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Transparência pública e corrupção nos municípios brasileiros: o impacto do governo eletrônico

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01/05/2012 às 08:55
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O direito de acesso à informação pública e os mecanismos de promoção da transparência são instrumentos para o desenvolvimento das instituições e da participação cidadã, indispensáveis à prevenção e o combate à corrupção.

Resumo

Esta pesquisa tem como objetivo analisar o impacto dos mecanismos de governo eletrônico sobre a ocorrência de improbidades na administração pública municipal brasileira. Trata-se de um estudo exploratório, orientado para variáveis, baseado numa amostra representativa de municípios brasileiros. Os resultados evidenciam a associação negativa existe entre essas variáveis, corroborando a importância de aperfeiçoar a transparência pública como instrumento indispensável de combate à corrupção no Brasil.

Palavras-chave: Corrupção. Governo Eletrônico. Transparência. Municípios.


1            Introdução

Esta pesquisa tem como objetivo descrever o comportamento das improbidades no setor público municipal brasileiro e verificar a sua associação com a qualidade dos mecanismos de governo eletrônico. Em geral, a ocorrência das improbidades é simplesmente denominada de “corrupção” e entendida como o abuso do poder público pelo interesse privado. Nesta pesquisa, porém, entenderemos que o agente público probo é aquele que age de acordo com a moralidade, a boa-fé e a lealdade. (MEIRELLES, 2007) É aquele que se atém ao que a lei determina e, tanto nestes, quanto nos atos discricionários, se pauta pelos valores da honestidade.  Por isso, ao invés de fazer uso dessa definição controversa de corrupção, serão as improbidades, entendidas aqui como a má gestão e o desvio da função pública, tanto pela ineficiência quanto pela inidoneidade do administrador, contrariando os imperativos éticos da administração e afetando negativamente o bem-estar social, que serão o objeto de análise.[1] (FAUSTINO, 2008, p.19)

Além disso, vale ressaltar que o estudo empírico da corrupção sempre foi prejudicado pela ausência de dados objetivos, uma condição que obrigou muitos pesquisadores a estudar o fenômeno a partir de dados baseados na percepção subjetiva e na expertise de especialistas ou empresários – uma estratégia bastante controversa, pois simplesmente presume a existência de uma correlação destes índices com os níveis reais de corrupção. (LAMBSDORFF, 2006, p.03) Nesta pesquisa essa dificuldade metodológica foi superada, pois a análise dos resultados do Programa de Fiscalização de Municípios por Sorteios Públicos da Controladoria-Geral da União permite, por primeira vez, gerar estatísticas confiáveis sobre a quantidade e a qualidade das improbidades cometidas na administração pública municipal brasileira no que tange a aplicação dos recursos públicos federais. Assim, fazendo uso dessas informações, gerou-se um banco de dados com mais de 67.000 registros de ocorrência de improbidade, em 840 municípios brasileiros, classificadas pelos auditores da Controladoria-Geral da União, segundo a gravidade de seus efeitos nocivos sobre o bom funcionamento da administração pública e dos programas governamentais.

Além da melhor qualidade dos dados sobre as improbidades, a seleção aleatória dos municípios brasileiros a serem auditados por esse órgão de controle interno, permite a geração de estatísticas mais confiáveis, pois elimina os principais vieses da amostra, favorecendo o estudo inferencial. Isso permitiu que fosse realizada uma análise estatística exploratória sobre o impacto da transparência pública municipal, mensurada pela qualidade dos mecanismos de governo eletrônico das prefeituras, e a ocorrência das improbidades na administração pública municipal que, por primeira vez, permitisse a inferência representativa para o conjunto dos municípios brasileiros.

Com esse intuito, serão apresentados: a descrição do Programa de Fiscalização de Municípios por Sorteios Públicos da Controladoria-Geral da União, cujos resultados serão objeto de estudo; detalham os aspectos metodológicos da amostra de municípios; a discussão do papel do governo eletrônico como instrumento de promoção da transparência pública (descrevendo o grau de seu desenvolvimento nos municípios brasileiros); os resultados dos testes de associação estatística que evidenciam empiricamente a hipótese de que a qualidade dos mecanismos de governo eletrônico é um fator significativo na redução da ocorrência de improbidades nos municípios brasileiros; e, nas considerações finais, serão discutidas as principais conclusões da pesquisa e suas implicações para a prevenção e o combate às improbidades na administração pública municipal brasileira.


