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Audiência de custódia: conceito, previsão normativa e finalidades

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Agenda 26/01/2019 às 09:30

4.  PROJETO AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA – CONSELHO NACIONAL (RESOLUÇÃO Nº 213/15) E A SUA DINÂMICA PROCEDIMENTAL

Em fevereiro de 2015, o Conselho Nacional de Justiça, à época sob a presidência do Ministro do STF, Ricardo Lewandowski, implantou, em um esforço institucional do referido ministro, por meio de provimento e resoluções e em conjunto com o Instituto do Direito de Defesa (IDD) e Tribunais de Justiças dos Estados da Federação, o Projeto “Audiência de Custódia” o qual visa(va) não só um melhor juízo acerca da necessidade da prisão do indivíduo flagranteado, bem como instituiu um programa de monitoração eletrônica, caso o magistrado entenda que a prisão do flagranteado é desnecessária.

Outrossim, em 12 de dezembro de 2015, o CNJ aprovou de maneira unânime a resolução n° 213/15, a qual disciplina de maneira detalhada como ocorre a apresentação do cidadão preso em virtude de flagrante delito ou por mandado judicial, em todo o território nacional.

A referida resolução, na esteira dos tratados internacionais de direitos humanos, disciplinou que qualquer pessoa presa em flagrante delito deverá ser obrigatoriamente apresentada à autoridade judiciária competente, nos termos dos regimentos internos dos tribunais de justiça dos entes federados.

Ademais, a resolução fixou o prazo de 24 (vinte e quatro) horas a partir da comunicação do flagrante e da respectiva expedição da nota de culpa, para o preso em flagrante ser apresentado e ouvido sobre as circunstâncias da sua prisão. E mais, vale registrar que obrigatoriedade da apresentação física do flagranteado não é suprida pelo simples envio do APF para o Juiz.

Assim, em homenagem ao sistema acusatório previsto na CF/88, o procedimento da audiência de custódia será realizado com o acompanhamento do membro Ministério Público, da Defensoria Pública ou Advogado, sendo expressamente proibida a presença dos agentes policiais responsáveis pela prisão do indivíduo.

Do mesmo modo, visando salvaguardar os postulados do contraditório e da ampla defesa, ao preso é garantido o atendimento com seu defensor de maneira prévia e reservada, em local condizente para resguardar a confidencialidade do diálogo. Ao final, um funcionário do juízo, qualificado e devidamente credenciado, explicará ao preso às razões, os fundamentos e a dinâmica do procedimento da audiência de custódia.

4.1. O papel do Juiz, Ministério Público, Advogado e flagranteado na audiência de custódia

Para uma melhor compreensão do procedimento da AC, é necessário analisar quais as atribuições e responsabilidades que a resolução n° 213/2015 – CNJ conferiu ao magistrado; ao membro do Ministério Público; ao advogado e ao cidadão detido.

Iniciada a audiência, o juiz advertirá o detido sobre a possibilidade de se manter em silêncio, bem como facultará ao preso exercer os seus direitos consagrados na CF/88, quais sejam, entrevistar-se de maneira reservada com o seu defensor; eventual atendimento ambulatorial; e comunicar-se com seus familiares.

Ato contínuo, o juiz esclarecerá ao cidadão detido qual a finalidade do ato, ou seja, analisar a legalidade da prisão em flagrante; verificar eventuais maus-tratos ou torturas no período em que o flagranteado esteve em poder dos agentes de segurança pública; analisar a necessidade ou não da manutenção da restrição da liberdade, decretar a prisão preventiva, relaxar a prisão em caso de ilegalidade ou conceder a liberdade provisória, com ou sem os vínculos das medidas cautelares diversas da prisão (art. 319, CPP). (ANDRADE; ALFEN, 2016, p. 108).

Deverá ainda, o magistrado, assegurar que o detido não permaneça algemado, salvo em casos de resistência, receio de fuga ou perigo à integridade física própria ou alheia, circunstância que será justificada por escrito, conforme a disciplina da súmula vinculante n° 11 do STF. (STF, SÚMULA Nº 11).

A autoridade Judiciária, ainda, questionará ao flagranteado sobre a dinâmica da sua prisão, indagará sobre o trato que lhe foi dispensado nos estabelecimentos em que ficou aguardando apresentação à audiência, formulará perguntas sobre a ocorrência de eventuais torturas e/ou maus-tratos. Caso o flagranteado reporte ao magistrado relatos de abusos por parte dos agentes públicos, deverá de imediato tomar as decisões para fazer cessar as ilegalidades e, posteriormente apurar a denúncia contra os agressores.

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Prosseguindo, o juiz diligenciará no sentido de saber se ocorreu a confecção de laudo de exame de corpo de delito, ordenando a sua realização caso não tenha sido elaborado, para que se apure e constate a denúncia de tortura ou maus-tratos sofridos pelo detido.

De mais a mais, ao magistrado não é dado formular questionamentos de “mérito” que objetivam produzir provas sobre os fatos objeto do auto de prisão em flagrante, uma vez que o objetivo da audiência de custódia não é o de instruir uma eventual ação penal, ao revés, o referido ato visa tão somente avaliar a legalidade da prisão em flagrante e a necessidade ou não de sua conversão em prisão preventiva.

Prosseguindo, logo após proceder à oitiva do preso, o magistrado dará palavra ao Ministério Público e, seguidamente, à defesa do flagranteado, momento em que ambos poderão formular perguntas consentâneas com as características da audiência de custódia, sendo proibidas as perguntas sobre o mérito dos fatos relatados no auto de prisão em flagrante.

