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A inconstitucionalidade do projeto de lei da homofobia (PLC nº 122/2006) e o estado totalitário marxista.

tréplica a Paulo Roberto Iotti Vecchiatti

29/09/2007 às 00:00
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Somente agora cobrei ânimo para retribuir a honra que o Dr. Paulo Roberto Iotti Vecchiatti me dispensou, oferecendo réplica ao meu artigo "Projeto de Lei n.º 5003-b/2001 (crimes de homofobia): a lei da mordaça gay, os superdireitos gays, inconstitucionalidade e totalitarismo" (http://jus.com.br/artigos/9306), por meio do seu texto "Constitucionalidade do Projeto de Lei n.º 5003/2001. Uma réplica a Paul Medeiros Krause" (http://jus.com.br/artigos/10248).

Senti-me particularmente honrado por meu nome constar do título do trabalho. Ademais, considerei extremamente elegante o modo como o Dr. Vecchiatti tratou as minhas idéias, procurando demonstrar o seu total equívoco e a minha mui censurável ignorância. Agradeço, pois, ao Dr. Vecchiatti pela sua tentativa de me livrar das trevas do erro e da insensatez.

Como, contudo, a estultícia ainda não me abandonou, sendo eu também um certo tanto renitente, servir-me-ei de alguns argumentos do Dr. Vecchiatti, a fim de desenvolver um pouco mais meu ponto de vista.

No artigo replicado, defendi a inconstitucionalidade do PL 5003-b/2001, oriundo da Câmara dos Deputados, e que passou a ser designado, no Senado, por PLC (Projeto de Lei da Câmara) n.º 122/2006. Naquela oportunidade, argumentei que o projeto de lei cerceia a liberdade de pensamento e de crença, cominando pena de reclusão de até cinco anos para qualquer manifestação, ainda que de ordem religiosa ou filosófica, de oposição ao homossexualismo. Destaquei o recrudescimento das penas acessórias – a redação proposta para o art. 16 da Lei 7.716, de 5 de janeiro de 1989, praticamente decreta a morte civil do condenado. Apontei, outrossim, para que se cuida de hipótese clara de policiamento ideológico, com a aplicação de penas excessivamente gravosas, desproporcionais.

Ponderei que o projeto de lei referido não é neutro, científico ou imparcial, mas alicerçado na ideologia marxista; que ele conta com o apoio decisivo do governo federal e dos partidos de esquerda. Diante disso, sublinhei, é compreensível a hostilidade dos seus defensores a valores próprios da civilização ocidental, judaico-cristã. Sobre este ponto, entretanto, não identifiquei qualquer comentário do Dr. Vecchiatti. Gostaria de ter visto sair de sua pena o reconhecimento de que ele faz profissão de fé em doutrinas desenvolvidas por: Antonio Gramsci, Georg Lukacs, Max Horkheimer, Teodoro Adorno, Erich Fromm e Herbert Marcuse. Leia-se, por exemplo, deste último, Eros e civilização.

Do texto Politicamente correto: o que é, de onde veio e para onde pode nos levar [01], extraem-se algumas informações úteis:

"Gramsci disse que os trabalhadores jamais iriam perceber os seus verdadeiros interesses de classe, assim como definidos pelo marxismo, até serem libertados da cultura ocidental, particularmente do Cristianismo, já que todos eles estavam cegos, pela religião e pela cultura, aos seus reais interesses de classe. Lukacs, que foi considerado o teórico marxista mais brilhante desde o próprio Marx, perguntou-se, em 1919: ´´Quem irá nos salvar da cultura ocidental?´´

Em 1923, na Alemanha, foi fundado um centro de estudos que tomou para si a tarefa de traduzir o marxismo de termos econômicos para culturais, o que criou o discurso politicamente correto que conhecemos hoje.

Os trabalhos iniciais do Instituto eram convencionais, mas em 1930 assumiu um novo diretor, chamado Max Horkheimer, e as visões dele eram bem diferentes.

