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Sigilo bancário em relação à administração tributária.

Existe direito individual a não ser fiscalizado?

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3. CONCLUSÃO

Este trabalho pretende levar ao leitor a uma reflexão sobre um instituto de muita importância, e que ainda não foi completamente esclarecido nem pela legislação, nem pela doutrina brasileira de forma clara – o sigilo bancário.

Procuramos primeiramente introduzir o tema, falando de sua importância nos dias atuais, daí partimos para o conhecimento histórico, analisando como surgiu o instituto e como se procedeu a sua evolução através dos tempos.

Passamos em seguida para a exposição dos sistemas legais que envolvem o instituto no Brasil, procurando uma adequada conceituação do instituto, analisando a legislação, o enquadramento do sigilo bancário nas diversas situações e detalhando alguns, dos diversos desdobramentos, em que se pode discutir a situação do instituto do sigilo bancário em nossa sociedade.

Para concluir então, elencamos inicialmente algumas constatações principais, verbis:

- A Lei Complementar n°. 105, de 2001, principalmente em se tratando de seus artigos 1°, §4°, 5° e 6°, apresentam-se contundentemente constitucional por não haver direito ou garantia individual e constitucionalmente protegida à não submissão à fiscalização tributária.

- Da mesma forma o Decreto n°. 3.724, de 2001, por arrastamento, apresenta-se totalmente constitucional.

- A quebra do sigilo bancário deve-se dar somente mediante o cumprimento de determinados requisitos legais pré-estabelecidos, como a existência de fundado indício de prática de infração, pelo contribuinte, à legislação tributária, e a atitude prudente, moderada e cautelosa do Fisco.

- Não há que se falar em irretroatividade da quebra do sigilo bancário, salvo o período decaído, em razão de inexistir garantia constitucional do ato jurídico perfeito para prática de ato ilegal e antijurídico.

- O combate à sonegação fiscal, com a utilização de todos os instrumentos pertinentes e legalmente autorizados, como o acesso aos registros bancários, é imprescindível aos que pleiteiam a diminuição da carga tributária atualmente existente.

Vale ressaltar, que este estudo não pretende esgotar a discussão, ainda ampla e crescente, acerca da quebra do sigilo bancário pelo Fisco, bem como, de modo algum, concordamos com a sonegação fiscal e de todos os outros artifícios utilizados pelo contribuinte para afastar de si a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária.

Acatamos a idéia de que ao Estado devem sobrar recursos viáveis e mantenedores das garantias constitucionais que possam ser implementados a fim de combater as práticas evasivas dos contribuintes, como o acesso às informações bancárias, sem que isto signifique, necessariamente, "quebra" de sigilo de dados ou mesmo devassa em sua intimidade.

Propõe-se, ademais, uma defesa por um processo mais justo, para que se apresente viável a quebra do sigilo bancário somente quando o Fisco possuir fortes indícios de fraude fiscal. Dessa forma, cabível se mostra que a Administração Tributária tenha livre acesso às informações referentes às movimentações financeiras de seus contribuintes.

A quebra do sigilo bancário pelo Fisco vem sendo maciçamente discutida, tanto em âmbito doutrinário, quanto jurisprudencial, porém, conforme demonstrado em todo o decorrer deste trabalho, não é mais questão que mereça análise delongada, tendo em vista que o caminho seguido pela LC 105/2001 parece ser bastante razoável e, mais que isso, constitucional.

Mais do que o Direito Tributário, o assunto em tela envolve também questões de Direito Penal, Bancário, e até de Direito Administrativo. De toda sorte, conforme muito bem destacado pelo Ex-Ministro Francisco Rezek, a matéria relativa a sigilo bancário é de competência da legislação complementar, sendo, portanto, infraconstitucional. Ou seja, não há que se falar que, uma vez ocorrida a quebra de sigilo bancário, feita por quem for, ocorre invasão e desrespeito a direito constitucionalmente protegido. Ainda, mesmo que assim não fosse, conforme já asseverado, não há direito absoluto, mesmo constitucional e individual.

O estudo sistemático da questão visa, além do mais, à busca de novos paradigmas para a atuação do jurista frente à conduta fazendária.

Há, é certo, que ressaltar, que por vezes, a manutenção do sigilo bancário acaba por servir à prática de fraudes, sendo uma forma de esconder manobras ilegais de muitos e verdadeiros "ladrões", que se aproveitam desta garantia constitucional para cometer os mais diversos crimes, sabendo que a legislação mantém o sigilo de suas contas e, com isso, escondem seus delitos.

Foi pensando nisto que o legislador criou hipóteses em que a quebra do sigilo bancário se torna viável pela Autoridade Fazendária. Porém, esta só poderá ocorrer em casos específicos e somente pelas pessoas legalmente competentes para tanto.

Neste sentido que encontramos a corrente daqueles que defendem que o Fisco ter conhecimento das movimentações bancárias não seria quebra de sigilo, uma vez que, ele, assim como o gerente do banco, está praticando as atividades ligadas às suas profissões, na qual, se enquadra o de ter conhecimento das movimentações bancárias. Seria então quebra o fato do Fisco repassar estas informações a terceiros, salvo atuação de cobrança em juízo, pois, enquanto permanecer no âmbito da SRFB não se enquadraria como quebra de sigilo bancário.

Retornamos ao nosso pensamento inicial, no qual a quebra do sigilo bancário, conforme consideramos no decorrer dos capítulos acima, deve ser preservada em circunstâncias pré-estabelecidas legalmente, e sobre devido processo legal, respeitando a todas as balizas constitucionais, já que visa evitar a sonegação e outros crimes fiscais de prática comum.

