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Disposições sobre a perda da posse e as ações possessórias.

Novo olhar constitucional em face da propriedade

Agenda 27/04/2015 às 04:19

O presente artigo defende a necessidade de igualar hierarquicamente ambos os institutos, propondo-se ao aplicador do direito, como fundamento de legitimidade, a busca da validade substancial da norma, ou seja, a adequação aos valores Justiça e Utilidade.

Sumário: 1. Da Perda da Posse; 2. Das ações possessórias: aspectos gerais; 3. Do posicionamento dos Tribunais frente as ações possessórias; 4. Conclusão; 5. Referências


1. DA PERDA DA POSSE

Perde-se a posse quando cessa, embora contra a vontade do possuidor, o poder sobre o bem, na forma do art. 1.223 do CC. Ora, a análise do dispositivo permite concluir que a perda do caráter da posse pode ocorrer de forma consensual ou violenta, uma vez que há a ressalta “embora contra a vontade do possuidor”, o que faz crer que a perda pode ocorrer por sua vontade. Pois é nessa esfera de mudança de caráter da posse a partir do consenso que afiguram-se as hipóteses de interversão da posse a e constituto possessório.

Na interversão da posse pelo consenso, ocorre a aquisição do bem pelo possuidor direto das mãos do indireto, seria a hipótese onde o locatário adquire o imóvel do locador, passando agora a ter além dos direito de uso, gozo e fruição, o de disposição. Já o constituto possessório ocorre o movimento oposto, onde a pessoa que possuía em nome próprio o bem, passa a possuir em nome alheio, ou seja, o possuidor direto, continua na condição de possuidor direto, mas de um bem que já não está mais em sua titularidade, seria o exemplo de um vendedor de imóvel transferisse consensualmente a posse, mas o comprador o autorizasse a permanecer no bem durante determinado período. Neste caso, observa-se que o possuidor continua com os poderes de uso, gozo e fruição, mas não mais de disposição.

A edição da Lei 10.931 trouxe para o nosso ordenamento a disciplina do patrimônio de afetação. Grosso modo, a afetação consiste na separação e individualização de bens e direitos para determinado desiderato. Neste caso, passa-se a constituir um patrimônio individualizado, com uma administração financeira e responsabilidade próprias. Tal conceito é extraído da exegese da indigitada lei, conforme o art. 31-A, ipsis litteris:

Art. 31-A. A critério do incorporador, a incorporação pode ser submetida ao Regime de Afetação no qual o terreno, acessões e demais bens e direitos vinculados, manter-se-ão apartados do patrimônio do incorporador.

§ 1º O Patrimônio de Afetação não se comunica com o patrimônio geral do incorporador só respondendo por dívidas e obrigações vinculadas à incorporação respectiva.


2. DAS AÇÕES POSSESSÓRIAS: ASPECTOS GERAIS

A posse também tem por efeito o de gerar direito de o possuidor defendê-la contra a ameaça ou perturbação, ou ainda, a privação de seu exercício, provocadas por terceiro. Existem dois tipos de proteção possessórias previstas em lei, a autoproteção e a heteroproteção. A autoproteção, como sugere seu nome, identifica-se com a possibilidade do possuidor agir com as “próprias mãos” na defesa da posse.

Nesse sentido, a lei confere ao possuidor o direito de, por si só, proteger a sua posse. Contudo, essa proteção deve guardar uma relação de proporcionalidade com a força utilizada contrária a posse, em outras palavras, a proteção não pode ir além do indispensável à restituição na forma do art. 1.210 do CC.

