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Apresentação espontânea impede prisão em flagrante

26/12/2011 às 14:15
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Trata-se de exposição sobre a impossibilidade de prisão em flagrante daquele que se apresenta espontaneamente perante a autoridade policial.

Resumo

Trata-se de exposição sobre a impossibilidade de prisão em flagrante daquele que se apresenta espontaneamente perante a autoridade policial.

Palavras-chave: apresentação espontânea, prisão, impossibilidade.

Abstract

It is exposed on the impossibility of imprisonment in the act of those that are spontaneously before the police authority.

Keywords: spontaneous appearance, prison, impossible.


Introdução

Esboçam-se aqui apenas alguns apontamentos quanto à apresentação espontânea, uma vez que esta ainda obsta a prisão em flagrante.

Essa inviabilidade da prisão em flagrante se dá por dois motivos. Primeiro, por não ter havido captura e condução, carecendo assim dos pressupostos das fases desse procedimento. E, segundo, por não preencher os requisitos do art. 302, III e IV, do CPP.

Já quanto ao flagrante próprio versado no inciso I do art. 302 do CPP, não se pode, em princípio, falar em apresentação espontânea, haja vista que, nessa hipótese, o agente é surpreendido cometendo a infração.

Vejamos, então, as questões relacionadas com o inciso II e, a seguir, aquelas ligadas aos incisos III e IV, todos do CPP.


1. Da apresentação espontânea e a impossibilidade de prisão pelo flagrante próprio do art. 302, II, do CPP

Se o agente acaba de cometer à infração e se apresenta imediatamente à polícia, numa leitura mais apressada do art. 302, II, poder-se-ia pensar na admissibilidade de sua prisão em flagrante. Isso porque o art. 317 do CPP não trata mais da apresentação espontânea. Foi alterado pela Lei 12.403/11. Versa agora sobre outro instituto – prisão domiciliar.

Contudo, doutrinariamente, a prisão em flagrante tem seu iter cronológico: 1) captura do suspeito; 2) condução à Delegacia de Polícia; 3) lavratura dos autos; 4) despacho efetuador; 5) arbitramento de fiança (se possível); 6) recolhimento ao cárcere; 7) expedição de nota de culpa; 8) comunicações ao juízo, promotor, defensoria etc [01].

De tal modo, se houver apresentação espontânea, não há falar-se em captura e nem tampouco em condução. Sem esses dois elementos das fases formais do flagrante, não se poderá dar ensejo às demais fases, tais como lavratura dos autos, fiança, encarceramento.

Assim leciona Eduardo Luiz Santos Cabette:

Seguindo nesse raciocínio, não se pode perder de vista que a eventual "lavratura" de um auto de prisão em flagrante e a possível "custódia" de alguém, pressupõem, em trivial lição da doutrina, a "captura" do suspeito, o que obviamente não ocorre em casos de sua apresentação espontânea. Se o infrator se apresenta "sponte propria" é justamente porque jamais foi "capturado", elidindo, destarte, pressuposto para a formalização de um flagrante. [02]

E isso, mesmo quando a apresentação espontânea se dá pelo próprio investigado mediante acionamento da Polícia Militar ou de terceiro, que venham a encaminhá-lo à Delegacia de Polícia. Ao ser encaminhado à Depol, esse encaminhamento não terá natureza de captura e condução. Nada mais será do que carona. É! É isso mesmo. Carona.

O fato de o suspeito estar no local da infração não impede a apresentação espontânea. Pois, se estava ainda na cena do crime, mas ele próprio acionou a Polícia, com a finalidade de se apresentar, não se poderá impor a prisão, uma vez que não se preenchem os requisitos do art. 302, conforme se esposou acima.


2. Da apresentação espontânea e a impossibilidade de prisão por flagrante impróprio e por flagrante presumido (art. 302, III e IV, do CPP)

Vamos agora à análise dos incisos III (flagrante impróprio) e IV (flagrante presumido) do art. 302 do CPP.

Em relação a esses dispositivos, os mesmos argumentos supraelencados são aplicáveis. Porém, os fatores impedientes de prisão em flagrante nas condições dos incisos III e IV não param por aí, uma vez que exigem ainda outros requisitos que merecem atenção em tópico próprio.

