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Casos de aplicação e de não aplicação da Súmula 392, do Superior Tribunal de Justiça, e de fraude à execução fiscal

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Resumo:


  • O crédito tributário de um tributo real é uma obrigação propter rem, sendo que a alienação do bem do qual decorrem as obrigações tributárias transfere essas obrigações ao adquirente, conforme preceituado pelo CTN.

  • O Código de Processo Civil estabelece que a litigiosidade da coisa é necessária para a sucessão processual, permitindo à Fazenda Pública aceitar ou não a sucessão do adquirente em relação às obrigações tributárias.

  • A substituição da Certidão de Dívida Ativa e o redirecionamento da execução fiscal ao adquirente são permitidos nos casos de alienação fraudulenta, mas devem ser analisados caso a caso, considerando a litigiosidade da coisa e a ciência da Fazenda Pública.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Casos em que não é correto o pedido de substituição de CDA nos tributos reais.

Enfim, após toda essa longa análise, impõe destacar quando ocorre a alienação antes da citação válida uma vez já iniciada a execução, ou quando foi alienada a coisa antes mesmo do processo executivo, não é válido utilizar a substituição da CDA com o respectivo redirecionamento para o adquirente com base no art. 42, do CPC, pois não existe a coisa litigiosa para o Código de Processo Civil.

Entretanto, tal entendimento não se aplica se não houve o comunicado ao órgão competente da fazenda pública pelas partes envolvidas da realização da transação do bem ou não houve comunicado do respectivo Cartório sobre a mesma, quando se tratava de obrigação sua realizá-la.

No primeiro caso, seria ofensivo ao conteúdo ético do ordenamento jurídico brasileiro, imaginar a possibilidade de ver o Estado impedido de cobrar o crédito tributário do contribuinte por descumprir uma obrigação por parte deste. Seria uma evidente ofensa ao princípio da boa-fé objetiva.

Já no caso da falta do repasse das informações pelo Cartório, em razão do seu ofício, quando estava obrigado legalmente a realizá-lo, temos direta aplicação do art. 134, inciso VI, do CTN.[12]

Assim, ultrapassados tais excludentes, temos que, em existindo a inscrição em dívida ativa, mas sem existir o processo executivo, ou sem o alienante ter sido citado ainda, não há que se falar em alienação de coisa litigiosa, mas tão-somente há fraude à execução, pois a ciência da existência da dívida ativa já é suficiente, segundo o CTN, para que os atos de alienação futuros caracterizarem fraude à execução.

Neste caso e quando alienado o bem antes da execução com a respectiva ciência da Fazenda Pública (ato de atualização cadastral se alienado apenas em escritura particular ou por registro em cartório se alienado em escritura pública), devido a coisa não ser litigiosa ainda, não poderia a Fazenda Pública realizar a substituição da CDA.

Entretanto, se já iniciado o processo executivo e durante o período de distribuição do processo executivo e citação do executado, tiver ocorrido a alienação, cabe ao juízo não permitir a substituição da CDA e não extinguir o processo, pois não esqueçamos que, apesar de a coisa não ser litigiosa, houve fraude à execução e se trata de patrimônio público que sendo deixada de ser cobrado, devendo o Juízo continuar a execução contra o alienante, estendendo os efeitos da decisão ao adquirente, na forma do art. 42, §3º, do CPC.


Conclusão.

O crédito tributário de um tributo real emana de uma obrigação propter rem e, por isso, quando ocorre a alienação do bem do qual decorre as obrigações tributárias, estas vão agregadas ao mesmo à pessoa do adquirente. Esse entendimento foi bem desenvolvido pela doutrina, consagrado pelo Código Tributário Nacional nos seus artigos 130 e 131 e acatado pela jurisprudência.

O Código de Processo Civil, ao tratar de sucessão processual, foi bem expresso sobre a necessidade da litigiosidade da coisa para que fosse facultado ao outro pólo da demanda, no qual se encaixa a Fazenda Pública, aceitar ou não a sucessão processual.

O próprio Código de Processo Civil, ao ser analisando de forma conjunta com o art. 185, do CTN, demonstra a desnecessidade de tal alteração do sujeito passivo, por se tratar, minimante, de fraude à execução (art. 593, III c/c art. 42, caput, e art. 42,§3º, todos do CPC), mas também faculta, depois de validamente citado o Executado, à Fazenda Pública de alterar o sujeito passivo através da substituição de CDA e redirecionamento do pólo passivo da execução fiscal (art. 42,§2º, CPC).

Assim, somente nos casos em que ocorreu a alienação do bem - lembremos que necessita que a Fazenda Pública tenha ciência de tal alienação – antes da citação válida do Executado ou mesmo antes do processo executivo, é que se deve aplicar a súmula 392, do STJ, mas importa lembrar sobre a possibilidade de continuar a execução em relação ao alienante quando a alienação se deu após inscrição em dívida ativa e tendo ciência da mesma pelo alienante, uma vez que ocorreu alienação fraudulenta na forma do art. 185, do CTN.


ANEXO

Abaixo segue uma tabela bem explicativa de tudo que afirmamos, separada pelo momento da alienação:

Momento da alienação.

