6. A QUESTÃO DA LITISPENDÊNCIA DIANTE DAS AÇÕES COLETIVAS
Vicente Grecco Filho47 ensina que
A listispendência é a situação que é gerada pela instauração da relação processual (v. art. 219, efeito da citação), produzindo o efeito negativo de impedir a instauração de processo com ação idêntica (mesmas partes, mesmo pedido, mesma causa de pedir). Se instaurado, o segundo deve ser extinto, salvo se, por qualquer razão, o primeiro for antes extinto sem julgamento do mérito também.
Nesse contexto, não resta dúvida de que a propositura de duas ações com mesmas partes, mesma causa de pedir e mesmos pedidos, como regra geral, implicará a extinção sem resolução do mérito da segunda ação.
Wânia Guimarães Rabêllo de Almeida48 apresenta pertinente questionamento: “Estando em curso uma ação individual e uma ação coletiva, tendo ambas como objeto a tutela de interesses ou direitos difusos ou coletivos, estará configurada a litispendência?” E responde:
A resposta a esta questão é fornecida pelo art. 104. do CDC, in verbis: “As ações coletivas, previstas nos incisos I e II do parágrafo único do art. 81, não induzem litispendência para as ações individuais”.
Assim, as ações coletivas em defesa de interesses e direitos difusos ou coletivos não induzem litispendência para as ações individuais.
Contudo, os efeitos da decisão proferida na ação coletiva somente alcançarão os titulares das ações individuais que requererem a sua suspensão no prazo de trinta dias contado da ciência do ajuizamento da ação coletiva, como dispões a parte final do art. 104. do CDC.
Com isto, tomando ciência da ação coletiva, o autor da ação individual poderá:
A) insistir no julgamento do pedido apresentado na ação individual, situação em que será beneficiado pela decisão proferida na ação coletiva;
-
B) requerer a suspensão do processo49 relativo à ação individual até o julgamento final da ação coletiva. Nessa hipótese, o autor da ação individual será beneficiado pela decisão de procedência proferida na ação coletiva. Se o pedido apresentado na ação coletiva for jugado improcedente, o processo atinente à ação individual prosseguirá o seu trâmite normal.
Portanto, o instituto da litispendência sofre, ainda que em sede de processo do trabalho, influência do Código de Defesa do Consumidor. Paradoxalmente, algumas decisões judiciais afastam a aplicação do mencionado dispositivo legal e reconhecem a existência de litispendência.
7. A TUTELA INIBITÓRIA PREVENTIVA
O congestionamento do Judiciário Trabalhista também pode ser reduzido com a utilização da tutela inibitória preventiva. Trata-se de ação que possui como fundamento o inciso XXXV, do art. 5º da CF: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.” A lesão é rotineiramente objeto de apreciação pelo Judiciário. Porém, ações com alegação de ameaça ainda são pouco levadas aos tribunais trabalhistas.
Andréa Aparecida Lopes Cançado50 apresenta sintético conceito da tutela em exame: “Trata-se a ação inibitória de uma tutela de cognição exauriente, voltada para o futuro, para a prevenção da prática, da continuação ou da repetição do ilícito e não propriamente contra o dano, como ocorre com a tradicional tutela ressarcitória.”
Luiz Guilherme Marinoni51 bem observa que a tutela antecipatória encontra amparo legal nos artigos 461 do CPD e 84 do CDC, e observa que a redação de ambos os artigos é bem semelhante. E continua:
Porém, a identidade entre tais normas é apenas aparente, pois suas funções são distintas. O art. 84. do CDC foi instituído para servir às relações de consumo e à tutela de quaisquer direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos. É certo que, em uma análise mais rápida, alguém poderia supor que essa norma, por estar inserida no CDC, apenas poderia tratar dos direitos do consumidor. Acontece que, para a tutela dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, há um sistema processual próprio, composto pela Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.347/85) e pelo Título III do CDC. Como diz o art. 90. do CDC, às ações fundadas no CDC se aplicam as normas da Lei da Ação Civil Pública. Por outro lado, complementa o art. 21. da Lei d a Ação Civil Pública que as disposições processuais que estão no CDC são aplicáveis à tutela dos direitos que nela estão previstos.
