível, em princípio, deixar de se aplicar a penalidade de perdimento dos bens apreendidos.
Os produtos ou subprodutos da infração ambiental são, portanto, bens ilícitos que, diferentemente de veículos e instrumentos que podem possuir outras finalidades lícitas, não devem ser utilizados pelo próprio infrator, o que justifica, nos casos em que confirmada a infração, o perdimento dos bens apreendidos (produtos do ilícito ambiental) de propriedade do infrator.
Quanto aos instrumentos utilizados na prática da infração, a situação é diferente, tendo em vista a condição, em geral, de licitude do bem. Assim, é possível que, a depender dos elementos de análise da autoridade julgadora, possa-se decidir, motivadamente, por sua devolução ao autuado. Trata-se de decisão discricionária, referente à aplicação de uma das penalidades administrativas legalmente previstas, e não de direito subjetivo do autuado.
Quer-se com isso dizer que o infrator não tem direito à devolução do instrumento lícito, mas, pelo contrário, deverá sofrer, em regra, a penalidade prevista e ser destituído do bem. Contudo, se as circunstâncias do caso forem todas favoráveis ao agente, a ponto de indicar uma desproporcionalidade entre o dano ambiental causado e a perda da propriedade utilizada, pode a autoridade decidir pela não aplicação da pena de perdimento.
É preciso destacar que o princípio da proporcionalidade indica a necessidade de relação direta entre a finalidade que se pretende alcançar e os meios a serem utilizados. Seguindo-se o raciocínio, deve-se considerar que os princípios da precaução e da prevenção em matéria ambiental legitimam a aplicação da penalidade de perdimento, quando há riscos concretos de utilização do bem em outras infrações. Assim, na defesa do meio ambiente, não deve a autoridade julgadora permitir que o bem utilizado para cometimento da infração volte às mãos do infrator, se há elementos concretos ou mesmo indícios de que o mesmo continuará sendo indevidamente utilizado.
A defesa do meio ambiente, portanto, legitima que a propriedade do infrator seja dele retirado, caso haja qualquer indicativo de possibilidade de repetição do uso indevido. Um bom elemento, nesse sentido, a indicar a necessidade do perdimento, existirá quando o mesmo bem já tiver sido utilizado como instrumento de infração ambiental, ou seja, quando se estiver diante de reincidência. Nesse sentido, a doutrina ambiental é uníssona:
Outra hipótese, no nosso entendimento, é determinante para a aplicação da sanção de perdimento do instrumento utilizado na prática da infração sem maiores questionamentos – a contumácia. Se o mesmo veículo é apreendido diversas vezes na prática do transporte de produtos de origem ilícita, caracteriza-se a sua utilização preponderante para a prática de atividades ilícitas. Na mesma linha, se uma mesma embarcação é apreendida várias vezes por utilização em pesca ilegal ou mesmo transporte irregular de produtos ou subprodutos naturais, caracteriza-se sua utilização prevalente para atividades ilícitas.
Nesses casos entendemos ser inquestionável a possibilidade de aplicação de pena de perdimento, em nome do princípio da precaução, pois a devolução do veículo ou da embarcação certamente resultará em novas infrações[9].
Insta salientar, nesse aspecto, que a análise da proporcionalidade não deverá ter nenhuma relação com o valor da multa ambiental praticada ou com o valor de mercado do bem transportado, mas poderá ser sopesada com o prejuízo ambiental potencialmente causado ou com o dano efetivo resultante da infração. Ou seja, é incompatível com a defesa do meio ambiente uma análise simplista de valoração econômica dos bens envolvidos. Nesse sentido, destaca o respeitado Cur Trennepohl:
Outro aspecto importante a ser observado diz respeito à proporcionalidade da sanção. É argumento corriqueiro das peças de defesa que o valor de um veículo é muitas vezes superior ao valor da multa aplicada ou mesmo do valor comercial do produto transportado. Isto representa reduzir o recurso natural a um mero componente duma relação custo versus benefício. Evidentemente que uma árvore, para o meio ambiente, tem um valor diferente de uma dúzia de tábuas, assim como o valor da multa administrativa não representa a importância da mesma árvore para o equilíbrio ambiental[10].
