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Legislação federal sobre poluição sonora urbana e competência dos Municípios

25/11/2011 às 13:44
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Sobre a poluição sonora, a União já legislou até os limites de sua competência e capacidade, cabendo aos Municípios legislar sobre os aspectos aplicáveis à convivência urbana, tendo como base normas técnicas editadas e atualizadas pelos órgãos normatizadores, no caso da ABNT e do INMETRO.

I – Introdução

De maneira resumida abordaremos a legislação federal referente à poluição sonora em áreas urbanas e competência dos municípios em legislar nesse campo.

De início, citemos o artigo 24 da Constituição Federal:

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre

VI – florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção ao meio ambiente e controle da poluição; VII – proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico;

§ 1º No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais.

O artigo 30 da Carta Magna relaciona as competências atribuídas aos Municípios, entre as quais estão as de legislar sobre assuntos de interesse local, prestar serviços públicos de interesse local e promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano.

Art. 30. Compete aos Municípios:

I – legislar sobre assuntos de interesse local;

V – organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;

VIII – promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;

Como parte essencial no que concerne a legalidade e legitimidade da União de legislar sobre o tema em pauta está à definição do que é poluição, definição esta expressa pelo inciso III do art. 3º da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981:

Art. 3º Para os fins previstos nesta Lei entende-se por:

III - poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente:

a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população;

b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas;

c) afetem desfavoravelmente a biota;

d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente;

e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos;

Cabe destacar que a Lei nº 6.938/81, que “dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências” foi recepcionada e tem sido acatada como regulamento da Constituição Federal no campo do meio ambiente, detalhando a distribuição de competências entre os entes da Federação.


II - Competência da União, dos Estados e dos Municípios em matéria ambiental

Os especialistas em matéria de Direito Ambiental e os técnicos da área, como engenheiros, arquitetos, químicos, etc, concordam unanimemente que a emissão de sons e ruídos em níveis que causam incômodos às pessoas e animais e que prejudica, assim, a saúde e as atividades humanas, enquadra-se perfeitamente no conceito de poluição legalmente aceito no Brasil.

Está entre as competências da União formuladas pela Constituição Federal de 1988, portanto, a de estabelecer normas gerais sobre o controle da poluição, entendida esta de forma ampla. Esta competência vem sendo cumprida particularmente nos campo da legislação ambiental e penal, como se verifica a seguir.

A legislação ambiental disciplina o controle da poluição de um modo geral, por exemplo, obrigando o licenciamento ambiental de atividades efetiva ou potencialmente degradantes e poluidoras, entre elas as que emitem elevados níveis de sons, ruídos e vibrações.

Relaciona-se, portanto, entre a legislação ambiental federal que trata da matéria a já citada Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981 e a Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998 que “dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências”, cujo artigo 54 considera crime “causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora”.

Assim sendo, como a poluição sonora pode causar danos à saúde humana, afetando os sistemas auditivo e nervoso das pessoas, e inclusive causando outras doenças, como, por exemplo, Stress gastrites, problemas cardíacos, AVC’s, pode aquele que a provocar ser enquadrado no disposto nesse artigo da lei, sujeitando-se a penas de reclusão de um a quatro anos, além de multa.

É importante salientar que na discussão do projeto que resultou na Lei nº 9.605/98, a poluição sonora chegou a ser explicitada entre os crimes ambientais, mas foi abruptamente retirada por pressão da bancada evangélica, a qual via no dispositivo a possibilidade de cerceamento da liberdade de culto.

Hoje, contudo, observa-se que já existem diversas decisões jurisprudências condenando os templos evangélicos em razão da prática de poluição sonora, perturbando a paz, o sossego alheio, a saúde e a segurança da coletividade.

Também o Código de Trânsito Brasileiro, instituído pela Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997 trata do controle da poluição sonora em seu art. 104:

Art. 104. Os veículos em circulação terão suas condições de segurança, de controle de emissão de gases poluentes e de ruído avaliadas mediante inspeção, que será obrigatória, na forma e periodicidade estabelecidas pelo CONTRAN para os itens de segurança e pelo CONAMA para emissão de gases e ruído.

§ 5º Será aplicada a medida administrativa de retenção aos veículos reprovados na inspeção de segurança e na emissão de gases poluentes e ruído.

