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Os entraves para o desenvolvimento das energias renováveis no Brasil.

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O Brasil é privilegiado em recursos naturais que poderiam ser aproveitados como fontes geradoras de energia. Ocorre que existem entraves os quais dificultam a consolidação da produção de energias verdes no país nos âmbitos interno e externo.

RESUMO: A conscientização ambiental começou como uma resposta à industrialização e ao crescimento econômico. O aumento da exploração dos recursos naturais e, consequentemente, a maior liberação de resíduos poluentes, resultaram em impactos ambientais que, segundo fontes como o IPCC, alteraram o clima do planeta. Uma das soluções para amenizar tal problema seria a substituição da energia fóssil, predominantemente utilizada, por fontes energéticas mais limpas e renováveis. O Brasil é privilegiado em recursos naturais que poderiam ser aproveitados como fontes geradoras de energia. Ocorre, entretanto, que existem entraves os quais dificultam a consolidação da produção de energias verdes no país. Dessa forma, esse trabalho visa discutir tais problemáticas, tendo como ponto de vista o âmbito externo e interno do Brasil, que limitam o pleno desenvolvimento de importantes fontes energéticas renováveis, como a solar e a eólica.

PALAVRAS-CHAVE: Mudanças Climáticas. Energia Renovável. Patentes.


INTRODUÇÃO

A natureza morta não serve ao homem.[1] O desenvolvimento dos países está diretamente relacionado à exploração ambiental. Durante um longo período, o crescimento econômico foi buscado independentemente das consequências. Contudo, os danos causados ao meio ambiente, advindos dessa ânsia por lucro, começaram a modificar o clima mundial. A Terra parecia perder seu equilíbrio o que, consequentemente, levou a ambição humana a conhecer seu limite: a ameaça à existência do homem e a do próprio planeta.

Foi a partir da conscientização ambiental que as ideias de desenvolvimento e sustentabilidade começaram a ser aliadas. A preservação e conservação do meio ambiente entraram na pauta de discussão global, assim como as medidas que poderiam ser adotadas para abrandar os danos já existentes e impedir os futuros. Uma das soluções encontradas foi a diminuição do uso de energias fósseis, altamente poluentes e amplamente utilizadas, a partir do uso de fontes alternativas de energia.

O Brasil possui uma das matrizes energéticas mais limpas do mundo. O setor elétrico brasileiro, entretanto, ainda é fortemente dependente da energia hidráulica. Fontes renováveis de energia, tais quais a eólica e a solar, são exploradas eficientemente em outros países, mas encontram uma série de dificuldades para se desenvolverem no Brasil. A fim de avaliar tais dificuldades esse artigo foi construído.

O presente trabalho compõe-se, além desta introdução, de quatro capítulos. O primeiro aborda as mudanças climáticas ocorridas a partir da ação antrópica e que levaram à reconsideração das fontes energéticas utilizadas pelo mundo. O segundo é dedicado à análise da matriz energética brasileira e do seu grande potencial para o desenvolvimento de energias renováveis, o qual não é devidamente aproveitado. Os capítulos três e quatro abordam, respectivamente, a discussão sobre a possibilidade da propriedade intelectual e das patentes serem os reais entraves ao desenvolvimento sustentável, e de que forma a legislação está contribuindo para o desenvolvimento das tecnologias verdes no Brasil, além de analisar o exemplo alemão por meio de seu German Renewable Sources Act. Derradeiramente, são apresentadas as considerações finais.


1 MUDANÇAS CLIMÁTICAS E A NECESSIDADE DE UMA MATRIZ ENERGÉTICA VERDE

Em meados do século XVIII, começa na Inglaterra a Revolução Industrial. Uma das muitas novidades foi a introdução e uso de uma fonte de energia mais eficiente: os combustíveis fósseis – primeiramente o carvão e, em seguida, o petróleo. A substituição da manufatura pelas máquinas fabris acarretou radicais mudanças sociais e econômicas, principalmente na Europa. Houve, na época, um rápido crescimento populacional e a intensificação da saída do homem do campo para a cidade. O aumento demográfico gerou a expansão do mercado consumidor para bens manufaturados, o que forçava o aprimoramento das técnicas de produção a fim de atender a crescente demanda. Tal fato ocasionou o aumento da exploração dos recursos naturais, assim como dos resíduos poluentes. Foi nesse processo de urbanização e industrialização aceleradas que ocorreu o agravamento da situação ambiental, como observa Moradillo:

A forma como o homem vem utilizando os recursos naturais e os danos causados ao ambiente, tanto pela extração como pela utilização desses recursos, são motivos de preocupação desde a Revolução Industrial, ocorrida no século XVIII. O conjunto de eventos degradativos, potencializados pelos avanços tecnológicos, são os principais fatores nas mudanças ocorridas atualmente no ecossistema global, dentre eles o clima, a poluição e a extinção[2].

