2. GESTÃO, PROBLEMAS E GESTORES
O surgimento do que entendemos atualmente por gestão remonta à revolução industrial, onde se buscaram soluções para situações até então inexistentes, partindo normalmente como qualquer ramo do conhecimento, do empréstimo de conhecimento de outras ciências, que quando estudadas em conjunto, com o acrescimento da experiência específica, deram origem a ciência da administração (ciência humana considerando que trata sempre da ação de pessoas em grupo), ou gestão. Vejamos o que disse MAXIMIANO:
Com a expansão da atividade industrial e o crescimento no número e no tamanho das organizações, surgiu a necessidade de administrá-las com sucesso. Alguns autores perceberam essa necessidade e trabalharam no sentido de desenvolver uma teoria da administração geral. Essa teoria deveria enfatizar os aspectos mais importantes na administração global de uma grande empresa e ao mesmo tempo orientar o trabalho dos executivos de primeiro nível e dos gerentes intermediários. Foi esse esforço que resultou na definição da administração que é estudada na atualidade. Nessa definição, administrar é um processo de tomar decisões de planejamento, organização e assim por diante, conforme visto no capítulo anterior. (MAXIMIANO, 2010, p. 36).
Considerando se tratar de uma ciência, a gestão aplica-se a diversas áreas do conhecimento, “com as profissões, ocorre o mesmo. Pesquisadores, engenheiros, médicos, advogados e outros profissionais realizam atividades que exigem habilidades de planejamento, organização, controle e trabalho em equipe, o conteúdo administrativo no trabalho desses profissionais justifica o estudo da administração” (MAXIMIANO, 2010, p. 9), devendo ser aplicada também a Investigação Criminal, considerando a mesma se tratar de um processo complexo envolvendo pessoas com um objetivo específico a ser atingido.
Quando falamos em gestão, também podemos dizer administração, ou mesmo gerenciamento e a mesma existe onde houver algo (empresa, instituição, entidades em geral etc.) ou alguém a ser gerido. A gestão, em linhas gerais, tem a função de organizar e direcionar forças à melhor solução de problema, seja em instituições públicas ou privadas, variando apenas em seus objetivos específicos. Conforme MAXIMIAMO (2010, p.8), “Administração é uma palavra que exprime uma ideia antiga: tomar decisões que promovam o uso adequado de recursos, para realizar objetivos.” e envolve “cinco processos principais interligados: planejamento, organização (e outros processos da gestão de pessoas), execução e controle”,
Gerir o CICLO DO ESFORÇO INVESTIGATIVO, por exemplo, seria exatamente planejar e organizar o esforço a ser desenvolvido pelos atores envolvidos em cada etapa ali proposta (execução), visando ao final o seu objetivo específico, que seria a solução de um fato criminoso, ou trazendo autoria e materialidade ou descartando a existência de crime. Acerca destas etapas, disse MAXIMIANO:
Planejamento. O processo de planejamento é a ferramenta para administrar as relações com o futuro. As decisões que procuram, de alguma forma, influenciar o futuro, ou que serão colocadas em prática no futuro, são decisões de planejamento.
Organização. Organização é o processo de dispor os recursos em uma estrutura que facilite a realização dos objetivos. O processo de organizar consiste no ordenamento dos recursos, ou na divisão de um conjunto de recursos em partes coordenadas, segundo algum critério ou princípio de classificação. O resultado desse processo chama-se estrutura organizacional.
[...]
Execução. O processo de execução consiste em realizar atividades planejadas, por meio da aplicação de energia física e intelectual. (MAXIMIANO, 2010, p. 8-9).
Não há como falar de gestão sem falar do gestor, o profissional que deve através dos seus conhecimentos (de sua ciência administrativa) fazer com que outros sob sua gerência se tornem melhores, mais eficazes em seus trabalhos do que seriam sem a existência daquele.
O gestor tem papel preponderante na solução de qualquer problema ou melhoria necessária, podendo partir desde a fixação das metas a serem atingidas e sempre controlando o processo visando a melhor maneira da conquista dos objetivos planejados, e para isso não basta apenas que o gestor se porte como um dirigente, mas sim como um líder, e continuando as lições ora expostas, MAXIMIANO ensina:
O processo de controle procura assegurar a realização de objetivos. Controlar é a função que consiste em comparar as atividades realizadas com as atividades planejadas, para possibilitar a realização dos objetivos. (MAXIMIANO, 2010, p. 9).