Essa interligação entre a Lei da Ação Civil Pública e o CDC faz surgir,como já dito, um sistema processual para a tutela dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos. Como o art. 84. está inserido no Título III do CDC, e assim dentro desse sistema processual, ele se aplica à tutela de quaisquer direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos. Nesse sentido, o art. 84. do CDC é a base processual para as ações coletivas inibitória e de remoção do ilícito.
Ainda que o art. 84. do CDC também tenha sido pensado para dar tutela aos direitos individuais do consumidor, o posterior surgimento do art. 461. do CPC, por ser capaz de dar tutela a qualquer espécie de direito individual, tornou desnecessária a invocação do art. 84. do CDC para a tutela dos direitos individuais do consumidor. Ou se a lembrança dessa norma ainda pode ser feita quando em jogo direitos individuais do consumidor, isso se deve à necessidade de relacionar as normas de direito material de proteção do consumidor com uma norma de caráter processual para ele especificamente criada.
De qualquer forma, se há no sistema de proteção aos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos uma norma (art. 84. do CDC) que serve para prestação das tutelas inibitória e de remoção do ilícito (entre outras tutelas), essa deve ser apontada como a base da ação coletiva, deixando-se o art. 461. do CPC como sustentáculo para as ações individuais.
Tanto o art. 84. do CDC, quanto o art. 461. do CPC, abrem oportunidade para o juiz ordenar sob pena de multa ou decretar medida de execução direta (por exemplo, a busca e apreensão), no curso do procedimento ou na sentença. Portanto, ainda que a tutela inibitória não tenha que se ligar necessariamente à ordem sob pena de multa, e a tutela de remoção do ilícito possa não se contentar apenas com medidas de execução direta, uma vez que ambas podem, consideradas as peculiaridades da situação concreta, exigir um ou outro desses mecanismos executivos, o certo é que tais normas possuem instrumentos adequados à prestação das tutelas inibitória e de remoção do ilícito aos direitos coletivos (lato sensu) e individuais. Assim, por exemplo, no caso de concorrência desleal, deverá ser invocado o art. 461. do CPC, mas na hipótese de direito ao meio ambiente o art. 84. do CDC.
Nesse ponto, cumpre observar que a tutela inibitória coletiva tem potencial para ofertar grande contribuição para o descongestionamento do Judiciário Trabalhista. Também é oportuno observar que a aplicação subsidiária desta tutela no processo do trabalho encontra autorização no art. 769. da CLT.
8. A AÇÃO CIVIL PÚBLICA
De forma sintética, no estudo do direito encontra-se uma polaridade entre o público e o privado. Contudo, modernamente, surgem novos direitos que não podem ser situados satisfatoriamente em um só dos referidos polos. Como exemplo, temos o direito do consumidor, o direito ambiental e os direitos trabalhistas de natureza metaindividuais, dentre outros.
Segundo Carlos Henrique Bezerra Leite52, no direito brasileiro, “este moderno sistema integrado de acesso à justiça é implementado por aplicação direta de normas jurídicas da CF (art. 5º, XXXV, 129, III) da LACP, do CDC (Título III) e, por aplicação subsidiária, das normas do CDC, desde que estas não sejam incompatíveis com aquelas.” E continua o doutrinador53:
Alguns processualistas apelidaram esse novo sistema de “jurisdição civil coletiva”, o que implica dizer que, atualmente, a “jurisdição civil” abrange dois sistemas: o da tutela jurisdicional individual, regido basicamente pelo CPC, e o da tutela jurisdicional coletiva (ou “jurisdição civil coletiva”), disciplinando, em linhas gerais, pelo sistema integrado de normas contidas na CF, na LACP, no CDC e, subsidiariamente, no CPC.
Com relação ao direito processual do trabalho, pode-se inferir que, com a promulgação da CF, de 1988, do CDC de 1990, e, mais tarde, da LOMP, de 1993, a “jurisdição trabalhista” passou a ser constituída de três sistemas:
-
a) o primeiro, que passaremos a chamar de jurisdição trabalhista individual, é destinado aos tradicionais “dissídios individuais” utilizados para solução das reclamações (rectius, ações) individuais ou plúrimas. Seu processamento é regulado pelo Título X, Capítulo III, da CLT e, subsidiariamente, pelo CPC, a teor do art. 769. consolidado;
b) o segundo, doravante denominado jurisdição trabalhista normativa, é voltado para os dissídios coletivos de interesses, nos quais se busca, por intermédio do Poder Normativo exercido originalmente pelos Tribunais do Trabalho (CF, art. 114, §2º), a criação de normas trabalhistas aplicáveis às partes figurantes do “dissídio coletivo” e seus representados. Seu processamento é regulado pelo Título X, Capítulo IV, da CLT e, subsidiariamente, o CPC, por força da regra contida no mencionado art. 796. do texto obreiro;
c) o terceiro e último sistema, aqui cognominado de jurisdição trabalhista metaindividual, é vocacionado, basicamente, à tutela preventiva e reparatória dos direitos ou interesses metaindividuais, que são os difusos, os coletivos e os individuais homogêneos.
