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A inocuidade dos atos administrativos punitivos do Procon e a intervenção do Poder Judiciário

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Agenda 20/12/2018 às 17:24

3. A COMPETÊNCIA DO PROCON QUANTO A APLICAÇÃO DE PENALIDADES 

O aumento da população nos centros urbanos ocasionou uma elevada e intensa necessidade em adquirir produtos e serviços, impulsionando as relações de consumo, e, consequentemente, acentuando transtornos a elas relacionados, como exploração dos consumidores e práticas abusivas e enganosas.

Destarte, em virtude disso, o Estado Brasileiro, juntamente com os estados e municípios, viram-se obrigados a intervirem para assegurar aos consumidores direitos e proteção especializada.

Nesta senda, foram criados os Programas de Proteção aos Consumidores dotados de autonomia funcional e poder de polícia para a aplicação de penalidades administrativas. 

3.1 O Programa de Proteção ao Consumidor (PROCON) e sua natureza jurídica 

O PROCON é uma autarquia, ente administrativo, fruto da descentralização da Administração Pública. Essa descentralização ocorre através da transferência de determinada atribuição estatal, criando órgãos não dotados de subordinação. Nesse sentido Gasparini dissertou que “as autarquias são detentoras, em nome próprio, de direitos e obrigações, poderes e deveres, prerrogativas e responsabilidades.”[35]

As autarquias são órgãos que fazem parte da Administração Pública Indireta ou descentralizada, e são criadas como mecanismos de especialização, por isso possuem autonomia administrativa e financeira.

Caracterizam-se por ter patrimônio próprio, apesar de seus bens serem considerados públicos para efeitos legais.  Ademais, por terem gestão financeira própria, seus encargos e receitas não se misturam à Administração Pública.

Não há que se falar em instância superior administrativa revisora das decisões administrativas das autarquias, em razão de não haver subordinação entre elas e a Administração Pública, e sim vinculação, por meio da qual a Administração apenas verifica o cumprimento das funções que lhe foram atribuídas, realizando controle finalístico.

Os PROCONs são meios criados para atuarem de forma administrativa na conciliação de conflitos das relações de consumo, objetivando a diminuição das demandas judiciais e celeridade na resolução dos conflitos.

Estes órgãos possuem autonomia funcional e poder polícia, devendo ser regulados por regras específicas. Dessa forma, faz-se necessário a elaboração de normas complementares pelos estados e municípios. Sobre o assunto, Eduardo de Souza Floriano explanou que:

Considerando a autonomia municipal e o poder de autorregulamentação, além do fato de que o Decreto nº 2.181/97 dispõe apenas sobre regras gerais de processo administrativo, é de extrema relevância que cada município elabore regras complementares sobre o processo administrativo no seu âmbito de atuação, de modo a formatá-lo à estruturação, às competências do órgão executivo e, ainda, ao quadro de pessoal que o compõe.[36]

A legislação regula os PROCONs de forma geral, sendo imprescindível que sua área e meios de atuação sejam regulados por legislações estaduais e municipais, para que se adequem a realidade estadual e municipal.

A existência de um PROCON em determinada localidade, pressupõe a aprovação através de um decreto ou lei, onde estarão definidas suas condições de funcionamento e demonstra a sua importância no meio social.

Vale ressaltar que a criação do Procon Municipal é de grande importância para todos os munícipes, tendo em vista ser meio de coibir abusos por parte dos fornecedores e prestadores de serviço. Com a existência do Procon Municipal, as relações de consumo serão mais transparentes, fazendo com que o consumidor sinta-se seguro e protegido.[37]

A criação do PROCON objetiva executar medidas que estreitam o vínculo desse órgão tanto para com a sociedade, quanto em relação ao Poder Judiciário. Monteiro Filho salientou que:

Partiu-se da premissa de que a troca de experiências com a esfera administrativa poderia representar um ponto intermediário fundamental no relacionamento entre as empresas e o Poder Judiciário, além de o processo administrativo constituir um relevante filtro à entrada de novos feitos judiciais.[38]

Os PROCONs, são considerados meios de solução de conflitos através da mediação e conciliação administrativas, contribuindo para a diminuição das demandas judiciais e funcionando como uma instância de instrução e julgamento de poderes limitados. Estes órgãos são responsáveis pelo atendimento à população e pela fiscalização das relações de consumo. O Decreto n° 2.181/97 fixou competências aos PROCONs, a saber:

