Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

Aspectos conceituais da liberdade de expressão e o inquérito das “fakes news”

Agenda 27/12/2021 às 15:30

Reflexões acerca do inquérito das fake news e o direito à liberdade de expressão, à luz do STF.

INTRODUÇÃO:

É de extrema importância traçar o que seria o direito à liberdade de expressão para que se possa fazer uma análise do caso em comento. Sendo a liberdade de expressão um conceito para que as pessoas possam expressar as suas ideias sem serem coagidas.

A liberdade de expressão é premissa para qualquer governo democrático na atualidade.

Mas não significa dizer que, para expressar as opiniões, não se tenha que respeitar alguns limites. Para se viver em harmonia é preciso estar atento sobre declarações que possam ofender outras pessoas.

A liberdade de expressão possui lugar na Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), documento que norteia a garantia de direitos e liberdades fundamentais para todos, devido a sua grande importância. Trazendo em seu artigo 19 que, Todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e ideias por qualquer meio de expressão.

Estando prevista na Constituição Federal, a liberdade de expressão é um direito fundamental e é tida como uma garantia básica para a dignidade humana e para o funcionamento da estrutura democrática do Estado.

No âmbito da estrutura democrática do Estado, a liberdade de expressão protege a pluralidade de posicionamento de diferentes vertentes políticas e ideológicas dentro dos limites da Constituição.

Uma das formas de saber se está sendo protegido o direito à liberdade de expressão nos países é por meio do Relatório Global de Expressão, uma publicação anual realizada pela ONG.

Na pesquisa atual publicada em 2020, o relatório confirmou uma realidade que já vinha aparecendo nos últimos anos.

Desde 2015, o Brasil passou um país com sua democracia em crise, deixando para trás um dos melhores índices da pesquisa. E as fake news têm colaborado para a queda do Brasil no ranking de liberdade de expressão.

A Constituição Federal, em seu Art. 5º, inciso IV, traz o seguinte texto sobre a liberdade de expressão: é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato.

No Art. 200 da CF, a lei reafirma a liberdade de expressão ao trazer que: a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

Os indivíduos que participam das decisões políticas, que afetam a nação, precisam ter liberdade para adquirir conhecimento, comparar informações e embasar suas escolhas em dados confiáveis.

Assim, a liberdade de expressão é um dos alicerces da democracia, pois dá capacidade para que o povo seja empoderado, ao mesmo tempo em que permite que suas opiniões sejam ouvidas.

Ser livre para se manifestar, sem censura, é um dos aspectos que condicionam à construção de uma sociedade mais justa e menos desigual. Mas ter liberdade de expressão não implica na admissão de ofensas, calúnias, invasões, danos materiais ou morais sem uma punição.

Nossa Carta Magna veda o anonimato e exige que, quando expressar seu pensamento, o autor se identifique, pois além de garantir os créditos sobre uma opinião, essa medida serve também para que o autor seja responsabilizado em caso de exceder os limites e cometer crimes como calúnia e injúria contra outras pessoas.

Assim, é possível concluir que, no Brasil, a lei não admite censura, apenas responsabilização punitiva em função de ações posteriores à divulgação de um pensamento que viole direitos alheios.

Um estado democrático não deve restringir ideias, mas deve responsabilizar aquele que viole o direito dos demais.

A mídia tem tido um papel importante para liberdade de expressão, principalmente no combate às fakes news.

Ainda que o ambiente virtual possa dar a falsa impressão de anonimato, tanto a liberdade de expressão quanto seus limites, são válidos também nessa esfera online. Assim, quem usar as redes para proliferar insultos, discursos de ódio e mentiras, estará sujeito às punições que estão previstas no nosso ordenamento jurídico.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

METODOLOGIA:

Para o tema Aspectos conceituais da liberdade de expressão e o inquérito das fakes news, serão utilizados, como referencial teórico, artigos acerca do assunto e nossa Constituição Federal.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

O interesse de abordar o referido tema nesse trabalho surgiu a partir de uma situação específica, em que o Presidente do Supremo Tribunal Federal determinou a instauração, de ofício, de investigação de ataques sofridos pela Corte, por uma rede de fake news que contaria com a participação organizada de uma série de empresários, políticos e ativistas de redes sociais.

Direito à liberdade de expressão ou notícias falsas para gerar caos no âmbito jurídico?

Trataremos sobre o que seria direito à liberdade de expressão e o que seria fakes news envolvendo o Supremo Tribunal Federal.

O inquérito investiga a existência de uma organização criminosa, que articula ataques contra membros do STF, Congresso e a democracia.

A medida também foi tomada devido ao aumento expressivo de notícias falsas ou deturpadas sobre decisões e sobre os próprios ministros.

Como o ministro Dias Toffoli já mencionou, em um dos seus discursos, as campanhas de desinformação querem promover o caos e essa atitude seria incompatível com o direito à liberdade de expressão.

O ministro já declarou que a abertura do inquérito das fakes news foi a decisão mais difícil que já precisou tomar durante o seu mandato.