Basicamente há duas situações onde isso ocorre, na Legítima defesa da posse e no desforço imediato. Na primeira, é assegurado o direito ao possuidor de autoproteger a coisa da perturbação. Observa-se que não chegou a ocorrer a perda da coisa. Já o desforço imediato, consiste no direito de autoproteção da posse no caso de esbulho, ou seja, de perda da coisa. Aqui, o possuidor chega a perder a coisa e lhe é assegurado, por força do exercício do direito de sequela, a persegui-la tão logo ocorra a perturbação. A lei só permite o desforço imediato se a vítima do esbulho “agir logo”, ou seja, agir imediatamente após a agressão (“no calor do acontecimento”) ou logo que possa agir. Aquele que está ausente (não presenciou o esbulho) só perderá esse direito se não agir logo após tomar conhecimento da agressão à sua posse, conforme preceitua o art. 1.224 do CC. Cumpre ressaltar que tanto a legitima defesa da posse quando o desforço imediato devem guardar uma relação de moderação, buscando ser proporcional as forças de perturbação ou esbulho, nesse sentido preleciona Chaves e Rosenvald:

“Tanto a legítima defesa como o desforço imediato deve ser praticados sem demora, em sequência imediata à agressão. Ou seja, a defesa privada é excepcional e deve ser exercida com presteza e moderação, sob pena de a conduta do possuidor converter-se em ato ilícito, como delito de exercício arbitrário das próprias razões (art. 345 do CP). (CHAVES E FARIAS, ROSENVALD, 2012, p. 220)

Nas hipóteses onde não caibam a legitima defesa ou desforço imediato, seja por existir apenas uma ameaça a perturbação ou em virtude da mora da vítima em agir, o Estado-Juiz concede a tutela jurisdicional, conhecida de interdito possessório, trata-se da heteroproteção. O interdito possessório seria o gênero no qual compartam três espécies: interdito proibitório, manutenção de posse e reintegração de posse.


3. DO POSICIONAMENTO DOS TRIBUNAIS FRENTE AS AÇÕES POSSSESSÓRIAS

A doutrina costuma conceituar o interdito proibitório como uma ação de preceito cominatório, uma vez estipular ao final da ação uma prestação negativa, de não fazer amparada com uma alternativa coercitiva (geralmente multa) de modo a desestimular a concretização da ameaça de esbulho ou turbação. Dessa maneira, trata-se de uma ação de caráter preventivo, manejada quando há justo receio de que a coisa está na iminência de ser turbada ou esbulhada, apesar de não ter ainda ocorrido nenhuma ação concreta nesses sentidos, como citado, há apenas uma ameaça.

Neste sentido, é a doutrina de Carlos Roberto Gonçalves:

“O interdito proibitório pressupõe os seguintes requisitos: a) posse atual do autor; b) a ameaça de turbação ou esbulho por parte do réu; c) justo receio de ser efetivada a ameaça. (...). O primeiro requisito é a posse atual do autor. O art. 932 do estatuto processual afirma que a posse a ser protegida pode ser direta ou indireta. É certo que a posse a ser provada é a atual”.

Dessa maneira, é imprescindível que tal ação possessória seja instruída com provas suficientes a demonstrar de forma inequívoca que há, primeiramente a posse do Autor da demanda, bem como a ameaça de turbação ou esbulho, do contrário, não há como proceder com o amparo jurisdicional, conforme se observa no julgado que segue:

