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Holding familiar e proteção patrimonial

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Agenda 24/05/2016 às 14:46

3 O PAPEL DAS HOLDINGS NA PROTEÇÃO PATRIMONIAL

O interesse em constituir uma sociedade holding familiar para fins de proteção patrimonial advém dos riscos e custos vultosos decorrentes da manutenção de um acervo patrimonial considerável sob titularidade de pessoa(s) física(s).

Não obstante, verifica-se ainda a necessidade de dar solução aos proprietários de empresas familiares que desejam manter o controle das empresas na família, passando-o às gerações futuras.

De mais a mais, o desejo de reduzir a carga tributária, e ainda, de evitar tumultuados processos de sucessão são também razões que incentivam a constituição da sociedade em comento.

Nesta senda, a seguir explanar-se-á acerca do papel desempenhado pelas sociedades holdings familiares na resolução das referidas situações.

3.1 PLANEJAMENTO SUCESSÓRIO

Como exposto na introdução do presente trabalho, as empresas familiares representam atualmente números expressivos na economia global. E, apesar de tal quadro, desde as organizações menores a grandes grupos, não raro conhece-se alguma história de sucessão empresarial mal sucedida.

Por vezes a empresa familiar é comandada pelo mesmo gestor durante décadas, e, quando este vem a óbito repentinamente, seus sucessores – em muitos casos sem preparo profissional para assumir tal responsabilidade – acabam por desempenhar desastrosas administrações, que desencadeiam duras crises, ou ainda, a própria alienação da empresa a terceiros.

Desta forma, vislumbra-se a importância do planejamento sucessório para preservação da empresa familiar, bem como do controle da mesma nas “mãos” da família.

Neste sentido, como bem apontam Mamede e Mamede, aberta a sucessão, nos casos em que o autor da herança não deixa testamento, os herdeiros chamados à sucessão legítima desde logo enfrentam dificuldades:

Quando entre os bens há uma ou mais empresas, o desafio será (1) sua administração durante o inventário, já que os atos de gestão estarão afeitos ao processo de inventário, e (2) eventual disputa entre os herdeiros por suas partes no patrimônio, ou seja, por seus quinhões. Note que, com a divisão dos bens, há uma divisão da participação societária na(s) empresa(s). Se a família detinha 60% das quotas ou ações, quatro herdeiros irão deter, cada um, 15%, o que pode levar a um enfraquecimento do poder de controle. Há, ademais, o risco de que os herdeiros se engalfinhem numa disputa pela administração societária (MAMEDE e MAMEDE, 2014, pág. 83).

De outro norte, nos casos em que o autor da herança opta por deixar suas disposições de última vontade estabelecidas em testamento, enfrenta limitações impostas pela Lei, a exemplo do artigo 1.789, do Código Civil, que lhe permite dispor somente de metade de seu acervo patrimonial.

Contudo, admitindo-se que a existência do testamento possa resolver a questão da distribuição dos bens entre os herdeiros, evitando discussões neste sentido, em algumas situações não será possível – ou não será desejável – atribuir a participação societária a apenas um herdeiro, o que, de todo modo, poderá acarretar disputas pela administração da empresa.

Neste sentido, alertam Mamede e Mamede:

[...] o testamento permite apenas a divisão antecipada dos bens, incluindo participações societárias, respeitando o direito de cada herdeiro à sua parte legítima sobre o patrimônio. Não resolve o problema da empresa ou empresas, na medida em que não permite definir uma distribuição de funções no âmbito das unidades produtivas. E se essa distribuição deixou a dois ou mais herdeiros participações na sociedade, mantém-se grande a chance de que a abertura da sucessão seja seguida por uma disputa por poder pelos negócios. Como se só não bastasse, a divisão, entre dois ou mais herdeiros, da participação societária pode conduzir a uma fragmentação das quotas ou ações e, com ela, à perda do poder de controle que a família mantinha sobre o negócio (MAMEDE e MAMEDE, 2014, págs. 85/86).

A constituição de uma holding, por outro lado, tem o condão de elidir esses problemas, de modo a viabilizar a antecipação do procedimento de inventário, permitindo que o gestor decida em vida a sucessão do patrimônio e na empresa, determinando, inclusive, quem ficará responsável pela administração na sua falta, sem que os herdeiros sejam preteridos em seus direitos e a empresa fique sujeita à eventual inabilidade para a condução dos negócios familiares.

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Desta feita, tem-se que o planejamento sucessório pode ser realizado através do próprio instrumento de formalização da sociedade (estatuto ou contrato social) – integralizando-se o patrimônio pertencente à família em forma de capital social, de modo a evitar, também, a incidência do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação – ITCMD e demais custas afetas ao processo de inventário, traduzindo-se em vantagem tributária.

Com efeito, tal constituição societária poderá se dar nos seguintes moldes, conforme lecionam Mamede e Mamede:

A sucessão hereditária, assim, se fará não nos bens ou na empresa ou na participação societária na(s) sociedade(s) operacionais, mas na participação societária na holding. No entanto, será ainda preciso decidir se a transferência das quotas ou ações da sociedade de participação se fará antes ou após a morte. Se antes, a transferência se fará por doação, caracterizando adiantamento de legítima, ou seja, entrega antecipada da parte que caberá aos herdeiros necessários após a morte. [...] Se a preferência é a transferência após a morte, deve-se utilizar do testamento; assim o controle da holding se mantém com os ascendentes, sendo transferido para os descendentes apenas após a morte (MAMEDE e MAMEDE, 2014, págs. 87/88).

