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A forma de cálculo das aposentadorias especiais do §4º do art. 40 da Constituição Federal de 1988

Agenda 31/08/2015 às 11:22

A forma de cálculo das aposentadorias concedidas com base nos três incisos do §4º do art. 40 da CF/88, deve levar em conta a data do implemento dos requisitos para a aposentadoria estipulados na norma. Há integralidade e paridade?

Antes de tudo, recordemos a redação do §4º do art. 40 da CF/88:

“§4º - É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata este artigo, ressalvados, nos termos definidos em leis complementares, os casos de servidores: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)

I portadores de deficiência; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)

II que exerçam atividades de risco; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)

III cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005).”

A forma de cálculo das aposentadorias concedidas com base nos três incisos do §4º do art. 40 da CF/88, deve levar em conta a data do implemento dos requisitos para a aposentadoria estipulados na norma. Assim, se o implemento se deu antes do dia 20/02/2004, data de publicação da MP nº 167, o cálculo deverá se dar com base na integralidade. Se após esta data, o cálculo deverá se dar com base na média aritmética simples. Esta, conforme a estrutura normativa atual, é a regra do cálculo nas aposentadorias concedidas com base no §4º do art. 40 da CF/88.

Mas, afinal de contas, quais são os requisitos dos três incisos do §4º do art. 40 da CF/88?

Como é de conhecimento público, face à ausência de leis complementares federais que deveriam regulamentar cada um dos três incisos do §4º do art. 40 da CF/88, o Judiciário adotou soluções temporárias e paliativas para a efetivação dos direitos previstos nestas regras, determinando a aplicação, no que couber, de normas do RGPS.

Deste arremedo, excepciona-se apenas o caso do inciso II do §4º do art. 40 da CF/88, que já possui lei complementar própria (LC nº 51/85, com redação dada pela LC nº 144/14), mas que trata apenas da aposentadoria na atividade policial, necessitando-se de uma lei mais ampla, visto que a atividade de risco é bem diversificada e pode envolver outras atividades desempenhadas pelos servidores públicos.

Pois bem, explicada a situação, passemos a perfilhar os requisitos de cada um dos três incisos que compõem o §4º do art. 40 da CF/88, na forma como se encontram hoje.

O primeiro, a regra do art. 40, §4º, I da CF/88 (servidores portadores de deficiência), encontra-se regulamentado pela Lei Complementar nº 142/2013, conforme decisão do STF no Agravo Regimental interposto no MI nº 5126/DF. Nesta norma, o servidor se aposenta após implementar os seguintes requisitos:

I - aos 25 anos de tempo de contribuição, se homem, e 20 anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência grave;

II - aos 29 anos de tempo de contribuição, se homem, e 24 anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência moderada;

III - aos 33 anos de tempo de contribuição, se homem, e 28 anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência leve; ou

IV - aos 60 anos de idade, se homem, e 55 anos de idade, se mulher, independentemente do grau de deficiência, desde que cumprido tempo mínimo de contribuição de 15 anos e comprovada a existência de deficiência durante igual período.

O segundo, a regra do art. 40, §4º, II, da CF/88 (servidores que exerçam atividades de risco), está regulamentado pela Lei Complementar nº144/2014, que deu nova redação ao art. 1º da LC nº 51/85. Nesta norma, o servidor policial se aposenta após implementar os seguintes requisitos:

I - compulsoriamente, com proventos proporcionais ao tempo de contribuição, aos 65 anos de idade, qualquer que seja a natureza dos serviços prestados;

II - voluntariamente, com proventos integrais, independentemente da idade:

a) após 30 anos de contribuição, desde que conte, pelo menos, 20 anos de exercício em cargo de natureza estritamente policial, se homem;

b) após 25 anos de contribuição, desde que conte, pelo menos, 15 anos de exercício em cargo de natureza estritamente policial, se mulher.”

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Por fim, o terceiro, a regra do art. 40, §4º, III da CF/88 (servidores com atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física) está disciplinado pelo que estabelece a Súmula Vinculante 33 do STF.

A referida súmula possui a seguinte redação:

“Aplicam-se ao servidor público, no que couber, as regras do regime geral da previdência social sobre aposentadoria especial de que trata o artigo 40, § 4º, inciso III da Constituição Federal, até a edição de lei complementar específica”.

