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A judicialização da política pela ótica eleitoral com base nos processos de cassação de Prefeitos e Vice-Prefeitos no Rio Grande do Sul

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Agenda 06/10/2015 às 11:22

Considerações Finais

Neste trabalho, considerando os dados no que tange os resultados dos processos, percebe-se que o TRE teve intervenções positivas em uma minoria dos casos analisados, efetivamente, cassando mandatos e instituindo novas eleições, ou determinando a ascensão do segundo colocado. Então, a primeira interpretação poderia ser que não há uma judicialização da política porque o comportamento do TRE-RS é moderado e intervém efetivamente na minoria dos casos, aplicando apenas multas leves, arquivando ou absolvendo os requeridos na maioria dos processos.

Porém, como não centramos nossa análise no resultado final do processo, pode-se dizer que o fato de, dos 489 municípios do Rio Grande do Sul, 34%, terem seus pleitos revisados pelo Tribunal Regional Eleitoral em uma eleição, sugere que a abertura desse espaço dento da Justiça Eleitoral para alterar resultados, tem modificado sensivelmente a dinâmica da competição política local. Acrescenta-se ainda o fato de não terem sido analisados processos que envolvem os candidatos e/ou eleitos para o Poder Legislativo, e somente aqueles que chegaram ao conhecimento do TRE, excluindo aqueles que foram extintos já em sua origem, ou seja, a Zona Eleitoral, o que certamente englobaria praticamente todos os municípios do Rio Grande do Sul.

Houve a tentativa, junto ao órgão especializado do TRE, de obter os mesmos dados em relação aos processos referentes às Eleições Municipais de 2000 e 2004, porém, na época essas informações ainda não eram sistematizadas, de modo que não seria possível obter dados sobre todas as variáveis, impossibilitando uma análise uniforme dos casos. Por esse motivo, não foi possível realizar uma análise dos dados ao longo do tempo, desde a promulgação da Lei das Eleições (Lei 9.504/97).

Os dados que puderam ser sistematizados foi o número de municípios onde teve processo de cassação e o resultado do processo. Nas eleições municipais de 2000, foram apenas 19 (dezenove) municípios onde os pleitos, em relação a cargos majoritários, sofreram algum tipo de revisão pelo tribunal, destes, apenas resultaram condenações leves (multas) e nenhuma cassação de mandato, sendo que não ocorreram Eleições Suplementares. A Eleição Suplementar ocorrida no município de Novo Hamburgo [Vide acórdãos do TSE nº 24.861 e 24.863], foi a primeira a ser realizada já com o entendimento jurisprudencial provocado pela edição da Lei 9.504/97. Anteriormente, já havia a previsão de Eleições Suplementares, mas, no entanto, por haver divergências quanto a questão da anulação ou não dos votos, a medida adotada era diversa. Dessa forma, o TRE-RS não dispõe de registros de Eleições Suplementares no período anterior a 2004.

Já nas eleições municipais de 2004, houve um aumento significativo da procura pela Justiça Eleitoral para resolução de contenciosos eleitorais: foram 146 municípios – infelizmente o TRE-RS não disponibilizou as estatísticas dos resultados em relação a multa, absolvição e arquivamento para que fosse possível mensurar quais resultaram em algum tipo de condenação/punição, mas, neste pleito, ocorreram 7 (sete) eleições suplementares, a saber, nos municípios de Novo Hamburgo, Triunfo, Sentinela do Sul, Ajuricaba, Tucunduva, Campo Novo e Pouso Novo.

Nesse sentido, pode-se afirmar que nas eleições municipais de 2000, apenas três anos depois da promulgação da Lei das Eleições (9.504/97) e um ano depois da Lei que inseriu a captação ilícita de sufrágio (Lei 9.840/99), a informação sobre os dispositivos legais, dada a alteração recente do marco legal, ainda não era tão democratizada, e os atores políticos ainda não consideravam esta como uma estratégia de competição política. Já na eleição de 2004, os processos aumentaram potencialmente em relação à eleição anterior, o que comprova que a utilização desse instrumento pelos competidores começa a ser mais comum, devido a própria democratização da informação e do acesso à Justiça Eleitoral. Nessas eleições de 2004, alguns casos obtiveram resultados positivos para os adversários políticos dos competidores eleitos, cassando respectivos mandatos e diplomas, ganhando uma repercussão pública maior com a determinação de várias eleições suplementares. A partir disso, supõe-se que esses dispositivos passaram a chamar atenção dos atores políticos, como uma forma de interferir no resultado eleitoral por meio de outra via que não fossem as usuais de competição pelo voto.

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Os atores políticos se voltam então para essa possibilidade, e, portanto, o salto no número de processos e de municípios que foram palco dessas solicitações de revisão judicial dos resultados eleitorais, é uma conseqüência disso. Os competidores se deram conta que usando esses dispositivos, poderiam desestabilizar os candidatos adversários, ou, ainda melhor, conseguir alterar resultados eleitorais negativos.