 Após os questionamentos, o Ministério Público e a Defesa deverão requerer o relaxamento da prisão em flagrante em caso de ilegalidade, a concessão da liberdade provisória, com ou sem cumulação de medidas cautelares diversas da prisão, ou decretação da prisão preventiva, bem como o emprego de providências imprescindíveis para que se preservado os direitos do indivíduo preso.

Ao final, o magistrado irá decidir acerca da necessidade ou não de se converter a prisão em flagrante em preventiva, bem como analisará a necessidade de encaminhamento assistencial, caso o flagranteado seja portador de transtornos mentais, dependência química (CAPS) ou esteja desempregado (SINE).

Finda a audiência de custódia, cópia de sua ata será entregue a pessoa presa em flagrante, ao seu defensor e ao membro do ministério público. Caso a prisão seja relaxada ou for concedida a liberdade provisória o detido será colocado imediatamente em liberdade, mediante alvará de soltura, momento em que será cientificado de suas obrigações e direitos, ou caso o flagrante seja convertido em prisão preventiva, será o conduzido será encaminhado ao estabelecimento prisional adequado.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na elaboração do presente artigo, variadas ideias foram elencadas, das quais, por questões didáticas, advém à síntese das mais relevantes anteriormente esposadas.

Inicialmente, verificou-se o conceito da audiência de custódia, seus princípios, sua previsão normativa nos Tratado e Convenções Internacionais de Direitos Humanos.

Nesse vértice, constatou-se que a audiência de custódia, trata-se de procedimento judicial pelo qual a pessoa presa em virtude de flagrante delito ou decisão judicial fundamentada, deve ser submetida, sem demora, na presença de um magistrado, a fim de averiguar a legalidade e necessidade da referida prisão e que o referido procedimento surgiu em âmbito internacional, após a segunda guerra mundial, visando à salvaguarda dos direitos humanos.

Prosseguindo, chegou-se à conclusão de que a audiência de custódia, trouxe inúmeras finalidades, das quais foram analisadas as principais, que são: a) conformar o CPP aos tratados internacionais de direitos humanos; b) prevenir e repreender a tortura policial; c) conter prisões arbitrárias, ilegais ou desnecessárias; d) combater a cultura do “encarceramento em massa”.

Outrossim, restou demonstrado que o referido procedimento é ferramenta útil ao combate à tortura policial, às prisões desnecessárias ou ilegais, vez que na oportunidade em que se realiza a audiência de custódia, o magistrado poderá analisar as circunstâncias da prisão em flagrante de uma maneira mais fidedigna e poderá indagar ao cidadão conduzido se os seus direitos e garantias foram assegurados.

De mais a mais, analisou-se, de forma pormenorizada, à iniciativa do Conselho Nacional de Justiça de implantar a audiência de custódia no território brasileiro, a qual foi levada a efeito por meio da Resolução n° 213-CNJ.

A referida resolução, conforme articulado no presente artigo, disciplinou que qualquer pessoa presa em flagrante delito ou em virtude de decisão judicial fundamentada, deverá ser obrigatoriamente apresentada à autoridade judiciária competente, no prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas, nos termos dos regimentos internos dos tribunais de justiça dos entes federados, para que seja analisada a necessidade, legalidade e a circunstância de sua prisão. Analisou-se com o devido cuidado, cada passo do procedimento, desde as incumbências dos juízes presidentes, bem como do ministério público, do defensor e seu cliente.

Deste modo, concluiu-se pelo acerto da resolução, a qual, além de alinhar o código de processo penal aos tratados de direitos humanos, assegurou um procedimento de acordo com a Constituição Federal de 1988. Pois, ao acusado são garantidos todos os seus direitos e, ao seu defensor de igual forma. De maneira não diferente, o Ministério Público como titular da ação penal pública, representado por um membro ministerial, tem assento garantido neste procedimento, podendo formular pedidos e manifestações que melhor lhe provier.

Forte nisso, verificou-se que a audiência de custódia está, aos poucos, humanizando o processo penal. O referido procedimento retira os envolvidos em uma prisão de um lugar extremamente burocrático e, agora, os coloca juntos, frente a frente.

Por fim, conclui-se que a audiência de custódia trouxe a importante lição que é humanizar os atores do processo penal, vez que há muito são acostumados e treinados para lidar somente com a “papelada” e, hoje, se veem diante de uma desafiadora e sublime missão, qual seja, a de lidar com pessoas.


REFERÊNCIAS

ANDRADE, Mauro Fonseca; ALFLEN, Pablo Rodrigo. Audiência de Custódia no Processo Penal Brasileiro. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2016.

BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Parecer - Prisão em flagrante delito e direito à audiência de custódia. Disponível em: <http://www.academia.edu/9457415/Parecer_-_Pris%C3%A3o_em_flagrante_delito_e_direito_%C3%A0_audi%C3%AAncia_de_cust%C3%B3dia>. Acesso em: 22 de jul. 2018.

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______. Decreto nº 592/92. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0592.htm>. Acesso em: 26 de jun. 2018.

______. Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 11 de jul. 2018.

______. Lei nº 12.830/13. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12830.htm.>.  Acesso em: 22 jul. 2018.

______. Decreto-Lei nº 3.689/1941. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3689Compilado.htm.  Acesso em: 28 out. 2018.

CANINEU, Maria Laura. O direito à “audiência de custódia” de acordo com o direito internacional. Disponível em: <https://www.hrw.org/pt/news/2014/02/03/252627>. Acesso em: 13 de jul. 2018.

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Notas

[1] LXV - a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária;

[2] LXVI - ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança;

Sobre o autor
Hudson Campos Viana

Advogado (licenciado). Pós-Graduando em Direito Penal e Processual Penal.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VIANA, Hudson Campos. Audiência de custódia: conceito, previsão normativa e finalidades. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5687, 26 jan. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/70446. Acesso em: 22 nov. 2024.

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