2           O Programa de Fiscalização de Municípios por Sorteios Públicos da Controladoria-Geral da União

O Programa de Fiscalização de Municípios por Sorteios Públicos (PFSP) é uma das iniciativas da Controladoria-Geral da União (CGU), órgão da Presidência da República, criada pela medida provisória nº. 2.143-31, de 2 de abril de 2001. (BRASIL, 2001) A esse órgão cabe assistir ao Presidente da República nos assuntos relativos à defesa do patrimônio público, ao controle interno, à auditoria pública e à ouvidoria. A atividade de controle interno é uma responsabilidade do governo federal, expressa pelo art. 74 da Constituição Federal e a partir de 1994, foi centralizada na Secretaria Federal de Controle Interno da Controladoria-Geral da União. (BRASIL, 1988) Essas e atribuições estão expressamente definidas na lei n°10.683, de 28 de Maio de 2003. (BRASIL, 2003)

TABELA 1. Ficha Técnica do Programa

Ano de Criação

2003

Sorteios Realizados (até 2010)

33

Municípios Auditados (1º ao 33º)

1.871 (33,62% do total)

Recursos Auditados

Aprox. R$ 14 bilhões

Fontes: CGU, 2011; IBGE, 2011.

2.1.            Os principais processos

A escolha dos municípios a serem auditados é aleatória, realizada por meio do mecanismo de sorteio da Caixa Econômica Federal para as loterias, assegurando a transparência no processo de seleção. No primeiro sorteio foram auditados 5 municípios, no segundo 26, do terceiro ao nono foram auditados 50. A partir do 10º sorteio são auditados 60 municípios. O programa fiscaliza municípios com até 500 mil habitantes – esta população abarca 99,3% dos municípios brasileiros. (IBGE, 2011) Em municípios pequenos (até 20 mil habitantes) são analisados os recursos federais investidos em todas as áreas programáticas do governo; em municípios de médio porte (entre 20 e 500 mil habitantes) são analisadas as áreas de educação, assistência social e saúde, além de duas outras selecionadas em cada sorteio. (CGU, 2006).

Durante a fase de preparação da auditoria, após o sorteio, todas as informações referentes aos repasses de verbas federais aplicadas no município; além de informações sobre os convênios firmados, as denúncias feitas e as suspeitas de irregularidades apontadas pela mídia ou pela população são reunidas para análise. Em média, as ações de fiscalização perduram uma semana em que serão analisados os recursos repassados nos dois últimos exercícios financeiros. Durante o período da auditoria, os analistas de finanças e controle da Controladoria-Geral da União realizam o exame de convênios, licitações, notas fiscais de compras, a inspeção física das obras, verificam o funcionamento dos conselhos municipais, realizam entrevistas junto ao público beneficiário de alguns programas de governo, dentre outras ações. (CGU, 2006).

O principal produto deste programa é o “relatório de fiscalização” que sintetiza os resultados da auditoria nos municípios fiscalizados. Neste documento estão descritos todos os comentários, notas informativas e as falhas verificadas, ao qual é dada ampla divulgação no endereço eletrônico da Controladoria-Geral da União (2011). Além disso, são expedidos ofícios, com os resultados da fiscalização, diretamente, as Prefeituras Municipais, as Câmaras de Vereadores e as Promotorias de Justiça dos municípios auditados; aos Ministérios, ao Ministério Público Federal, ao Tribunal de Contas da União, dentre outros, possíveis interessados.

2.2.            A relevância das informações de auditoria

A análise da corrupção incorre em dois grandes desafios metodológicos: a conceitualização e a mensuração. A complexidade do fenômeno, associada a sua natureza sigilosa, impõe sérios obstáculos ao seu estudo. (JOHNSTON, 1996) Por isso, em geral, os dados são baseados na percepção subjetiva e na expertise, cuja utilização presume a existência de uma associação desses índices com os níveis reais de corrupção.[2]  (LAMBSDORFF, 2006, p.03)

As informações extraídas dos relatórios de fiscalização são importantes, pois oferecem uma excepcional alternativa para mensurar objetivamente os casos de corrupção e demais improbidades na aplicação dos recursos públicos federais nos municípios, em âmbito nacional. Ou seja, supera, em grande parte, as dificuldades impostas pelos indicadores subjetivos, baseados na percepção.