APELAÇÃO CÍVEL. POSSE (BENS IMÓVEIS). AÇÃO DE INTERDITOPROIBITÓRIO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA POSSE DA AUTORA SOBRE O IMÓVEL DESCRITO NA INICIAL. Trata-se de ação de ação de interdito proibitório julgada improcedente na origem, dada a ausência de comprovação que a autora exercia a posse sobre a área em litígio. Tratando-se de ação possessória, a qual, dada a sua natureza, visa, única e exclusivamente, a proteção da posse, não tendo qualquer importância a alegação de domínio, inaplicável ao o disposto na súmula nº 487 do STF, haja vista que relativa às ações petitórias, nas quais se discute a propriedade e não a posse. Ao interdito proibitório, aplicam-se as mesmas regras atinentes à manutenção ou reintegração de posse, conforme autoriza o art. 933 do CPC, de forma que a autora deve comprovar o exercício da posse e o justo receio de ser turbada ou esbulhada, ex vi legis do art. 927 do mesmo diploma legal. Assim, é impróprio o ajuizamento de ação de interdito proibitório no caso em comento, haja vista que os requisitos relacionados no art. 927 do CPC não restaram preenchidos, na media em que a autora não comprovou a sua posse, alegando tão somente a propriedade baseada em contrato de promessa de compra e venda e cessão de direitos hereditários, pelo que descabida a presente ação possessória. Por fim, descabida a análise de quem possuiu o melhor título de propriedade sobre a área em questão, visto que a causa de pedir nas ações possessórias é a posse e não o domínio. A prova testemunhal colhida nos autos não foi favorável à autora, não tendo mencionado que a mesma exercia e/ou exerce a posse sobre a área descrita na inicial, de forma que a manutenção da sentença de improcedência é medida que se impõe. APELAÇÃO DESPROVIDA.

(Apelação Cível Nº 70033432006, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Niwton Carpes da Silva, Julgado em 08/09/2011)

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No mais disso, há de se ponderar que, não só na ação de interdito proibitório, como nas demais possessórias, não se discute o domínio do bem, ou a propriedade, mas tão-somente a posse a sua legalidade. Dessa maneira, é preciso o exercício pleno e exaustivo do princípio constitucional do contraditório e ampla defesa para se valer de todos os meios idôneos e necessários a demonstrar as alegações dos fatos. Porquanto, discute-se o alcance e sentido de normas ditas de conceito indeterminado, como a função social da propriedade, o direito à moradia, a boa destinação econômica e a própria realização do direito da dignidade da pessoa humana naquele caso concreto.

Nessa trajetória, quanto a necessidade dos meios probatórios suficientes, observa-se a fundamentação para o não provimento do agravo de instrumento julgado recentemente, 22 de abril de 2014, pela décima oitava Câmara Cível, no Tribunal do Rio Grande do Sul:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. POSSE (BENS IMÓVEIS). AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. LIMINAR. AUSÊNCIA DE PROVA SUFICIENTE DOS REQUISITOS LEGAIS. AUDIÊNCIA DE JUSTIFICAÇÃO. CABIMENTO.

Na dicção do artigo 927 do Código de Processo Civil e seus incisos, incumbe ao autor instruir a petição inicial da ação de reintegração possessória com prova da anterioridade de sua posse, da turbação ou do esbulho praticado pelo réu e da data em que ocorreu um ou outro. Nesse contexto, somente a prova documental não é suficiente para formar juízo, razoavelmente seguro, para concessão de medida liminar, até porque esta somente é admissível quando houver um juízo de “quase-certeza” do direito constitutivo da parte autora. Necessidade, contudo, de realização da audiência de justificação prevista no art. 928 do CPC, a fim de não se tolher o direito da parte à prova do fato constitutivo do seu pedido.(grifos nossos)

(Agravo de Instrumento Nº 70059367854, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Pedro Celso Dal Prá, Julgado em 22/04/2014)

De igual maneira:

POSSESSÓRIA. REINTEGRACAO LIMINAR. PARA A CONCESSAO DE LIMINAR NAS ACOES POSSESSORIAS NAO BASTA QUE O AUTOR APRESENTE DOCUMENTOS RELATIVOS A PROPRIEDADE DA COISA. A PETICAO INICIAL DEVERA ESTAR DEVIDAMENTE INSTRUIDA COM PROVA DOCUMENTAL QUE COMPROVE A POSSE ANTERIOR; A TURBACAO OU ESBULHO E RESPECTIVA DATA; E AUTORIA DA VIOLENCIA POSSESSORIA, OU SEJA, QUE A TURBACAO OU ESBULHO TENHAM SIDO PRATICADOS PELO REU. NAO APRESENTANDO, O AUTOR, COM A INICIAL, TAL PROVA, DEVERA TER, O JUIZ, A CAUTELA DE DETERMINAR QUE O MESMO JUSTIFIQUE PREVIAMENTE SUAS ALEGACOES, DESIGNANDO, PARA TAL, AUDIENCIA PRELIMINAR DE JUSTIFICACAO DE POSSE, COM A CITACAO DO REU PARA ACOMPANHA-LA, SUBMETENDO, DESSA FORMA, A PROVA ORAL AO INDISPENSAVEL CONTRADITORIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO PARA CASSAR A LIMINAR CONCEDIDA SEM QUE FOSSEM OBSERVADAS ESSAS CAUTELAS.