I - planejar, elaborar, propor, coordenar e executar a política estadual, do Distrito Federal e municipal de proteção e defesa do consumidor, nas suas respectivas áreas de atuação;

II - dar atendimento aos consumidores, processando, regularmente, as reclamações fundamentadas;

III - fiscalizar as relações de consumo;

IV - funcionar, no processo administrativo, como instância de instrução e julgamento, no âmbito de sua competência, dentro das regras fixadas pela Lei nº 8.078, de 1990, pela legislação complementar e por este Decreto;

V - elaborar e divulgar anualmente, no âmbito de sua competência, o cadastro de reclamações fundamentadas contra fornecedores de produtos e serviços, de que trata o art. 44 da Lei no 8.078, de 1990 e remeter cópia à Secretaria Nacional do Consumidor do Ministério da Justiça;

VI - desenvolver outras atividades compatíveis com suas finalidades.[39]

Veja que essas atribuições do PROCON colocam no centro, a proteção do consumidor e nas diferentes situações em que ele se encontra na relação de consumo.

Quanto ao Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (Sindec), Eduardo de Souza salienta que:

O Sindec é, portanto, instrumento facilitador da ação dos Procons, já que permite atendimento mais intuitivo das demandas dos consumidores, além da uniformização da inserção dos dados no sistema, permitindo rápido e eficiente acesso a relatórios temáticos em âmbito nacional, estadual e municipal, o que possibilita a elaboração de eficazes políticas de proteção ao consumidor.[40]

O SINDEC permite a consulta dos dados registrados em âmbito nacional, sejam de atendimentos, reclamações instauradas, cartas de informações preliminares, simples consultas ou atendimentos extra PROCONs.

José Geraldo Brito Filomeno cita o objetivo da criação dos PROCONs explicando que os mesmos “visam ao atendimento do consumidor, equacionamento de suas queixas, tentativa de resolução, orientação e encaminhamento a outros órgãos para a devida apreciação do caso específico e adoção das medidas cabíveis.”[41]

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Tratou-se, de foram geral, sobre a finalidade destes órgãos para atendimentos iniciais de casos que se caracterizam como relação de consumo e o encaminhamento dos que não se encaixam.

Na lição de Antônio Herman V. Benjamin, Cláudia Lima Marques e Leonardo Roscoe Bessa sua principal atribuição é “aplicar, diretamente, as sanções administrativas aos fornecedores que violam as normas de proteção ao consumidor.”[42]

Os PROCONs têm legitimidade para aplicar penalidades administrativas aos fornecedores que infringem a legislação consumerista, através de seu poder de polícia, em favor do interesse público.

3.2              O poder de polícia do PROCON

O poder de polícia consiste na limitação dos interesses particulares em prol da coletividade, tratando-se de uma atividade fim da administração, de elevada importância para a preservação do interesse público.

Para Hely Lopes Meirelles, o poder de polícia é “a faculdade de que dispõe a Administração Pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades, e direitos individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado.”[43]

Este poder é a ferramenta de frenagem de que possui a Administração Pública, para conter os abusos do direito individual, se norteando no princípio da supremacia do interesse público sobre o privado.

O artigo 78 do Código Tributário Nacional conceitua poder de polícia como:

Artigo 78. Considera-se poder de polícia atividade da Administração Pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.

Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder.[44]

Assim, o poder de polícia é atividade administrativa, sendo a atuação da Administração Pública subordinada à ordem jurídica, regida pelo ordenamento jurídico vigente, acarretando limitação direta a direitos de particulares, abrangendo a imposição de sanções em caso de desatendimento a ordem.

Exemplos da atuação da Administração através do poder de polícia é demonstrado quando expede alvarás, realizada inspeções e vistorias, interdita edificações ou estabelecimentos comerciais que se encontram em situação irregular, aplicação de multas de trânsito, apreensão de mercadorias, guinchamento de veículos, etc.

O exercício do poder de polícia, em se tratando da defesa administrativa do consumidor, revela-se pela imposição de deveres positivos e negativos, sobretudo de informação ao consumidor. Acerca disso, Bruno Miragem elucida que:

Na defesa do consumidor, equivale dizer que a proteção contra a publicidade enganosa, por exemplo, tanto pode se dar pela proibição desta modalidade de publicidade, que deixe de conter as informações constantes do artigo 37, §1°, do CDC, quanto o estabelecimento de informações consideradas essenciais que, detalhando o preceito legal, realizem o direito subjetivo à informação do consumidor, o que poderia ser viabilizado através de uma portaria, por exemplo.[45]

O PROCON, em sua atividade fiscalizatória, tem o seu poder de polícia balizado por força de lei que determina como uma de suas competências fiscalizar as relações de consumo ocorridas entre consumidores e fornecedores.