Foi a decisão mais difícil da minha gestão a abertura desse inquérito. Mas ali já vínhamos vivendo algo que vinha ocorrendo em outros países, o início de uma política de ódio plantada por setores que queriam e querem destruir instituições, que querem o caos, disse Toffoli, em entrevista após um balanço de sua gestão.https://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2020-09/abrir-inquerito-das-fake-news-foi-decisao-mais-dificil-diz-toffoli

Dias Toffoli acredita que há segmentos que buscam uma ruptura, mesmo não tendo visto atitudes do governo que contribuíssem para isso:

Evidentemente que pode haver realmente segmentos de pessoas que se identificam com o governo, mas querem que vá além. Isso foi combatido, está sendo combatido e vai ser combatido, porque não podemos deixar o ódio entrar na nossa sociedade. Não podemos deixar nossas instituições caírem, afirmou. (https://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2020-09/abrir-inquerito-das-fake-news-foi-decisao-mais-dificil-diz-toffoli)

Para anunciar a abertura do inquérito pelo STF, sem provocação de outro órgão, o ministro Dias Toffoli afirmou que não existe um estado democrático de Direito, nem democracia, sem um Judiciário independente e sem uma imprensa livre.

É possível observar, diante das referidas declarações do ministro do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, que ele acredita que as fakes news tem o objetivo de enfraquecer o âmbito jurídico e criar o caos, sendo esta a justificativa da abertura do inquérito para averiguar possíveis notícias, achando o mesmo nada ter a ver com o direito à liberdade de expressão.

É importante abordar nesse tópico, também, sobre a liberdade de imprensa, que encontra seu respaldo no art. IVIX e XIV e no art. 220§ 2ª, da CF/88.

Lei de Imprensa tem por objetivo regulamentar a liberdade de manifestação do pensamento e de informação.

O Supremo Tribunal Federal já se posicionou sobre o direito à liberdade de imprensa, acreditando que esta tem uma missão democrática e com fundamento ma CF, protegendo o direito de exercer crítica a qualquer pessoa, incluindo as autoridades judiciárias:

RELAÇÃO DE INERÊNCIA ENTRE PENSAMENTO CRÍTICO E IMPRENSA LIVRE. A IMPRENSA COMO INSTÂNCIA NATURAL DE FORMAÇÃO DA OPINIÃO PÚBLICA E COMO ALTERNATIVA À VERSÃO OFICIAL DOS FATOS. O pensamento crítico é parte integrante da informação plena e fidedigna. O possível conteúdo socialmente útil da obra compensa eventuais excessos de estilo e da própria verve do autor. O exercício concreto da liberdade de imprensa assegura ao jornalista o direito de expender críticas a qualquer pessoa, ainda que em tom áspero ou contundente, especialmente contra as autoridades e os agentes do Estado. A crítica jornalística, pela sua relação de inerência com o interesse público, não é aprioristicamente suscetível de censura, mesmo que legislativa ou judicialmente intentada. O próprio das atividades de imprensa é operar como formadora de opinião pública, espaço natural do pensamento crítico e real alternativa à versão oficial dos fatos (BRASIL, ADPF 130, 2009).

A conduta tomada pelo ministro da Suprema Corte também representa um precedente perigoso no âmbito jurídico, pois muitos juízes, inspirados em tal episódio, poderiam perseguir e prejudicar desafetos que os critiquem publicamente, achando estes estarem amparados no artigo , incisos IV e IX, e artigo 220, todos da CF/88:

(...) IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;

IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;

Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

Mesmo a liberdade de expressão não sendo absoluta em nosso território nacional, ela assegura o direito à crítica, mesmo que ácida, especialmente contra os gestores de cargos público do Estado, porquanto nesse caso, a crítica encontra fundamento não só na liberdade de manifestação, mas também, no princípio republicano.

Por isso, o inquérito também viola a liberdade de expressão e de crítica política.

O Ministro Dias Toffoli, em contrapartida, justifica que o que se investiga nesse inquérito vai muito além de manifestações ou críticas contundentes contra a corte. Trata-se de uma máquina de desinformação que se utiliza de robôs, de financiamento e de perfis falsos para desacreditar as instituições democráticas republicanas e seus agentes.

Toffoli também defende que seja criada uma regulamentação com o objetivo de inibir a propagação das fake news. Em algumas de suas declarações sobre o caso, ele acredita que não se pode normalizar, condescender e aceitar as fake news como um fenômeno inevitável. Não se pode aceitar como algo que seja impossível de combater ou que seja algo que se tornará natural no dia a dia.

Segundo o ministro, as campanhas de desinformação buscam criar o "caos" e não seria essa a finalidade do direito à liberdade de expressão.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

.https://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2020-09/abrir-inquerito-das-fake-news-foi-decisao-mais-dificil-diz-toffoli

Constituição Federal de 1988.

ADPF 130,  Brasil, 2009.

Sobre o autor
Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!