A fiscalização por meio do sorteio dos municípios, por sua vez, permite uma seleção aleatória de casos, contribuindo para afastar os principais vieses da amostra. Esse aspecto inovador permite o teste de proposições empíricas com base nas técnicas estatísticas – extremamente útil para realizar inferências de natureza descritiva, testar hipóteses e gerar previsões, por meio de modelos de associação entre variáveis. Porém, vale ressaltar, a análise estatística, descritiva e associativa, não é adequada, na mesma medida, para determinar os mecanismos causais subjacentes aos fenômenos. A explicação causal deriva, exclusivamente, de um referencial analítico e de pressupostos teóricos, cujo fundamento é o comportamento individual. (LITTLE, 1991; RAGIN, 2000; GERRING, 2009) Por esta razão, após a análise dos dados apresentaremos a função de utilidade dos agentes públicos, com o intuito de auxiliar na adequada interpretação e explicação dos resultados empíricos.


3           Aspectos Metodológicos da Pesquisa

3.1.            População, características da amostra e unidades de observação.

A pesquisa analisou todos os municípios, aleatoriamente sorteados entre a 20º e a 33º rodada (anos de 2006 e 2009) pelo programa de fiscalização. Isso representa uma amostra aleatória simples de 840 municípios brasileiros.[3] Considerando que a população de municípios atinge a marca de 5.565 e desconhecendo a estimativa da proporção do evento na população (assumindo p=0,5), é possível considerar esse conjunto de casos uma amostra, cujo erro amostral é de 3,4%, para um nível de confiança de 95%. (BARNETT, 1974)

A amostra abarca aproximadamente 15% dos municípios brasileiros. Os Estados que obtiveram as maiores e menores taxas de frequência de municípios auditados foram, respectivamente, o Amapá (com 37% de municípios) e Santa Catarina (com 11% de municípios). As regiões norte (21%), nordeste (18%) e centro-oeste (13%) detêm o maior percentual de municípios incluídos na amostra - as regiões sudeste (12%) e sul (11%) o menor.[4] Além disso, do total da amostra, 577 municípios (69%) são considerados pequenos (até 20.000 habitantes) e 263 municípios (31%) são de porte médio (entre 20.001 e 500.000 habitantes). Segundo os dados do IBGE (2011), essa população de municípios brasileiros, de até 500.000 habitantes, corresponde a 99,3% do total.

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3.2.            Os indicadores de improbidade

No que tange a unidade de observação, vale destacar que foram analisados todos os registros descritos nos relatórios de fiscalização, cuja classificação foi realizada pelos analistas de finanças e controle da Controladoria-Geral da União. Ao total, foram consideradas 67.891 registros, classificadas em: informações e comentários, falhas formais, médias e graves. (CGU, 2010)

A Controladoria-Geral da União utilizou os seguintes critérios de classificação:

a. Informações & comentários (I&C): são o registro sobre as normalidades da gestão, sobre os fatos ou contextualizações relevantes para o entendimento de determinado aspecto da administração ou ainda sobre impactos positivos, ganhos de desempenho e/ou qualidade nas operações de uma unidade, tais como melhorias (implantação e/ou implementação de alterações de caráter organizacional, ou especificamente operacional, vinculadas à missão institucional de uma unidade, que resultem em ganhos, claramente identificados, de desempenho e/ou de qualidade) e economias (implantação e/ou implementação de alterações de caráter organizacional, ou operacional, vinculadas à missão institucional de uma unidade, que redundem em ganhos financeiros, obrigatoriamente mensuráveis). Os registros do tipo "informação" não contêm recomendação;

b. Falhas formais: erros pontuais que pela baixa materialidade e relevância não têm desdobramentos que impactam a gestão de um programa ou ação governamental. Têm normalmente origem no descumprimento de normativos, em consequência de atos involuntários ou omissões, que não comprometem (não impactam) o desempenho do programa ou da unidade;

c. Falhas médias: são as situações indesejáveis que, apesar de comprometerem (impactarem) o desempenho do programa ou da unidade, não se enquadram nas ocorrências da falha grave. São decorrentes de atos ou de omissões em desacordo com os parâmetros de legalidade, eficiência, economicidade, efetividade ou qualidade, resultantes de fragilidades operacionais, nos normativos internos ou de insuficiência de informações gerenciais;

d. Falhas graves: são as situações indesejáveis que comprometem (impactam) significativamente o desempenho do programa ou da unidade, nas quais há a caracterização de uma das seguintes ocorrências:

I - omissão no dever de prestar contas;

II - prática de ato de gestão ilegal, ilegítimo, antieconômico, ou infração a Norma legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional ou patrimonial, que tenham potencialidade para causar prejuízo ao erário ou configurem grave desvio relativamente aos princípios a que está submetida a Administração Pública;

III - dano ao erário decorrente de ato de gestão ilegítimo ou antieconômico; e

IV - desfalque ou desvio de dinheiros, bens ou valores públicos.