O poder de polícia administrativa do PROCON, é, frequentemente confundido com o poder de polícia das agências reguladoras. Para melhor elucidação tem-se o recurso especial:

Processo civil. Consumidor. Embargos à execução fiscal. Multa aplicada pelo Procon. Divergência jurisprudencial. Ausência de similitude fática. Não conhecimento. Omissão. Inexistência. Dosimetria da sanção. Validade da CDA. Reexame de matéria fática. Súmula 7 (MIX\2010\1261) do STJ. Competência do Procon. Atuação da Anatel. Compatibilidade.

(…)

5. Sempre que condutas praticadas no mercado de consumo atingirem diretamente o interesse de consumidores, é legítima a atuação do Procon para aplicar as sanções administrativas previstas em lei, no regular exercício do poder de polícia que lhe foi conferido no âmbito do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor. Tal atuação, no entanto, não exclui nem se confunde com o exercício da atividade regulatória setorial realizada pelas agências criadas por lei, cuja preocupação não se restringe à tutela particular do consumidor, mas abrange a execução do serviço público em seus vários aspectos, a exemplo, da continuidade e universalização do serviço, da preservação do equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão e da modicidade tarifária. (…)[46]

É possível extrair o entendimento de que o PROCON fica restrito à aplicação das sanções administrativas no âmbito do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, nos termos previstos no CDC. Sendo assim, não deve-se confundir a atividade regulatória das agências reguladoras, que possui caráter normativo, devendo ser obedecido pelos fornecedores de cada atividade específica, com a atividade fiscalizadora do PROCON, que será restrita às condutas praticadas nas relações de consumo.

É fundamental que as empresas ofereçam atendimento adequado, de qualidade e transparente aos consumidores, como modo de prevenção de litígios e consequente atuação repressiva dos PROCONs, tendo em vista a legitimidade de engendrar punições ao fornecedor incauto.

3.3 Sanções Administrativas 

A efetivação da prevenção e repressão dos PROCONs se dá por meio da aplicação de penalidades. Nesse sentido Monteiro Filho dissertou que:

Cabe ao PROCON atuar nas relações de consumo, objetivando a harmonia das mesmas, assim, autuar, multar e punir não são fins em si mesmos, mas meios excepcionais voltados à efetivação do papel da autarquia como reguladora do mercado, mercê do exercício do poder de polícia, da normatização de questões e da decisão de controvérsias.[47]

Destarte, as sanções administrativas são meios necessários para a harmonia das relações de consumo, após o exaurimento das tentativas de conciliações. A sanção é, via de regra, a parte coativa da lei dirigida aos que a infringem.

As sanções decorrentes do processo administrativo de defesa do consumidor estão elencadas no artigo 56 do Código de Defesa do Consumidor e tem a finalidade de assegurar a efetividade do direito do consumidor.

A aplicação das penalidades administrativas devem observar o prévio processo administrativo, dando a oportunidade ao contraditório e ampla defesa da reclamada. A previsão legal encontra-se no artigo 5°, inciso LV da Constituição Federal: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.”[48]

Significa assegurar a participação dos indivíduos no processo, de forma que eles possam trazer aos autos, provas e impugnações, que visem a apresentação de argumentos na defesa de seus direitos.

É expressamente assegurado o direito ao contraditório e a ampla defesa nos processos administrativos, sendo que a inobservância, ocasionará nulidade do ato administrativo.