Com efeito, devem-se considerar as condições de regularidade traduzidas pelas expressões perseguição e encontro.

Se a alguém se apresenta espontaneamente, não se pode dizer que ela foi perseguida, nem tampouco encontrada. Assim, por via de regra, não se demonstramos pressupostos do art. 302, III e IV, do CPP.

Art. 302. Considera-se em flagrante delito quem: I - está cometendo a infração penal; II - acaba de cometê-la; III - é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração; IV - é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração.

O conceito de perseguição é dado pela própria lei:

Art. 290. § 1º. Entender-se-á que o executor vai em perseguição do réu, quando: a) tendo-o avistado, for perseguindo-o sem interrupção, embora depois o tenha perdido de vista; b) sabendo, por indícios ou informações fidedignas, que o réu tenha passado, há pouco tempo, em tal ou qual direção, pelo lugar em que o procure, for no seu encalço.

Apresentando-se espontaneamente, não se pode dizer que foi perseguido. Inferência que se faz por motivos óbvios.

E se por ventura foi perseguido, mas não foi localizado pela polícia ou por quem o perseguiu, e sua localização se deu por ato de sua vontade, não se pode dizer também que foi encontrado.

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Para se caracterizar o encontro a que se refere o art. 302, IV, do CPP, a localização deve ser conseqüência da perseguição frustrada. Deve ser realizada logo depois do crime e causada pela continuidade das diligências encetadas, visando ao encalço do agente, em decorrência da perseguição malograda.

Como assevera Aury Lopes Júnior:

O primeiro requisito [do inciso IV] é que o agente seja "encontrado". Fazendo uma interpretação sistemática em relação aos incisos anteriores, pode-se afirmar que esse "encontrado" deve ser causal e não casual. É o encontrar de quem procurou, perseguiu e depois, perdendo o rastro, segue buscando o agente. Não se trata de um simples encontrar sem qualquer vinculação previamente estabelecida em relação ao delito. [03] (grifos no original).

Na lição de Eugênio Pacelli de Oliveira tem-se que a regra da experiência nos indica que, para que haja encontro do acusado, deve haver a anterior perseguição. [04]

Então, só há falar-se em encontro do suspeito se aquele que o procura estiver no seu encalço, logo depois da prática do delito, e consiga dessa forma localizá-lo, havendo correlação entre a procura e o encontro.

Nessa vereda, se nem mesmo a localização casual (acidental, fortuita) do suspeito pode dar ensejo à sua prisão, o que dizer se essa localização decorre de ato dele próprio? Não será, portanto, encontro, na acepção técnico-jurídica da palavra.

Com isso, se não houve perseguição ou se a perseguição foi frustrada e a localização do suspeito não se deu em razão da procura, não se perfazem os requisitos dos incisos III e IV do art. 302 do CPP para a prisão em flagrante. Se, dentro dessas circunstâncias, a prisão for levada a cabo pela autoridade policial, deverá ser imediatamente relaxada pelo juiz.

É certo que, se o suspeito estiver acuado e resolver se entregar, por perceber que sua localização será inexorável, a prisão poderá ser efetuada. É o exemplo do suspeito que entra em uma propriedade rural e se esconde, mas, ao ouvir as vozes dos policiais e o latido dos cães farejadores se aproximando do esconderijo, resolve se entregar. Nesse caso, estamos que a prisão será legítima, pois o encontro decorreu da perseguição.


3. Do comparecimento espontâneo no Código de Processo Penal Militar

Vale ainda salientar que o Código de Processo Penal Militar prevê o instituto do "comparecimento espontâneo".

Os requisitos da prisão em flagrante delito do CPPM (art. 244) são idênticos aos do CPP, embora haja algumas distinções formais e terminologias próprias [05] para a lavratura dos autos. Veja-se, por exemplo, que a autoridade militar poderá relaxar a prisão em flagrante. Estamos que se trata de uma impropriedade técnica do legislador, nada obstante, é expressão própria do CPPM.

Contudo, naquele diploma normativo, está disposto que o comparecimento espontâneo deverá ser realizado preferencialmente perante o Juiz. Caso contrário, deverá ser tomada sua oitiva e em seguida apresentado à autoridade judiciária para que esta delibere sobre a necessidade de prisão preventiva.