Na década de 50, as consequências da industrialização já podiam ser notadas. Os fenômenos conhecidos como smogs[3] ocorridos em Londres, Inglaterra, resultaram na morte de milhares de pessoas. Esse foi considerado um marco que mostrou ao mundo o impacto sofrido pelo meio ambiente.

Em 1968, políticos, físicos, industriais e cientistas juntaram-se para discutir a questão ambiental. Era o Clube de Roma, um grupo que visava discutir meio ambiente, sustentabilidade e desenvolvimento. Já em 1972, o Clube publicou o estudo Limites do Crescimento. Neste, foi feita uma projeção matemática sobre os efeitos do crescimento populacional sob o esgotamento dos recursos naturais, constatando que os limites do crescimento seriam alcançados em 100 anos. O estudo sofreu críticas pesadas e foi considerado alarmista.

Ainda em 1972, em Estocolmo, na Suécia, foi realizada a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, conhecida como a Conferência de Estocolmo. Esta foi a primeira conferência global voltada para o meio ambiente.

Os debates tiveram como resultado a Declaração sobre o Meio Ambiente Humano, uma carta de princípios de comportamento e responsabilidades que deveriam nortear as decisões sobre políticas ambientais. Um plano de ação também foi redigido e convocava os países, organismos das Nações Unidas e organizações internacionais a cooperarem na busca de soluções para os problemas ambientais.[4]

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Ela alertou os países sobre as consequências destrutivas que o crescimento econômico e a industrialização causavam à Terra. “Aproveitando a energia gerada pela Conferência, a Assembleia Geral criou, em dezembro de 1972, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA)”.[5]

Em 1987, em virtude do Relatório de Brundtland, chamado Nosso Futuro Comum, publicado pela Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, presidida por Gro Harlem Brundtland, mestre em saúde pública e então Primeira Ministra da Noruega, foi difundido o conceito de Desenvolvimento Sustentável. “O desenvolvimento sustentável é o desenvolvimento que encontra as necessidades atuais sem comprometer a habilidade das futuras gerações de atender suas próprias necessidades.”[6] O relatório, que sugeria a conciliação entre crescimento econômico e preservação ambiental, levou à discussões que desencadearam na realização da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, no Rio de Janeiro, em 1992. Na Cúpula da Terra, como ficou conhecida, ou Eco-92, foi estabelecido um plano de ação para aliar o desenvolvimento à sustentabilidade: a Agenda 21.

Na Agenda 21, os governos delinearam um programa detalhado para a ação para afastar o mundo do atual modelo insustentável de crescimento econômico, direcionando para atividades que protejam e renovem os recursos ambientais, no qual o crescimento e o desenvolvimento dependem. As áreas de ação incluem: proteger a atmosfera; combater o desmatamento, a perda de solo e a desertificação; prevenir a poluição da água e do ar; deter a destruição das populações de peixes e promover uma gestão segura dos resíduos tóxicos.[7]

Em 1988, o PNUMA e a Organização Meteorológica Mundial (OMM) criaram o Painel Intergovernamental para as Mudanças Climáticas (IPCC) que se tornou uma importante fonte científica de informações relacionadas às mudanças climáticas e aos impactos socioeconômicos que estas causariam. Um importante instrumento internacional para esse fim, a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC), foi adotada em 1994.

O Quarto Relatório do IPCC, o IPCC-AR4[8], publicado em 2007, atestava que havia cerca 90% de chance das alterações climáticas serem causadas pela ação antrópica. Segundo o Relatório, o aquecimento global é inequívoco e muitos dos distúrbios climáticos estão diretamente ligados ao aumento de emissões de gases de efeito estufa. Essas emissões teriam aumentado cerca de 70%, entre 1970 e 2004. “A principal fonte de aumento da concentração atmosférica de dióxido de carbono desde o período pré-industrial se deve ao uso de combustíveis fósseis, com a mudança no uso da terra contribuindo com uma parcela significativa, porém menor.”[9] Sendo o dióxido de carbono (CO2) o gás de efeito estufa mais importante, foi constatado, no estudo, que a taxa de aumento da concentração anual desse gás tem sido muito elevada. Se nada for feito, deverá acontecer um aumento destas emissões de CO2 entre 25-90% em 2030, com os combustíveis fósseis mantendo sua posição dominante no setor energético mundial até o dado ano.