(Agravo de Instrumento Nº 189023153, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Alçada do RS, Relator: Osvaldo Stefanello, Julgado em 18/04/1989).

No aspecto processual, é típico das ações possessórias a cumulação de pedidos, sendo perfeitamente admitido que o Autor, por exemplo, além de pleitear a reintegração da posse, requeira, também, a garantia de que o Réu não lhe turbará ou esbulhará novamente, por meio do interdito proibitório. Frisa-se que tal cumulação não acompanha apenas o Autor, como também o Réu que pode numa ação de reintegração de posse julgada improcedente requerer que o Autor não incomode mais a sua condição de possuidor.

Quanto a reintegração de posse, seria a ação utilizada para corrigir agressões que fazem cessar a posse de alguém, conforme exegese do art. 926 do Código de Processo Civil vigente. Trata-se, dessa forma, de uma ação de caráter repressivo manejada quando ocorre o esbulho, que é a privação da posse da coisa, contra a sua vontade. Frisa-se que não há necessidade da posse ser direta, assim tanto o possuidor indireto quanto o direto podem se valer de tal remédio processual para resgatar a sua condição de possuidor de fato da coisa. Para intentar socorro, o Autor deve provar a sua posse, o esbulho praticado pelo réu, a data do esbulho e a perda da posse.

A propósito:

Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. POSSE. BENS IMÓVEIS. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. ART. 927 DO CPC. POSSE ANTERIOR NÃO DEMONSTRADA. A ausência de demonstração de posse anterior impõe o não-reconhecimento do direito à reintegração possessória. Não é possuidor aquele que nunca exerceu poder fático sobre o bem, conquanto detentor de título que lhe confira o direito de propriedade, pois a proteção possessória conferida aos interditos exige que haja relação material do homem com a coisa (corpus). Ação possessória apenas com lastro na alegação de domínio. Impossibilidade. RECURSO DE APELAÇÃO DESPROVIDO. UNÂNIME.

(Apelação Cível Nº 70055970446, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Pedro Celso Dal Pra, Julgado em 26/09/2013)

A análise dos julgados que versam sobre a reintegração de posse onde o Estado figura como polo ativo, sustentando a impossibilidade de ocupação de bens imóveis públicos, permite observar que na esmagadora maioria dos julgamentos prevalece a posse do Estado em detrimento as ocupações coletivas. Tal posicionamento dos tribunais permite concluir que há em nossas cortes a preocupação em manter o status quo de desigualdades sociais e concentração de renda. Embora o judiciário não possa proceder com desapropriações, nossa Constituição Federal possibilitou o uso da expropriação por parte do judiciário nas ações possessórias a fim de garantir o direito básico, inerente a personalidade, que seria a moradia, reflexo do meta direito da dignidade da pessoa humana. Demais disso, o art. 1.228, § 4º do Código Civil brasileiro prevê a desapropriação indireta judicial em prol de uma coletividade que dê função social à posse.

Sob a norma que determinada a impossibilidade do usucapião de bens públicos classificados como devolutos ou dominicais, tem-se o judiciário chancelando tal preceito em detrimento ao direito à moradia, bem que integra a situação existencial de qualquer pessoa. Não há o que se falar em função social da propriedade, pois o Estado-Juiz, ao final da demanda, determina que o status quo seja reinstaurado, que aquela propriedade volte ficar em seu estado de inutilidade, inerte e imprestável.

