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O valor da biodiversidade.

Elementos para a ponderação da biodiversidade quando em colisão com outros princípios constitucionais

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10/01/2013 às 14:05
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5. CONCLUSÃO

A biodiversidade deve ser entendida como um conceito pluridimensional, inexistindo um relação simples e unívoca entre biodiversidade e os serviços ambientais essenciais para os seres humanos.  Uma incorreta compreensão acerca da complexidade das teias que se formam nas relações dos diversos seres vivos, inclusive o Homem, leva necessariamente à uma desvaloração da biodiversidade, o que, especialmente quando se cuida de estabelecer políticas públicas visando à sua conservação ou à edição de normas jurídicas tendentes à sua tutela, pode ter conseqüências drásticas para as presentes e futuras gerações.

Ao privilegiar unicamente o aspecto econômico-financeiro imediato, os seres humanos podem estar levando os recursos naturais, em especial os biológicos, a um ponto de ruptura, isto é, uma situação na qual um ecossistema experimenta um deslocamento para uma nova situação, com mudanças significativas para a biodiversidade e nos serviços às pessoas que ele sustenta e em que é impossível (ou pelo menos é muito difícil e caro) voltar ao estado anterior. Daí porque não mais é possível defender-se uma visão estreita acerca do valor da biodiversidade, mas é necessário que sua tutela seja vista de forma integrada às outras preocupações centrais da sociedade, como o combate à pobreza, a melhoria dos indicadores sociais e o desenvolvimento econômico.   Sem que adotemos medidas eficazes para proteção da biodiversidade, nosso futuro como espécie estará seriamente ameaçado. Com efeito, como apontado no Relatório GBO3[44],

As medidas tomadas durante as duas próximas décadas determinarão se as condições ambientais relativamente estáveis das quais a civilização humana tem dependido durante os últimos 10.000 anos continuarão para além deste século. Se não formos capazes de aproveitar essa oportunidade, muitos ecossistemas do planeta se transformarão em novos ecossistemas, com novos arranjos sem precedentes, nos quais a capacidade de suprir as necessidades das gerações presentes e futuras é extremamente incerta.

Neste aspecto, a correta compreensão do que é a biodiversidade e do quanto os seres humanos somos dela dependentes é fundamental para garantir que, quando em colisão com outros valores fundamentais, em especial o desenvolvimento econômico, possa o operador do Direito dispor de conhecimentos suficientes para poder conferir à biodiversidade um peso adequado na hora de solucionar a colisão, estabelecendo quais intervenções e restrições são admissíveis.

 Assim, em resumo, ao conferir à biodiversidade o valor e a prioridade que ela merece, questionando as atividades humanas e subordinando-as a uma melhoria da qualidade de vida para o homem, no presente e no futuro, estaremos não só exercitando nossa cidadania ambiental, protegendo as formas de vida que conosco compartilham o planeta, mas estaremos também, fundamentalmente, garantindo as bases para a continuidade da vida humana.


REFERÊNCIAS

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Notas

[1] Cf ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos fundamentais. P. 82 e SS.

[2] Cf ALEXY, Robert. La formula del peso. In CARBONELL, Miguel (editor). El principio de proporcionalidad y la interpretación constitucional. Serie Justicia e derechos Humanos – Neoconstitucionalismo y Sociedad. Quito: Ministerio de Justicia e Derechos Humanos de Ecuador. 2008, p. 13-42.

[3]  MILARÉ, edis. Direito do ambiente. 5ª. ed.São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 548

[4] BENSUSAN , N. 2008. Introdução. A impossibilidade de ganhar a aposta e a destruição da natureza In: Bensusan, N. (org.)Seria melhor mandar ladrilhar? Biodiversidade: como, para que e por que. 2a. edicao (revisada e ampliada), Brasilia; Editora Unb, 2008. p. 18

[5] Cf. BENSUSAN, Nurit. O que a natureza faz por nós: serviços ambientais. In: Bensusan, N.

(org.) Seria melhor mandar ladrilhar? Biodiversidade: como, para que e por que. 2a. edicao

(revisada e ampliada). Brasília:  Editora Universidade de Brasilia, p. 229 – 257

[6] SECRETARIADO DA CONVENÇÃO SOBRE DIVERSIDADE BIOLÓGICA, op. Cit. pp. 51/52.