De acordo com o IPCC-AR4, é necessária a mitigação de emissões de gases estufa, inclusive com a incorporação de modelos de desenvolvimento sustentável. Dentre as principais medidas de mitigação de emissões para estabilizar as concentrações de gases estufa, estão consideradas, entre outras, a diminuição do uso de fontes fósseis na geração e uso de energia e a adoção de fontes energéticas renováveis.

De fato, o primeiro grande esforço mundial para diminuir a emissão de gases de efeito estufa foi feito com a celebração do Protocolo de Quioto em 1997. Esse acordo estabelece normas para determinados países industrializados reduzirem a emissão de gases-estufa. Expiraria no final de 2012, contudo, foi acertada a extensão da validade do protocolo para até 2020, durante a Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP 18), em Doha, no Qatar, também em 2012. A extensão do acordo foi ratificada apenas por 36 países[10], os quais só correspondem a cerca de 15% das emissões de gases estufa no mundo.

O Brasil, como outros países em desenvolvimento, não precisou cumprir as metas do Protocolo de Quioto. Em 2009, entretanto, em Copenhague, durante a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP15, o País apresentou metas voluntárias para reduzir a emissão de gases de efeito estufa entre 36,1% - 38,9% até 2020 (em relação ao que emitia em 1990).[11] Tais metas voluntárias foram incluídas na Política Nacional sobre Mudança do Clima, legislação adotada ainda em 2009. Uma delas é concernente às fontes alternativas de energia, com a extensão da redução estimada de emissão de toneladas de carbono de 26 a 33 milhões.

Sabe-se que o Brasil é privilegiado em recursos naturais, o que, por si só, é um estímulo ao incremento de fontes limpas de energia que poderiam auxiliar o País no cumprimento das metas assumidas na COP15. Entretanto, apesar de a matriz energética brasileira ser considerada verde, ela ainda é fortemente atrelada à fonte hídrica de energia, enquanto as demais fontes alternativas não são plenamente exploradas.


2 POTENCIAL ENERGÉTICO BRASILEIRO: SUBAPROVEITAMENTO DE FONTES ALTERNATIVAS

O Brasil possui uma das matrizes energéticas mais renováveis do mundo. Na matriz de demanda total de energia do Brasil de 2012, o petróleo respondeu por 39,4%, o gás natural por 11,5%, e o carvão mineral por 5,4%, perfazendo um total 56,3% de combustíveis fósseis. Nas fontes renováveis, a hidráulica contribuiu com 13,9%, os produtos da cana com 15,4%, a lenha com 9,1% e outras bioenergias com 3,9%, somando 42,3% de renováveis. A participação da energia nuclear ficou em 1,4%.[12] A participação de energias renováveis no País está muito acima da média mundial, de 13,3% conforme a Agência Internacional de Energia. Até 2021, os estudos do Ministério de Minas e Energia (MME) mostram a manutenção das fontes renováveis na matriz de energia, acima de 44%.

Quanto à emissão de carbono, a economia brasileira, em 2011, foi cerca de duas vezes menos intensa nesse aspecto do que a economia americana, 1,4 vezes menos que a economia europeia, e 2,8 vezes menos do que a economia chinesa.[13] Em termos de emissão por habitante, cada brasileiro, produzindo e consumindo energia, emitiu quatro vezes menos do que um europeu, nove vezes menos do que um americano e menos da metade do que emitiu um chinês. Para produzir 1 TWh, o setor elétrico brasileiro emite 8 vezes menos do que o setor elétrico americano, 5 vezes menos que o europeu e 12 vezes menos do que o chinês.[14]

A energia elétrica é a fonte mais nobre, considerando os aspectos técnicos, econômicos e socioambientais, e a que mais contribui, de maneira significativa, para o desenvolvimento e o bem-estar da sociedade. Considerando-se apenas a matriz de oferta interna de energia elétrica, em 2012, a oferta hidráulica respondeu por 77,5%, a biomassa por 5,9% e a eólica por 0,8%, somando 84,2% de renováveis.[15]

A geração de energia elétrica do país, como se constata, é fortemente ligada às usinas hidrelétricas. Segundo o Ministério de Minas e Energia:

O Brasil optou pela hidroeletricidade, por esta fonte oferecer condições mais favoráveis para fazer frente ao crescimento socioeconômico previsto para os próximos anos, em termos de custo (competitividade econômica), viabilidade ambiental, índice de emissões de gases do efeito estufa e confiabilidade no suprimento.[16]