Por sua fez, a regra do RGPS a qual se refere a Súmula vinculante do STF nº 33 é a do art. 57 da Lei nº 8.213/91, que possui a presente redação:

“A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei”.

Destarte, para fins de cálculo dos proventos, qualquer que seja a regra na qual o servidor venha a se aposentar, seja o inciso I, II ou III do mencionado § 4º, observar-se-á a data do implemento dos requisitos e não a data de seu ingresso no Serviço Público. Se implementou antes do dia 20/02/2004, data de publicação da MP nº 167, o cálculo se dará com base na integralidade. Se após, o cálculo se dará com base na média aritmética simples. Vale lembrar que foi com a MP nº 167 de 20/02/2004 que, efetivamente, a integralidade pereceu, dando lugar ao cálculo pela média das contribuições.

Portanto, o fato de ser uma aposentadoria especial, com requisitos e critérios diferenciados para a concessão da aposentadoria, não implica dizer que o critério de cálculo seja também especial, com base na integralidade. Esta, como já dito acima, foi extinta com o advento da MP nº 167/04. O § 4º nada mais é do que uma exceção aos requisitos normalmente exigidos dos servidores que se aposentam pela regra voluntária permanente, insculpida na alínea “a” do inciso III do §1º do art. 40 da CF/88. As regras permanentes, após o advento da MP nº 167/04, submetem-se ao cálculo pela média da vida contributiva do servidor e o reajuste dos proventos se dá na forma da lei.

Somente as regras de transição garantem aposentadoria com integralidade e paridade. Os três incisos do §4º não são regras de transição. Eles apenas garantem ao servidor o direito de se aposentar com requisitos mais brandos, tempo a menor, face às circunstâncias desfavoráveis em que desempenham suas funções.

É certo que o servidor que lançar mão de qualquer um dos incisos do §4º para se aposentar deve ter em mente que só se aposentará com integralidade, que nada mais é do que se aposentar com a totalidade da atual remuneração do cargo, se tiver preenchido os requisitos da regra antes da MP nº 167/04.

Destarte, em que pese ser merecida a adoção de critérios e requisitos mais brandos para a aposentadoria do servidor que exerce atividade pública submetido a condições pessoais e ambientais desfavoráveis, não podemos olvidar que, além desta merecida vantagem, seria demasiadamente benevolente, cara e diferenciada, se esta aposentadoria também garantisse integralidade e paridade.

Se assim fosse, o servidor contribuiria por menos tempo e se aposentadoria com a totalidade da última remuneração, integralidade e ainda com direito à paridade, já que ambas são irmãs siamesas. Seria uma super regra de aposentadoria. Mas não nos parece, entretanto, ter sido este o alcance que o legislador quis emprestar ao §4º do art. 40 da CF/88. Este dispositivo constitucional, portanto, limita-se a prever critérios diferenciados em relação à regra normal para a concessão do benefício, e não para o seu cálculo.

Dada a dificuldade de compreensão do tema aqui abordado, volta e meia surgem decisões judiciais, data maxima venia, equivocadas quanto à aplicação da integralidade nas aposentadorias concedidas com base nos incisos do §4º do art. 40 da CF/88.

A título de exemplo, em casos de aposentadoria com base no inciso II do §4º do art. 40 da CF/88, há decisões judiciais que determinam que seja feito o cálculo com base na integralidade (totalidade da atual remuneração do servidor no cargo efetivo), só porque o inciso II do art. 1º da LC nº 51/85 estabelece que esta aposentadoria se dará com proventos integrais. Ora, trata-se aqui de uma clássica confusão entre o que é “aposentadoria com provento integral” e o que é “integralidade”. São institutos que não se confundem, embora, devamos reconhecer, bem parecidos.

O provento integral a qual se refere o inciso II do art. 1º da LC nº 51/85 tem lugar quando o servidor policial implementar 30 anos de contribuição, se homem, e 25, se mulher. Neste caso, o provento será integral, pois implementou-se todos os anos de contribuição exigidos na norma. O servidor implementa 30/30 avos = 1, cuja divisão resulta em um número inteiro, um. Preenche, portanto, 100% do tempo de contribuição exigido em lei.

