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Mau gosto não é crime: elogio crítico ao Ministro Ayres Britto no julgamento do Habeas Corpus n. 82.424

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Agenda 19/05/2019 às 11:59

4 CONCLUSÕES

Como foi dito logo no começo deste texto, José Emílio Medauar Ommati e Samantha Ribeiro Meyer-Pflug visitaram esse julgamento e estressaram o tema da liberdade de expressão e discurso do ódio. E ambos chegaram a conclusões diametralmente opostas. Segundo José Emílio Medauar Ommati, o STF acertou em indeferir a ordem de habeas corpus pois a Constituição não alberga o direito de manifestar o ódio e a intolerância, de modo que seria uso ilegal e abusivo da liberdade de expressão. Já para Samantha Ribeiro Meyer-Pflug, deveria o Tribunal ter prestigiado a liberdade de expressão e o direito de livre pesquisa e de liberdade ideológica, mesmo diante do discurso de ódio.

O STF fez justiça? Ou Siegfried Ellwanger Castan foi vítima de uma injustiça? Se se entender que o paciente teve garantido o devido processo legal, com a mais ampla defesa e contraditório, desde a primeira instância (Vara Criminal de Porto Alegre), passando por todas as demais instâncias judiciais (TJ/RS, STJ e STF), tendo todos os atores processuais (as partes, os interessados, as autoridades policiais, os membros do Ministério Público, os magistrados e os advogados) envolvidos no processo agido com integridade (respeito e considerações pelos demais atores e pelo Direito, buscando a verdade, produzindo provas válidas e usando argumentos convincentes) e todos eles agindo com liberdade, com responsabilidade e com boa-fé, o resultado do processo foi justo e adequado, ainda que contrário aos interesses de Ellwanger.

Se dependesse do voto do ministro Ayres Britto, o paciente teria obtido o deferimento de sua postulação e os seus livros estariam protegidos pelo manto constitucional da liberdade de expressão, decorrente das pesquisas científicas e das convicções filosóficas e políticas. A maioria da Corte assim não entendeu e o fez de modo sério, em exame aprofundado da questão. O resultado do julgamento não foi lotérico. Foi fruto da seriedade e da integridade dos ministros do Tribunal. Essa é garantia de Justiça que podemos ter: magistrados íntegros, que analisam as circunstâncias fáticas com seriedade e aplicam as leis com equilíbrio.


5 REFERÊNCIAS

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Plenário. Habeas Corpus n. 82.424. Relator ministro Moreira Alves. Redator do acórdão ministro Maurício Corrêa. Julgamento em 17.9.2003. Publicação no Diário de Justiça de 19.3.2004. Disponível: www.stf.jus.br.

MEYER-PFLUG, Samantha Ribeiro. Liberdade de expressão e discurso do ódio. São Paulo: RT, 2009, p. 25.

OMMATI, José Emílio Medauar. Liberdade de expressão e discurso de ódio na Constituição de 1988. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2016, p. 21.

PERELMAN, Chaïm. Lógica Jurídica. Tradução de Vergínia K. Pupi. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Crime de Racismo e anti-semitismo: um julgamento histórico no STF (HC n. 82.424). Brasília: Supremo Tribunal Federal; Brasília Jurídica, 2004.

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Notas

 Texto escrito em justa e merecida homenagem ao ministro Ayres Britto. A escolha desse tema tem justificação acadêmica e motivação afetiva. Acadêmica pela indiscutível e simbólica relevância do julgamento do Habeas Corpus n. 82.424 e pela inquestionável qualidade do voto do homenageado e dos votos dos outros membros da Corte. No aspecto afetivo há a admiração que nutro pelo ministro Ayres Britto, um profissional competente e acima de tudo um homem bom. Além disso, tive a ventura de assistir in loco as históricas sessões desse julgamento, pois à época era advogado militante perante o STF. Posso dizer que presenciei (vi, ouvi e senti) a construção de um capítulo da história do Tribunal. E na parede de minhas memórias essa lembrança é um quadro que me satisfaz, parodiando o inesquecível menestrel Belchior.

[2] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Plenário. Habeas Corpus n. 82.424. Relator ministro Moreira Alves. Redator do acórdão ministro Maurício Corrêa. Julgamento em 17.9.2003. Publicação no Diário de Justiça de 19.3.2004. Disponível: www.stf.jus.br.

[3] OMMATI, José Emílio Medauar. Liberdade de expressão e discurso de ódio na Constituição de 1988. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2016, p. 21.

[4] MEYER-PFLUG, Samantha Ribeiro. Liberdade de expressão e discurso do ódio. São Paulo: RT, 2009, p. 25.

[5] PERELMAN, Chaïm. Lógica Jurídica. Tradução de Vergínia K. Pupi. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

[6] SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Crime de Racismo e anti-semitismo: um julgamento histórico no STF (HC n. 82.424). Brasília: Supremo Tribunal Federal; Brasília Jurídica, 2004.

Sobre o autor
Luís Carlos Martins Alves Jr.

LUIS CARLOS é piauiense de Campo Maior; bacharel em Direito, Universidade Federal do Piauí - UFPI; orador da Turma "Sexagenária" - Prof. Antônio Martins Filho; doutor em Direito Constitucional, Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG; professor de Direito Constitucional; procurador da Fazenda Nacional; e procurador-geral da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico - ANA. Exerceu as seguintes funções públicas: assessor-técnico da procuradora-geral do Estado de Minas Gerais; advogado-geral da União adjunto; assessor especial da Subchefia para Assuntos Jurídicos da Presidência da República; chefe-de-gabinete do ministro de Estado dos Direitos Humanos; secretário nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente; e subchefe-adjunto de Assuntos Parlamentares da Presidência da República. Na iniciativa privada foi advogado-chefe do escritório de Brasília da firma Gaia, Silva, Rolim & Associados – Advocacia e Consultoria Jurídica e consultor jurídico da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB. No plano acadêmico, foi professor de direito constitucional do curso de Administração Pública da Escola de Governo do Estado de Minas Gerais na Fundação João Pinheiro e dos cursos de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MG, da Universidade Católica de Brasília - UCB do Instituto de Ensino Superior de Brasília - IESB, do Centro Universitário de Anápolis - UNIEVANGÉLICA, do Centro Universitário de Brasília - CEUB e do Centro Universitário do Distrito Federal - UDF. É autor dos livros "O Supremo Tribunal Federal nas Constituições Brasileiras", "Memória Jurisprudencial - Ministro Evandro Lins", "Direitos Constitucionais Fundamentais", "Direito Constitucional Fazendário", "Constituição, Política & Retórica"; "Tributo, Direito & Retórica"; e "Lições de Direito Constitucional".

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALVES JR., Luís Carlos Martins. Mau gosto não é crime: elogio crítico ao Ministro Ayres Britto no julgamento do Habeas Corpus n. 82.424. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5800, 19 mai. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/74003. Acesso em: 23 dez. 2024.

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