Incluem-se ainda como falhas graves os descumprimentos de normativos relativos à Administração Pública que normalmente já indicam a gravidade de tais atos e dispõem sobre sanções aplicáveis aos agentes públicos responsáveis. (CGU, 2010)

Segundo os critérios de classificação da Controladoria-Geral da União, nenhum município da amostra deixou de apresentar ao menos um dos tipos de falha. As ocorrências se distribuíram da seguinte maneira:

•38 municípios apresentaram somente falhas médias - 4,5% da amostra;

•110 municípios apresentaram somente falhas formais e médias – 13% da amostra;

•143 municípios apresentaram somente falhas médias e graves – 17% da amostra;

•540 municípios apresentaram falhas formais, médias e graves – 64% da amostra. (CGU, 2010)

Vale ressaltar que, como todos os municípios apresentaram falhas médias e nenhum município apresentou unicamente falhas formais ou graves.


4           O governo eletrônico como instrumento fundamental da transparência no setor público

4.1.            Os mecanismos de governo eletrônico

As novas tecnologias da informação e comunicação, em especial, a Internet, fizeram surgir uma nova sociedade de indivíduos que, cada vez mais conectados, produzem e utilizam serviços, e se beneficiam das informações disponíveis na rede. (BRASIL, 2011c; CASTELLS, 1999) O avanço das tecnologias de informação e comunicação que vem ocorrendo nos últimos anos transformaram a sociedade contemporânea na chamada “sociedade da informação”, uma sociedade onde a informação e o conhecimento são considerados estratégicos para o seu funcionamento. (ARAKAKI, 2008)

Neste cenário de transformação da sociedade pelas tecnologias de informação e comunicação (TICs), surgiu o governo eletrônico, e-government ou e-gov, que pode ser definido como a utilização das TICs para ampliar e melhorar a prestação de informações e serviços pelos governos. Na Internet o e-gov corresponde ao governo materializado nos portais que integram informações e serviços de interesse do próprio Estado e dos cidadãos, de forma acessível e coerente, permitindo alcançar níveis superiores de eficácia e eficiência dos serviços prestados aos cidadãos e empresas, além de, eventualmente, promover uma maior participação nos processos decisórios. (ARAKAKI, 2008, p. 14)

Emissão de documentos, prestação de informações ligadas aos serviços públicos, acompanhamento das ações de governo e condução dos negócios públicos, acesso aos governantes e representantes eleitos são exemplos das possibilidades do uso das tecnologias de informação e comunicação pela administração pública. A possibilidade de acesso aos serviços, de participação nas decisões e acompanhamento dos atos governamentais por parte de todos os cidadãos, portanto, impõem a adoção de meios e métodos digitais por parte do governo, em todos os poderes constituídos e níveis governamentais, do emprego das tecnologias de informação e comunicação em benefício da eficácia, transparência e governança. (TAKAHASHI, 2000, p.8)

Para aqueles que dispõem de meios de acesso, as informações são diversas, públicas e gratuitas e, para os que não dispõem, o Estado assume um papel muito importante, voltado para a democratização do acesso à rede e a prestação eficiente de seus serviços aos cidadãos, por meio das políticas de inclusão digital. (BRASIL, 2011c) A adoção de meios eletrônicos para a prestação dos serviços governamentais exige que sítios e portais desenvolvidos e mantidos pela administração pública sejam fáceis de usar, relevantes, efetivos e eficientes. É, portanto, responsabilidade da administração pública oferecer ao cidadão a melhor experiência possível de acesso ao governo eletrônico, respeitando inclusive, as particularidades da população atingida. (BRASIL, 2011a) Assim, visto por outro ângulo, o e-gov deve ser entendido como uma iniciativa para modernizar a administração pública e torná-la mais eficaz, eficiente e efetiva, sendo resultados também do processo de evolução do modelo de gestão burocrático para o gerencial. (ARAKAKI, 2008)

O governo eletrônico é um instrumento de transformação da sociedade, nesse processo ele assume múltiplos papéis, servindo como:

•Promotor da cidadania e do desenvolvimento: o governo eletrônico deve ser voltado para as demandas dos cidadãos e a promoção do acesso e a consolidação de seus direitos (acesso aos serviços públicos, à informação, à economia de tempo e deslocamento, a ser ouvido pelo governo, ao controle social das ações dos agentes públicos, à participação política);