O PROCON deve estabelecer um prazo a ser cumprido pelo fornecedor, assim como nas demandas judicias. Quanto ao direito do contraditório e ampla defesa, tem-se o recurso ordinário:

ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE NULIDADE DE MULTA APLICADA PELO PROCON. USUÁRIO DE TELEFONE QUE RECLAMOU CONTRA A EMPRESA RÉ. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. OBSERVAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. REVELIA RECONHECIDA. 1. Deve ser destacado que a empresa reclamada postulou e obteve o prazo de vinte dias para a apresentação dos documentos necessários à comprovação de que as ligações internacionais efetivamente tinham ocorrido. 2. Todavia, o prazo não foi obedecido, tendo a documentação vindo aos autos quase quatro meses depois. 3. Por evidente, que não pode exigir que o Procon aguardasse indefinidamente pela sua apresentação, sob pena de gerar benesses e criar ainda uma insegurança jurídica, eis que os prazos devem ser rigorosamente cumpridos pelas partes para a garantia da isonomia processual. Apelação provida. [49]

O recurso de apelação apresentado foi interposto pelo Município de Maringá contra sentença de ação declaratória de ato administrativo, que lhe promoveu a Apelante Embratel, e também em face do PROCON de Maringá, a qual acolheu o pedido inicial para declarar nulo o ato administrativo que lhe aplicou multa. No entanto, o recurso foi provido, tendo em vista a Apelante ter respeitado o contraditória e a ampla defesa, sendo que a multa foi aplicada por revelia da Apelada.

Observa-se que o prazo no processo é de extrema importância, já que a prestação jurídica precisa ser dada em prazo razoável, que vise solucionar a questão.

O Código de Defesa do Consumidor prevê como medidas sancionatórias a serem aplicadas pelos órgãos administrativos de defesa do consumidor, em seu artigo 56:

I - multa;

II - apreensão do produto;

III - inutilização do produto;

IV - cassação do registro do produto junto ao órgão competente;

V - proibição de fabricação do produto;

VI - suspensão de fornecimento de produtos ou serviço;

VII - suspensão temporária de atividade;

VIII - revogação de concessão ou permissão de uso;

IX - cassação de licença do estabelecimento ou de atividade;

X - interdição, total ou parcial, de estabelecimento, de obra ou de atividade;

XI - intervenção administrativa;

XII - imposição de contrapropaganda.[50]

O artigo supracitado apresenta um rol de possibilidades de penalização do infrator à legislação consumerista, podendo serem, algumas, aplicadas de forma cumulativa.

As penas podem ser divididas em pecuniárias, objetivas e subjetivas. Bruno Miragem aduz que “distinguem-se por se constituírem da imposição de multa (pecuniárias), serem relativas a produtos ou serviços (objetivas), ou ainda relativas à atividade do fornecedor (subjetivas).”[51]

As sanções objetivas estão elencadas nos incisos II, III, IV, V e VI, do artigo 56, sendo apreensão, inutilização, cassação do registro, proibição de fabricação, ou suspensão do fornecimento de produtos ou serviços. Elas têm como finalidade principal proteger os consumidor contra os danos causados pela utilização de produtos ou serviços.

As sanções subjetivas estão previstas no artigo 56, em seus incisos VII, VIII, IX, X, XI e XII, sendo a suspensão temporária da atividade, revogação da concessão ou permissão de uso cassação da licença do estabelecimento ou de atividade, interdição total ou parcial, de estabelecimento, de obra ou de atividade, intervenção administrativa e imposição de contrapropaganda.

O artigo 59 do Código de Defesa do Consumidor dispõe que as sanções de cassação do alvará de licença, de interdição e de suspensão temporária da atividade, bem como a de intervenção administrativa, serão aplicadas apenas quando o fornecedor reincidir na prática das infrações de maior gravidade.

Sendo assim, a autoridade que aplicar as penalidades previstas no artigo retro mencionado deverá, de forma obrigatória, motivar sua decisão na reincidência da prática de infração de maior gravidade. O Decreto 2.181/97 define reincidência em seu artigo 27, como:

A repetição de prática infrativa, de qualquer natureza, às normas de defesa do consumidor, punida por decisão administrativa irrecorrível. Estabelece ainda no parágrafo único, o prazo de 5 (cinco) anos (a ser contado da data da decisão administrativa da primeira infração até a decisão da segunda) como período máximo para caracterização de reincidência.[52]

A reincidência e uma conduta condenável em qualquer ramo do Direito, o que leva a uma penalização maior. No caso, o PROCON orienta o fornecedor e, ainda assim, este novamente viola as regras do Código de Defesa do Consumidor e o direito do consumidor.

Nesta senda, a autoridade deverá observar minuciosamente o disposto no artigo 27 ao caracterizar o infrator reincidente.