Em princípio todos podem gerenciar algo, mais existem vários níveis de gerenciamento, desde aqueles relacionados aos afazeres de nossas residências até as tomadas de decisões dos dirigentes das maiores Organizações e Países existentes. O tema tem bastante relevância em todos os meios onde possam existir decisões a serem tomadas, como é o caso da Organização Para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, que prescreveu em obra própria:
“Liderança” e “Direção” são frequentemente utilizadas indistintamente. Na prática, os dois conceitos sobrepõem-se, compartilham diversos pontos comuns, visto que ambos repousam sobre estruturas e sistemas institucionais, e ambos orientam-se em direção a um melhor desempenho da organização. No entanto, existe de fato uma diferença de ênfase entre os dois conceitos. Segundo Jo Brosnaham, a liderança pressupõe maior atenção ao desenvolvimento de atributos que têm em relação com a integralidade, a visão, a capacidade de inspirar os outros, a consciência de si, a coragem para inovar e a capacidade de discernimento. Enquanto a ênfase da direção recai sobre sistemas, processos e incentivos formais, a liderança remete em geral a influência informal – saber mobilizar as pessoas por meio de valores e visões. (Organização Para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico - OCDE, 2002, p. 21/22).
O gestor tem papel preponderante na solução de qualquer problema ou melhoria necessária e por isso precisa fazer com que todos aqueles que desempenham funções na busca dos objetivos pretendidos estejam engajados no processo, não somente por razões formais (como por exemplo, um agente público que cumpre ordens de um superior hierárquico somente por ser concursado, porém não tem interesse real na solução de um determinado problema), mas por acreditarem e terem a consciência no procedimento e na importância (especialmente social) dos resultados buscados.
2.1. Gestão na iniciativa privada X Gestão no serviço público
É sabido que a iniciativa privada adota padrões de excelência com o aumento de produtividade, por meio da aplicação de modelos de gestão os quais vêm variando de acordo com as mudanças sociais, uma vez que, quase sempre o principal destinatário de qualquer produto, seja público ou privado, é a sociedade.
O tema vem sendo debatido, e o esforço em melhorar os processos de gerenciamento público vem sendo feitos e discutidos, muitas vezes pelos próprios servidores públicos que são envolvidos em processos gerenciais. Essa discussão pode ser vista no artigo “GESTÃO DE PESSOAS NO SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL: o caso do núcleo de documentação da Universidade Federal Fluminense” apresentado no XIII Seminário Nacional de Bibliotecas Universitárias – SNBU, de autoria de Marcos Vinícius Mendonça Andrade e Ana Rosa dos Santos:
Os avanços observados nas últimas décadas têm levado as organizações – sejam elas públicas ou privadas – a buscarem novas formas de gestão com o intuito de melhorar o desempenho, alcançar resultados e atingir a missão institucional para o pleno atendimento das necessidades dos clientes.
Nota-se que o sucesso das organizações modernas depende, e muito, do investimento nas pessoas, com a identificação, aproveitamento e desenvolvimento do capital intelectual.
No Serviço Público Federal estas observações não se diferenciam muito. A partir da década de 90, com as profundas mudanças nos cenários nacional e internacional, o Estado teve a necessidade urgente de buscar novos paradigmas para a Administração Pública Federal.
Observa-se que existe um grande esforço no sentido de mudar do antigo modelo burocrático para um modelo de gestão gerencial que em muitos casos grandes avanços aconteceram, como por exemplo, a introdução de novas técnicas orçamentárias, descentralização administrativa de alguns setores, redução de hierarquias, implementação de instrumentos de avaliação de desempenho organizacional.
Entretanto, algumas questões cruciais permanecem pendentes e precisam ser enfrentadas. Um dos caminhos que poderão ser percorridos é o aprimoramento da gestão de pessoas, tendo como premissas a valorização do capital intelectual e a modernização do processo produtivo.
A ênfase nessas duas estratégias passa necessariamente pelo investimento em inovações tecnológicas, sobretudo em Tecnologia da Informação, e na definição de um novo perfil para os servidores públicos. Perfil este que deve encarar o cidadão brasileiro, como cliente. “Reconhecer a importância de se incentivar, informar e educar o cidadão para o exercício de sua cidadania é essencial para a melhoria da qualidade dos serviços públicos”. (PQSP, 2004). (ANDRADE; SANTOS, 2004).
De outro lado, o serviço público não tem a eficiência própria da iniciativa privada, mas tem mecanismos de cobrança e disciplinamento muitas vezes mais atuantes, o que deixa o servidor público, que não tem a preparação para uma gestão de excelência, refém de seu próprio trabalho. Além da existente de poderes de cobrança de resultados próprio do serviço público, muitas vezes o servidor está sujeito à análise de seus procedimento por profissionais que não detém a preparação específica para tanto, o que deixa ainda mais sensível a atuação no serviço público, principalmente quando se pretende inovar sem a preparação correta. Sobre a disciplina pública, DEZAN, no artigo “A aplicação da sanção administrativa disciplinar. Relação entre a vinculação deôntica, a razoabilidade e a proporcionalidade das medidas punitivas” disse:
A aplicação da sanção disciplinar constitui exercício do jus puniendi estatal, referente ao controle da disciplina interna do serviço público, consubstanciando-se em concreção do direito subjetivo de, após constatada a infração, a sua responsabilidade e o quantum incidente (dosimetria da sanção), elaborar o ato administrativo que lhe dê efeitos jurídicos.