Fontes alternativas de energia, como a eólica e a solar, têm participação mínima no setor elétrico e irrisória na matriz energética nacional. Segundo “O setor elétrico brasileiro e a sustentabilidade no século 21: oportunidades e desafios”, relatório elaborado por organizações não governamentais[17] e publicado em 2012, se fosse aproveitada a luz solar para consumo elétrico em menos de 3% da área urbanizada do Brasil, seria possível atender a 10% de toda a demanda atual de energia elétrica do país. Da mesma forma, segundo dados do Atlas Eólico Brasileiro, o país tem potencial para gerar 143 GW apenas com a força dos ventos, número que é 12 vezes maior que a capacidade instalada da futura usina hidrelétrica de Belo Monte, em construção no Rio Xingu, no Pará.[18]

O Brasil não consegue explorar efetivamente o potencial eólico e solar que possui, o que poderia afastar de vez o risco de racionamento cada vez que o nível dos principais reservatórios baixa com a escassez de chuvas. Os principais entraves para o aproveitamento pleno e expansão das energias eólica e solar estão relacionadas, principalmente, aos altos custos decorrentes da sua utilização e à falta de políticas públicas eficientes que as consolidem.

A participação do setor privado na modificação da matriz energética é vital. Para que os operadores econômicos decidam investir no setor, importante é que a ordem jurídica promova e incentive investimentos em novas tecnologias, assegurando aos investidores um ambiente de negócios favorável, com segurança jurídica. Contudo, como se verá adiante, o valor central que deve prevalecer é o desenvolvimento sustentável.


3 PROPRIEDADE INTELECTUAL E PATENTE: REAIS DIFICULDADES PARA A APLICAÇÃO DAS TECNOLOGIAS VERDES?

A busca de tecnologias verdes se tornou indispensável no atual contexto de degradação ambiental, apesar de seus altos custos de utilização e investimento. É acertado o pensamento de que

[...] os impactos causados pela tecnologia constituem na verdade reflexo da utilidade que o homem decide dar a elas... Neste cenário, as tecnologias verdes apresentam-se como uma reação ao uso indiscriminado que até os dias de hoje se fez das tecnologias.[19]

João Bilhim aduz:

Só recentemente se compreendeu que a natureza não é desordem, passividade, meio amorfo – constitui uma totalidade complexa; e que o homem não é uma entidade isolada em relação a essa totalidade... Trata-se de fazer emergir a ciência do homem e, simultaneamente, de fazer nascer uma nova concepção da ciência que conteste e perturbe as fronteiras estabelecidas, as pedras mestras dos paradigmas teóricos e da própria instituição científica.[20]

A tecnologia é entendida como conjunto de conhecimentos técnicos que se aplicam a um determinado ramo de atividade industrial/comercial.[21] Os países desenvolvidos investem grandes somas de dinheiro para a produção dessas tecnologias e, como meio de proteção, recorrem às patentes. Estas são consideradas formas de proteção à propriedade intelectual, são análogas a um contrato entre a sociedade e os inventores e garante a estes o direito de impedir, por determinado lapso temporal, que outros fabriquem, usem ou vendam seu trabalho intelectual.[22] Já os países em desenvolvimento, sem possuir o investimento em tecnologias e pesquisas nivelado com aqueles, são tidos normalmente como receptores dessas invenções, possuindo uma posição aparentemente confortável que gera desconfianças dos produtores. Karina Correa Pereira ressalta essa diferença de conceitos e afirma que

[...] por essa razão, o que acontece na prática é que países desenvolvidos olham com muita cautela para os países em que pretendem licenciar ou transferir suas tecnologias e impõem o maior número de restrições possíveis para que possam se assegurar de que seus contratos sejam respeitados, uma vez que desconfiam da capacidade dos governos locais de colocar em prática a legislação que está no papel.[23]

É problemático, porém, pensar numa mera transferência de energia se essa não vier acompanhada de incentivos à indústria e à pesquisa. No entendimento de José Carlos Vaz e Dias, contratos de transferência são acordos verbais ou expressos que visam o desenvolvimento de inovações, exploração temporária de direitos e, também, o ensinamento de conhecimento técnico para terceiros.[24] A posição de países como o Brasil é de que a proteção do direito imaterial dos criadores dessas tecnologias constitui empecilho à proteção ambiental. Já países desenvolvidos, como os Estados Unidos, defendem que isso incentivará a criação de novas tecnologias e sua posterior transferência.[25] Essa colisão de conceitos é o que se caracteriza como o verdadeiro entrave ao desenvolvimento sustentável. O ideal seria não uma mera transferência contendo um lado criador e outro lado receptor, mas sim um compartilhamento de tecnologias e ideias.