A poluição sonora já era há muito tempo tratada na Lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941 – Lei das Contravenções Penais -, cujo art. 42 considera a poluição sonora uma contravenção referente à paz pública:

Art. 42. Perturbar alguém o trabalho ou sossego alheios:

I - com gritaria ou algazarra;

II – exercendo profissão incômoda ou ruidosa, em desacordo com as prescrições legais;

III – abusando de instrumentos sonoros ou sinais acústicos;

IV – provocando ou não procurando impedir barulho produzido por animal de que tem a guarda:

Pena – Prisão simples de quinze dias a três meses, ou multa.

Observa-se, portanto, que desde 1941 a Lei já protege o cidadão brasileiro dos incômodos da poluição sonora, isto muito antes de se pensar na questão ambiental da forma ampla como é tratada atualmente, e ainda nem sequer existia as enormes caixas de som que ficam situadas na parte traseira dos veículos automotores perturbando a saúde, o sossego alheio e a segurança da coletividade, e tampouco igrejas evangélicas, carros de propaganda com som ligado no mais alto volume, etc.

No entanto, há que diferenciar, o controle da poluição sonora dentro da abordagem dada pelas legislações ambiental, de trânsito e penal, do controle da localização, nas áreas urbanas, das atividades que a causam, este último intrinsecamente ligado ao planejamento e controle do uso do solo e das funções urbanas e, portanto, de competência exclusiva do poder municipal.


III - Competência do Município para legislar sobre Poluição Sonora

Observa-se, como posto no início desse artigo, o inciso VIII do art. 30 da Constituição Federal que incumbe ao Município “promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano”.

Dessa forma podemos destacar que a ocorrência de poluição sonora nas áreas urbanas só ocorre, portanto, ou com o consentimento do poder público municipal, ou pela ineficiência, negligência, omissão ou conivência dele.

Sob a avaliação dos planos urbanísticos municipais, as atividades urbanas devem ser distribuídas de modo a não haver incompatibilidades, tais como a localização de uma grande metalúrgica no meio de uma área residencial ou, pior ainda, ao lado de um hospital e jamais venham a perturbar o sossego, a segurança e a saúde alheias.

É também de competência dos municípios medidas mitigadoras da poluição sonora, como a restrição ao uso de buzinas em determinadas áreas e os horários e locais em que podem funcionar atividades naturalmente barulhentas, como espetáculos musicais e esportivos, bares, boates, danceterias, obras civis, entre outros.

O disciplinamento do uso do solo e das atividades urbanas é estabelecido por meio das leis municipais de ordenamento urbano e pelos códigos municipais de obras e de posturas.

Assim sendo, se na hipótese de determinado Município ainda não existirem essas leis ou na ausência delas permitem a prática da poluição sonora, nada pode ser feito em termos de aplicabilidade da legislação federal ou estadual, pois o “Pacto Federativo” garante a autonomia administrativa dos entes federados, respeitando-se as competências constitucionais de cada um deles segundo preceitua o caput do art. 18 da Constituição Federal.

Para controlar a poluição sonora, os Municípios e os órgãos ambientais e de trânsito valem-se de normas técnicas editadas pela Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT e pelo Instituto Brasileiro de Normatização e Metrologia – INMETRO, as quais definem os limites de ruído acima dos quais se caracteriza poluição sonora.

Como normas técnicas, esses instrumentos são periodicamente atualizados de acordo com a evolução tecnológica, o que não poderia ocorrer ou simplesmente seria muito mais difícil de ocorrer se fossem leis. Isto sem se levar em conta que as normas técnicas tratam de assuntos altamente complexos e polêmicos, de natureza especializada e, por essa razão, impossíveis de serem tratados pelos poderes legislativos. Outro argumento para que o poder legiferante (processo de criação de leis) sobre a poluição sonora urbana caiba ao Município é a capacidade ou poder de fazer cumprir efetivamente uma lei que a discipline. Dessa forma, observe-se que somente o Município tem condições operacionais de fiscalizar e combater a prática de poluição sonora dentro de seu território e da sua competência.

Sobre poluição sonora, tramitava na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 4.260, de 2001, de autoria do Deputado De Velasco, o qual tratava da definição de poluição sonora, ruídos, vibrações e dispunha sobre os limites máximos de intensidade da emissão de sons acústicos e normatizava a emissão de ruídos e vibrações resultantes de qualquer atividade. Mas esse projeto propunha regulamentar vários aspectos que invadiam a autonomia municipal, o que colocava em dúvida sua constitucionalidade. Além disso, ele simplesmente reproduzia disposições de normas da ABNT, engessando-as em uma lei que poderia em pouco tempo estar obsoleta, porém terminou sendo arquivado.