O exercício da jurisdição trabalhista metaindividual é feito, basicamente, pela aplicação direta e simultânea de normas jurídicas da CF (arts. 129, III e IX; 8º, III e 114), da LOMPU (LC n. 75/93, artigos 83, III; 84, caput, e 6º, VII, a e b), da LACP (Lei n. 7.347/85) e pelo Título III do CDC (Lei n. 8.078/90), restando à CLT e ao CPC o papel de diplomas legais subsidiários.
O conceito de Ação Civil Pública é apresentado por Amarildo Carlos de Lima54, nos seguintes termos: “[...] é possível se afirmar que a Ação Civil Pública é aquela de titularidade definida em lei, cujo objeto tem por fim a responsabilização por danos ou ameaça de danos causados a Interesses Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos sociais relevantes.”
Sobre o mesmo conceito, Carlos Henrique Bezerra Leite55 apresenta o ensinamento que segue:
Com o escopo de oferecer modesta contribuição para o adequado estudo da matéria, parece-nos factível propor que a ação civil pública é o meio, constitucional assegurado ao Ministério Público, ao Estado ou a outros entes coletivos autorizados por lei, para promover a defesa judicial dos interesses ou direitos metaindividuais.
A legitimação ativa para a proposição da Ação Civil Pública consta do art. 5º da Lei n. 7.347/85, in verbis:
Art. 5º Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar: (Redação dada pela Lei nº 11.448, de 2007).
I - o Ministério Público; (Redação dada pela Lei nº 11.448, de 2007).
II - a Defensoria Pública; (Redação dada pela Lei nº 11.448, de 2007).
III - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; (Incluído pela Lei nº 11.448, de 2007).
IV - a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista; (Incluído pela Lei nº 11.448, de 2007).
V - a associação que, concomitantemente: (Incluído pela Lei nº 11.448, de 2007).
a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil; (Incluído pela Lei nº 11.448, de 2007).
b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. (Incluído pela Lei nº 11.448, de 2007).
§ 1º O Ministério Público, se não intervier no processo como parte, atuará obrigatoriamente como fiscal da lei.
§ 2º Fica facultado ao Poder Público e a outras associações legitimadas nos termos deste artigo habilitar-se como litisconsortes de qualquer das partes.
§ 3° Em caso de desistência infundada ou abandono da ação por associação legitimada, o Ministério Público ou outro legitimado assumirá a titularidade ativa. (Redação dada pela Lei nº 8.078, de 1990)
§ 4° O requisito da pré-constituição poderá ser dispensado pelo juiz, quando haja manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido. (Incluído pela Lei nª 8.078, de 11.9.1990)
§ 5° Admitir-se-á o litisconsórcio facultativo entre os Ministérios Públicos da União, do Distrito Federal e dos Estados na defesa dos interesses e direitos de que cuida esta lei. (Incluído pela Lei nª 8.078, de 11.9.1990) (Vide Mensagem de veto)(Vide REsp 222582 /MG - STJ)
§ 6° Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial. (Incluído pela Lei nª 8.078, de 11.9.1990) (Vide Mensagem de veto) (Vide REsp 222582 /MG - STJ).
O Ministro Ives Gandra Martins Filho56 apresenta relevante lição sobre a legitimidade concorrente do Ministério Público e dos Sindicatos:
A defesa dos interesses coletivos em juízo, através da ação civil pública, pode ser feita tanto pelo Ministério Público do Trabalho como pelos sindicatos, de vez que o ordenamento processual assegura a legitimidade concorrente de ambos (CF, art. 129, 1 Lei 7.347/85, art. 5, I e II). No entanto, o prisma pelo qual cada um encara a defesa dos interesses coletivos é distinto:
a) o sindicato defende os trabalhadores que a ordem jurídica protege (CF, art. 8, III); e
b) o Ministério Público defende a própria ordem jurídica protetora dos interesses coletivos dos trabalhadores (CF, art. 127).
