6. CONCLUSÃO
Os direitos fundamentais sociais foram se formando e se consolidando ao longo da história a duras penas, tendo custado o suor, o sangue e a vida de muitos. Abrir mão dos mesmos, seja de apenas um deles, é abrir caminho para que outros venham a ser tolhidos.
Se nossos poderes Executivo e Legislativo, por nós eleitos e a quem caberia bem representar-nos, avançam contra eles, em total desrespeito aos princípios da máxima efetividade da constituição, da igualdade, da proibição do retrocesso e, em ultima ratio, ao da dignidade da pessoa humana, em prol de si mesmos e de uma modelo econômico internacional, também contra nós avançam, avançam contra nossa soberania, cabendo a nós, por meio das vias democráticas, nos insurgirmos contra tal menoscabo. E uma dessas vias (a outra seria uma melhor e maior participação política) é o Judiciário, mormente nossa Suprema Corte.
E cremos que o STF deva orientar-se no sentido de que a busca por uma afirmação dentro do cenário econômico internacional e as referidas emendas constitucionais não devem desnaturar a dimensão social do nosso Estado, como colocado na Magna Carta de 1988.
Isto porque, permanecem vigentes os fundamentos que o norteiam, impressos em seu art. 1º e incisos (soberania, cidadania, dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho), os direitos sociais fundamentais e os correspondentes deveres que o Estado tem de implementá-los e protege-los mediante políticas públicas proativas de modo a garantir a satisfação do núcleo essencial dos mesmos, este sim, erigido ao status de cláusulas pétreas.
Portanto, há de se se resolver a pretensa antinomia entre a norma que prevê o subsídio como parcela única e a que garante e resguarda o direito à percepção do adicional noturno, considerando:
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Os fundamentos de nosso Estado democrático de Direito: soberania, cidadania, dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho.
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A essência fundamental do adicional noturno como direito a uma contraprestação por um trabalho mais penoso (trabalho noturno este do qual a sociedade atual não pode prescindir) e que assiste tão-somente ao servidor nesta condição. Aí seu núcleo essencial, devendo ser considerado, nesta medida, cláusula intangível;
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A máxima efetividade do texto constitucional, com a otimização de seu texto sem alterar seu conteúdo, primando pela densificação dos direitos fundamentais, ai aplicando os princípios da dignidade da pessoa humana e da isonomia, notadamente em seu caráter material;
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A harmonização entre ambos os bens constitucionalmente previstos, aplicando o princípio da proporcionalidade, entendo que o adicional noturno não se confunde com outros adicionais e gratificações que, por se revestirem de generalidade (que, por isso são, em verdade, aumentos travestidos vantagens pecuniárias), devem ser extirpados, em respeito à norma constitucional do subsídio.
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A inconstitucionalidade de interpretação diversa e da lei infraconstitucional na parte que afirma ser o adicional noturno incompatível com o subsídio.
Só assim conseguiremos fechar as portas para eventuais outras agressões que possam assolar nossos direitos sociais. Só assim poderemos dizer que vivemos um verdadeiro Estado democrático de Direito, fazendo valer a simples e eficaz ideia de Justiça e Direito, há séculos gravada nos textos do velho Direito Romano: “Justitia est constans et perpetua voluntas jus suum cuique tribuendi” 1.
7. BIBLIOGRAFIA
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Notas
1 “Justiça é a constante e perpétua vontade de dar a cada um o que lhe é de direito”. Frase atribuída a Ulpiano, jurisconsulto romano, que consta no Digesto (533 d.C), uma das partes do Corpus Juris Civilis ou “Código Justinianeu”, surgido em Constantinopla, por iniciativa do imperador Justiniano I, no Império Romano do Oriente, que reuniu, em um único código, um dos maiores legados de Roma: o Direito Romano (Instituições de Justiniano, Livro I, Tít. I, n. 1, 1979 apud NADER, 1995; MARTINS, 2012).