•Instrumento de mudança das organizações públicas, provocada pela melhoria do atendimento ao cidadão e a racionalização do uso dos recursos públicos. Isto não significa somente disponibilizar informações e serviços na Internet, mas fazer com que a presença do governo beneficie a sociedade e promova o efetivo acesso aos serviços públicos. Além disso, o acesso deve ser o mais amplo possível, possibilitando que o governo eletrônico construa capacidades coletivas de controle social e participação política;

•Promotor do processo de disseminação das TICs: as políticas de governo eletrônico devem incentivar a promoção do desenvolvimento de empresas nacionais a partir do aumento da demanda por produtos e serviços e da articulação de iniciativas de fomento e financiamento;

•Promotor da disseminação de práticas de gestão do conhecimento na Administração Pública, por meio da produção compartilhada e colaborativa da informação e do conhecimento no setor público, possibilitando a articulação e a gestão estratégica das políticas públicas (essenciais à integração das três esferas de governo). (BRASIL, 2004)

O governo eletrônico também pode ser encarado sob quatro perspectivas diferentes: a do cidadão (oferta de serviços de utilidade pública ao cidadão); de processos (remodelagem dos processos produtivos do governo, visando a maior eficiência); da cooperação (integração dos órgãos governamentais entre si e com outras organizações privadas e não governamentais, com o intuito de agilizar o processo decisório, sem perda de qualidade); da gestão do conhecimento (criação, gerenciamento e divulgação, em repositórios adequados, do conhecimento gerado e acumulado nos órgãos governamentais). (LENK; TRAUNMÜLLER, 2001) Na mesma linha, o modelo de Alexandre Fernandes Barbosa et al. (2004) considera as relações do e-gov sob o ponto de vista dos contextos interno e externo:

•Contexto interno: foco na gestão da administração pública: envolve os esforços de desburocratização, transparência, desintermediação e eficiência operacional;

•Contexto externo: foco no cidadão: envolve a eficácia e a qualidade dos serviços públicos, o desenvolvimento da sociedade da informação, a inclusão digital e o controle social.[5] (BARBOSA et al, 2004)

No que tange ao programa de governo eletrônico do governo federal, essas iniciativas visam priorizar o uso das tecnologias da informação e comunicação (TIC's) para democratizar o acesso à informação, visando ampliar o debate e a participação popular na construção das políticas públicas e aprimorar a qualidade dos serviços e das informações prestadas. Em síntese, é possível afirmar que a política de governo eletrônico no Brasil segue um conjunto de diretrizes, baseadas em três ideias fundamentais: participação cidadã; melhoria do gerenciamento interno do Estado; e integração com parceiros e fornecedores. (BRASIL, 2011b) Os objetivos da política são: transformar a relação do governo com a sociedade e promover interatividade com cidadãos, empresas e órgãos governamentais; contribuir para o processo de democratização do país; dinamiza a oferta de serviços públicos e proporcionar uma administração pública mais eficiente – permitindo que a sociedade utilize esses novos instrumentos para se manifestar junto ao poder público. (BRASIL, 2011c)

Acima de tudo, é preciso destacar que, a implementação do governo eletrônico é uma ferramenta indispensável para tornar o governo mais transparente, sob o ponto de vista do controle social, ao tornar disponível, aos cidadãos, informações sobre as ações e gastos do governo. Um aspecto fundamental para a prevenção e o combate à corrupção; pois, como foi discutido anteriormente no capítulo sobre “a função de utilidade do agente”, a transparência é um importante instrumento para fortalecer as capacidades institucionais do Estado e assim, elevar os custos de transação dos acordos corruptos – reduzindo significativamente os incentivos ao engajamento na corrupção.

4.2.            O governo eletrônico nos municípios brasileiros

Segundo os dados da Pesquisa de Informações Básicas Municipais do IBGE, em 2006, 48,1% dos municípios do país já possuíam, página na Internet. (IBGE, 2006) Desde então, este percentual vem crescendo em todas as classes de tamanho de municípios e em todas as regiões brasileiras. (IBGE, 2006) Em 2004, o percentual de municípios que declarava ter página era de 38,9%. Esta proporção chegava a 92,6% nos municípios com mais de 100 mil a 500 mil habitantes, alcançando a totalidade dos com mais de 500 mil. A Região Sul era a que apresentava a maior proporção de municípios com página (65,5%), seguida pela Região Sudeste (55,8%). (IBGE, 2006) Em 2009, a pesquisa revelou que 60,0% dos municípios do país já possuíam página na Internet. (IBGE, 2009)

A qualidade do serviço prestado nestas páginas, porém pode variar significativamente. Por isso, de acordo com a proposta do Gartner Group (SOOD, 2003), o IBGE classificou os portais em três fases: informativa, interativo e transacional.