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IV – Conclusão

Concluindo, parece-nos claro e evidente que, sobre a poluição sonora, a União já legislou até os limites de sua competência e capacidade, cabendo aos Municípios legislar sobre os aspectos aplicáveis à convivência urbana, tendo como base normas técnicas editadas e atualizadas pelos órgãos normatizadores, no caso da ABNT e do INMETRO. Como se observa, a Poluição Sonora é considerada atualmente grave problema de Saúde Pública. São inúmeros os agravos à saúde causados por elevados índices de pressão sonora. A perda da audição (PAIR – Perda Auditiva Induzida por Ruído) é o efeito mais comum associado ao excesso de ruído e pode ser causado por várias atividades da vida diária. A poluição sonora pode causar ainda: mau humor; cefaléia; flutuações da pulsação cardíaca; hipertensão arterial; doenças cardíacas; gastrite; aumento do colesterol; aumento da pressão sanguínea; perda da libido; queda na produtividade física e mental, criando estados de cansaço e tensão que afetam o sistema nervoso e cardiovascular; vaso dilatação dos vasos periféricos; contração dos músculos das vísceras; modificações no funcionamento das glândulas endócrinas; disfunções gastrointestinais; tensão e dor muscular, principalmente nos ombros e pescoço. A responsabilidade sobre a geração da Poluição Sonora deve ser de todos, pessoas físicas ou jurídicas, não devendo existir a isenção de ninguém às barras da lei, nem mesmo a propriedade privada na figura das residências, devendo o Poder Municipal limitá-las administrativamente por meio do Poder de Polícia.

Entende-se que a questão da poluição sonora, com seus efeitos nefastos na saúde e relação ao bem estar da população, deve merecer a atenção do Poder Executivo e que este deve tomar as medidas apropriadas para, se não resolver, pelo menos atenuar a situação, que no meu humilde entendimento não resolve a questão.

Nesse caso, só há uma única alternativa: Em caso do cometimento da infração ambiental pela prática de poluição sonora por estabelecimentos como bares, restaurantes com música ao vivo, boates e danceterias, deve-se proceder ao imediato fechamento dos mesmos como medida cautelar, juntamente com a cobrança de multa, e a abertura de um processo administrativo objetivando e fazendo com que o infrator-poluidor pare de, e se abstenha da prática de fazer barulho, principalmente em horário noturno, e no caso de automóveis com aparelho ou equipamento sonoro de alta potência, como é o caso de hoje, na traseira do veículo, proceder sua apreensão juntamente com multa, e no caso de reincidência apreender definitivamente o instrumento sonoro e exigir a assinatura de um Termo de Ajuste de Conduta para que o infrator-poluidor deixe de causar poluição sonora.

Esse é o meu entendimento e minha contribuição como ex-procurador da Secretaria de Proteção ao Meio Ambiente de Maceió, para a sociedade e principalmente a todos aqueles que querem paz, sossego, silêncio e ter condições de poder descansar em suas residências, sem ser molestado por verdadeiros arruaceiros e criminosos que perturbam a paz social, através do deboche, da insolência, da algazarra, e do desrespeito ao próximo ferindo de morte a Constituição Federal, as leis ambientais que regem a matéria, aos legisladores e principalmente aos prefeitos que em sua grande maioria se comportam de maneira omissa e até conivente com essa prática criminosa que a prática de poluição sonora.


Legislação:

Competência dos Municípios em matéria ambiental: Constituição Federal:

Artigo 23, inciso VI: É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:

VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;

Artigo 30, incisos I e II:

Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e estadual, no que couber;

Jurisprudência:

TJRJ. Meio ambiente. Poluição Sonora. Competência legislativa. Município. Interesse local. Considerações do Desembargador Carlos Santos de Oliveira sobre o tema. CF/88, art. 30, I e II.

... Nesse particular deve ser destacado que a legislação municipal que estabeleça regras sobre assunto de interesse local e busque a suplementação da legislação federal no que couber, na forma dos incisos I e II do artigo 30 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, principalmente, no que concerne ao controle de Poluição ambiental, incluindo-se, por óbvio, a Poluição Sonora, deve respeitar a normatização federal produzida pela entidade competente, in casu, ABNT (...)

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Sobre o autor
Roberto Ramalho

Advogado e ex-procurador da Secretaria Municipal de Proteção ao Meio Ambiente de Maceió

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RAMALHO, Roberto. Legislação federal sobre poluição sonora urbana e competência dos Municípios. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3068, 25 nov. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20500. Acesso em: 2 nov. 2024.

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