Horkheimer era muito interessado em Freud e a chave para que ele pudesse traduzir o marxismo de termos econômicos para termos culturais era precisamente sua combinação com o freudismo. Se, no começo de sua história, o Instituto preocupava-se principalmente com a subestrutura econômica da sociedade burguesa, nos anos que se seguiram sua atenção se voltou para a superestrutura cultural. De fato, a fórmula marxista tradicional, no que diz respeito à relação entre as duas, foi posta em questão pela Teoria Crítica.

Todas essas coisas da moda – feminismo radical, os departamentos de estudos das mulheres, dos gays, dos negros – são ramificações da Teoria Crítica, criada pela Escola de Frankfurt nos anos 1930. De acordo com essa teoria, a sociedade capitalista ocidental é repressora e deve ser, não apenas passivamente compreendida, mas desmistificada e transformada como um todo, para permitir a plena emancipação do indivíduo.

Outros membros importantes que se juntaram ao time foram Teodoro Adorno e, especialmente, Erich Fromm e Herbert Marcuse, que introduziram um elemento que é central no PC [politicamente correto]: o sexo. Marcuse, particularmente, clamava em seus escritos por uma sociedade ´´polimorficamente perversa´´, sua definição para a sociedade futura que desejava criar. Na visão de Fromm, masculinidade e feminilidade não refletiam diferenças essenciais como então se acreditava. Na verdade, essas diferenças derivavam de funções da vida, que eram em parte socialmente determinadas. ´´Sexo é uma convenção; diferenças sexuais são convenções´´."

Essas considerações prévias são essenciais para compreender o texto do Dr. Vecchiatti. Sabendo ele ou não, as idéias que defende não são neutras: são ideológicas (não científicas) e, como tais, sempre limitadas e parciais, formuladas com o objetivo de suplantar os fundamentos da civilização ocidental supostamente opressora.

Após afirmar que todas as premissas das quais parti são equivocadas – não digo o mesmo do Dr. Vecchiatti: algumas de suas premissas são corretas, embora ele as desenvolva equivocadamente –, asseverou o ilustre articulista: "Em síntese, alegou aquele jurista [este que ora escreve] ser o referido projeto de lei inconstitucional por desnecessário".

Na verdade, fiz notar que o projeto de lei da mordaça gay é desnecessário porque agressões físicas ou injúrias a quaisquer pessoas, homossexuais ou não, já configuram crime, sendo despicienda a lei contra a alegada homofobia. Imputou-me, ainda, o nobre debatedor, desconhecimento do conteúdo do princípio da isonomia. A meu ver, a imputação não procede.

É óbvio que discriminações que não sejam arbitrárias, que tenham fundamento lógico-racional, são toleradas ou estão de acordo com o princípio da igualdade. O que não se conforma, porém, com o princípio da isonomia é tratar os homossexuais como se fossem uma raça, conferindo-lhes os privilégios – severíssimos para os demais – da lei anti-racismo. Mais do que isso: a lei da mordaça gay pretende tornar a lei anti-racismo ainda mais rígida. As novas penas acessórias – os efeitos da condenação – praticamente destroem a vida do condenado. Entendo que não há justificativa razoável para os homossexuais e o pensamento filosófico marxista gozarem dos privilégios outorgados pela Lei 7.716, de 1989, a lei anti-racismo. Em outras palavras, a discriminação que o projeto de lei pretende promover é arbitrária, desproporcional, atentando contra a natureza das coisas.

O que os defensores da causa gay não reconhecem é que, na verdade, visam fazer calar, policiar, os que discordam das suas opiniões. Chamo a atenção para a redação proposta para o § 5.º do art. 20 da Lei 7.716, de 1989:

"§ 5.º O disposto neste artigo envolve a prática de qualquer tipo de ação violenta, constrangedora, intimidatória ou vexatória, de ordem moral, ética, filosófica ou psicológica. (NR)" (grifou-se)

A amplitude do dispositivo acima deveria causar perplexidade em qualquer estudioso minimamente comprometido com o Estado Democrático de Direito. Alguém afirmar que o homossexualismo é imoral não poderá causar constrangimento psicológico a algum homossexual? Terá, por isso, que responder pela prática de crime?