As sanções pecuniárias, que são a imposição de multas, devendo ser aplicadas com prudência. Se excessivas, as multas ganham caráter confiscatório, sendo repudiado pelo sistema legal vigente. Eduardo Gabriel Saad dispõe que:

Como penalidade pecuniária, a multa prevista no CDC tem por finalidade precípua desestimular infrações prejudiciais ao consumidor, tanto à sua saúde como à sua segurança. As somas indicadas acima, por seu vulto e se a autoridade não se houver com prudência e objetividade, não apenas poderão levar o fornecedor a desistir definitivamente da prática do ato reputado violador do CDC, como também, leva-lo à insolvência.[53]

As sanções administrativas devem ser aplicadas respeitando o direito ao contraditória e a ampla defesa, bem como os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Destarte, faz-se necessário observar os critérios estabelecidos em lei para melhor aplicação das sanções administrativas.

3.4 Critérios para fixação da penalidade de multa

Dentre as possíveis penalidades administrativas aplicáveis, destaca-se a sanção pecuniária, por ser a mais recorrente das penalidades. É cediço que nenhuma penalidade poderá ser aplicada de forma arbitrária, devendo haver parâmetros para sua graduação. Destarte, o artigo 57 do Código de Defesa do Consumidor dispõe sobre esses parâmetros:

Art. 57. A pena de multa, graduada de acordo com a gravidade da infração, a vantagem auferida e a condição econômica do fornecedor, será aplicada mediante procedimento administrativo, revertendo para o Fundo de que trata a Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985, os valores cabíveis à União, ou para os Fundos estaduais ou municipais de proteção ao consumidor nos demais casos.

Parágrafo único. A multa será em montante não inferior a duzentas e não superior a três milhões de vezes o valor da Unidade Fiscal de Referência (Ufir), ou índice equivalente que venha a substituí-lo.[54]      

A pena de multa deverá, portanto, observar os critérios estabelecidos no artigo supracitado a fim de evitar abusividades, ilegalidades e desproporcionalidades por parte do poder público.

A Unidade Fiscal de Referência (Ufir) foi extinta em dezembro de 2000 e era utilizada para corrigir monetariamente valores. Destarte, os PROCONS estaduais ou municipais adequaram os cálculos conforme o IPCA – E E (Índice de Preço ao Consumidor Amplo Especial). O PROCON Municipal de Itumbiara utiliza o valor de R$ 2,52 (dois reais e cinquenta e dois centavos), fixado no exercício de 2015.

Ademais, os PROCONS estaduais ou municipais, revestidos de suas autonomias, criaram portarias, onde preveem de forma mais restrita os critérios de fixação de penalidades. O PROCON Goiás, por exemplo, utiliza parâmetros criados por portarias disponíveis para consulta em seu sítio eletrônico.[55]

A Portaria 032/2009 do PROCON – Goiás norteia os PROCONS municipais do estado a realizarem os cálculos das multas. A partir dessa Portaria e da Portaria 003/2015 do PROCON - Goiás foi criada uma tabela com fórmulas, onde sendo devidamente preenchida, os valores das multas aplicados seguem todos os critérios legais:[56]

Os critérios que norteiam a fixação dos montantes das sanções pecuniárias devem buscar atingir o fim punitivo, em razão do descumprimento da legislação consumerista, bem como o fim intimidativo, evitando que o fornecedor reincida na prática infrativa.

As multas devem observar os princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e da motivação, sendo que o processo administrativo deve ter observado o princípio do contraditório e da ampla defesa, sob pena de nulidade.  Nesse sentido, Almeida leciona que:

São aplicadas e cobradas ou executadas pela própria Administração, em procedimento administrativo próprio, resguardado o direito de defesa do infrator. Revestem-se, assim, de grande significado na defesa do consumidor, pois têm a função de educar o fornecedor, inibindo condutas desonestas e abusivas e reprimindo os atos fraudulentos.[57]

Após a aplicação das penalidades é oportunizado ao fornecedor o direito ao contraditório e ampla defesa, onde o recurso interposto será analisado ainda em sede administrativa.

Em situações diversas, nem sempre o fornecedor cumpre a ordem do órgão administrativo e acaba recorrendo ao Poder Judiciário, com o intuito de que a decisão seja anulada ou reformada. Quando isso acontece, a decisão administrativa perde sua eficácia, tornando-se inócua.

A possibilidade de revisão dos atos administrativos será assunto do próximo capítulo.

Sobre a autora
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Amanda Cristina Basílio. A inocuidade dos atos administrativos punitivos do Procon e a intervenção do Poder Judiciário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5650, 20 dez. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/68808. Acesso em: 22 nov. 2024.

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