Já a integralidade é o direito de multiplicar o resultado da operação anterior, isto é, os 30/30 avos = 1, pelo valor de sua última e atual remuneração no cargo efetivo, isto é, pela remuneração constante em seu atual contracheque. Não se olha para o histórico contributivo do servidor. Não se pergunta pela média do seu histórico de contribuições. Se sua atual remuneração for de R$ 2.000,00, multiplica-se R$ 2.000,00 por 1 = R$ 2.000,00. Assim, o servidor leva tudo para a aposentadoria, tudo que for do cargo, evidentemente. Não há o decréscimo de valores que um cálculo pela média poderia provocar.

Portanto, não se pode emprestar ao inciso II do art. 1º da LC nº 51/85 o poder que ele não tem. É necessário que o estudo seja mais aprofundado nesta questão, antes de se proferir uma decisão que venha a conceder um direito que o servidor não tem.

Outro equívoco muito comum nas decisões judiciais, diz respeito à aposentadoria especial do inciso III do §4º do art. 40 da CF/88. Como neste caso, a teor da Súmula Vinculante do STF nº 33, aplicam-se as regras do RGPS, mais precisamente o art. 57 da Lei nº 8.213/91, que, em seu § 1º, estabelece que a aposentadoria especial consistirá numa renda mensal equivalente a 100% do salário de benefício, alguns menos atentos creem tratar-se de permissão para calcular-se a aposentadoria com base na integralidade.

Esquecem-se, entretanto, que, mesmo que fôssemos fazer o cálculo com base no §1º do citado art. 57 - o que é, diga-se de passagem, um erro, pois o comando do inciso III do §4º do art. 40 da CF/88 pega emprestado apenas os requisitos para a concessão de aposentadoria do art. 57, e não os critérios de cálculo – o salário de benefício no RGPS é apurado calculando-se a média aritmética simples, da mesma forma como é feito no RPPS. Desta feita, seja como for, ou à moda RGPS ou à moda RPPS, o cálculo sempre haverá de ser pela média, afastando-se, portanto, a integralidade. Média e integralidade são como óleo e água: não se misturam. Ou é um ou é o outro.

O próprio Ministério da Previdência Social, que tem por lei, a prerrogativa de emitir normas para orientar a aplicação das regras do RPPS, ao editar a NOTA TÉCNICA Nº 02/2014/CGNAL/DRPSP/SPPS/MPS, estabeleceu nestes termos a forma de cálculo da aposentadoria especial concedida com base no inciso III do §4º do art. 40 da CF/88, “verbis”:   

“III- DAS REGRAS DE CÁLCULO E REAJUSTAMENTO DOS PROVENTOS

76. A regra geral vigente para o cálculo dos proventos das aposentadorias concedidas conforme o art. 40 da Constituição Federal, entre as quais estão as aposentadorias especiais previstas no § 4º desse artigo, foi estabelecida no art. 1º da Lei nº 10.887, de 2004, que disciplinou o cálculo dos proventos das aposentadorias, conforme determinado pelos §§ 3º e 17 do art. 40 da Constituição Federal, na redação dada pela Emenda Constitucional nº 41, de 2003, a seguir:

Art. 40. ...........................................................................................

§ 3º Para o cálculo dos proventos de aposentadoria, por ocasião da sua concessão, serão consideradas as remunerações utilizadas como base para as contribuições do servidor aos regimes de previdência de que tratam este artigo e o art. 201, na forma da lei. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 41, de 19/12/2003)

(...............)

§ 17. Todos os valores de remuneração considerados para o cálculo do benefício previsto no § 3º serão devidamente atualizados, na forma da lei. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 41, de 19/12/2003)

(...............)

77. O art. 1º da Lei nº 10.887, de 2004, válido no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, estabelece que:

Art. 1º No cálculo dos proventos de aposentadoria dos servidores titulares de cargo efetivo de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, previsto no § 3º do art. 40 da Constituição Federal e no art. 2º da Emenda Constitucional nº 41, de 19 de dezembro de 2003, será considerada a média aritmética simples das maiores remunerações, utilizadas como base para as contribuições do servidor aos regimes de previdência a que esteve vinculado, correspondentes a 80% (oitenta por cento) de todo o período contributivo desde a competência julho de 1994 ou desde a do início da contribuição, se posterior àquela competência.

