4 CONCLUSÕES
Como foi dito logo no começo deste texto, José Emílio Medauar Ommati e Samantha Ribeiro Meyer-Pflug visitaram esse julgamento e estressaram o tema da liberdade de expressão e discurso do ódio. E ambos chegaram a conclusões diametralmente opostas. Segundo José Emílio Medauar Ommati, o STF acertou em indeferir a ordem de habeas corpus pois a Constituição não alberga o direito de manifestar o ódio e a intolerância, de modo que seria uso ilegal e abusivo da liberdade de expressão. Já para Samantha Ribeiro Meyer-Pflug, deveria o Tribunal ter prestigiado a liberdade de expressão e o direito de livre pesquisa e de liberdade ideológica, mesmo diante do discurso de ódio.
O STF fez justiça? Ou Siegfried Ellwanger Castan foi vítima de uma injustiça? Se se entender que o paciente teve garantido o devido processo legal, com a mais ampla defesa e contraditório, desde a primeira instância (Vara Criminal de Porto Alegre), passando por todas as demais instâncias judiciais (TJ/RS, STJ e STF), tendo todos os atores processuais (as partes, os interessados, as autoridades policiais, os membros do Ministério Público, os magistrados e os advogados) envolvidos no processo agido com integridade (respeito e considerações pelos demais atores e pelo Direito, buscando a verdade, produzindo provas válidas e usando argumentos convincentes) e todos eles agindo com liberdade, com responsabilidade e com boa-fé, o resultado do processo foi justo e adequado, ainda que contrário aos interesses de Ellwanger.
Se dependesse do voto do ministro Ayres Britto, o paciente teria obtido o deferimento de sua postulação e os seus livros estariam protegidos pelo manto constitucional da liberdade de expressão, decorrente das pesquisas científicas e das convicções filosóficas e políticas. A maioria da Corte assim não entendeu e o fez de modo sério, em exame aprofundado da questão. O resultado do julgamento não foi lotérico. Foi fruto da seriedade e da integridade dos ministros do Tribunal. Essa é garantia de Justiça que podemos ter: magistrados íntegros, que analisam as circunstâncias fáticas com seriedade e aplicam as leis com equilíbrio.
5 REFERÊNCIAS
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Plenário. Habeas Corpus n. 82.424. Relator ministro Moreira Alves. Redator do acórdão ministro Maurício Corrêa. Julgamento em 17.9.2003. Publicação no Diário de Justiça de 19.3.2004. Disponível: www.stf.jus.br.
MEYER-PFLUG, Samantha Ribeiro. Liberdade de expressão e discurso do ódio. São Paulo: RT, 2009, p. 25.
OMMATI, José Emílio Medauar. Liberdade de expressão e discurso de ódio na Constituição de 1988. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2016, p. 21.
PERELMAN, Chaïm. Lógica Jurídica. Tradução de Vergínia K. Pupi. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Crime de Racismo e anti-semitismo: um julgamento histórico no STF (HC n. 82.424). Brasília: Supremo Tribunal Federal; Brasília Jurídica, 2004.
Notas
Texto escrito em justa e merecida homenagem ao ministro Ayres Britto. A escolha desse tema tem justificação acadêmica e motivação afetiva. Acadêmica pela indiscutível e simbólica relevância do julgamento do Habeas Corpus n. 82.424 e pela inquestionável qualidade do voto do homenageado e dos votos dos outros membros da Corte. No aspecto afetivo há a admiração que nutro pelo ministro Ayres Britto, um profissional competente e acima de tudo um homem bom. Além disso, tive a ventura de assistir in loco as históricas sessões desse julgamento, pois à época era advogado militante perante o STF. Posso dizer que presenciei (vi, ouvi e senti) a construção de um capítulo da história do Tribunal. E na parede de minhas memórias essa lembrança é um quadro que me satisfaz, parodiando o inesquecível menestrel Belchior.
[2] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Plenário. Habeas Corpus n. 82.424. Relator ministro Moreira Alves. Redator do acórdão ministro Maurício Corrêa. Julgamento em 17.9.2003. Publicação no Diário de Justiça de 19.3.2004. Disponível: www.stf.jus.br.
[3] OMMATI, José Emílio Medauar. Liberdade de expressão e discurso de ódio na Constituição de 1988. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2016, p. 21.
[4] MEYER-PFLUG, Samantha Ribeiro. Liberdade de expressão e discurso do ódio. São Paulo: RT, 2009, p. 25.
[5] PERELMAN, Chaïm. Lógica Jurídica. Tradução de Vergínia K. Pupi. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
[6] SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Crime de Racismo e anti-semitismo: um julgamento histórico no STF (HC n. 82.424). Brasília: Supremo Tribunal Federal; Brasília Jurídica, 2004.