Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

A configuração criminal da prorrogaçao indevida do contrato administrativo

Exibindo página 3 de 3
Agenda 11/11/2014 às 11:43

4 CONCLUSÃO

Uma das aplicações mais famosas do art. 92 da Lei de Licitações se deu no julgamento da Ação Penal Originária n. 226-SP[7] no Superior Tribunal de Justiça, no qual o Ministro Luiz Fux relatou o caso da construção irregular do Tribunal Regional do Trabalho da Segunda Região, à época presidido pelo então Desembargador do Trabalho Nicolau dos Santos Neto e pelo Desembargador do Trabalho Délvio Buffulin.

Um simples exemplo que se reveste da importância de discussão do tema, uma vez que inúmeros procedimentos administrativos são realizados à revelia do ordenamento regente e, inúmeras vezes, desconsiderados para o adequado atendimento ao interesse público.

Especificamente quanto à prorrogação contratual, foi possível verificar que um procedimento considerado simples pela administração pública, em muitos dos casos, reveste-se de particular gravidade que macula todo o procedimento licitatório que originou a contratação, além de configurar possíveis responsabilizações administrativas, civis e criminais.

Muitos dos atentados ao Erário configurados pela corrupção ou pela concussão possuem um pano de fundo no curso do processo normal da contratação pública, representados por superfaturamentos, direcionamento de licitação, pagamentos indevidos e, principalmente como detalhado, favorecimento ilegal ao contratado. Todo esse desvirtuamento assume a caracterização de uma superficial regularidade sustentada pela justificativa de “ausência de prejuízo à Administração”, mas com grave infração a todos demais postulados que regem a administração pública.

Neste estudo foi possível desenvolver o entendimento da interferência de uma mera prorrogação contratual indevida em todo o processo licitatório, partindo da consideração basilar dos princípios que regem as licitações públicas, passando pela estruturação prévia à contratação e analisando diretamente os quesitos de alteração temporal do contrato quando realizada de forma irregular e suas respectivas implicações no escopo criminal.

A intenção de obter, para si ou para outrem, vantagem nos processos licitatórios não pode ser combatido meramente pelo texto da norma, é necessário que se apliquem as sanções decorrentes, estritamente nos ditames legais impostos. A permissividade pública com as disfunções contratuais tem causado incalculáveis prejuízos à administração pública e aos princípios que a orientam.

A prorrogação indevida dos contratos é apenas um dos pontos de ataque de interesses escusos que são tomados como procedimentos normais, dentre os inúmeros atos decorrentes de licitações e contratos da administração pública, sem maiores avaliações, mas que, conforme demonstrado, podem agredir severamente o ordenamento jurídico e os primados do direito.

Este trabalho procurou demonstrar a gravidade de um ato administrativo-contratual, hodiernamente observado o sob único aspecto de causa ou não prejuízo material à administração pública, todavia sem ser questionado sobre suas implicações morais e principiológicas, que levam à indubitável responsabilização civil, administrativa e penal e, consequentemente, ao grave dano à sociedade.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Alcorão. II - Sooratu Albaqarati (???? ??????), 188. Disponível em http://www.centroislamico.com.br/viewpage_kuran.php?page_id=23. Acesso em 10 mai. 2014.

BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo. Crimes Federais: abuso de autoridade… 7. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2011.

BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2000.

BATISTA DOS SANTOS, Márcia Walkiria et al. Temas polêmicos sobre licitações e contratos. 4. ed. ver. ampl. São Paulo: Malheiros, 2000.

BAZILLI, Roberto Ribeiro. Contratos Administrativos. São Paulo: Malheiros, 1996.

BRASIL, CGU - Controladoria-Geral da União da Presidência da República. Transparência Pública. Disponível em http://www3.transparencia.gov.br/Transparencia Publica. Acesso em 26 jan 2012.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Brasília: Diário Oficial da União, 1988.

BRASIL. Lei n. 8429, de 2 de junho de 1992. Dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional e dá outras providências. Brasília: Diário Oficial da União, 1992.

BRASIL. Lei n. 8666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Brasília: Diário Oficial da União, 1993.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

BRASIL. Lei n. 12846, de 1º de agosto de 2013. Dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira, e dá outras providências. Brasília: Diário Oficial da União, 2013.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Ação Penal Originária n. 226/SP, Corte Especial, rel. Min. Luiz Fux, j. em 01 ago. 2007, Diário da Justiça, DF, 08 out. 2007.

___________________. Recurso Especial n. 197.775, 5ªT., rel. Min. Félix Fisher, j. em 18 jun. 1999, Diário da Justiça, DF, 21 jul. 1999.

___________________. Recurso Especial n. 545.471, 1ªT., rel. Min. Denise Arruda, j. em 23 ago. 2005, Diário da Justiça, DF, 19 set. 2005, p. 187.

___________________. Recurso Especial n. 702.628, 5ªT., rel. Min. Félix Fisher, j. em 03 set. 2005, Diário da Justiça, DF, 05 out. 2005.

BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão n. 1253/2011, Plenário, rel. Min. José Múcio Monteiro, Sessão de 18 mai. 2011. Diário Oficial da União, DF, 26 mai. 2011.

BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão n. 2406/2006, Plenário, rel. Min. Marcos Vinicios Vilaça, Sessão de 06 dez. 2006. Diário Oficial da União, DF, 08 dez. 2006.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. 3. ed. Coimbra: Almedina, 1983.

CASTRO, Flávia Lages. História do Direito Geral e do Brasil. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2004.

COSTA JÚNIOR, Paulo José da. Direito Penal das Licitações: comentários aos arts. 89 a 99 da Lei n. 8666, de 21.06.1993. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

DALLARI, Adilson de Abreu. Aspectos Jurídicos da Licitação. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2006.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2001.

FERNANDES, Flávio Sátiro. Dos Crimes Licitatórios. Ciência Jurídica. ano VIII, v. 56, p. 41-49, mar-abr. 1994.

FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de Direito Administrativo. 7. ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Malheiros, 2004.

FRANCO, Cláudia Daniela de F. S. A Tutela Penal na Lei de Licitações e Contratos. Revista do Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Brasília, ano 14, n. 12. p. 63-68. dez. 2002.

GASPARINI, Diógenes. Crimes na Licitação. 4. ed. rev. atual. São Paulo: NDJ, 2011.

__________________. Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 2000. pp. 513-514. Apud MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e contrato administrativo. 14. ed. atual. por Eurico de Andrade Azevedo e Vera Monteiro. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 241-424.

GRECO FILHO, Vicente. Dos Crimes da Lei de Licitações. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 12. ed. São Paulo: Dialética, 2008.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32. ed. São Paulo: Malheiros, 2006.

_____________________. Licitação e Contrato Administrativo. 15. ed. atual. por Eurico de Andrade Azevedo e Vera Monteiro. São Paulo: Malheiros, 2010.

MIRABETE, J.F. Processo Penal. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2002.

MONTESQUIEU, Charles Louis de Secondat – Barão de. Do Espírito das Leis. São Paulo: Abril Cultural, 1985.

NIEBUHR, Joel de Menezes. Licitação Pública e Contrato Administrativo. Curitiba: Zênite, 2008.

NOVAES, Fernando Araújo de. O Princípio da Proporcionalidade nas Sanções Administrativas da Lei n. 8666, de 21 de junho de 1993. Fórum de Contratação e Gestão Pública - FCGP. Belo Horizonte, ano 5, n. 56, p. 7597-7605, ago. 2006.

NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.

NUNES, Adeildo. O Crime nas Licitações. Revista da Esmape, Recife, v. 4, n. 9. p. 025-037, jan-jun 1999.

PELLEGRINO, Carlos Roberto M. Aspectos Penais das Licitações e Contratos Administrativos.  Revista Brasileira de Ciências Criminais. n. 41. p. 149-154. ano 11. jan-mar 2003.

PEREIRA JÚNIOR, Jessé Torres. Comentários à Lei de Licitações e Contratações da Administração Pública. 7. ed. rev. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Renovar, 2007.

POLTRONIERI, Renato. Licitação e Contratos Administrativos Segundo o Direito Positivo. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2004.

SANTA CATARINA. Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina. RLA-09/00582243. Rel. Júlio Garcia. j. 18.04.2011. Disponível em http://consulta.tce.sc.gov.br/ RelatoriosDecisao/Pareceres/900582243_3464148.htm. Acesso em 28 mar. 2013.


Notas

[1] RLA-09/00582243. Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina. Rel. Júlio Garcia. j. 18.04.2011.

[2] Para melhor estudo, cf. Cármen Lúcia Antunes Rocha, Princípios Constitucionais da Administração Pública, 1994.

[3] Conforme Acórdão n. 2406/2006 do Plenário do Tribunal de Contas da União.

[4] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 702.628, 5ªT., rel. Min. Félix Fisher, j. em 03.09.2005, DJ de 05.10.2005.

[5] “5. O tipo previsto no artigo 92 da Lei 8.666/93 reclama dolo genérico, inadmitindo culpa ou dolo eventual posto dirigido ao administrador desonesto e não ao supostamente inábil.” BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Apelação Penal n. 200201653178, Corte Especial, rel. Min. Luiz Fux, j. em 01.08.2007, DJ de 08.10.2007.

[6] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 197.775, 5ªT., rel. Min. Félix Fisher, j. em 18.06.1999, DJ de 21.07.1999.

[7] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Ação Penal Originária n. 226/SP, Corte Especial, rel. Min. Luiz Fux, j. em 01.08.2007, DJ de 08.10.2007.

Sobre o autor
Cleverson Lautert Cruz

Gerente-Executivo de Segurança Institucional do Ministério Público do Trabalho. ex-Diretor-Geral Adjunto do Ministério Público do Trabalho. Ex-Assessor de Controle Interno do Ministério Público do Trabalho. Ex-Assessor Jurídico da Procuradoria-Geral do Trabalho. Graduado em Administração pela Universidade de Brasília e em Direito pela Universidade Paulista. Pós-graduado em Direito Público e em Administração Pública.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LAUTERT CRUZ, Cleverson. A configuração criminal da prorrogaçao indevida do contrato administrativo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4150, 11 nov. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/33065. Acesso em: 22 dez. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!