A necessidade de um processo instaurado tem por finalidade proteger o contribuinte através dos institutos do contraditório e da ampla defesa. Entrementes, não há impedimento legal ou constitucional para que este processo seja administrativo, ou procedimento de fiscalização, como determina a LC 105/2001. Até mesmo porque, também nos processos administrativos é obrigatório o respeito à garantia constitucional do contraditório e ampla defesa (CR/88, art. 5º, "LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes").

Repise-se, o modo como essa intervenção fazendária vem sendo feita é o melhor, mais justo e condizente com o texto da Carta Magna. Cabe aos estudiosos do Direito questionar, constantemente, acerca da legalidade de certas ações governamentais operacionalizadas na prática, a fim de zelar pelos direitos dos cidadãos e de garantir o cumprimento e respeito ao disposto na Constituição. No entanto, eventual má prática do instrumento legalmente disponível não deve gerar a negação do próprio instrumento, mas, sim, a punição do agente infrator que praticou de forma incorreta o permissivo legal.

Não há que se discordar, como já colocado, que há circunstâncias em que o controle fiscal beneficia a todos, devendo ser mantido e defendido por aqueles que têm plena consciência da importância de seu papel na sociedade e que conhecem bem aquele ditado de que "quem não deve não teme".

É necessário, reiterar, contudo, que existem balizas procedimentais que resguardam a intimidade do contribuinte o máximo possível. E estas balizas devem sempre ser respeitadas. Afinal de contas, contribuintes somos todos, e por sermos todos iguais, devemos buscar a manutenção dessa igualdade através de uma constante vigilância da atuação fazendária.

Claro, que não se pretende aqui estabelecer diretrizes para os pensamentos subseqüentes sobre o tema. Mas, crê-se que com este trabalho seja possível plantar a semente do tema e chamar a atenção para a complexidade e infinidade de interpretações existentes em relação ao assunto. Esperamos que, o que foi aqui plantado seja colhido em forma de estudos mais densos e longos para tentar achar o senso comum, em prol dos cidadãos e da sociedade e não de ferramentas (sigilo bancário) que ocultam a prática atos ilegais e ilícitos penais.

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4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Notas

  1. BASTOS, Celso Ribeiro e MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil.2ºVolume. Editora Saraiva.São Paulo.P.4.1988-1989
  2. BASTOS, Celso Ribeiro e MARTINS, Ives Gandra.Comentários à Constituição do Brasil. 2º Volume. Editora Saraiva.São Paulo.P.63. 1988-1989
  3. HUNGRIA,Nelson. Comentários ao Código Pena. Vol. 6.
  4. NETO,Tourinho.Revista da Associação Brasileiro de Direito Tributário. Del Rey. Belo Horizonte, 1998, apud "Sigilo Bancário, a Nova Lei que Define o Crime de Lavagem de Dinheiro," pp.234 e 235
  5. COVELLO,Sérgio Carlos. O Sigilo Bancário. Edição Universitária de Direito.S.Paulo,P 69.1991
  6. FARHAT, Raymond, apud QUEIROZ, Cid Heráclito de, O sigilo Bancário, in Sind. Dos Bancos do RJ, Caderno Especial, 1992.
  7. COVELLO, Sérgio Carlos.O Sigilo bancário Ed.Universitária de Direito. S.Paulo.P.71.1991.
  8. ABRÃO, Nelson. Abalo de Crédito. (Enciclopédia Saraiva do Direito, Vol.I)
  9. Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem. Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1(um) ano, ou multa.
  10. "Não se conceberia que o advogado e o padre, p.ex., fossem compelidos a devassar confidências recebidas em função de sua atividade, quando outras leis os garantem em função de sua atividade, contra delações a que os obrigaram, e até os punem se as fizerem (Código Penal, art. 154)" BALLEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. Atualizado por DERZI, Misabel Abreu Machado, pp.993.
  11. Ninguém pode ser obrigado a depor de fatos, a cujo respeito, por estado ou profissão, deva guardar segredo.
  12. São proibidos de depor as pessoas que, em razão de função, ministério, ofício ou profissão, devam guardar segredo, salvo se, desobrigadas pela parte interessada, quiserem dar o seu testemunho.
  13. MARINS, James. Direito Processual Tributário Brasileiro. 4. ed. São Paulo: Dialética, 2005, p. 247.
  14. Parecer de Miguel Reale e Ives Gandra Martins, consultados pela Ordem do Advogados do Brasil, Secção São Paulo, publicado no site Consultor Jurídico em 11 de dezembro de 2002, www.conjur.com.br
  15. Texto básico da palestra proferida, pelo Autor, no dia 02/08/2001, em São Paulo, no Ciclo de Palestras Jurídicas, uma promoção do UNIBANCO e da FEBRABAN.
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Sobre o autor
Flávio Lúcio Chaves de Resende

Procurador da Fazenda Nacional desde 2008. Graduado em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (2007). Pós-Graduando Lato Sensu em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera-Uniderp e Rede LFG e em Direito Processual Civil pela Universidade Anhanguera-Uniderp e Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP) e Rede LFGexperiência na área de Direito, com ênfase em Direito Tributário, Constitucional, Administrativo e Processo Civil. Ex-Gestor Fazendário da Secretaria de Estado de Fazenda de Minas Gerais.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RESENDE, Flávio Lúcio Chaves. Sigilo bancário em relação à administração tributária.: Existe direito individual a não ser fiscalizado?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2690, 12 nov. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17819. Acesso em: 25 abr. 2024.

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