À guisa de julgamentos, destacam-se:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. POSSE (BENS IMÓVEIS). AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. OCUPAÇÃO DE ÁREA PÚBLICA. - Nos bens públicos a posse é inerente ao domínio, sendo considerado mero detentor o particular que ali se encontra. - Esbulho configurado pela ocupação irregular de área pública, corroborado pela ocorrência policial juntada aos autos. - Preenchidos os requisitos para a concessão da liminar, dispostos no art. 927 do CPC, merece ser mantida a decisão que deferiu areintegração de posse em favor do Município. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO.

(Agravo de Instrumento Nº 70057453789, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Gelson Rolim Stocker, Julgado em 30/01/2014)

REINTEGRAÇÃO DE POSSE Pretensão de desocupação total da área invadida e remoção das benfeitorias edificadas Denunciação da lide aos alienantes em razão da evicção Sentença de improcedência da ação principal e da lide secundária Perícia que conclui pela existência de sobreposição das áreas Identidade física entre a área ocupada e a pertencente ao domínio público (DAEE Departamento de Águas e Energia Elétrica) Autora que é condômina e representante do Condomínio do Reservatório Paraibuna Paraitinga, conforme Decretos Federais nºs 68.324/78, 69.678/71 e 84.847/80 União que detém a posse da área desde 1969, em virtude de desapropriação amigável, com título devidamente registrado a época Réus que também detém título de domínio sobre a área, datado de 1999, enquanto seus antecessores na posse desde 1987 Desapropriação que é forma originária de aquisição da propriedade Bens públicos que não admitem posse por particulares, mas apenas mera detenção Bens inalienáveis e insuscetíveis de usucapião Impossibilidade de discussão nesta seara do melhor título de domínio Posse pretérita da União e da autora, condômina e representante do complexo caracterizada, de sorte que há esbulho possessório pelos réus Denunciação da lide procedente, já que imperioso o direito do adquirente a indenização em razão da evicção Ausência do direito à indenização e retenção de benfeitorias por inexistência de posse e impossibilidade de aproveitamento das edificações, sujeitas à demolição Sentença reformada Recurso provido.

(Apelação Cível Nº 0249749-90.2009.8.26.0000, Oitava Câmara de Direito Público, Tribunal de Justiça de SP, Relator: Manoel Ribeiro, Julgado em 16/04/2014)

Felizmente, na contramão, verifica-se em alguns julgados posicionamento que dar guarita ao direito fundamental a moradia, nesse sentido:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL Ocupação irregular das margens do Rio Paraíba do Sul Área de risco - Prova da ilicitude e da responsabilidade da Municipalidade - Ausência de violação à separação dos Poderes - Procedência parcial - Astreintes fixadas em valor razoável - Possibilidade de imposição de multa diária em desfavor da fazenda pública Dever do Município de alojamento dos ocupantes da área Direito à moradia que foi erigido como direito fundamental Poder público municipal que possui papel central na garantia deste direito, que possui aplicação imediata, a teor do art. 5º, § 1º da CF -Sentença parcialmente reformada Provido o recurso do Ministério Público; desprovidos os demais.

(Apelação Cível Nº 0026613-29.2010.8.26.0577, Primeira Câmara Reservada ao Meio Ambiente, Tribunal de Justiça de SP, Relator: Moreira Viegas, Julgado em 27/03/2014)

Por fim, no que tange as ações de interdito possessórias, cumpre pontuar a ação de manutenção de posse, que como sugere o próprio termo, implica numa ação que buscará corrigir agressões que turbam a posse. Trata-se de uma ação de caráter repressivo, manejada quando ocorre turbação, a exemplo do vizinho que colhe frutos ou que implementa marcos na área de outro. O juiz, acolhendo o pedido, pode condenar o réu a proceder com as devidas indenizações, bem como o dever de abstenção, sob pena de multa diária.