Ainda, é possível que se recorra ao instituto do usufruto, previsto nos artigos 1.390 e seguintes, do Código Civil, hipótese em que o gestor transfere tão somente a nua propriedade das quotas ou ações da holding aos herdeiros, mantendo-se na administração da holding enquanto viver, ostentando a condição de usufrutuário.

Por fim, vale dizer que, por ocasião da doação das quotas ou ações aos herdeiros, pode o gestor proteger o patrimônio de seus descendentes de eventuais impasses conjugais, gravando-as com cláusulas de incomunicabilidade e/ou inalienabilidade e, assim, excluindo-os da comunhão conjugal nos termos dos artigos 1.668 e 1.911, do Código Civil – respeitada a legítima (cf. art. 1.848, CC).

Contudo, importa ressaltar que a proteção acima mencionada somente é oponível a terceiros, tais quais os cônjuges e credores, quando tal cláusula for averbada no Registro Civil e no Registro Público de Empresas Mercantis, em atendimento à determinação do artigo 979, também do CC[4].

3.2 PLANEJAMENTO FISCAL E TRIBUTÁRIO

Diferentemente do que ocorre com os efeitos do planejamento sucessório na constituição da holding, que poderão ser vislumbrados de qualquer forma, quando do falecimento do gestor autor da herança, a realização de planejamento fiscal e tributário não é garantia de obtenção de vantagens fiscais em todo caso.

O resultado fiscal, neste tipo de planejamento, fica condicionado a uma boa análise do cenário fiscal aplicável ao tipo de patrimônio e à atividade empresarial desenvolvida pela família, combinada com uma acertada definição de qual situação seria mais vantajosa, sopesando-se minuciosamente todos os ônus e bônus que a indicação de determinada estrutura possa acarretar. Tal responsabilidade pesa, quase que totalmente, sobre os ombros do profissional especialista que assumir tal encargo.

Sobre o tema, recomendam Mamede e Mamede (2014, pág. 91): “é preciso compreender a realidade vivida pela empresa e seus sócios (a família), para aferir se a constituição de uma holding é uma vantagem. Em muitos casos, simplesmente não é”.

Com efeito, verificando-se vantagem em ver constituída a holding familiar para fins de obtenção de vantagens fiscais lícitas, o planejamento fiscal e tributário deverá se dar da nos seguintes moldes:

Inevitavelmente, o planejamento exige uma mudança na cultura da empresa. Desenvolvida a nova proposta fiscal, torna-se indispensável que os diversos setores da(s) empresa(s) vivenciem as práticas tributárias que foram recomendadas. [...] é indispensável que os administradores estejam comprometidos com os cenários que foram propostos pelo especialista e que sigam os parâmetros que foram traçados no plano de reestruturação (MAMEDE e MAMEDE, 2014, pág. 92).

Assim sendo, constata-se a indispensabilidade do comprometimento dos gestores, em manifesta relação de confiança para com o especialista responsável pelo planejamento, para que se verifiquem os resultados pretendidos.

Demais disso, a proposta fiscal a ser apresentada deverá conter o resultado do exame das oportunidades havidas no ordenamento jurídico brasileiro – extremamente dinâmico no que tange às normas e regulamentações tributárias – podendo, por exemplo, indicar a correção de eventuais práticas fiscais equivocadas adotadas pelas empresas analisadas, ou ainda, conter a recomendação de mudança da sede ou abertura de uma filial em local que haja incentivos para determinada atividade desenvolvida pela empresa familiar.

Ainda, poderá a proposta indicar o aproveitamento de vantagens tributárias à que a empresa faça jus e eventualmente venha ignorando; ou apontar a constatação de recolhimentos feitos à menor que devam ser confessados de forma imediata a fim de evitar eventuais atuações futuras.

Enfim, na proposta fiscal, poderá o especialista a quem se confiar a sua elaboração, inclusive, indicar, além dos exemplos de situações acima citados, o tipo societário e a natureza jurídica que a sociedade holding poderia adotar para obter as vantagens que se lhe apontar, bem como toda e qualquer conduta que possa trazer vantagem à família em termos fiscais e tributários de acordo com o tipo societário que desejarem adotar.


4 VANTAGENS E DESVANTAGENS

O leque de vantagens que se pode obter com a formação de uma holding familiar é bastante amplo, conforme já se mencionou por vezes nas considerações feitas ao norte; ao passo que obtendo-se de sua constituição o planejamento sucessório, fiscal e tributário, já se verifica clara proteção patrimonial para o acervo familiar. Não obstante, pode-se elencar inúmeros benefícios diretos obtidos mediante a constituição de uma holding familiar, a saber:

Enfim, as vantagens verificadas em razão da constituição de uma holding familiar são inúmeras, pelo que se optou por mencionar apenas algumas das que se classifica como mais expressivas.

Por outro lado, é inegável que algumas desvantagens podem ser observadas em razão da formação de uma holding familiar, mas, adianta-se: são de expressividade reduzida ao serem confrontadas com as vantagens. Vejamos:

Desta feita, sopesando-se as vantagens e desvantagens apuradas, é crível que, utilizando-se do próprio aprimoramento dos mecanismos adotados através dos planejamentos para a constituição da holding familiar, as desvantagens acima expostas podem ser superadas sem maiores embaraços.

Sobre o autor
Bruna Scinskas Richter

Bacharel em Direito pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná [Ago/2014]. Especialista em Direito Empresarial e Advocacia Empresarial pela Universidade Anhanguera-Uniderp [nov/2015]. Especialista em Direito Tributário também pela Universidade Anhanguera-Uniderp [mar/2016]. Advogada.<br>

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RICHTER, Bruna Scinskas. Holding familiar e proteção patrimonial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4710, 24 mai. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/49138. Acesso em: 2 mai. 2024.

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