Eis o teor:

Art. 262. Comparecendo espontaneamente o indiciado ou acusado, tomar-se-ão por termo as declarações que fizer. Se o comparecimento não se der perante a autoridade judiciária, a esta serão apresentados o termo e o indiciado ou acusado, para que delibere acerca da prisão preventiva ou de outra medida que entender cabível. Parágrafo único. O termo será assinado por duas testemunhas presenciais do ocorrido; e, se o indiciado ou acusado não souber ou não puder assinar, sê-lo-á por uma pessoa a seu rogo, além das testemunhas mencionadas.

Nesse diapasão, o investigado que houver comparecido espontaneamente no âmbito da investigação militar não será preso em flagrante. Apenas será ouvido, na presença de duas testemunhas e, depois, encaminhado ao juiz.

Crê-se que a apresentação do investigado ao juiz poderá ser feita por meio de ofício, com cópia do termo e de demais elementos informativos do expediente, por meio eletrônico inclusive, da mesma forma como se procede na prática com os autos da prisão em flagrante. Mas a prisão em flagrante certamente ficará inviabilizada, cabendo, nessa ocasião, tão somente ao juiz analisar a necessidade da prisão preventiva, nos termos do art. 257 do CPPM.

É isso.


Referências bibliográficas

BARROS FILHO, Mário Leite de. Da análise das excludentes de antijuridicidade pelo delegado de polícia. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2942, 22 jul. 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/19603>. Acesso em: 17 dez. 2011.

CABETTE, Eduardo Luiz Santos. O advento da reforma do código de processo penal pela lei 12.403/11 e o destino da apresentação espontânea do acusado. Folha do Delegado. Disponível em: http://www.folhadodelegado.jex.com.br/artigos. Acesso em: 18 dez. 2011.

LEITE, Ravênia Márcia de Oliveira. A prisão em flagrante e a hipótese de relaxamento pelo delegado de polícia. Jus Vigilantibus. Disponível em: http://www.dietrich.adv.br/verArtigo.php?aid=107. Acesso em: 17 dez. 2011.

LOPES JÚNIOR, Aury. Direito Processual Penal e sua Conformidade Constitucional. Vol. II. 6ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.

OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de Processo Penal. 13ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2010.


Notas

  1. LEITE, Ravênia Márcia de Oliveira. A prisão em flagrante e a hipótese de relaxamento pelo delegado de polícia. Jus Vigilantibus. Disponível em: http://www.dietrich.adv.br/verArtigo.php?aid=107. Acesso em: 17 dez. 2011. Ver também: BARROS FILHO, Mário Leite de. Da análise das excludentes de antijuridicidade pelo delegado de polícia. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2942, 22 jul. 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/19603>. Acesso em: 17 dez. 2011.
  2. CABETTE, Eduardo Luiz Santos. O advento da reforma do código de processo penal pela lei 12.403/11 e o destino da apresentação espontânea do acusado. Folha do Delegado. Disponível em: http://www.folhadodelegado.jex.com.br/artigos. Acesso em: 18 dez. 2011.
  3. LOPES JÚNIOR, Aury. Direito Processual Penal e sua Conformidade Constitucional. Vol. II. 6ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 83
  4. OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de Processo Penal. 13ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2010.
  5. Nesse sentido é a linha perfilhada por Ravênia Leite, quando afirma ser inoportuna a expressão "relaxamento" quando a não efetuação da prisão em flagrante se dá por despacho da autoridade policial. Ver: LEITE, Ravênia Márcia de Oliveira. Op. cit.
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Sobre o autor
Eduardo de Camargo Loberto

Delegado de Polícia de Minas Gerais. Especialista em Ciências Penais pelo Curso de Pós-Graduação Lato Sensu com Formação para Magistério Superior da Pós-Uniderp/MS. Graduado pela Unisal-Lorena/SP. Professor do Curso de Pós-Graduação em Direito Penal da Faculdade de Direito e Ciências Sociais do Leste de Minas – Fadileste. Professor de Legislação Penal Especial no Curso Especial de Formação de Sargentos da Polícia Militar de Minas Gerais. Autor de artigos jurídico-científicos. Palestrante.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LOBERTO, Eduardo Camargo. Apresentação espontânea impede prisão em flagrante. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3099, 26 dez. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20717. Acesso em: 22 dez. 2024.

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