O Dr. Vecchiatti afirma ser fato notório o cometimento intenso de delitos homofóbicos. Todavia, neste ponto ele incorre no erro que me atribui, o de alegar sem provar. Um ou dois casos noticiados pela mídia, com a hiperdramatização característica dos defensores da causa gay [02], que faz ver os fatos com lentes de aumento, não comprovam o cometimento importante, em número significativo, de crimes de intolerância – agressão física ou psíquica – contra homossexuais, justificador de uma tutela jurídico-penal específica. Cabe indagar com base em que critérios objetivos o Sr. Luiz Mott do Grupo Gay da Bahia definiu ser o Brasil o campeão mundial da homofobia. Pelo que se sabe, os países islâmicos tratam o homossexualismo com muito maior rigor. A afirmação de Luiz Mott é mera frase de efeito. Ele está defendendo os interesses de seu grupo. Somente os órgãos oficiais de segurança pública poderiam oferecer dados confiáveis a esse respeito. A cifra, em verdade, é ínfima, tal como no caso das mortes de mulheres causadas por aborto criminoso. Aumentam-se as estatísticas para criar comoção popular.

O que está por trás realmente do projeto de lei de homofobia é a tentativa de impor a todos o dogma da moralidade ou naturalidade do homossexualismo, que não é científico, mas de origem ideológica, marxista, tornando-se penalmente punível a contestação a essa pretensa verdade. Nada mais truculento. Nada mais inadmissível. Trata-se de evidente policiamento ideológico.

Ocorre, porém, que muitos juristas e parte significativa da sociedade já incorporaram, inconscientemente, após anos e anos de bombardeio dos deformadores da opinião pública, o modo de pensar da Escola de Frankfurt, de sorte que julgam tratar-se a moralidade e naturalidade do homossexualismo verdades de fé absolutas, incontrastáveis, até mesmo no campo das idéias ou das crenças. Por certo, a lei não poderia obrigar quem quer que fosse a aceitar o dogma da infalibilidade papal. Todavia, almeja-se impor aos brasileiros o dogma da infalibilidade de Erich Fromm e Herbert Marcuse.

Assinalo que já reputo inconstitucional a Lei 7.716, de 1989, com as alterações procedidas pela Lei 9.459, de 13 de maio de 1997, ao tratar da mesma forma o racismo e a discriminação por motivos religiosos. Com efeito, na Constituição [03], o racismo mereceu um tratamento severíssimo, não podendo outras formas de discriminação serem a ele igualados. Os crimes de racismo são inafiançáveis e imprescritíveis, sempre punidos com reclusão.

O Dr. Vecchiatti parte do entendimento de que todos devem acatar a definição marxista de "preconceito" e "repressão". Ocorre que a não-aceitação da prática homossexual como moral e natural, por razões de ordem religiosa e filosófica, não configura um preconceito. Preconceituoso é tachar de preconceito visões amadurecidas, sopesadas ao longo de milênios, sobre a homossexualidade. A minha discordância com a definição de preconceito do articulista ora contrastado não merece cadeia. As crenças e convicções filosóficas do Dr. Vecchiatti e do Grupo Gay da Bahia não devem gozar do privilégio da infalibilidade, da imutabilidade, da intangibilidade. Todos podem ser passíveis de crítica, inclusive os homossexuais. Todas as crenças e convicções filosóficas e éticas merecem idêntico tratamento pelo direito positivo. A lei não deve impor a todos o modo marxista de enxergar o mundo.

Aliás, não creio que haja suporte jurídico e moral para a realização das paradas gays ou paradas do orgulho gay, mormente com dinheiro público. Trata-se de promoção explícita e irresponsável da imoralidade. Concordem ou não, a Constituição assegura-me o direito de pensá-lo e afirmá-lo, sem ser punido por isso.

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Acrescente-se que o entendimento da Organização Mundial de Saúde acerca da homossexualidade não é critério decisivo para defini-la ou não como doença (e, muito menos, como moral ou imoral). Primeiro, porque em ciências biológicas não existem verdades definitivas. Segundo, porque tal entendimento não é unânime entre os especialistas – veja-se o já citado Gerard J. M. van den Aardweg. Terceiro, porque as causas da homossexualidade ainda não são suficientemente conhecidas. Quarto, porque é evidente o lobby dos militantes gays e da esquerda internacional nos organismos internacionais, como o é para a aprovação do projeto de lei de que se cuida.