[7] Idem, Ibidem, p. 23

[8] SECRETARIADO DA CONVENÇÃO SOBRE DIVERSIDADE BIOLÓGICA, op. Cit. P. 09

[9] SWIFT, Michael. Prefácio. In MOREIRA, Fátima, SIQUEIRA, José e BRUSSAARD, Lijbert. Biodiversidade do solo em ecossistemas brasileiros. Lavras: editora Ufla, 2008

[10] SILVA, José  Maria  Cardoso e GARDA, Adrian Antonio. Padrões e processos biogeográficos na amazônia. Disponível em << http://zoo.bio.ufpr.br/sbe/Conteudo786-1.pdf>> acesso em 26.08.2011.

[11] Idem, Ibidem, p. 190.

[12] Jeffrey J. Walker1, John R. Spear1 & Norman R. Pace . Geobiology of a microbial endolithic community in the Yellowstone geothermal environment. Nature 434, 1011-1014 (21 April 2005) disponível em << http://www.nature.com/nature/journal/v434/n7036/full/nature03447.html>> acessado em 24.08.2011

[13] http://oglobo.globo.com/blogs/nossoplaneta/. Acesso em 24.08.2011.

[14] O artigo com os resultados da pesquisa pode ser acessado em http://www.sciencemag.org/cgi/content/abstract/326/5954/858.

[15] <http://www.nasa.gov/home/hqnews/2010/dec/HQ_10-320_Toxic_Life.html> acesso em 24.08.2011

[16] MAY, Robert M. Why Worry about How Many Species and Their Loss?

 <http://www.plosbiology.org/article/info%3Adoi%2F10.1371%2Fjournal.pbio.1001130> acesso em 25.08.2011.

[17] MORA, Camilo,  et alli.  (2011) How Many Species Are There on Earth and in the Ocean? PLoS Biol 9(8): e1001127. doi:10.1371/journal.pbio.1001127. acesso em 24.08.2011

[18] Cf. Bensusan, N. 2008. Introdução. A impossibilidade de ganhar a aposta e a destruição da natureza In: Bensusan, N. (org.)Seria melhor mandar ladrilhar? Biodiversidade: como, para que e por que. 2a. edicao (revisada e ampliada), Brasilia; Editora Unb, 2008. pp. 17 – 39

[19] “It is a remarkable testament to humanity's narcissism that we know the number of books in the US Library of Congress on 1 February 2011 was 22,194,656, but cannot tell you—to within an order-of-magnitude—how many distinct species of plants and animals we share our world with”. MAY, Robert M. Why Worry about How Many Species and Their Loss?

[20] MORA Camilo,  et alli.  (2011) How Many Species Are There on Earth and in the Ocean? PLoS Biol 9(8): e1001127. doi:10.1371/journal.pbio.1001127. acesso em 24.08.2011

[21] SECRETARIADO DA CONVENÇÃO SOBRE DIVERSIDADE BIOLÓGICA, Panorama da Biodiversidade Global 3, Brasília: Ministério do Meio Ambiente, Secretaria de Biodiversidade e Florestas (MMA), 2010, p. 24.

[22] Cf. Bensusan, N. 2008. Introdução. A impossibilidade de ganhar a aposta e a destruição da natureza In: Bensusan, N. (org.)Seria melhor mandar ladrilhar? Biodiversidade: como, para que e por que. 2a. edicao (revisada e ampliada), Brasilia; Editora Unb, 2008. p. 18

[23] SECRETARIADO DA CONVENÇÃO SOBRE DIVERSIDADE BIOLÓGICA, Panorama da Biodiversidade Global 3, Brasília: Ministério do Meio Ambiente, Secretaria de Biodiversidade e Florestas (MMA), 2010, p. 55.

[24] Informação disponível em <http://www.wwf.org.br/informacoes/especiais/biodiversidade/>  acesso em 25.08.2011.

[25] ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais, São Paulo, Malheiros, 2008, p. 117/118.

[26] SECRETARIADO DA CONVENÇÃO SOBRE DIVERSIDADE BIOLÓGICA, op. Cit. p. 15.