Assim, a proporcionalidade deve ser muito bem analisada pelo agente, para que não seja arbitrariamente aplicada, a ponto de se deixar de penalizar devidamente o infrator ambiental e de se resumir a defesa do meio ambiente à proteção patrimonial e/ou econômica dos bens envolvidos.
Situação bastante grave, que também deve orientar a necessária aplicação da penalidade de perdimento do produto ou instrumento da infração, existe quando configurada a evidente má-fé do infrator. Entende-se caracterizada tal intenção, nos casos em que o condutor tenta burlar a fiscalização, seja adulterando documentos, ou modificando rotas de viajem, seja alterando os bens, nas suas características físicas, visando facilitar a ação delituosa, como, por exemplo, a colocação de fundos falsos em veículos ou embarcações.
Configurando-se situações de tal gravidade, não se pode aceitar que o instrumento ou veículo utilizado na infração, diante dessas circunstâncias, seja devolvido ao infrator. Inclusive, sobre o uso de instrumentos ilícitos, destaca-se que a Instrução Normativa Ibama nº 28/09 prevê expressamente a impossibilidade de devolução de tais bens, mesmo nas situações em que a infração não for confirmada ou reste prescrita:
Art. 8º.
(...)
§ 5º Reconhecida a prescrição da infração ambiental, o respectivo bem apreendido, se de origem, posse ou utilização lícita, será restituído, revogando-se o respectivo termo de depósito no caso de ter sido concedido ao agente infrator.
§ 6º Independentemente da manutenção ou não do auto de infração pela autoridade julgadora, não serão devolvidos bens apreendidos de origem, posse ou utilização ilícita.
Vê-se, assim, que os bens ilícitos não podem ser devolvidos, ainda que a infração não reste mantida pela autoridade julgadora. Com muito mais razão, portanto, não há que se admitir a devolução nos casos em que o auto de infração for confirmado e o bem apreendido for de posse, origem ou utilização ilícita.
Ainda no que tange aos instrumentos da infração, entende-se pertinente tecer breves considerações sobre a situação, atualmente corriqueira, de realização de atividades agro-pastoril em áreas anteriormente embargadas pelos órgãos ambientais. Nesses casos, em que se cria animais domésticos ou se exerce agricultura, em áreas embargadas, tem-se que os animais ou produtos da atividade agrícola constituem verdadeiros instrumentos da infração ambiental, na medida em que impedem a regeneração natural da área ambientalmente protegida. Nesses casos, mesmo se tratado de instrumentos, será difícil admitir a restituição dos bens apreendidos ao infrator, pois a condição prévia de embargo da área e a presunção ou certeza de ciência dessa situação pelo infrator caracterizam, em geral, a má-fé do responsável ou a sua vontade deliberada de degradar o meio ambiente. Na realidade, o simples fato de existir embargo anterior na área indevidamente utilizada para atividades agro-pastoris já configura a reincidência do autuado em descumprir as normas ambientais, motivo pelo qual difícil será motivar uma decisão pelo não perdimento dos bens apreendidos.
Ademais, em se tratando de animais domésticos e exóticos apreendidos pelos órgãos ambientais, há mais um fator a justificar a decisão de perdimento dos bens apreendidos e a impossibilitar sua restituição ao infrator. É que, exceto no caso de animais encontrados em unidades de conservação de proteção integral, os donos dos animais serão notificados, antes da apreensão dos bens pelo órgão ambiental, para retirarem os animais da área protegida. Assim, caso a apreensão administrativa chegue a se concretizar, é porque o infrator resistiu, mais uma vez, em cumprir as normas ambientais e em regularizar a situação degradadora, mantendo os animais em áreas indevidas. O assunto é objeto do Decreto nº 6.514/08, o qual estabelece:
Art. 103. Os animais domésticos e exóticos serão apreendidos quando:
I - forem encontrados no interior de unidade de conservação de proteção integral; ou
II - forem encontrados em área de preservação permanente ou quando impedirem a regeneração natural de vegetação em área cujo corte não tenha sido autorizado, desde que, em todos os casos, tenha havido prévio embargo.