Sendo assim, essa é uma possível explicação para a crescente procura pela Justiça Eleitoral em relação a ações provenientes dos pleitos municipais, tendência essa que deverá ser comprovada nas próximas eleições, considerando ainda que foram inseridos novos dispositivos pela Lei da Ficha Limpa (LC 135/2010), que altera a Lei das Inelegibilidades e terá seus primeiros impactos nas eleições municipais de 2012. 

A possibilidade de abrir um processo contra o adversário é vista e elencada pelos competidores como uma das estratégias para vencer o pleito. Na pior das hipóteses, esse processo desestabiliza a candidatura do oponente tornando-o um competidor mais frágil, desvia sua atenção para o processo e sua defesa tirando o foco da competição, e na melhor das hipóteses, pode tirá-lo do jogo, ou mesmo alterar um resultado desfavorável de um pleito conseguindo a cassação do vencedor.

Essa hipótese máxima pode significar tanto a ascensão do segundo colocado, na maior parte dos casos o próprio proponente da ação – no caso de uma situação em que o vencedor não tenha atingido 50% dos votos validos, ou ter uma nova oportunidade de disputa – no caso de determinação de uma Eleição Suplementar. De qualquer modo, essa possibilidade se apresenta como um atrativo aos competidores, na medida em que utilizá-la pode ter boas perspectivas de sucesso no jogo político. Isso só é possível porque o próprio marco legal que rege as ações da Justiça Eleitoral permite o acesso desses atores políticos em situações várias.

Pode ocasionar uma sobrecarga na Justiça Eleitoral, pois como a gama de situações que podem levar a um processo é ampla, e os atores políticos legitimados a propor tais ações também abrange um conjunto muito grande, há uma infinidade de motivos que podem se tornar um processo e merecer o devido tratamento jurídico, ainda que sejam frágeis seus fundamentos ou seu conjunto probatório.

Naturalmente, processos sem fundamento legal, são analisados e extintos em sua origem, ou seja, a própria Zona Eleitoral, não chegando à análise do TRE, a segunda instância. Mas isso não significa que recursos vários não tenham sido empreendidos nesses processos, visto que a Zona Eleitoral também é uma das partes que compõem o Organismo Eleitoral brasileiro.

Isso demonstra que, em nível de competição política local, está brotando uma semente de não aceitação dos resultados eleitorais, e assim, as tentativas por vezes frágeis, não embasadas em denúncias e provas contundentes, de anular o pleito e/ou modificar seu resultado, estão cada vez mais freqüentes.

A dinâmica da competição altera-se significativamente no que tange as armas. Atores políticos não somente dedicam-se à propaganda, as práticas usuais de campanha na busca pelo voto, como também dedicam-se a monitorar possíveis erros dos adversários preferencialmente documentados com provas, passíveis de utilização no caso de um processo. Dedicam-se, assim, a vasculhar as falhas de campanha do adversário e em buscar assiduamente testemunhas, fotos, documentos, recibos, vales, fotografias, filmagens, gravações, que possam incriminar o adversário. Tudo isso dá origem a um arsenal de provas, algumas úteis, outras nem tanto. A dinâmica se altera por que o pleito começa a ter duas frentes, do ponto de vista dos competidores: a conquista do voto dos eleitores e o monitoramento da conduta do adversário.

Evidentemente, o trabalho ora apresentado não pretende expor verdades absolutas a respeito da dinâmica da competição política eleitoral e a intervenção do Poder Judiciário nas questões de alçada política. Contribui com a discussão da judicialização da política a partir de uma ótica diferenciada, a ótica da Justiça Eleitoral, enfatizando a influência do Poder Judiciário na dinâmica da competição política, a partir de suas intervenções ou meras ameaças iminentes de intervir. Com isso espera-se que novas agendas de pesquisa sejam protagonizadas a respeito, com dados de outros estados do Brasil, compreendendo outras variáveis que não foram contempladas aqui, como a própria atuação dos advogados nessa relação entre Justiça Eleitoral e conflitos políticos gerados nas eleições municipais.


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Sobre a autora
Juliana Costa Meinerz Zalamena

Graduada em Serviço Social e Sociologia, Unijui/RS, Mestre em Ciência Política, UFRGS/RS, Professora de Sociologia na Escola Estadual de Ensino Básico Yeté, Tuparendi/RS.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ZALAMENA, Juliana Costa Meinerz. A judicialização da política pela ótica eleitoral com base nos processos de cassação de Prefeitos e Vice-Prefeitos no Rio Grande do Sul. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4479, 6 out. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/38142. Acesso em: 5 nov. 2024.

Mais informações

Este artigo é um recorte da Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da UFRGS, intitulada "JUDICIALIZAÇÃO, COMPETIÇÃO POLÍTICA LOCAL E ELEIÇÕES MUNICIPAIS NO RIO GRANDE DO SUL".

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