É impensável a propriedade intelectual desvencilhada de impactos sobre a população miserável do globo.[26] Entretanto, é necessária a proteção do direito dos inventores, tendo em vista que este é o incentivo aos pesquisadores para a criação de novas tecnologias. À cooperação entre o público e o privado resta o papel de atenuar esse conflito e de “levar a humanidade à superação destes problemas e ao desenvolvimento conjunto de todas as nações, garantindo a própria sustentabilidade dos seres humanos.”[27]

O País tem investido nos últimos anos em pesquisas nas áreas de tecnologias verdes, entretanto, por não ser pioneiro nessa área, tem enfrentado certas dificuldades concernentes à proteção da propriedade intelectual alienígena. Com isso, para a propriedade imaterial não constituir um entrave ao desenvolvimento sustentável, no pensamento de Marcos Wachowicz, Heloisa Medeiros e Amanda Madureira, é necessário repensar seus princípios justificadores e assim atribuí-la nova legitimidade, sendo submetida ao requisito do desenvolvimento sustentável. [28]

3.1 LICENCIAMENTO COMPULSÓRIO DE PATENTE

Invenção caracteriza-se por um aperfeiçoamento de certa ideia ou técnica. Já descoberta é “a revelação ou identificação de fenômeno existente na natureza, alcançada através da capacidade de observação científica do homem, atribuindo às descobertas a qualidade de constituir a herança da humanidade.”[29]

A propriedade, tida na concepção romana como o jus utendi fruendi et abutendi, recebe restrições no direito moderno devido à sua função social, estabelecida pela Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5°, XXIII. Ressaltando esse aspecto, há pressões por parte dos países em desenvolvimento para o compartilhamento de tecnologias dos países detentores das mesmas.

O licenciamento compulsório, vulgarmente conhecido como quebra patentária, é visto por alguns como forma de aplicação da função social da propriedade. Este deve ser utilizado conforme o interesse público e os acordos internacionais, ressaltando assim que o princípio da proporcionalidade (interesse coletivo x proteção da propriedade) é o norteador da sua utilização.[30] Sua legitimidade pode ser retirada do texto constitucional que em seu artigo 173, caput, aduz: “[...] a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo [...]”, além do seu parágrafo 4º: “A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário do lucro.”

Resta agora analisar se o licenciamento compulsório de tecnologias verdes atende ao imperativo do relevante interesse coletivo e da segurança nacional. Além de sopesar se compensa colocar em risco a confiança já abalada dos países desenvolvidos por uma licença “outorgada”. É importante ressaltar que se deve superar o entendimento que apenas países em desenvolvimento o utilizam, uma vez que há vários registros de países como os Estados Unidos que se valem desse instituto. Milton Barcellos ressalta que

[...] o uso procedimental correto do instituto da licença compulsória certamente elevará as qualidades do Brasil como um País que cumpre os Acordos Internacionais, mas que não é submisso às pressões comerciais impostas pelos Países desenvolvidos e seus nacionais.[31]

O investimento em tecnologias renováveis é, indubitavelmente, de interesse da população. Entretanto, é possível a existência de sacrifícios injustos realizados por uma inoperância no cumprimento do exigível dever estatal.[32] Também, é possível que a proteção do direito imaterial constitua real empecilho ao desenvolvimento sustentável. Com isso, cabe ao governo o sopesamento dessas duas realidades para posteriormente tomar decisões. Ao analisar o histórico de licenciamentos compulsórios realizados pelo País, percebe-se que foi utilizado primordialmente nos casos farmacêuticos, ressaltando assim que o Brasil ainda precisa fazer reais investimentos em pesquisa de energias renováveis para poder depois pensar no cabimento desse método.

Sobre as autoras
Camila Machado Lima

Advogada na área de Direito Público. Pós-Graduanda em Direito Administrativo pela PUC Minas. Bacharela em Direito pela Universidade Federal do Ceará (2016). Membro da Comissão de Estudos Constitucionais OAB-CE.

Lia Carolina Vasconcelos Camurça

Advogada. Bacharela em Direito pela Universidade Federal do Ceará (2016).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, Camila Machado; CAMURÇA, Lia Carolina Vasconcelos. Os entraves para o desenvolvimento das energias renováveis no Brasil.: Uma abordagem sobre o incentivo à inovação tecnológica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5118, 6 jul. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/58916. Acesso em: 2 nov. 2024.

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