4. CONCLUSÃO

O fim desse breve estudo foi aferir qual o melhor caminho a ser seguido pelos hermeneutas relativamente à discussão entre posse e propriedade em ações possessórias, e a interferência e cotejamento necessário dos princípios da função social da posse e da propriedade, ainda que superada a exceção de domínio do atual Código Civil.

Arraigados à concepção liberal/individualista do Código de Napoleão, a jurisprudência vem caminhando na análise da exceção de domínio nos interditos possessórios, uns reconhecendo a separação absoluta entre os juízos possessório e petitório, e outros, de forma tímida, admitindo não haver a possibilidade de estabelecer regra ou princípio na análise de tais temas, diante da necessidade de estabelecer-se, caso a caso, a função social não somente da propriedade, mas também da posse.

Ao lado desses fatos, gize-se, os julgados desta jaez dirigem-se ao sabor dos ventos pela falta de aprofundamento sobre as teorias objetiva (Ihering) e subjetiva (Savigny) sobre a posse, além do frágil conceito de possuidor estabelecido pelo Código Civil que, apesar de adotar a primeira teoria, contém inúmeros indícios de mesclagem com esta última.

O papel do político do Direito, assim, de resgate do valor justiça para a justificação da norma, fazendo equiparar a hierarquia entre os institutos posse e propriedade, relegando-se aquele que não cumprir com sua função social, independentemente de apresentação de justo título. É necessário correlacionar os princípios da função social da propriedade e da posse com as alterações legislativas do atual Código Civil, tudo com vistas a conceber, definitivamente, uma solução concreta, e não meramente aparente, ao conflito posto em juízo.

É desafio de todo juiz identificar o alcance da aplicação dos princípios da função social da posse e da propriedade nas ações possessórias, confrontando em igual peso ambos os institutos e criar uma nova possibilidade de um direito redirecionado às práticas solidárias de convivência humana e não tão alheia à realidade social.

A ação concreta frente a este desafio será, sem dúvida, uma inquestionável contribuição para os estudiosos do Direito, mas sobretudo, e principalmente, aos jurisdicionados, que clamam e aguardam por uma Justiça mais eficaz, célere e comprometida com aspectos e anseios sociais.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Código Civil. Organização de Luiz Roberto Curia. Ed. 7ª, atual. e ampli. – São Paulo: Saraiva, 2012.

BRASIL. Código de Processo Civil. Organização de Luiz Roberto Curia. Ed. 7ª, atual. e ampli. – São Paulo: Saraiva, 2012.

BRASIL. LEI ORDINARIA n°. 10.931, Senado. Publicada no Diário Oficial da União em 02 de agosto de 204. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/lei/l10.931.htm>. Acesso em: 24 abri. 2014.

FARIAS, CRISTIANO CHAVES; ROSENVALD, NELSON. Curso de Direito Civil: Reais, 8ª ed. Bahia: JusPODIVM, 2012.

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SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. Apelação cível nº 0026613-29.2010.8.26.0577, da 1ª Câmara Reservado ao Meio Ambiente. Relator: Des. Moreira Viegas. São Paulo, Julgado em 27/03/2014. Disponível em: <https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/resultadoCompleta.do;jsessionid=1C8CD35B39BA8475DB4132509A5E6F0B.cjsg3>. Acesso em: 25 abril de 2014.

Sobre o autor
Cloves Nascimento

Bacharelando no ultimo ano do curso de Direito da Universidade do Estado da Bahia.Estagiário concursado do Ministério Público do Estado da Bahia.Pesquisador bolsista Iniciação Científica da FAPESBMonitor de ensino das disciplinas de Criminologia e Direito PenalEx-estagiário do escritório Figueiredo Advogados e Associados

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