§ 1º Na hipótese prevista no inciso II, os proprietários deverão ser previamente notificados para que promovam a remoção dos animais do local no prazo assinalado pela autoridade competente.
§ 2º Não será adotado o procedimento previsto no § 1º quando não for possível identificar o proprietário dos animais apreendidos, seu preposto ou representante.
§ 3º O disposto no caput não será aplicado quando a atividade tenha sido caracterizada como de baixo impacto e previamente autorizada, quando couber, nos termos da legislação em vigor. (Incluído pelo Decreto nº 6.686, de 2008).
Grifos nossos
Diante de tal previsão, há ainda mais razão para se concluir pela necessidade de se dar perdimento aos bens apreendidos, nessa situação, tendo em vista que a contumácia do infrator em desrespeitar as normas ambientais parece retirar da autoridade julgadora qualquer tentativa de motivar decisão favorável, no que tange à pretensa devolução de animais apreendidos em áreas embargadas.
Considerações finais
Não há dúvida acerca da legalidade da penalidade administrativa de perdimento dos instrumentos e produtos de infração ambiental. Há, contudo, casos e circunstâncias que devem orientar a autoridade julgadora na decisão motivada de devolução dos bens apreendidos ao seu proprietário, seja por se tratar de terceiro de boa fé, seja porque os princípios da proporcionalidade e razoabilidade justificam a aplicação de outras sanções que não a expropriação do bem objeto de apreensão.
Contudo, a penalidade de perdimento há de ser necessariamente imposta ao autuado no que tange aos produtos ou subprodutos da infração ambiental, que, pela condição em que foram originados, devem ser tidos por ilícitos. Em relação a instrumentos e veículos utilizados no cometimento da infração, não haverá espaço para a sua devolução, nos casos de ilicitude do bem, reincidência e configuração de má-fé do infrator.
Todas as circunstâncias envolvidas no caso concreto, contudo, devem ser analisadas pelo órgão ambiental, para evitar injustiças e garantir o cumprimento da finalidade da norma. O fato é que nenhum critério pode ser interpretado como absoluto, tornando exata uma ciência do Direito, que na sua essência requer análise e ponderações do agente. Assim, a discricionariedade administrativa a ser aplicada garante à autoridade sancionadora competente certo subjetivismo, o qual, contudo, depende de vasta motivação, para não se tornar arbitrário.
Referências
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 15 ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2006.
DELMANTO, Roberto. Leis penais especiais comentadas. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.
FREITAS, Vlademir Passos de; FREITAS, Gilberto Passos de. Crimes contra a natureza. 8. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.
MELO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2004.
MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 7 ed. ver., atual. e reform. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.
TRENNEPOHL, Curt. Infrações contra o meio ambiente: multas, sanções e processo administrativo – comentários ao Decreto nº 6.514, de 22.07.2008. Belo Horizonte: Fórum, 2009.
VULCANIS, Andréa. Aspectos jurídicos relativos a pena de apreensão. Fórum de Direito Urbano e Ambiental, 2002.
Notas
[1] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 15 ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2006. p. 72.
[2] TRENNEPOHL, Curt. Infrações contra o meio ambiente: multas, sanções e processo administrativo – comentários ao Decreto nº 6.514, de 22.07.2008. Belo Horizonte: Fórum, 2009. p. 441.
[3] MELO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 361.
[4] MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 7 ed. ver., atual. e reform. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 1180.
[5] DELMANTO, Roberto. Leis penais especiais comentadas. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. pp. 420/421.
[6] FREITAS, Vlademir Passos de; FREITAS, Gilberto Passos de. Crimes contra a natureza. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 100.
[7] VULCANIS, Andréa. Aspectos jurídicos relativos a pena de apreensão. Fórum de Direito Urbano e Ambiental, 2002. pp. 337/343.
[8][8] STJ, ROMS 15870/GO. Rel. Min. José Delgado. DJ. 17 nov. 2003.
[9] TRENNEPOHL, Curt. Ob. Cit. pp. 445/446.
[10] TRENNEPOHL, Curt. Ob. Cit. p. 446.