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Exclusão da sucessão por ato de indignidade:

por um redimensionamento ético e hermenêutico do art. 1814, inciso I, do Código Civil

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CONCLUSÃO

Por tudo que foi exposto, fica evidente que a redação atual do art. 1814, inciso I, do Código Civil de 2002 ainda continua arraigada no revogado art. 1595, inciso I, do Código Civil de 1916, este com viés exclusivamente patrimonial, fazendo que a repetição no Código de 2002 ficasse completamente desconexa com a eticidade e nova ordem axiológica do sistema de Direito Privado.

Na interpretação de uma norma deve-se buscar qual valor é mais importante  e também, com maior influência na ordem jurídica vigorante.

Interpretar as regras do Código Civil com base em princípios éticos é contribuir para que a ideia de justiça aplicada concretamente torne-se realidade.

Para o grego Platão, a justiça é virtude suprema. Mestre Aristóteles a considerava sublime virtude moral. O romano Cícero denominou-a de senhora de todas as virtudes. O Novo Código Civil, ao determinar que a aplicação de suas normas siga, rigorosamente, os valores éticos, está contribuindo para que, como instrumento regulador dos fatos da vida individual e social do homem, sejam instaurados relacionamentos entre os cidadãos pautados na absoluta igualdade entre a prestação e a contraprestação entre o que se dá e o que se recebe; para que o mérito e a dignidade sejam valorizados; e que o direito privado abra caminhos para a realização do bem comum.

Os aspectos axiológicos estão plantados de modo comezinho no Código Civil de 2002, sobretudo a eticidade, de forma intensa e definitiva. Não podendo ser ignorada por aquele que almejar compreendê-la e aplicá-la a um caso concreto.

Portanto, infere-se que devem também ser incluídos como atos de indignidade, para fins sucessórios, as ações tipificadas pela lei penal como: i) homicídio culposo - art. 121, §3º; ii) induzimento, instigação ou auxílio a suicídio - art. 122; iii) infanticídio - art. 123.


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Notas

[1] Do latim: sem deixar testamento. Direito Civil. Diz-se da sucessão em que não há testamento e daquele que é herdeiro apenas por força de lei. (FERREIRA, 2010).

[2] Termo jurídico para: Pessoa falecida cuja sucessão está aberta aos herdeiros e legatários. (FERREIRA, 2010).

[3] Do latim: Pelo próprio direito, de acordo com o direito. (FERREIRA, 2010).

[4] Do latim: Desde então; com efeito retroativo. (FERREIRA, 2010).

[5] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:  XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido.

[6] Do latim: Nenhum delito do pai causa punição ao filho inocente. (KOCHER, 2014, on-line).

[7] Do latim: Número limitado. Uma cota definida. (KOCHER, 2014, online).

[8] Do latim interpretatio, do verbo interpretare que significa explicar, traduzir, comentar ou esclarecer. Na acepção jurídica corresponde a tradução do sentido ou do pensamento que seja contido em lei, na decisão judicial, no ato ou contrato. (LEITE, 2012).

[9] Do grego: que tem boa sorte; feliz. Doutrina que admite ser a felicidade individual ou coletiva o fundamento da conduta humana moral, i. e., que são moralmente boas as condutas que levam à felicidade. (FERREIRA, 2010).

[10] Estudo dos juízos de apreciação referentes à conduta humana suscetível de qualificação do ponto de vista do bem e do mal, seja relativamente a determinada sociedade, seja de modo absoluto. (FERREIRA, 2010).

[11] Do latim: Pacto de corvo. Sobre o qual dispõe o art. 426 do Código Civil de 2002: Não pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva.

[12] Artigo 463 - Os casos de indignidade

É excluído da sucessão como indigno :

l) que voluntariamente matou ou tentou matar a pessoa cuja herança está em causa , ou o cônjuge ou um descendente ou um ascendente do mesmo, desde que não cumprida por qualquer causa que exclua a responsabilidade criminal nos termos do direito penal;

2) aqueles que cometeram, em detrimento de uma dessas pessoas, um fato para o qual o direito penal declara o assassinato disposições;

3) aqueles que denunciaram qualquer pessoa de crime punível com prisão perpétua ou pena de prisão não inferior ao mínimo de três anos, se a denúncia foi declarada caluniosa em processo penal, ou tenham testemunhado contra aquelas pessoas acusadas a estes crimes, se o testemunho foi declarada contra ele, falso em processo penal;

4) que tenha causado intencionalmente violência ou a pessoa cuja herança está em causa, para fazer, alterar ou revogar uma vontade, sendo ele ou ela impedido;

5) aqueles que têm suprimido, escondido ou alterado a vontade do que foi ajustado;

6 ) que já formou um falso testemunho ou o usou conscientemente. (Código Civil Italiano, 1942, tradução nossa).

[13] Título XII – Dos crimes contra a pessoa.

Capítulo I - Dos crimes contra a vida ea integridade física

Artigo 578. Infanticídio na condição de abandono moral e material.

A mãe, que causa a morte de seu bebê imediatamente após o nascimento, ou o feto durante o parto, ou quando o fato é determinado por condições materiais e morais de negligência relacionadas ao parto, é punido com pena de prisão de quatro a doze anos.

Artigo 579. Assassinato de consentimento.

Quem provoca a morte de um homem , com o consentimento dele , é punido com pena de prisão 6-15 anos.

Artigo 580. Incitar ou suicídio assistido.

Qualquer um que faz com que os outros  cometam suicídio ou induz  aos outros sobre o suicídio, ou de qualquer forma facilita a execução, será punido, se ocorrer o suicídio, com pena de prisão de cinco a doze anos. Se o suicídio não é o caso, será punido com prisão de um a cinco anos, desde que a tentativa de suicídio resulte em uma lesão corporal grave ou gravíssima.

(Código Penal Italiano, 1930, tradução nossa).

Sobre os autores
Isa Omena Machado de Freitas

Pós-graduada em Direito Privado, Direito Civil e Processo Civil. Advogada. Professor Mestre da Faculdade de Ciências Jurídicas de Paraíso do Tocantins (FCJP) e da Faculdade Serra do Carmo (FASEC). Doutoranda em Ciências Jurídicas e Sociais. Universidad Del Museo Social Argentino- UMSA.

Vinicius Pinheiro Marques

Doutor em Direito Privado (magna cum laude) pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC MINAS). Mestre em Prestação Jurisdicional e Direitos Humanos pela Universidade Federal do Tocantins (UFT). Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Professor de Direito da Universidade Federal do Tocantins (UFT), do Centro Universitário Luterano de Palmas (CEULP/ULBRA) e da Faculdade Católica do Tocantins (FACTO).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FREITAS, Isa Omena Machado; MARQUES, Vinicius Pinheiro. Exclusão da sucessão por ato de indignidade:: por um redimensionamento ético e hermenêutico do art. 1814, inciso I, do Código Civil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4258, 27 fev. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/31071. Acesso em: 18 mai. 2024.

Mais informações

Publicado no CONPEDI/UFSC 2014.

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