§ 1º As remunerações consideradas no cálculo do valor inicial dos proventos terão os seus valores atualizados mês a mês de acordo com a variação integral do índice fixado para a atualização dos salários-de-contribuição considerados no cálculo dos benefícios do regime geral de previdência social.

(...............)

§ 5º Os proventos, calculados de acordo com o caput deste artigo, por ocasião de sua concessão, não poderão ser inferiores ao valor do salário-mínimo nem exceder a remuneração do respectivo servidor no cargo efetivo em que se deu a aposentadoria.

(...............)

78. Além disso, todos os proventos das aposentadorias concedidas com fundamento no art. 40 da Constituição Federal, na redação da Emenda nº 41, de 2003, devem, em obediência ao que dispõe a redação vigente do § 8º desse artigo, ser reajustados de forma a preservar-lhes, em caráter permanente, o valor real, in verbis21:

Art. 40. ................................................................................................

§ 8º É assegurado o reajustamento dos benefícios para preservar-lhes, em caráter permanente, o valor real, conforme critérios estabelecidos em lei. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 41, de 19/12/2003)

(...............)

79. Portanto, às aposentadorias especiais previstas no § 4º do art. 40,aplicam-se os §§ 3º e 17 (disciplinado pelo art. 1º da Lei nº 10.887, de 2004) e o § 8º do art. 40 da Constituição Federal. A propósito, as regras gerais de cálculo e de reajustamento aplicáveis aos proventos dos servidores são similares àquelas definidas no âmbito do RGPS, conforme estabelecido nos arts. 28, 29 e 41-A da Lei nº 8.213, de 1991. Portanto, não há possibilidade de aplicação de outras regras para o cálculo e revisão das aposentadorias especiais independentemente da data de ingresso do servidor no serviço público, em cargo efetivo.

80. Nas regras de cálculo dos proventos das aposentadorias especiais, incluem-se também o disposto nos §§ 14, 15 e 16 do art. 40 da Constituição Federal, que tratam das condições para aplicação do valor correspondente ao teto de benefícios do RGPS às aposentadorias e pensões. A aplicação desse limite dependerá da criação do regime de previdência complementar em cada ente da federação.”

Assim sendo, repitamos, embora sendo bastante louvável a pretensão do legislador de oferecer condições mais favoráveis e mais rápidas de aposentadoria àqueles que desempenham suas funções submetidos a condições que prejudiquem a saúde ou a integridade física, não podemos deixar de considerar que o direito ao cálculo pela integralidade e paridade deve ser reservado apenas ao servidor que conseguiu implementar os requisitos de qualquer um dos três incisos do §4º, até o advento da MP nº 167 de 20/02/2004. Após esta data, o servidor só poderá ter integralidade e paridade se implementar os rigorosos requisitos estipulados nas regras de transição do art. 6º da EC nº 41/03 e do art. 3º da EC nº 47/05.

E, por fim, apenas para aliviarmos o rigor da opinião expendida neste opúsculo e para acariciarmos os que com ela não concordam, mesmo que consideremos não fazer sentido o legislador conceder uma aposentadoria com critérios mais fáceis de serem alcançados para quem está submetido a uma situação desfavorável de trabalho e, na outra ponta, negar-lhe o direito a um cálculo mais favorável (o que poderiam chamar alguns de um meio direito, um direito mitigado, incompleto), a única solução, caso o legislador venha a mudar de ideia e pretenda garantir integralidade e paridade a quem se aposentar com base no §4º do art. 40 da CF/88, será fazê-lo por meio de emenda constitucional, visto que, a nosso ver, a forma como a estrutura normativa constitucional hoje se apresenta não garante este direito ao servidor. 

Sobre o autor
Alex Sertão

Professor de RPPS.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SERTÃO, Alex. A forma de cálculo das aposentadorias especiais do §4º do art. 40 da Constituição Federal de 1988. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4443, 31 ago. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/42229. Acesso em: 5 nov. 2024.

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