•A primeira fase (informativa) é caracterizada pela descrição das informações básicas necessárias para procedimentos ou serviços, tais como: onde obter, horário e local de funcionamento da instituição e pré-requisitos necessários. Geralmente são informações estáticas, básicas, limitadas e com propósito geral. Mesmo assim, cada serviço é claramente identificado com a unidade da instituição que o executa;

•A segunda fase (interativa) oferece a possibilidade de pesquisa, obtenção e submissão de formulários necessários para a realização de procedimentos, além de links para outras informações relevantes. O modelo ainda é voltado à estrutura formal e os departamentos de governo são referenciados de acordo com o organograma;

•A última fase (transacional) permite a obtenção completa do serviço público de forma on-line. O serviço é totalmente realizado por meio eletrônico e está disponível 24 horas durante os 7 dias da semana. Além disso, a estrutura departamental, por trás da prestação, deixa de ser percebida. Nesse estágio os usuários podem conduzir, inclusive transações financeiras on-line. O foco é construir aplicações de autosserviço e também usar a web como um complemento para outros canais de entrega. (BRASIL, 2007b)

Em 2009, observa-se que 1.497 municípios tinham páginas informativas, 1.060 interativas e só 780 dispunham de páginas transacionais. Destas últimas, a grande maioria estava concentrada nas regiões sudeste e sul, com 512 municípios desse total.

Como demonstra a tabela (4.0), entre 2006 e 2009, houve um aumento no número de páginas governamentais funcionais (uma redução média de 23% no número de páginas governamentais inexistentes ou não funcionais). Além disso, o número de páginas transacionais elevou-se muitas vezes nesse período – embora, em 2009, proporcionalmente, corresponda somente a 3% das páginas dos municípios da região norte, 11% nos da região nordeste, 13% nos da região centro-oeste, 15% nos da região sudeste e, no máximo, 21% nos da região sul – prevalecendo, em todas as regiões, às páginas meramente informacionais.

TABELA 2. A Evolução do Governo Eletrônico no Brasil

Região

Tipo

FA (2006)

FA (2009)

FR (2006)

FR (2009)

Status

Norte

Não Funcional

333

274

74,2

61,0

- 18%

 

Informacional

85

118

18,9

26,3

39%

 

Interativa

23

42

5,1

9,4

82%

 

Transacional

7

15

1,6

3,3

114%

 

Total Válido

448

449

99,8

100,0

 

Nordeste

Não Funcional

1167

995

65,1

55,5

- 15%

 

Informacional

445

398

24,8

22,2

- 11%

 

Interativa

152

210

8,5

11,7

+ 38%

 

Transacional

27

190

1,5

10,6

+ 600%

 

Total Válido

1791

1793

99,9

100,0

 

Sudeste

Não Funcional

737

546

44,2

32,7

- 26%

 

Informacional

612

451

36,7

27,0

- 74%

 

Interativa

252

415

15,1

24,9

+ 65%

 

Transacional

66

256

4,0

15,3

+ 288%

 

Total Válido

1667

1668

99,9

100,0

 

Sul

Não Funcional

410

235

34,5

19,8

- 43%

 

Informacional

544

381

45,8

32,1

- 30%

 

Interativa

176

314

14,8

26,4

+ 74%

 

Transacional

58

256

4,9

21,5

+ 341%

 

Total Válido

1188

1186

100,0

99,8

 

C. Oeste

Não Funcional

241

175

51,7

37,6

- 27%

 

Informacional

152

149

32,6

32,0

- 2%

 

Interativa

50

79

10,7

17,0

+ 58%

 

Transacional

23

63

4,9

13,5

+ 174%

 

Total Válido

466

466

100,0

100,0

 

Fonte: IBGE, 2006; 2009.

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Sobre o autor
James Batista Vieira

Doutorando em Ciência Política (IESP/UERJ)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VIEIRA, James Batista. Transparência pública e corrupção nos municípios brasileiros: o impacto do governo eletrônico. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3226, 1 mai. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21635. Acesso em: 21 nov. 2024.

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