Os sindicatos, entretanto, não podem instaurar inquérito prévio ao ajuizamento da ação, o que constitui prerrogativa apenas do Ministério Público (Lei 7.347/85, art. 8, 1 CF, art. 129, III; LC 75/93, art. 84, II) . Tal impossibilidade legal dificulta, para os sindicatos, o ajuizamento das ações públicas, na medida em que o procedimento prévio do inquérito é fundamental para a coleta de elementos de convicção para a instrução da ação civil pública.
A rigor, os sindicatos apenas teriam condições de ajuizar a ação civil públicacom sucesso nos casos em que a lesão patronal genérica aos direitos trabalhistas estivesse patente e devidamente documentada em relação a considerável número de empregados.
Na prática, o que tem ocorrido é os sindicatos oferecerem denúncia perante o Ministério Público do Trabalho, para que seja apurada a possível existência de lesão a direitos trabalhistas no âmbito de determinada empresa, de forma genérica. Dão, assim, cumprimento ao dispositivo legal que faculta a qualquer pessoa a possibilidade de provocar a iniciativa do Ministério Público nesse campo, ministrando-lhe informações sobre fatos que constituam objeto de ação civil pública (Lei 7.347, art. 6),
Por outro lado, a Constituição Federal de 1988, por meio do inciso III57 do art. 129, alargou o objeto da ação civil pública, inicialmente delineado pelos artigos 1º e 3º da LACP (Lei 7.347 de 24 de junho de 1985)58. Antes, por meio da ação civil pública, somente era possível o pedido de atribuição de responsabilidade a qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, por danos morais e patrimoniais causados ao meio ambiente, consumidor e aos demais enumerados nos incisos do art. 1º da LACP, tendo como objeto limitado a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, provimento jurisdicional de natureza condenatória (art. 3º da LACP). A CF foi além, pois permitiu não somente a reparação, mas também seu estágio anterior de prevenção, para a proteção dos direitos. Em outras palavras, a proteção passou a ser entendida em duas vertentes: a de reparação e a de prevenção59.
No âmbito justrabalhista, a ação civil pública é perfeitamente aplicável. “A única condição para a sua adequada utilização no processo do trabalho é que a matéria nela tratada tenha conteúdo trabalhista, pois somente assim poderá adequar-se à moldura do art. 114. da CF, que trata da competência da Justiça do Trabalho.” 60
Raimundo Simão de Melo61 nos apresenta relevantes observações sobre a ação civil pública em sede juslaborativa:
Sobre o objeto da Ação Civil Pública trabalhista e outras importantes questões, assim se manifestou Valdir Florindo:
“Convém destacar que o Ministério Público do Trabalho, fazendo uso de suas funções institucionais, pode propor a competente e moderníssima Ação Civil Pública (arts. 129, II CF e 83 caput e inciso III, da Lei Complementar n. 75/93), disciplinada pela Lei n. 7.347/85, pedindo a cessação da atividade nociva à saúde e à vida do trabalhador (art. 11), objetivando prevenir acidentes de trabalho. Pode, ainda, pedir liminarmente, a interdição de setores, obras, empresas, enfim, de todas as atividades que estejam em desacordo com as normas de segurança do trabalho, e com isso coloquem em risco seu meio ambiente (art. 12). A propositura desta Ação Civil Pública é, indiscutivelmente perante a Justiça do Trabalho, conforme dispositivos suso mencionados. Não seria demais dizer que a Ação Civil Pública não é exclusividade do Ministério Público (art. 129, § 1º, CF), podendo os sindicatos dela se utilizar (art. 5º, da Lei n. 7.347/85).”
É certo que os juízes do trabalho, em muitas regiões, já vêm apreendendo a grande importância para a sociedade e para a própria Justiça especializada da atuação do Ministério Público do Trabalho, por meio dos inquéritos civis e das Ações Civis Públicas, cujo exemplo marcante deu o juiz do trabalho, Samuel Hugo Lima, da 8ª Vara do Trabalho de Campinas, apreciando pedido liminar, em Ação Civil Pública, de interdição de obras de um edifício, que, após fazer constatação in locu, deferiu o pedido. Aquela empresa demandada, que há um ano vinha sendo instada administrativamente pelo Ministério do Trabalho a cumprir a lei, sem resultado positivo, em menos de um mês compareceu à audiência com laudo técnico comprovando ter implementado as normas de segurança do trabalho.