[27] ALHO, CJR. The value of biodiversity. Braz. J. Biol.,  São Carlos,  v. 68,  n. 4, nov.  2008 .   Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1519-69842008000500018&lng=pt&nrm=iso>. acessos em  23  agosto  2011.  http://dx.doi.org/10.1590/S1519-69842008000500018

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[28] Tradução livre. No original: “This ethical argument, stating that the protection of biological integrity is morally good, is based on the fact that most biodiversity loss nowadays is caused by human activities and disturbances […]”

[29] Apud SANTOS, Laymert Garcia. Politizar as novas tecnologias. São Paulo: Ed. 34, 2003, p. 20.

[30] MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente. 5ª. ed.São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 562.

[31] Refiro-me aqui ao fato de que, apesar da superação no mundo ocidental do modelo de estado autoritário, (de direita e de esquerda), cada vez mais a economia, através dos organismos e instituições financeiras, passa a sê-lo. Este novo tipo de totalitarismo, nas palavras de Plauto Faraco de Azevedo, é “o dos regimes globalitários, que repousam sobre os dogmas da globalização e do pensamento único, não admitindo nenhuma outra política econômica, negligenciando os direitos sociais em nome da razão competitiva e abandonando aos mercados financeiros a direção total das sociedades dominadas”. (Ecocivilização: ambiente e Direito no liminar da vida. São Paulo; Ed. RT, 2008, p. 18) . 

[32] Apud SANTOS, Laymert Garcia. Politizar as novas tecnologias. São Paulo: Ed. 34, 2003, p. 18

[33] CF. SANTIAGO NINO, Carlos. Introdução à análise do Direito. P. 73 e SS.

[34]Politizar as novas tecnologias. São Paulo: Ed. 34, 2003, p. 19

[35] Entrevista a BBC Brasil, concedida a Rodrigo Amaral em 11de setembro de 2002.  Disponível em <<http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2002/020904_lesterrg2.shtml>>. Acesso em 15.09.2011

[36] MOURA, Luiz Antônio Abdalla de. Economia Ambiental. Gestão de Custos e Investimentos. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2000, p. 5.

[37] O exemplo foi extraído de AZEVEDO, Plauto Faraco. Ecocivilização. 2ª. Ed. São Paulo: Ed. Rt, 2008, p. 9 e SS.

[38] Apud SANTOS, Laymert Garcia. Politizar as novas tecnologias. P. 21

[39] Op. Cit., p. 78

[40] Cf. BENSUSAN, Nurit,  O que a natureza faz por nós: serviços ambientais. In: Bensusan, N. (org.) Seria melhor mandar ladrilhar? Biodiversidade: como, para que e por que. 2a. Ed. Brasília: Ed. Unb, 2008, p. p. 229

[41] TEEB. A Economia dos Ecossistemas e da Biodiversidade para Formuladores de Políticas Locais e Regionais – disponível em  http://www.teebweb.org/ForLocalandRegionalPolicy/tabid/1020/Default.aspx.  P. 03. Acesso em 20.09.2011.

[42] Disponível em <http://veja.abril.com.br/090610/preco-biodiversidade-p-156.shtml>. acesso em 26.09.2011

[43] TEEB. Op. Cit., p. 03

[44] SECRETARIADO DA CONVENÇÃO SOBRE DIVERSIDADE BIOLÓGICA, op. Cit. P. 09


ABSTRACT: The article deals with the question of the value to be given to biodiversity when balancing constitutional principles in collision. It examines the dimensions of the concept of biodiversity (genetic diversity within a species, species diversity and ecosystem diversity) and points to the necessity, in the legal protection of biodiversity, to overcome the restrictive and utilitarian view that leads the economic development to prevail over the biodiversity. To that end, are given the ethical reasons (protection of biodiversity due to its intrinsic value), adopted by the national policy of biodiversity, and the anthropocentric reasons (aesthetic, cultural, and spiritual, as well as economic), criticizing the restrictive economic view that doesn’t evaluate the ecological services and the environmental costs.

Key-words: biodiversity. Value. Ethical reasons. Antropocentric reasons 

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Sobre o autor
Marcio Luiz Coelho de Freitas

Juiz Federal titular da 2ª Vara da Seção Judiciária do Amazonas. Mestrando em Direito Ambiental pela Universidade Estadual do Amazonas. Professor da Escola Superior de Magistratura do Estado do Amazonas.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FREITAS, Marcio Luiz Coelho. O valor da biodiversidade.: Elementos para a ponderação da biodiversidade quando em colisão com outros princípios constitucionais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3480, 10 jan. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23399. Acesso em: 25 abr. 2024.

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