Somente no dicionário dos militantes gays pederastia e homossexualismo não são sinônimos. Servindo-se de um método dos pensadores de esquerda, o desconstrucionismo, o Dr. Vecchiatti assevera que a Bíblia não condena o homossexualismo.

Com efeito, no desconstrucionismo, destrói-se o sentido original de um texto, para, em seguida, conferir-lhe o sentido desejado ou almejado. Foi o que os teólogos da libertação fizeram com os textos bíblicos, desconstituindo o seu sentido original para imprimir-lhes uma chave de interpretação marxista. O nobre Dr. Vecchiatti utiliza-se de exegese da Bíblia elaborada por militantes gays ("Edições GLS"), com evidente desprestígio da sua dicção literal, bem como da interpretação que lhe conferem as comunidades cristãs e os exegetas de competência científica reconhecida.

Ora, alterando-se o significado das palavras e dos textos, de acordo com o que é conveniente, pode-se justificar qualquer coisa.

É utilizando-se o desconstrucionismo que os defensores da causa gay, servindo-se dos princípios da igualdade, da dignidade humana etc., destruindo o seu conteúdo e sentido real, atribuem-lhes o significado que lhes interessa, para abonar as suas propostas de inovação legislativa. Prossegue o texto da Dra. Marli Nogueira [04]:

"Para o marxista cultural, o método é o desconstrucionismo. O desconstrucionismo remove todo o sentido de um texto, substituindo-o por qualquer sentido desejado. Então se descobre, por exemplo, que toda a obra de Shakespeare é sobre a opressão das mulheres, ou a Bíblia é sobre raça e sexo. Todos esses textos tornaram-se úteis para provar que ´´toda a História é sobre quais grupos têm poder sobre os outros´´."

De todo pertinentes, portanto, as seguintes ponderações da Dra. Marli Nogueira [05]:

"Daí a natureza ideológica e potencialmente totalitária dessas manifestações. Totalitária porque a essência de todas as ideologias consiste em espremer a realidade para dentro de uma teoria – como ocorre, por exemplo, com a idéia de que toda a história de nossa cultura se resume à opressão das mulheres. Como a realidade contradiz essa teoria, ela mesma deve ser proibida, o que é feito pelos Estados que se tornaram reféns das ideologias. É por isso que as ideologias são potenciais geradoras de Estados totalitários."

Por fim, caro leitor, não duvide: o Estado brasileiro está se tornando um estado comunista totalitário. Cabe às pessoas de bom senso insurgirem-se enquanto houver tempo. A omissão poderá custar muito caro às nossas liberdades.


Notas

01 De autoria da Dra. Marli Nogueira, Juíza do Trabalho em Brasília, baseado em artigo de William S. Lind, publicado por Mídia Sem Máscara, em fevereiro de 2006, e elaborado com a contribuição de Miguel Nagib e Félix Maier. Disponível em: <http://www.usinadeletras.com.br/exibelotexto.php?cod=3193&cat=Discursos>. Acesso em: 26 set. 2007.

02 Vide AARDWEG, Gerard J. M. van den. A batalha pela normalidade sexual e homossexualismo. Tradução de Orlando Reis. Aparecida: Santuário, 2000.

03 Art. 5.º, XLII: "a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei".

04 Op. cit.

05 Op. cit.

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Sobre o autor
Paul Medeiros Krause

Procurador do Banco Central em Belo Horizonte (MG), Ex-analista processual na Procuradoria da República no Estado de Minas Gerais

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

KRAUSE, Paul Medeiros. A inconstitucionalidade do projeto de lei da homofobia (PLC nº 122/2006) e o estado totalitário marxista.: tréplica a Paulo Roberto Iotti Vecchiatti. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1550, 29 set. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10468. Acesso em: 18 abr. 2024.

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