O tema em comento está afeto ao princípio da legalidade que vincula a Administração Pública. A exemplo do instituto ora tratado (dosimetria da sanção disciplinar), em muitos outros casos específicos o aplicador do Direito depara-se com a ausência de margem discricionária para o seu agir, ante a analítica descrição pela norma (i) do ato a ser produzido (ii) ou do procedimento a ser adotado, para a persecução da finalidade pública.
Porém o dever de dosar a sanção administrativa a ser aplicada parece ser fonte de equívocos, onde a Administração, no exercício de seu poder disciplinar, não tem dispensado a correta interpretação normativa, infringindo, destarte, o referido princípio da legalidade, ao passo que livremente efetiva a comutação de sanções, sem a previsão expressa de lei nesse sentido, sob o pretexto de assim se levar a efeito a dosagem da penalidade ao caso concreto, com fundamento nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
Não obstante, a autoridade julgadora do processo administrativo disciplinar não se deve esquecer de que operacionaliza (interpreta e aplica) institutos jurídicos postos, em tese, validamente no direito positivo, constituindo-se linguagem técnica, em forma de proposições que, implicadas a conseqüências jurídicas, formam a norma jurídica, in casu, de imposições afirmativas ou negativas de direito sancionador. (DEZAN, 2011, p. 1)
O que deseja a sociedade é a eficiência dos serviços e para alcançar tal finalidade, é necessário que o setor público se alinhe com a evolução do setor privado, tanto no que tange as próprias estruturas institucionais quanto na preparação das pessoas que compõem os seus quadros. Pode ser citada a criação do Programa Nacional de Gestão Pública e Desburocratização – GesPública 10 pelo Governo Federal como um marco público no Brasil rumo a implantação, ou pelo menos a busca de uma gestão de excelência.
Nessa esteira, mais especificamente relacionado à gestão na área de segurança pública, o Departamento de Polícia Federal vem buscando implementar em suas áreas administrativas uma gestão mais atual de seus processos, o que pode ser visto no artigo A Implementação de um processo de “Gestão por Processos” na Polícia Federal Brasileira [selecionado para fazer constar no BPM Cases Studies 2010 – reconhecida publicação internacional que consolidou importantes aplicações de gestão por processos no mundo ao longo do ano de 2010]:
A Polícia Federal entende que deve cumprir seu propósito provendo excelência nos serviços que presta à sociedade, agindo com esforço, perseverança e determinação para adaptar a instituição às políticas macroeconômicas do governo. Recentemente, o desenvolvimento da globalização e da tecnologia tornou o perfil dos cidadãos mais exigente, e a PF deve estar preparada para assisti-lo.
Porém, sem os recursos adequados para cumprir seus objetivos, uma instituição pública fica vulnerável à exposição a todos os tipos de ameaças. Desta forma, é essencial desenvolver um Plano de Gestão Estratégica evolutivo e flexível, maximizando os recursos disponíveis de modo a serem efetivos. Este Plano de Gestão Estratégica vai manter a instituição permanentemente alinhada com o posicionamento do governo.
Adicionalmente, é importante criar uma estrutura moderna de gestão e de avaliação de performance. Esforços e recursos devem ser convergidos para a análise e a exploração de cenários, monitoramento do ambiente externo, execução de projetos de redesenho de processos e de estratégia. Novos métodos, critérios e normas para gestão devem ser atualizados e implementados.
Desta forma, a PF começou nos últimos anos um intenso processo de modernização dos processos de gestão, que foi intensificado em setembro de 2007, quando a administração estava sob responsabilidade do delegado Luiz Fernando Correa e sua equipe. Desde então, os esforços da Administração da PF tem aumentado para melhorar sua capacidade gerencial. (SIMÃO et. al., 2010)
Assim, é absolutamente necessário discutir o modelo de gestão da Investigação Criminal, visando procurar respostas sobre a possível aplicabilidade de modelos de gestão mais atuais, tais como o CICLO DO ESFORÇO INVESTIGATIVO já comentado, tendo em vista o mesmo acompanhar as tendências da evolução do gerenciamento e se adequar a necessidade do objeto específico com que se trabalha na Investigação Criminal.