(ou momento da notificação à Fazenda)

Incidência da Súmula 392 do STJ

Incidência da fraude contra credores

Antes da inscrição em CDA

Sim

Não

Depois de inscrito em CDA, mas antes do ajuizamento da Execução

Sim

Sim

Depois da execução e antes da citação válida

X

Não possibilita redirecionamento

Sim

Depois de citado, Manifestou e ofertou outro bem em penhora

Não

Sim

Depois de citado, manifestou e ofertou o próprio bem em penhora

Não

Sim

(no caso, alienação de bem conscrito judicialmente)

Depois de Citado, manifestou sem ofertar bem em penhora

Não

Sim

Depois de citado, não se manifestou

Não

Sim


Notas

[1] Art. 2º, do Decreto nº 22.866/1933.“Consideram-se feitas em fraude da Fazenda Pública as alienações ou seu começo, realizadas pelo contribuinte em débito”.

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[2] Somente na execução: A doutrina de Luciano Amaro. Direito Tributário Brasileiro. Ed. Saraiva, 1997, p. 443 e Celso Ribeiro de Bastos. Curso de Direito Financeiro e de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 226. Em sentido contrário: Somente após a execução: efeitos da presunção a partir da inscrição em Dívida Ativa (Hugo de Brito Machado. Curso de direito tributário, p. 157).

[3] CTN. Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa. (Redação dada pela Lcp nº 118, de 2005)

Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem sido reservados, pelo devedor, bens ou rendas suficientes ao total pagamento da dívida inscrita. (Redação dada pela Lcp nº 118, de 2005)

[4] “Quem quer que tenha sucedido, a título universal ou singular, pendente a lide (tenha ou não havido habilitação, que é simples inserção processual, para integral formalmente a relação jurídica processual), está excluído dos embargos de terceiros; pois que não é terceiro: sucedeu à parte; adquiriu como vício litigiosi, ainda que o ignorasse ; e é indiferente que a aquisição tenha sido antes ou depois da sentença condenatória. Não importa se a parte, A, alienou a coisa a C, e C a D; D não é terceiro, nem o seria E, que a recebesse de D”. (Pontes de Miranda, Comentários ao Código de Processo Civil, Rio de Janeiro: Forense, 1977. Tomo XV, p. 33)

[5] Art. 568. São sujeitos passivos na execução:(Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)

I - o devedor, reconhecido como tal no título executivo; (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)

II - o espólio, os herdeiros ou os sucessores do devedor; (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)

III - o novo devedor, que assumiu, com o consentimento do credor, a obrigação resultante do título executivo; (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)

IV - o fiador judicial; (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)

V - o responsável tributário, assim definido na legislação própria. (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973).

[6] Dinamarco, Cândido Rangel. Execução Civil. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 290.

[7] CPC. Art. 600.  Considera-se atentatório à dignidade da Justiça o ato do executado que: (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).

I - frauda a execução; (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)

II - se opõe maliciosamente à execução, empregando ardis e meios artificiosos; (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)

III - resiste injustificadamente às ordens judiciais;  (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)

IV - intimado, não indica ao juiz, em 5 (cinco) dias, quais são e onde se encontram os bens sujeitos à penhora e seus respectivos valores. (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).

CPC. Art. 601. Nos casos previstos no artigo anterior, o devedor incidirá em multa fixada pelo juiz, em montante não superior a 20% (vinte por cento) do valor atualizado do débito em execução, sem prejuízo de outras sanções de natureza processual ou material, multa essa que reverterá em proveito do credor, exigível na própria execução.(Redação dada pela Lei nº 8.953, de 13.12.1994)

[8] Especificamente neste caso, ocorre ato atentatório à dignidade da justiça também na forma do art. 600, IV, combinado com o art. 601, do CPC, aumentando em 20% o valor da dívida.

[9] ASSIS, Araken de. Manual da Execução, São Paulo: RT, 2010, p. 297 e 311.

[10] Nesse sentido: CÂMARA. Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. Vol. II. Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, 2007, p. 233.

[11] Fraude à execução: Código Penal. Art. 179 - Fraudar execução, alienando, desviando, destruindo ou danificando bens, ou simulando dívidas:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.

Parágrafo único - Somente se procede mediante queixa.

[12] CTN, Art. 134. Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis:

(...)

VI - os tabeliães, escrivães e demais serventuários de ofício, pelos tributos devidos sobre os atos praticados por eles, ou perante eles, em razão do seu ofício;

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Sobre o autor
Humberto Antônio Barbosa Lima

Doutor (Ph.D.) em Ciências Jurídico-Econômicas pela Universidade de Coimbra. Mestre em Direito pela UFRN. Graduado em Direito pela UFC. Procurador do município de Natal Representante da Fazenda Pública junto ao Tribunal Administrativo de Tributos Municipais. Sócio do Barbosa e Souza Sociedade de Advogados. Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) de Direito Obrigacional e Direito Empresarial.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, Humberto Antônio Barbosa. Casos de aplicação e de não aplicação da Súmula 392, do Superior Tribunal de Justiça, e de fraude à execução fiscal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3176, 12 mar. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21263. Acesso em: 27 dez. 2024.

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