Contudo, na contramão da história, do desenvolvimento e aperfeiçoamento da função jurisdicional, há quem sustente ser até mesmo dispensável a utilização da Ação Civil Pública no campo do Direito do Trabalho, como o fez o então Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, Dárcio Guimarães Andrade, pelas seguintes razões, entre outras:
“Os trabalhadores têm ainda, a proteção da fiscalização de um órgão governamental, o Ministério do Trabalho, não necessitando da ação concorrente do Ministério Público do Trabalho. Já possuem sobre sua vontade individual três ordens de tutela em campos superpostos ou paralelos que são: as partes do contrato de trabalho, a cobertura sindical e a intervenção sancionadora do Ministério do Trabalho. Em área tão congestionada, dificilmente haverá lugar para uma ACP e a legitimação da Procuradoria do Trabalho... Na realidade, não tenho nenhuma simpatia pela aplicação da ACP no campo do Direito do Trabalho.”
Concluindo sua manifestação sobre a Ação Civil Pública trabalhista, defendeu referido articulista a então vigente Medida Provisória n. 1.984-23, do Governo Federal, que vedou a Ação Civil Pública para veicularpretensões que envolvam tributos, contribuições previdenciárias, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço ou outros fundos de natureza institucional cujos beneficiários podem ser individualmente determinados.”
A ação civil pública constitui significativo instrumento para colaborar com o descongestionamento do judiciário trabalhista. Do exemplo acima, nota-se que, com a atitude do juiz Samuel Hugo Lima, muito provavelmente um só processo (a ação civil pública) pacificou a situação dos trabalhadores daquela construção. Caso contrário, se cada trabalhador insatisfeito individualmente movesse sua ação, todos seriam dispensados e as Varas do Trabalho de Campinas estariam mais congestionadas.
De outro lado, infelizmente, ainda há exemplos que seguem “na contramão da história, do desenvolvimento e aperfeiçoamento da função jurisdicional.”
Raimundo Simão de Melo62 observa que:
Em juízo, é a Ação Civil Pública um dos mais importantes instrumentos de prevenção e defesa dos interesses difusos e coletivos da sociedade, razão porque, com o tempo, foi ampliada a legitimação para sua propositura.
Na seara trabalhista, não obstante os extraordinários resultados obtidos, ainda é tímida a sua utilização. Em regra, quem a utiliza mesmo é o Ministério Público do Trabalho.
Os sindicatos, mais legítimos representantes dos trabalhadores, na maioria, ainda não se convenceram da aplicação desse moderno instrumento processual coletivo, por razão, em parte, do tratamento que tem sido dado ao instituto por parte de alguns integrantes do Judiciário trabalhista, que chegam mesmo a negar a legitimidade a tais associações ou arguir falta de interesse processual.
Por sua vez, o ilustre Ministro e jurista do trabalho José Roberto Freire Pimenta, nos relembra do cuidado que os operadores do Direito devem ter com a implementação das normas-princípio, especialmente as que versam sobre direitos fundamentais sociais, muitas vezes destinados à tutela da vida e da subsistência do trabalhador. E completa:
Se tais direitos trabalhistas, rotineiramente objeto das numerosas e repetitivas reclamações trabalhistas individuais (descumpridos pelo mesmo empregador ou tomador de serviços e decorrentes de origem comum, configurando típico exemplo de direitos individuais homogêneos) possuem, na verdade, estatura e função constitucionais, devem, por isso mesmo, ser beneficiados por autêntico exemplo de uma tutela jurisdicional diferenciada pela via metaindividual e, ao mesmo tempo, contar com a eficácia e a proteção especiais que são atributo e exigência das normas constitucionais em geral, mesmo nas relações entre particulares (configurando sua concretização plena, específica e em tempo oportuno na esfera judicial, simultaneamente exigência e decorrência direta da denominada eficácia horizontal dos direitos fundamentais).63
Portanto, cumpre observar que a ação civil pública merece ser objeto de maior reflexão por todos envolvidos na solução das lides trabalhistas. Este estudo tem por objetivo defender a maior utilização do referido instituto, o qual, por sua vez, pode colaborar de forma expressiva para a redução de processos em tramitação, pois uma só ação civil pública equivalerá a inúmeras ações individuais.